Confesse: a cena é corriqueira. Você se encontra no exato dia seguinte depois de ter feito um treino intenso de tiros, ou uma aula de agachamento na academia, ou simplesmente voltou a pedalar depois de uns dias parado. Seus músculos estão parecendo pedras de tão duros, bem colados nos ossos. Sabe o nome disso? No universo da medicina do esporte, meu caro, chama-se dor muscular de início tardio (DMIT).
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Sentir dor muscular após pedalar demais, mesmo se o incômodo surgir um ou dois dias depois. A tal DMIT é exatamente o nome que se dá à sensação dolorida entre 24 e 48 horas depois do exercício, cuja causa a ciência ainda não descobriu a fundo.
Muitos acreditam que seja o resultado de microrrupturas das fibras musculares ou lesões musculares resultantes dos movimentos excêntricos (em que o músculo se alonga, o contrário do concêntrico, quando ele encurta).
Empurrar os pedais é um movimento excêntrico para os posteriores de coxa, que se alongam a cada pedalada. A DMIT é comum em ciclistas por conta desse movimento, especialmente depois de treinos duros, segundo Oliver Witard, especialista em nutrição e metabolismo do exercício da Universidade de Stirling, na Escócia, e integrante da equipe de experts do Instituto da Ciência do Esporte da Gatorade.
A dor muscular depois de treinar também pode ser resultado de inflamação, parte necessária do reparo e da recuperação celular, e que diminui à medida que nos adaptamos ao exercício específico. Mas o grau de desconforto da DMIT não é tão extremo a ponto de te afastar dos treinos por causa dela.
“Esse tipo de dor é natural. E o melhor: é possível controlá-la de forma que a pessoa consiga treinar no dia seguinte”, diz o fisioterapeuta Gary Guerriero, dos EUA. Adotar estratégias inteligentes, que se encaixem no seu estilo de vida, pode fazer uma diferença enorme para seu nível de dor. “A consistência é a chave – o que quer que você faça, se for consistente, vai ajudar”, garante Gary.
Apesar de ser normal sentir os músculos doloridos, não se deve achar que a DMIT é uma coisa boa. “Não é preciso sentir dor muscular depois de treinar, como se a sensação fosse uma prova de que você treinou forte e focado”, esclarece Blair Callaghan, doutora em fisioterapia de Washington (EUA).
“Que fique claro: a DMIT é sinal de algum dano muscular e fadiga.” A estudiosa ainda completa: “Se você torcer o tornozelo, vai caminhar de forma diferente. Se tiver DMIT, fará o exercício de forma diferente também”, explica.
Ou seja, para se proteger da dor, seu corpo faz reajustes que te levam a sentar no selim de maneira distinta do que você está acostumado, assim como pedalar e se posicionar na bike como um todo de um jeito atípico – e é assim que as pessoas acabam se lesionando. “Não há benefícios no longo ou no curto prazo em se sentir dolorido.”
A seguir, os especialistas dão dicas para te ajudar a se prevenir da DMIT, seja com mudanças na nutrição, estilo de vida e, claro, nos pedais.
O QUE FAZER FORA DA BIKE
O cross-training é um santo remédio
Para muitos de nós, o tempo que passamos em cima do selim é sagrado, mas podemos nos tornar ciclistas mais fortes suplementando o ciclismo – e até substituindo às vezes – com outras atividades.
“Sabemos que é difícil dizer: ‘Vou trocar a bike pela academia’, quando nossa vontade é pedalar”, diz Blair. “Mas, se você se comprometer um ou dois dias por semana com musculação ou outra atividade de fortalecimento, será um atleta mais saudável e completo – e haverá melhora na bike”, afirma. Ela recomenda aos ciclistas tirarem um ou dois dias por semana para fortalecimento, yoga, natação ou corrida para variar a utilização dos músculos e diminuir o estresse nos músculos específicos do ciclismo.
Melhore a ingestão de gordura saudável
A gordura ajuda a manter nossas células intactas. “O ômega-3 presente no óleo de peixe se incorpora na membrana celular do músculo e forma uma barreira, que pode ajudar a manter a integridade da membrana”, explica Oliver. Sem eles, as células deixam escapar uma enzima chamada creatina quinase, o que contribui para dores musculares e cãibras. Peixes gordurosos (não suplementos de óleo de peixe) têm quantidades mais significativas de ômega-3, mas quem não gosta muito de peixe pode recorrer a alimentos como linhaça e espinafre.
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Coma mais antioxidantes
Há alguns estudos sobre o fato de os antioxidantes diminuírem a inflamação, mas pesquisas importantes sugerem que os antioxidantes suavizam o dano celular através do fortalecimento do sistema imunológico, interrompendo o efeito dominó dos radicais livres que contribuem para o início da DMIT. Alimentos que contêm antioxidantes como as vitaminas A, C e E (mirtilo, romã, cereja e outras frutas vermelhas) também oferecem muitos outros benefícios extras, então fique à vontade para consumi-los com frequência.
Considere suplementos de vitamina D
Oliver também recomenda adicionar vitamina D na dieta, já que o nutriente foi identificado em estudos recentes como um agente-chave na aceleração da recuperação muscular. Outros estudos mostraram que ela melhora a função muscular e protege de lesões. Prefira alimentos como peixes gordurosos e laticínios para um maior aporte de vitamina D.
O QUE FAZER NA BIKE
Comece devagar A regra mais básica da prevenção das dores musculares é a constante progressão. “Você tem DMIT quando dá um passo maior do que as pernas na hora do treino”, diz Nate. Ana lise suas metas e sua situação atual. Você está magro? Ou com sobrepeso? Está pedalando bastante? Saindo de uma lesão? Faça uma avaliação honesta sobre si mesmo. Se estiver saindo do sedentarismo, comece pedalando no máximo três vezes por semana, de 60 a 90 minutos. Usar uma estratégia constante e progressiva é o ideal para ficar mais forte, mas sem sobrecarregar o corpo.
Gire, não soque o pedal
Manter uma cadência mais alta, na qual você gire bastante, ajuda a “minimizar o torque transferido para as articulações e o estresse geral nos músculos”, explica Nate. “Use um medidor de cadência e permaneça em uma média de 90 rotações por minuto, até se sentir confortável para se dedicar a treinos de tiro.”
Conheça seus limites, depois ultrapasse-o
“Não há problemas em forçar e fazer um treino longo ou uma semana de treinamento duro. Mas, depois de forçar, entenda e aceite que não vai se sentir tão bem”, orienta o nutricionista Stuart Phillips, professor da Universidade McMaster, no Canadá. “Você tem que voltar uns passos para trás depois de forçar o limite, para não ultrapassar suas capacidades e correr o risco de lesionar os músculos.” Semanas sucessivas de super treinos são um exagero. E exagero costuma levar ao overtraining.
O QUE FAZER NO PÓS-PEDAL
Reabasteça-se corretamente
Nosso corpo usa os aminoácidos das proteínas para reparar os danos musculares causados pelos exercícios. Ajude esse processo com um lanche proteico entre meia hora e uma hora depois do exercício e continue beliscando para minimizar a DMIT. Nanci Guest, nutricionista-chefe dos Jogos Pan-Americanos, recomenda comer por volta de 20 gramas de proteína logo depois do treino para uma ótima recuperação. Escolha lanches com whey protein para obter os melhores resultados. Ele contém o aminoácido leucina, que ajuda a dar início à síntese proteica nos músculos.
Massageie os músculo com um rolo
As fibras musculares formam nós após o exercício, mas é possível ajudá-las a funcionar mais suavemente quebrando essas aderências com automassagem, usando um rolo de EVA.
“Sou muito fã do rolo de EVA”, conta Blair. “É um equipamento semelhante a uma massagem, que melhora o fluxo sanguíneo e a nutrição dos músculos lesionados, acelerando a recuperação.” Use o rolo durante uma viagem ou vendo sua série favorita no Netflix – por muito menos grana do que uma massagem normal. “Não há desculpas para ficar sem um rolo em casa”, afirma Blair.