Marco Aurélio Simon era um garoto místico. Tudo o que fugia do convencional despertava seu interesse. Na adolescência, além de se dedicar ao escotismo, chegou a fazer um curso de detetive por correspondência, tamanho era o seu interesse pelos mistérios do mundo. Mas foi a sua própria história que acabou se tornando um dos mais intrigantes enigmas ocorridos em terras brasileiras.
Foi no dia 6 de junho de 1985 que a saga começou. O rapaz e o grupo de escoteiros do qual era integrante, o Olivetano, partiram para uma expedição no Pico dos Marins, na divisa entre Minas Gerais e São Paulo, há 26 anos. Marco Aurélio tinha 15 anos de idade. Os escoteiros subiram até a base da montanha, que tem 2.424 metros de altitude, e armaram acampamento.
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A viagem não trazia nenhum desafio excepcional. Pelo contrário: o Pico dos Marins já era um destino bastante procurado por turistas e aventureiros. Nem escalada estava incluída no passeio. Para chegar ao topo do morro, bastava fôlego para subir uma trilha aberta na década de 30.
No dia 7 de junho, os escoteiros, liderados por Juan Bernabeu Céspedes, iniciaram os preparativos para a subida ao cume, que só ocorreria na manhã seguinte. Certo da facilidade do trajeto, Céspedes dispensou o guia que seguiria a trilha com o grupo.
Mas quando o grupo atingiu uma altitude de cerca de 750 metros, um garoto se machucou, e o restante do grupo decidiu voltar. Marco Aurélio, que era o monitor, foi designado por Céspedes para ir na frente em busca de socorro.
Ainda que a atitude do líder contrariasse as normas escoteiras de que nenhum membro do grupo deveria explorar uma trilha sozinho, Marco Aurélio seguiu a orientação. O combinado era que o rapaz deixasse sinais nas pedras, para que o grupo o seguisse em ritmo mais lento por conta do acidentado.
Em um determinado ponto, quando o caminho traçado por Marco Aurélio ficou muito difícil para o grupo seguir, Céspedes desviou, optando por um atalho mais simples para a cidade, para buscar ajuda. Nesse ponto, não encontraram mais nenhuma marca nas pedras. No dia seguinte, o líder decidiu voltar ao acampamento que ficou montado, achando que encontraria Marco Aurélio em sua barraca. Mas encontrou-a intacta, exatamente como havia sido deixada no dia anterior. Nenhum vestígio do garoto foi encontrado. Nunca.
Durante quase um mês, cerca de 300 policiais participaram da busca pelo escoteiro no Pico dos Marins. “Foi uma das maiores buscas já realizadas no país, mas nada foi encontrado. Nenhuma faca, nenhuma peça do vestuário do Marco Aurélio. Nada”, diz Ivo Simon, pai do escoteiro. A busca foi tão detalhada que um policial perdeu uma faca na mata em um dia e no outro, ela foi achada por outra pessoa. Mas nenhum vestígio do garoto.
O inquérito policial foi arquivado em 1990, sem ter chegado a nenhuma conclusão. Algumas das hipóteses levantadas na época para o sumiço: ele teria sido assassinado pelo líder (esta foi a primeira possibilidade levantada pela polícia, que depois a descartou porque Céspedes não tinha instrumentos capazes de matar o garoto e sumir com o corpo), teria caído num buraco (se isso tivesse ocorrido, o cheiro do corpo em putrefação teria chamado a atenção dos cães farejadores que participaram da busca, o que não ocorreu) ou simplesmente fugido (nenhum morador da cidade ou dos arredores viu o escoteiro).
A quarta hipótese é de que ele poderia ter sido levado por um disco voador. O Pico dos Marins é considerado uma região com muito poder magnético, o que, segundo místicos, atrairia naves extraterrestres. Por isso, a família até procurou ufólogos, que também não souberam explicar o que havia acontecido.
Com o fracasso das investigações, a família passou a contar com o apoio de místicos, religiosos e ufólogos. “Fomos a umbandistas, parapsicólogos, espíritas. A maioria diz que ele está vivo”, conta Ivo. Quando procuraram o famoso médium Chico Xavier, morto em 2002, tiveram a seguinte resposta: “Só me comunico com pessoas que desencarnaram”.
Por conta disso tudo, a família Simon acredita que o rapaz ainda esteja vivo. E acompanha como seria a fisionomia do filho pelas transformações no rosto de Marco Antonio, gêmeo univitelino de Marco Aurélio, hoje com 57 anos. “A gente não tem mais onde buscar. Mas se alguém me disser algo, der alguma pista, nós vamos atrás. Não entregamos os pontos. O que me tortura é esse mistério, é não saber o que aconteceu com meu filho”, desabafou o Ivo Simon.
Podcast
Apesar de ter ocorrido há 37 anos, a investigação policial segue aberta e o caso foi desarquivado em julho de 2021 com novos desdobramentos. De pessoas que afirmam ter visto Marco Aurélio recentemente até indícios de que ele teria sido enterrado no terreno de uma casa na zona rural, próximo ao local do desaparecimento – dando início a escavações pelas redondezas – muitas hipóteses são levantadas.
Toda essa história é narrada com uma abordagem inédita dos fatos no podcast “Pico dos Marins: o caso do escoteiro Marco Aurélio”, lançado pelo Globoplay. A trama tem autoria e narração de Marcelo Mesquita e produção de Ivan Mizanzuk, além de contar com a participação da família do escoteiro, em especial o pai, Ivo Simon.
A produção da série ganhou corpo em 2017, quando Marcelo Mesquita estava em outro projeto como cineasta e, por acaso, teve contato com a história e se interessou por ela ao observar que havia alguns fatos sem respostas e decidiu se aprofundar no caso.
A partir da autorização da família de Marco Aurélio, que deseja até hoje encontrar uma conclusão para o seu desaparecimento, Mesquita vem se debruçando sobre o inquérito, com os documentos inéditos a que teve acesso, e entrevistando pessoas relacionadas ao acontecimento.
“São quatro anos mergulhados nessa história e, quando o caso reabriu em 2021, acendeu em nós uma nova chama, uma esperança de trazer um desfecho para o desaparecimento do Marco Aurélio”, destaca o autor.
A temporada tem 10 episódios e será dividida em duas partes. Clique aqui para saber mais.