No dia 25 de fevereiro, a brasileira Gisely Ferraz chegou ao topo do Fitz Roy, na Patagônia, em uma grande conquista para a escalada feminina do Brasil.
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Ao vencer os 3.405 metros de uma das montanhas mais respeitadas por escaladores de todo o Planeta, Gisely tornou-se apenas a segunda mulher do país a realizar o feito, repetindo o êxito de Branca Franco, em 2016.
Além disso, a escaladora natural de Curitiba (PR) foi a primeira brasileira a superar o Fitz Roy guiando todas as cordadas crux, revezando as outras com o espanhol Pedro Cifuentes. Ela atacou a montanha pela via mais longa Afanasieff, um desafiador e imponente paredão de 1.550 metros de altura.
“Escalar o Fitz Roy foi um grande desafio, era meu maior sonho nos últimos seis anos”, relata Gisely, que atualmente divide seu tempo entre EUA e Brasil. “Nesse período me preparei muito para grandes escaladas e só agora me senti confortável para essa tentativa”, conta.
Mochila pesada, pedras soltas e os perigos constantes do glaciar foram apenas alguns dos obstáculos enfrentados pela montanhista. “Foi preciso lidar com o psicológico o tempo todo, além de orientação, performance e, o mais importante, manter 100% de concentração mesmo já cansada no rapel, que é o crux e a parte mais perigosa da escalada no Fitz”, relata Gisely.
Inspirada pela própria Branca Franco e pela lendária Roberta Nunes, pioneira na Patagônia, a conquista de Gisely também carregou um sentimento especial, já que foi uma homenagem ao ex-namorado e parceiro de escalada, Ken Anderson, que morreu em 2019 em um trágico acidente durante a prática do esporte no Canadá.
“Ele acabou morrendo nos meus braços. Prometi que não iria desistir dos nossos sonhos. Dois anos e meio após sua morte fui para a Patagônia e pude espalhar suas cinzas no cume do Fitz Roy. A gente sonhava em escalar essa montanha juntos”, emociona-se a escaladora.
Desafios no Fitz
Localizado no município de El Chalten, na divisa entre Chile e Argentina, o Fitz Roy é considerado um pico de extrema dificuldade por suas características peculiares, com uma escalada técnica que mescla gelo e extensas rochas verticais.
Nos últimos seis anos, Gisely vinha treinando forte para escalar grandes paredes, principalmente em Yosemite, na Califórnia, um dos seus lugares preferidos nos EUA.
“Apesar da dificuldade técnica, escalar foi a parte fácil. Descer que é o crux. Tem sempre histórias da Patagônia, e com a gente não foi diferente, com muito vento e neve. Nos primeiros rapeis eu vi um pouco de tudo, as condições climáticas podem mudar muito rápido por lá, aumentando os riscos”, relata Gisely.
Atleta da marca La Sportiva e instrutora da técnica de offwidth em Utah, ela precisou se dedicar bastante para a missão do Fitz, principalmente nas últimas temporadas, quando escalou El Captain três vezes, o Half Dome em 16 horas e também a montanha El Monstro, no Chile, em apenas 17 horas.
Durante o verão, Gisely costuma vir ao Brasil para ficar com o filho Stephen Kolodzei, de 27 anos, que vive no país. “Agora com ele maior eu me senti mais confortável e com mais experiência para encarar o Fitz Roy. Sei que a escalada lá é mais perigosa por questão da montanha estar sempre em movimento, com queda de rochas e avalanches”, conta.
“Para escalar na Patagônia você deve estar preparado para todas possibilidades que podem acontecer na montanha, além de outras que você nem faz ideia que vai acontecer. Na mesma ventana, nesta mesma via, aconteceram dois acidentes e um americano morreu no último rapel. Nós, como fomos os últimos a descer, passamos pelo corpo dele e de dois brasileiros que infelizmente também morreram aqui em 2019”, afirma.
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Gisely chegou à Patagônia no último mês janeiro, sem parceiros de escalada. Por lá conheceu o espanhol Pedro Cifuente e o escalador local Franco, formando um time para subir a montanha. Na mesma janela de tempo, os brasileiros Arjuna Sundara e Marcelo Machado, além do grupo com Bruno Melo da Matta, Daniel Stassi e Rodrigo Aderne, também fizeram a bandeira brasileira tremular no topo do Fitz Roy,
“Meu desafio maior foi me integrar com a montanha em movimento, ela tem um barulho de pedras caindo dia e noite. É preciso saber separar este medo da realidade, e manter a concentração 24 horas para voltar com vida. Eu prometi para meu filho que eu não iria me arriscar mais do que deveria. Escalar o Fitz é um risco constante. Então meu desafio maior foi fazer tudo certo prata voltar com vida”, completa.
De volta aos EUA, Gisely retoma o trabalho como instrutora em clínicas de escalada no deserto de Utah, além de abrir novas vias no local com a experiente escaladora Pamela Shantipack. “Tenho um projeto a longo prazo de fazer a via Freerider em El Capitan em livre e também voltar para a Patagônia nas próximas temporadas pra fazer todos os cumes da cadeia do Fitz Roy”, finaliza a brasileira.