O Brasil possui belíssimas cavernas submersas, porém poucas são abertas à visitação – mas valem demais o esforço de conhecê-las

Existem muitas cavernas submersas nas profundezas dos mares, rios e lagoas do Brasil. Boa parte delas é fechada à visitação por questões de proteção ambiental, mas as poucas que restam para o público valem a pena ser conhecidas de perto. “As ricas formações rochosas e a entrada de luz quando você sai do escuro de uma caverna são visões que me fazem voltar sempre a esses lugares”, diz a mergulhadora Renata Linger. Você não precisa ser muito experiente para explorar algumas delas, que possibilitam curtir rolês de snorkel flutuando na superfície. Outras, no entanto, exigem bastante técnica do visitante.

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“Além das aulas, é necessário, no mínimo, 50 mergulhos em águas abertas e o certificado de Advanced Open Water Diver para fazer a especialização em mergulho em cavernas”, conta Ricardo Meures, da escola Scuba Point, em São Paulo. Além do treinamento, o equipamento também é diferente: são dois cilindros, dois reguladores, lanterna e uma mistura de gases, com nitrogênio e hélio, para suportar grandes profundidades. Tanto esforço compensa. Eis aqui cinco cavernas submersas no Brasil para você aproveitar ao máximo esses ambientes isolados e impressionantemente belo.

Lagoa Misteriosa (MS)

CAVERNAS SUBMERSAS: O nome da Lagoa Misteriosa, perto de Bonito, vem do desconhecimento sobre sua profundidade

Programar-se é essencial para submergir nos lindos tons azulados da lagoa Misteriosa, a primeira caverna inundada do Brasil com autorização para receber turistas. Ali, só é permitido entrar com os instrutores das agências credenciadas a vender o passeio (para mais informações, consulte o site atrativosbonito.com.br).

O rolê já começa em uma trilha de 550 metros, em meio à Fazenda Cabeceira do Prata, no município de Jardim, a 54 quilômetros da cidade de Bonito (agências como a H2O Ecoturismo oferecem traslados). Ao final do curto percurso com vegetação local, o cenário é de tirar o fôlego: uma dolina – espécie de depressão circular no solo – de 75 metros de profundidade encerra águas cristalinas.

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Olhando com mais calma, percebe-se que não se trata apenas de uma simples lagoa. Depois de descer a escadaria de 179 degraus para chegar à superfície translúcida, o que se vê é um abismo, ainda mais profundo, imerso na água. E o melhor é que ninguém passa vontade. Quem não possui curso de mergulho pode experimentar a flutuação com máscara, snorkel e colete salva-vidas. Mesmo de cima, dá para observar a beleza das profundezas, como pequenos peixes que brilham nos feixes de luz e troncos de árvores soltos. Se quiser ousar um pouco mais, dá para mergulhar com cilindro até os oito metros de profundidade.

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Esse limite não é à toa: a partir dali abrem-se dois poços, com cerca de dez metros de diâmetro, que descem para mais de 220 metros. Não se sabe ao certo onde fica o fundo, e é daí que surge o mistério que dá nome à lagoa. Para se aventurar nessas colunas verticais e apreciar a natureza submersa, é preciso muito preparo. Caso o mergulhador tenha a certificação Open Water Diver, ele pode atingir até 18 metros. Aos privilegiados com a Advanced Open Water Diver, a permissão é de 25 metros.

Para além dessa profundidade, o mergulho é enquadrado na categoria técnica (preço sob consulta; lagoamisteriosa.com.br) e deve seguir algumas regras, como uso de gás hélio no cilindro. Ao final do passeio (que dura em média 40 minutos, exceto no mergulho técnico), uma dica é passear no Recanto Ecológico Rio da Prata, que fica na mesma fazenda, com uma parada estratégica para almoçar na sede.

Abismo de Anhumas (MS)

CAVERNAS SUBMERSAS: esta foto e abaixo, o Abismo de Anhumas, na região de Bonito

Ainda na região de Bonito, outro destino adorado pelos mergulhadores de caverna é o Abismo de Anhumas, a 19 quilômetros da cidade (Estrada para Campo dos Índios, na Fazenda Anhumas). Aberta à visitação desde 1999, essa imensa gruta tem sua abertura no solo e traz como principal encanto sua formação geológica: milhões de anos esculpiram as lindas estalactites e estalagmites que, hoje, enchem os olhos dos visitantes. O passeio é pura aventura: para alcançar a água transparente, é preciso descer de rapel por uma fenda. O treinamento é feito um dia antes com os monitores locais, em Bonito (abismoanhumas.com.br). Nesse encontro, os instrutores avaliam quem está ou não apto à descida. São apenas 18 pessoas por dia, sendo quatro para mergulho, por isso reserve com antecedência.

Outra dica importante é marcar o traslado até o Abismo com uma agência de turismo local, bem como o aluguel do equipamento de mergulho autônomo, para aqueles que possuírem o curso Básico de Mergulho da Open Water. À beira da fenda, são três metros de uma passagem estreita, que leva ao imenso buraco que se abre sob os pés. Do teto da caverna, já é possível vislumbrar as formações calcárias dentro do lago, que possui, aproximadamente, 80 metros de profundidade e largura de um campo de futebol. Até o deck flutuante, são mais 72 metros de rapel.

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Um bote inflável leva os visitantes a um passeio, com explicações sobre a geologia local e uma vista impressionante ao salão de espeleotemas (deposições minerais em cavernas), na parte seca da gruta – onde não é permitido descer. No retorno à plataforma, é chegada a hora de se preparar para o mergulho. Há um banheiro químico para trocar de roupa e colocar a de neoprene, já que a temperatura da água não passa dos 20ºC.

Quem opta pela flutuação observa, da superfície, um vale de cones que chegam a 20 metros de altura, em meio à imensidão azul. Para os aptos a mergulhar com cilindro, é possível afundar até 18 metros e chegar bem perto das formações rochosas. Guarde um pouquinho de gás para a volta, porque a ascensão pela corda também exige esforço. Os guias locais aconselham a programar somente essa atividade no dia, porque o cansaço físico ao final das 4h30 de passeio é certeiro.

Mina da Passagem (MG)

Mesmo considerada uma caverna artificial, a Mina da Passagem, localizada na estrada que liga as cidades de Ouro Preto e Mariana, é uma das cavernas submersas mais frequentada pelos mergulhadores brasileiros, principalmente para o batismo em cavernas. Depois de um século e meio sendo explorada para extração de ouro, a mina passou a fazer parte do roteiro turístico das cidades históricas daquele Estado. Um bom pedaço do local foi preservado como os trabalhadores o deixaram, a começar pela entrada: os visitantes embarcam em uma vagoneta que percorre 315 metros de trilhos.

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O percurso é íngreme e desce lentamente a 120 metros de profundidade – mesmo assim é quase impossível não sentir um friozinho na barriga. Lá embaixo, a temperatura é estável, com uma pequena variação entre 17ºC e 20ºC. Os guias contam curiosidades locais e apontam as cavidades de onde o ouro era retirado, até chegar à beira de um lago com água cristalina. A visão é impressionante: a piscina, alagada pela infiltração do lençol freático nas galerias subterrâneas, reflete a formação rochosa das paredes. Quem não estiver habilitado para o mergulho, retorna à superfície para a visitação de um pequeno museu. Mas, se o intuito for se aventurar no labirinto submerso, o preparo começa ali mesmo, em um deque de equipagem construído pela agência Divegold, empresa que desde 1998 possui a concessão local da atividade de mergulho.

O certificado de Cavern Dive é imprescindível – não é aceito o de Overhead. Com os cilindros duplos, é possível descer até 240 metros (Deve-se agendar com antecedência, e os cilindros são pagos à parte). Por ser uma caverna artificial, não existe nenhum tipo de vida nas águas – o que não anula seu exotismo e beleza. Para descansar depois de um dia inteiro nas profundezas (a mina fica aberta das 9h às 17h), o mergulhador pode optar por pousadas na própria cidade ou seguir para Ouro Preto e continuar a visitação histórica da região.

Gruta do Camarinha (RJ)

A gruta do Camarinha se diferencia por estar em águas marinhas. Ela é o resultado de uma rachadura em um imenso rochedo da ilha de Cabo Frio, também conhecida como ilha do Farol, a três quilômetros da costa da cidade fluminense de Arraial do Cabo. A ilha é considerada uma das mais deslumbrantes paisagens do litoral brasileiro. Cardumes coloridos, golfinhos e tartarugas dividem espaço nas águas azuis claríssimas – e bem geladas. Os barcos de operadoras de mergulho fazem os 30 minutos de trajeto até se aproximar da fenda (o valor com a agência Arraial Sub é de R$ 160, o que inclui embarcação e cilindro com ar. Outros equipamentos são à parte e custam cerca de R$ 25 cada. Ali só entra quem tiver o certificado de Overhead ou Cavern Dive. Mesmo assim, os instrutores fazem um teste fora da gruta para saber se os participantes estão aptos a explorá-la.

Outra variante importante é a condição do mar. Ele deve estar extremamente calmo, sem ondulações e com uma temperatura mínima de 18ºC. Há duas formas de entrar: uma pelo lado mais raso, a 8 metros; outra pelo mais fundo, a 33 metros. O mergulhador nada na horizontal, em multiníveis, os 50 metros de comprimento de uma ponta a outra. Peixes, lagostas e polvos enfeitam o trajeto, que dura cerca de 15 minutos. Ao final, o esplendor da visão do mar aberto consagra esse paraíso natural brasileiro.

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Gruta da Pratinha (BA)

A Chapada Diamantina é um dos maiores complexos de ecoturismo do país e não poderia estar de fora quando o assunto é caverna. Mas, infelizmente, as leis ambientes não permitem mergulhar em muitas delas. Uma das únicas em que as autoridades liberaram a prática é a gruta da Pratinha e, mesmo assim, o mergulho fica restrito somente à flutuação. Porém a experiência vale a pena. A caverna se situa abaixo da casa do rancho da Fazenda da Pratinha, no município de Iraquara (Estrada BA-122).

Há várias atividades no local, como tirolesa, restaurante e contemplação da linda Gruta Azul (o mergulho ali é proibido). A gruta da Pratinha é uma das principais atrações e fica difícil resistir a suas águas cristalinas, provenientes do rio de mesmo nome, dentro da bela formação rochosa milenar. Os equipamentos para flutuação são adquiridos no próprio local (o mergulho com snorkel, máscara, colete salva-vidas e lanterna) e um guia acompanha o grupo nos 170 metros de trajeto.

Uma das peculiaridades dessa caverna são os microbúzios, minúsculas conchinhas que forram o leito. O azul-clarinho vem do depósito de calcário no fundo do rio. Ao final do mergulho, que dura cerca de 25 minutos, ainda dá para aproveitar uma espécie de aquário natural, com visibilidade de até 60 metros de alcance. Para o mergulho com cilindro é preciso autorização do Ibama.

 

 

 

 

 

(Reportagem publicada originalmente na Go Outside de maio de 2014 e atualizada em março de 2020)

 







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