Um médico do esporte e um fisiologista do exercício analisam a ciência por trás de seis métodos de recuperação populares que estão sendo divulgados para corredores.
+ Sem gelo e bota: os segredos (simples) de recuperação de Kilian Jornet
+ 3 terapias corporais alternativas para melhorar a recuperação de atletas
Suplementos, cremes, luzes, adesivos para dor : afinal, quais dessas alternativas realmente funcionam [para recuperação na corrida] e quais são pura enganação? Para responder, procurei a médica do esporte Amy Powell, M.D., da Universidade de Utah (EUA) e a fisiologista do exercício Grace Horan, MS, ACSM-EP, do Hospital for Special Surgery (EUA), para me ajudar a separar fatos de ficção.
Powell entende por que corredores, mesmo racionais, gastam dinheiro com o que poderia ser considerado pseudociência. “As pessoas estão buscando qualquer vantagem”, ela explica. “E também existe uma certa desconfiança na medicina convencional, talvez porque a gente não tenha feito um bom trabalho em mostrar aos atletas que estamos aqui para ajudá-los.”
Ela acrescenta que, se algo funciona para você e melhora sua performance, a maioria dos médicos do esporte tende a apoiar — desde que não cause prejuízo financeiro ou danos físicos.
Aqui está o que, segundo especialistas de verdade, é seguro no mundo dos tratamentos alternativos para corredores — e o que é melhor evitar:
Métodos de recuperação para corrida
Terapia de Luz Vermelha
A terapia de luz vermelha utiliza luz de baixo comprimento de onda (vermelha ou infravermelha próxima) aplicada à pele ou músculos, geralmente por meio de painéis ou saunas. A promessa é estimular a reparação celular, reduzir inflamações e acelerar a recuperação ao melhorar a função mitocondrial.
A experiência:
Os painéis de luz vermelha para rejuvenescimento da pele estão super em alta no momento, e talvez você já tenha visto aqueles dispositivos parecidos com máscaras de goleiro de hóquei, que disparam luz vermelha no rosto. (Há evidências científicas que apoiam seu uso dermatológico.) Corredores que buscam reparar músculos e tendões precisarão de painéis de corpo inteiro, disponíveis em spas médicos ou centros de bem-estar. Você se despe até onde se sentir confortável e fica de pé sob a luz quente e vermelha (como um frango de padaria!) por cerca de 20 minutos.
Opinião de Powell:
“Isso começou com a NASA, testando o crescimento de plantas no espaço e, depois, buscando ajudar a cicatrização de feridas em astronautas. Parece estimular a produção de colágeno, o que obviamente é importante para a pele, mas também para tendões. Isso é legal e pode ter impacto no futuro.”
Opinião de Horan:
“Existem algumas evidências — como alguns estudos pequenos — mostrando que a terapia de luz vermelha pode reduzir danos musculares e acelerar a recuperação. Mas, novamente, são estudos pequenos. Não há pesquisas de longo prazo comprovando que ‘sim, isso realmente funciona’. Ainda assim, eu diria que provavelmente não faria mal se alguém quiser tentar e notar que se sente melhor.”
Veredito dos especialistas:
Ainda não há comprovação científica para corredores, mas é promissor. Se você pode pagar e sente que ajuda, por que não?
Câmaras de Crioterapia
A câmara de crioterapia é uma cabine ou cápsula que atinge temperaturas ultrabaixas (geralmente -130 °C ou menos) por 2 a 4 minutos. A promessa é reduzir inflamações, acelerar a recuperação muscular e melhorar a circulação e o humor. Algumas pessoas juram também que ela é antienvelhecimento e ajuda a reduzir gordura.
A experiência:
A não ser que você tenha a sorte (e o dinheiro) de possuir uma dessas máquinas — que custam mais de R$ 30 mil —, será preciso encontrar um centro de crioterapia. Você se despe, ficando apenas de roupa íntima, mas é obrigado a usar luvas, chinelos, touca e máscara para proteger extremidades e áreas sensíveis do frio extremo. A maioria dos locais permite que você escolha uma música para ouvir enquanto fica lá, tremendo e se mexendo para manter o calor, observando o cronômetro. É desconfortável, mas suportável.
Opinião de Powell:
“Não sei se temos dados sólidos que comprovem os benefícios, mas também não acho que vá fazer mal. O mecanismo seria basicamente o de ação anti-inflamatória.”
Veredito dos especialistas:
Provavelmente não vai curar suas dores nem reverter o envelhecimento, mas se quiser congelar um pouco, não há grandes riscos.
Banheira de Gelo
Consiste em mergulhar o corpo (geralmente até o peito) em água gelada, entre 7°C e 13°C, por 1 a 5 minutos. A ideia é reduzir dores musculares, diminuir inflamações e acelerar a recuperação.
A experiência:
Alguns fisioterapeutas e treinadores oferecem piscinas próprias para isso, mas como nem todos têm acesso, surgiram spas especializados em banhos de imersão. Há também banheiras infláveis barata e opções sofisticadas. Basicamente, é um banho muito frio e desconfortável.
Opinião de Horan:
“Com os banhos de gelo, as pesquisas são mistas, mas a maioria mostra que não há diferença significativa na recuperação muscular geral. Há evidências de que mergulhar após treinos de força intensos pode até inibir o crescimento muscular, por diminuir o fluxo sanguíneo e a síntese de proteínas.”
Veredito dos especialistas:
Assim como a crioterapia, os banhos gelados são eficazes… para te deixar congelando. Evite logo depois de treinos de força, se quiser ganhos máximos, mas para reduzir inflamações pontuais, pode ser útil.
Soroterapia (Vitamin IV Drips)
Aplicação intravenosa de fluidos, eletrólitos e nutrientes como vitaminas do complexo B ou magnésio. A promessa é hidratar mais rápido, reduzir a fadiga e acelerar a recuperação, especialmente após longas corridas ou viagens.
A experiência:
Hoje existem clínicas que oferecem infusões intravenosas de vitaminas, aplicadas por enfermeiros. A sessão dura entre 25 e 60 minutos.
Opinião de Powell:
“Não temos estudos na literatura médica esportiva que sustentem esses benefícios. Mesmo para corredores fatigados após uma maratona, a hidratação oral é comprovadamente tão eficaz — e mais segura — que a intravenosa.”
Opinião de Horan:
“Minha opinião pessoal: eu não gostaria de levar uma agulhada para algo que posso obter bebendo Gatorade ou comendo alimentos ricos em vitaminas.”
Veredito dos especialistas:
Caro, envolve agulha e não tem base científica — não vale a pena. E vale lembrar: embora corredores amadores não estejam sujeitos a controles antidoping, a WADA proíbe o uso de soro intravenoso sem necessidade médica.
Câmaras de Oxigênio Hiperbárico
Ambientes selados nos quais a pessoa respira oxigênio puro a uma pressão superior à atmosférica. Vendidos como aceleradores de cicatrização, redutores de inflamação e melhoradores de recuperação para atletas.
A experiência:
A pessoa se deita em um tubo parecido com uma incubadora gigante ou um “pulmão de ferro” e respira oxigênio puro por uma hora ou mais. Centros de bem-estar oferecem sessões de oxigenoterapia hiperbárica, bastando preencher um formulário médico básico — sem a necessidade de autorização profissional.
Opinião de Powell:
“Respiramos oxigênio em torno de 21% em condições normais, e nossos corpos foram feitos para isso. Eles não lidam bem com concentrações muito maiores. Fora aplicações específicas, como cicatrização de feridas, há pouquíssima evidência de benefícios para outras situações.”
Veredito dos especialistas:
Não é indicado para atletas buscando performance nem para corredores lesionados — e ainda pode ser perigoso.