Numa época em que os cumes mais altos do mundo já foram conquistados, a última fronteira é no extremo oposto: o ponto mais fundo do oceano. Ao menos, o ponto mais fundo onde o ser humano já conseguiu chegar: a Depressão Challenger. “É o destino mais exclusivo da Terra. Quatro mil pessoas já chegaram ao cume do Everest e 562 ao espaço. Mas só sete já visitaram a Depressão Challenger”, conta Rob McCallum, fundador da EYOS Expeditions. Situada na profundidade de 10.928 metros, acredita-se ser o ponto mais fundo dos oceanos.
A expedição comercial é a primeira do gênero. A EYOS Expeditions, especializada em destinos exóticos e extremos, se uniu a empresa particular submarina de Caladan Oceanic para oferecer ao público em geral uma oportunidade única de participar desta expedição e mergulhar até as profundezas da Fossa Marianas, próxima das Ilhas Marianas, no Oceano Pacífico. A Fossa das Marianas é uma fenda a 10.984 metros de profundidade, de 2.400 km de comprimento e 70 km de largura no fundo do oceano pacífico. Para chegar lá, o submarino atravessa escuridão absoluta e pressão de mais de 7 toneladas por polegada quadrada.
Viagem para poucos e bons
Para dar ideia do grau de exclusividade da viagem, um dos poucos felizardos a passar pela experiência foi o diretor de cinema James Cameron, que dirigiu Titanic, em 2012, fazendo uma navegação solo em na embarcação Deepsea Challenge. Nessa expedição, segundo a EYOS, são apenas 3 vagas em aberto para turistas. O preço por pessoa é de US$750.000.
Ano passado, a expedição explorou abismos oceânicos no Pacífico, no oceano Índico, no oceano Antártico, no Ártico e no Atlântico, por dez meses. Este ano, equipe que irá tripular a nave, além dos viajantes comerciais, deve incluir investidor e aventureiro multimilionário texano Victor Vescovo. Ano passado, ele fez parte da última expedição à Depressão Challenger, em maio de 2019, buscando quebrar o recorde de ir até o ponto mais fundo de cada oceano, na expedição “Five Deeps”: a Fossa de Porto Rico no Atlântico, a Fossa de South Sandwich no oceano Antártico, a Fossa de Java no oceano Índico, a Depressão Deep no Pacífico e a Depressão Molloy no Ártico.
Vescovo pode não ser tão famoso quanto Jacques Cousteau, mas é uma figura impressionante da exploração oceânica, ao conseguir juntar fundos milionários para a expedição exploratória submarina mais avançada da história, habilidades como piloto submarino (e de avião) e disposição para ir a mais de 11 km de profundidade no fundo do mar.
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Além das aventuras submarinas, ele tem no currículo os Seven Summits (os cumes mais altos de cada continente), além de ter esquiado os pólos norte e sul. A eventual oportunidade de conviver com ele na expedição é uma espécie de bônus-aventura. O time de cientistas será liderado pelo veterano do projeto, o cientista especializado na zona hadal Alan Jamieson, da Universidade de Newcastle.
O ponto mais fundo do oceano
Os três participantes serão chamados de “especialistas da missão” e irão passar cerca de oito dias na Expedição Círculo de Fogo, viagem operada pela EYOS em conjunto com a Caladan Oceanic. Cada imersão de submarino levará cerca de 14 a 16 horas, entre ida, navegação no fundo e volta. Só a descida de cerca de 11 km leva mais de quatro horas. Os mergulhadores poderão passar mais quatro horas explorando o ponto mais fundo do oceano.
Apenas três expedições tripuladas já foram feitas até o fundo da Depressão Challenger. Os “especialistas da missão” irão adentrar na embarcação de exploração DSSV Pressure Drop na data prevista de junho de 2020 em Agat, Guam, território americano na Micronésia. Dali, em um dia chegarão à Fossa Marianas.
A expedição usará o Limiting Factor, módulo submarino da Caladan Oceanic, que passou por um teste de pressão em uma câmara simulando 14.000 metros de profundidade e já mergulhou cinco vezes até o fundo da Fossa Mariana. A EYOS diz que é o único veículo construído capaz de fazer múltiplos mergulhos no oceano profundo.
Os ocupantes do módulo submarino estão totalmente protegidos pela esfera de titânio de 90mm e não passam por nenhuma alteração de pressão interna no ambiente, ou nenhum tipo de estresse ambiental.
Apoio à expedição científica
Nenhum treinamento prévio é exigido. Contudo, os especialistas irão receber um manual de instruções bastante completo e muitas orientações prévias como parte de um treinamento. “O interior do módulo é um ambiente silencioso, tranquilo e muito relaxante. Tem dois assentos confortáveis, três painéis de visualização e câmeras surround de alta definição”, diz McCallum.
Enquanto estiverem a bordo, os participantes serão integrantes da tripulação, e deverão trabalhar em equipe com os cientistas, mapeando o fundo do oceano, operando sonares, ajudando técnicos submarinos, a equipe de filmagem, gerenciando os equipamentos e a logística. São tarefas imprescindíveis em uma missão com esse grau de complexidade nas zonas abissais. Claro que nem tudo é só trabalho: entre os mergulhos, haverá tempo para os tripulantes-viajantes descansarem, relaxarem, verem filmes, malharem ou fazerem um happy hour.
As zonas mais profundas do oceano ainda são extremamente misteriosas. A parte mais conhecida é a nerítica, que corresponde a 200 metros abaixo da superfície e onde vive a maior parte dos seres marinhos que conhecemos. As zonas abatial (entre 200 e 2.000 metros) e abissal (abaixo de 2.000 metros) são ainda profundamente desconhecidas. São repletas de fossas e abismos pouco explorados, como montanhas invertidas na profundeza do mar. A última camada de profundidade tem o nome de Hadal – de Hades, o inferno grego. São tão hostis à maior parte das formas de vida que o pouco que sabemos foi coletado principalmente por robôs. Esta expedição deve dar continuidade ao trabalho da Five Deeps, que resultou em mais de 40 novas espécies identificadas.
A viagem é parte de uma expedição de seis meses no Círculo de Fogo operada EYOS e pela Caladan Oceanic. “As missões tem o objetivo de verificar e testar os pontos mais profundos possíveis do oceano, coletar e analisar amostras científicas e ampliar o conhecimento científico sobre o ambiente mais extremo da terra”, diz Ben Lyons, CEO da EYOS Expeditions.