Dor estranha ao correr? Pode ser o seu assoalho pélvico

Por Jordan Smith, para a Outside USA RUN

assoalho pélvico na corrida
Foto: jcomp/Freepik

Não, isso não é exclusivo do pós-parto. O assoalho pélvico tem um papel crucial na sua passada e na geração de força ao correr — e, quando está desregulado, pode causar dores sérias.

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Corredores conhecem bem as consequências indesejadas da corrida. O impacto constante desse exercício pode sobrecarregar o corpo e provocar problemas bastante conhecidos, como canelite, fascite plantar e fraturas por estresse. Mas há uma condição comum entre corredores que muitas vezes é ignorada e pouco discutida: a disfunção do assoalho pélvico.

E não, não estamos falando só de casos após o parto.

“A saúde do assoalho pélvico pode afetar a performance na corrida de várias maneiras diferentes”, explica Jessie Klein, fisioterapeuta e fundadora da Willow Pelvic Health, nos Estados Unidos. “Por exemplo, um corredor pode apresentar tensão excessiva nos músculos do assoalho pélvico, o que gera desequilíbrio na forma como essa região interage com os estabilizadores do quadril, glúteos e músculos do core durante a corrida.”

Problemas no assoalho pélvico podem atingir qualquer pessoa, e os sintomas nem sempre são óbvios — especialmente se você não souber o que procurar. A seguir, as especialistas Susannah Rogers (fisioterapeuta na Cloudline Physical Therapy, na Filadélfia), Jessica Chellsen (fisioterapeuta, especialista em força e condicionamento físico e fundadora da Vibrant Coast Physical Therapy & Wellness) e a própria Klein explicam como o assoalho pélvico impacta a corrida, como identificar sinais de disfunção e o que fazer caso você esteja enfrentando esse tipo de problema.

O que é o assoalho pélvico?

Para começar: todo mundo tem assoalho pélvico. Embora o termo seja frequentemente associado à saúde da mulher e à gravidez, atletas de todos os gêneros e idades possuem esse grupo muscular — e ele tem um papel essencial na corrida.

Se você imaginar os ossos do quadril como uma tigela, o assoalho pélvico é o conjunto de músculos e tecidos que preenche o fundo dessa tigela, explica Rogers. Além de sustentar os órgãos pélvicos e ser responsável pelo controle da bexiga e do intestino, ele também influencia na função sexual, na postura e na estabilidade do core — dois fatores-chave para uma mecânica de corrida eficiente. Isso porque os músculos do assoalho pélvico ajudam a controlar o movimento dos quadris e a transferir as forças de impacto das pernas e do quadril para a pelve e a lombar.

“Assim como qualquer outro grupo muscular do seu corpo, o assoalho pélvico pode enfraquecer, ficar tenso demais ou apresentar falta de coordenação”, explica Chellsen. E isso afeta tanto funções do dia a dia quanto o desempenho esportivo.

Por que a disfunção do assoalho pélvico é tão importante

Embora a anatomia difira entre homens e mulheres, qualquer pessoa pode desenvolver disfunções no assoalho pélvico — e isso é mais comum do que parece, segundo Rogers. O termo é abrangente e inclui diferentes tipos de mau funcionamento: os músculos podem estar fracos, tensos demais ou mal coordenados com o restante do corpo.

Os sintomas variam: dor na região pélvica (que pode parecer uma dor no posterior da coxa ou nos adutores), incontinência urinária e disfunções sexuais. Um problema comum, por exemplo, é a perda de urina durante a corrida. Um estudo publicado na revista Sports Medicine Open revelou que cerca de 52% das atletas de elite apresentam incontinência urinária. Mas vale lembrar: nem toda disfunção do assoalho pélvico vem acompanhada de sintomas urinários — o que faz com que o diagnóstico muitas vezes seja tardio ou equivocado.

Entre as causas, estão fatores bem conhecidos entre corredores, como fraqueza dos glúteos e dos músculos do quadril. Isso força o assoalho pélvico a compensar como estabilizador, o que pode gerar sobrecarga. Outras causas incluem endometriose, aumento de pressão pela prática de corrida ou musculação e até prisão de ventre crônica. Alterações hormonais na perimenopausa e na menopausa também afetam a função do assoalho pélvico. (Segundo Rogers, nem sempre há um diagnóstico específico para a “disfunção”, embora isso seja comum.)

“É importante que todos aprendam a otimizar a saúde do assoalho pélvico e reduzir a sobrecarga sobre essa região”, alerta Chellsen.

Como a corrida pode causar disfunção no assoalho pélvico

Corredores têm maior risco de sofrer com esses problemas justamente por causa do impacto repetitivo.

“Forças geradas pelas pernas se transferem para cima, acumulando-se na pelve”, diz Rogers. “Se os músculos do assoalho pélvico não estiverem preparados para suportar essa carga, o risco de disfunção aumenta.”

O impacto da corrida gera uma força descendente sobre o assoalho pélvico de duas a três vezes o peso corporal. Ou seja: é preciso que esses músculos sejam fortes e coordenados para absorver essas cargas. Caso contrário, surgem sintomas como escape de urina, sensação de peso e dor. Também é essencial aprender a controlar a pressão interna, evitando “empurrar para baixo” enquanto corre, explica Chellsen.

Mas nem sempre a origem da dor está no assoalho pélvico em si. Como ele trabalha em conjunto com o core, os glúteos e os músculos do quadril, qualquer desequilíbrio no corpo pode afetar sua função. Chellsen destaca que fisioterapeutas costumam até analisar como seus pés absorvem o impacto da corrida, pois isso também pode influenciar o assoalho pélvico.

Como a disfunção do assoalho pélvico afeta corredores

Músculos fracos nessa região prejudicam sua passada, potência e resistência, explica Rogers. Os sintomas podem incluir dor ou desconforto nos quadris, virilha, lombar, abdômen ou nas articulações sacroilíacas (que ligam a pelve à coluna).

“A maior mudança que vejo no desempenho de corredores é quando sintomas como vazamento urinário ou dor fazem com que eles alterem a mecânica da corrida ou tensionem outras áreas para compensar”, diz Chellsen. Isso pode causar dor em tecidos e articulações e diminuir a eficiência da passada, já que compromete a coordenação entre os músculos abdominais, estabilizadores da coluna e diafragma.

Esses problemas também afetam a saúde mental. O medo de agravar os sintomas ou de ter escapes de urina durante a corrida pode abalar a confiança e o desempenho geral.

Se o assoalho pélvico está sendo usado de forma incorreta, excessiva ou está fraco, sua passada perde potência e eficiência. Isso pode gerar uma reação em cadeia.

“O assoalho pélvico está conectado aos quadris, lombar e músculos profundos do core. Se ele não funciona bem, o corpo tende a sobrecarregar músculos próximos, como os flexores do quadril e os glúteos”, diz Chellsen.

Por exemplo: uma dor persistente no quadril durante a corrida pode, na verdade, ter origem no assoalho pélvico — e vale investigar isso com uma avaliação específica.

O assoalho pélvico é composto por várias camadas musculares, e nem todas precisam estar comprometidas para gerar sintomas. Um músculo especialmente “problemático” nessa região é o obturador interno, que fica profundo no quadril e, quando inflamado, causa dor no quadril.

Além disso, um assoalho pélvico tenso pode limitar a mobilidade e alterar a forma como as forças são transferidas entre quadril e pelve — prejudicando a passada e gerando dor.

Como corredores podem cuidar do assoalho pélvico

O tratamento vai depender da pessoa e do tipo de disfunção. Algumas têm o assoalho pélvico naturalmente mais tenso, e o primeiro passo é aprender a relaxar esses músculos. Só depois é possível fortalecê-los. Mas, por ser uma região profunda, esse trabalho nem sempre é fácil de fazer sozinho. Se você suspeita de disfunção, procure um especialista em assoalho pélvico. (Importante: a avaliação e o tratamento podem ser invasivos.)

Há também técnicas de ativação e relaxamento que você pode tentar por conta própria. “Incluir exercícios respiratórios nos treinos ajuda a criar conexão entre o cérebro, o core e o assoalho pélvico”, diz Chellsen. Isso significa praticar a respiração diafragmática — com inspirações profundas pela barriga, não pelo peito — e expirações completas, sempre buscando soltar a tensão do corpo.

Depois de tratar (ou descartar) a tensão, é hora de fortalecer o assoalho pélvico e os músculos ao redor, como glúteos e quadris. Isso pode envolver exercícios como os famosos kegels, mas o tratamento não se resume a eles. O treinamento de força é fundamental para que os músculos absorvam impacto, com foco especial no core profundo e nos glúteos. Quando esses músculos funcionam bem, o assoalho pélvico não precisa compensar.

Como esses músculos atuam principalmente durante o apoio de uma perna só (como acontece o tempo todo ao correr), incluir exercícios unilaterais é essencial tanto para manter a saúde do assoalho pélvico quanto para prevenir lesões. Os benefícios, aliás, vão além da corrida. Mas Rogers lembra que, dependendo do seu caso (quais músculos estão ativos ou inativos, e quais são os sintomas), o foco do treino será diferente — sempre com orientação profissional.