Vender sonhos parece trabalho simples, mas em meio ao aumento do custo de vida e uma pandemia é necessário um esforço extra para que a compra se materialize. E foi isso que a Hurb (antigo Hotel Urbano) fez e os consumidores agora enfrentam problemas. As informações são da IstoÉ Dinheiro.
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Surfando em um momento em que o turismo estava parado e o que restava era planejar a próxima viagem, a agência escalonou um modelo de negócio lançado pouco antes: a venda de viagem com datas flexíveis e preços muito atrativos.
Encantando o turista com a possibilidade de comprar uma viagem por um preço baixo para utilizar dois anos depois, a Hurb fez um GMV (Gross Merchandise Volume), que é o volume de vendas, de mais de R$ 3 bilhões em 2020, no meio do lockdown e da crise do turismo. Dois anos depois, com muitas viagens para realizar, alta demanda mundial e preços de voos mais altos que no pré-pandemia, a empresa parece ter dificuldades para concretizar o que foi vendido no passado e vê crescer o número de reclamações de seus clientes.
No Reclame Aqui, as queixas se multiplicam. São 22,2 mil nos últimos seis meses – sendo que em todo o 2021 foram 27,7 mil. Nas redes sociais – em todas elas, do TikTok aos comentários nos perfis oficiais de seus executivos no LinkedIn –, as reclamações são certas. Já no Procon, o crescimento foi de aproximadamente 75%, saindo da média de 200 reclamações mensais para 350 em julho.
Entre as principais queixas, está a dificuldade de contato com a empresa e a falta de efetivação das viagens. No modelo adotado, o cliente sugere três possibilidades de datas. A Hurb então passa a buscar opções de tarifas promocionais junto às companhias aéreas dentro dessas datas, ou em dias próximos. Não encontrando, cabe ao cliente pedir o reembolso, crédito no site ou postergar a viagem.
Em respostas aos seus consumidores, a Hurb afirma que está com dificuldade de encontrar tarifas promocionais, por isso, as viagens de alguns – ou muitos – não têm acontecido.
Soma-se nessa equação, o fato de a empresa vender pacotes como créditos de viagem, uma vez que as próprias companhias aéreas só abrem venda de seus assentos com no máximo um ano de antecedência. Ou seja, aquele pacote comercializado em 2020 para 2022, ou os vendidos atualmente para 2024, possuem preços que são projetados e podem, ou não, serem aplicáveis na hora da emissão.
Com a recuperação do turismo intensificada desde o começo do ano, a bolha de viagens flexíveis criada pela Hurb parece estar estourando, mas para profissionais do setor os preços projetados e comercializados desde o começo já estavam muito abaixo do praticado no mercado.
De acordo com Mariana Aldrigui, professora e pesquisadora de turismo da EACH/USP e presidente do conselho de turismo da Fecomercio-SP, mesmo com as negociações, há um limite para os valores. “O turismo é um setor de preços muito uniformes. É muito difícil você ter grandes variações de um mesmo produto”, disse.
Uma das hipóteses levantadas pelo setor é de que a Hurb encontrou uma forma de fazer caixa, o que daria margem para devolver o valor de algumas dessas viagens que não seriam realizadas – ou até mesmo aceitar o prejuízo decorrente da diferença entre o valor comercializado pelo pacote e o preço atual.
Os pacotes de datas flexíveis, por premissa, são destinados para pessoas que podem viajar de acordo com essas condições. Porém, muitos dos consumidores da Hurb adquiriram os serviços com a expectativa de concretização da viagem em uma das três datas sugeridas, o que não aconteceu, gerando a onda de reclamações em todas as plataformas possíveis.
De acordo com o diretor de atendimento do Procon-SP, Rodrigo Tritapepe, o órgão está investigando a situação para entender se o problema é do aumento dos custos da operação turística, como os voos, ou se houve excessos por parte da agência. “Estamos acompanhando de perto a evolução desses números para tomar as providências que couberem para poder adequar a conduta da empresa”, disse.
Para justificar seus preços baixos, a Hurb diz que aposta e investe em tecnologia, inclusive em junho anunciou a abertura de um escritório no Canadá para ficar mais próximo de projetos de pesquisa e inovação. Dessa forma, a empresa continua apostando no modelo flexível e valores abaixo do mercado. Uma estratégia arriscada, principalmente considerando o valor da reputação que é ferido com as constantes reclamações e insatisfação de seus clientes. Procurada pela reportagem, a Hurb não quis conceder entrevista.