The Extra Mile: um gosto mais forte de perigo

Por Redação

Bernardo Fonseca relata último ciclo de aclimatação no Nepal antes da grande escalada no projeto The Extra Mile. Foto: Gabriel Tarso.

No projeto The Extra Mile: Every action counts (Um Passo a Mais: Cada ação conta), o brasileiro Bernardo Fonseca desembarcou no Nepal rumo ao topo do Everest (8.848 metros). Além da maior montanha do mundo, o esportista e empreendedor de 45 anos também pretende subir o Lhotse (8.516 metros), no mesmo país, em um intervalo de 24 horas para chamar a atenção sobre o lixo deixado nas montanhas. O feito, conhecido como “double-head”, seria uma conquista inédita para alpinistas brasileiros. Confira abaixo o relato de Bernardo sobre a terceira semana do projeto.

No nosso último ciclo de aclimatação teve de tudo um pouco. Os acontecimentos foram tão intensos que, agora, parando pra olhar com calma, alguns deles parecem surreais. Dessa vez, a aventura teve um gosto mais forte de perigo e deu pra sentir que, por mais que tenhamos técnica e preparo físico, é a montanha quem dita as regras.

Eu, Gabriel Tarso, Thindu Sherpa e Dawa Sherpa, saímos do Everest Base Camp (a 5.270 metros) na madrugada do dia 28 de abril, no horário do Nepal, com o objetivo final de tocar o C3 (Acampamento 3 do Everest), localizado a 7.158 metros de altitude. Para isso, tivemos que passar pelo Glaciar do Khumbu, considerado o primeiro grande obstáculo da rota sul até o cume do Everest (8.848 metros). Fizemos o percurso até o C1 (a 6.035 metros), onde dormimos uma noite, em seis horas. Apesar do tempo feio, até aí tudo correu bem.

No dia seguinte, partimos para o C2 (a 6.474 metros) em uma caminhada que durou pouco mais de duas horas. Chegando lá, uma vista bastante cinza e ainda assim lindíssima. Sabíamos que o clima não seria dos melhores, já que havia previsão de uma tempestade de neve justamente no período em que estaríamos lá. Mesmo assim, fomos. O frio estava de cortar e nevou muito. Era difícil até mesmo sair da barrada. O Tarso tinha uma bota mais simples de calçar pra andar lá fora, mas eu, se quisesse caminhar um pouco, tinha que colocar a bota de três camadas. O fato é que, em condições extremas como essa, até calçar uma bota pode ser desafiador.

Depois de uma noite no C2, seguimos para a missão final de tocar o C3 e voltar para o C2 e é nesse ponto que as coisas começam a ganhar outros contornos. Durante o trekking, fomos gravando e fazendo fotos, nos sentíamos muito fortes. Após cerca de duas horas, chegamos a um lugar chamado Jumar Point, que é um paredão já muito próximo do Lhotse. Começamos a subir e o tempo, que já não era dos melhores, começou a ficar muito ruim. Fomos atingidos por ventos de mais de 50km/h, vimos outras equipes voltando, mas continuamos subindo até que a parede, que era de neve, mudou pra um gelo duro, e a ventania se intensificou ainda mais. Estamos no meio da Lhotse face.

Chegou um momento em que a situação ficou realmente sinistra e senti um perigo iminente. Além disso, ficou inviável continuar especialmente porque cometi alguns erros: estava com a roupa errada, não esperava que a tempestade chegaria tão rápido, meus óculos congelaram a ponto de eu não conseguir enxergar absolutamente nada, e meu rosto também estava congelando porque eu havia tirado a minha bandana de proteção em um momento de calor. Chegamos aos quase 7.000 metros e a aproximadamente 100 metros do C3, decidimos voltar porque estava ficando realmente arriscado. Inclusive, todas as equipes já tinham voltado por conta do mau tempo.

De volta ao C2, descansamos. Mas a vontade de voltar no dia seguinte era grande, apesar da previsão ainda ser ruim. Sherpas não queriam ir novamente, mas conversamos por rádio com Arnold e seria bacana bater próximo ao c3 novamente para aclimatar. Por fim, tentamos novamente, mas fomos até o Jumar Point, atendendo a uma orientação do chefe dos sherpas que nos limitou a esse ponto. Thindu ficou mal e estava tossindo sangue, por isso não nos acompanhou. Nós todos também estamos tossindo, mas passamos bem. O resultado final é que não batemos no C3, mas fizemos duas avançadas pra aclimatar e ganhar altitude e isso foi muito bom. Mas os desafios não acabam aqui.

Voltamos pra dormir mais uma noite no C2 e voltamos ao Base Camp, levando com a gente todo o lixo que produzimos nesses dias. No caminho, um dia lindíssimo, com sol forte em alguns momentos e, do nada, um acontecimento inusitado: passando pelo Khumbu, eu dei mole e deixei uma câmera que estava na minha mochila cair em uma crevasse, que é uma fenda no glaciar. Tarso pegou uma corda emprestada pra juntar a outra que ele já tinha e rapelou cerca de 30 metros pra resgatar a câmera. Fizemos então uma força-tarefa pra puxar ele de volta jumariando (técnica de escalada) e deu tudo certo. Foi um momento surreal, mas também irado demais!

Agora, tudo o que precisamos é de um descanso e esperar a melhor janela de tempo pra partir pra maior missão de todas, que é o Double-Head.

A expedição ao Everest e o dia a dia no Nepal podem ser acompanhados diariamente no perfil do empresário no Instagram .







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