Morris e eu estamos correndo juntos, na praia. Orelhas em pé, rabo na horizontal, boca aberta. Ele é uma linha aerodinâmica. E, de vez em quando, vira a cabeça para fazer contato visual em intervalos regulares.
Trata-se de uma olhadinha que diz tanto “tudo bem?” como “caramba, isso é muito legal, não é?”. E ele está certo. Porque há algo muito especial em correr com seu cãozinho.
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Talvez você não tenha uma queda por brinquedos barulhentos, e ele pode não gostar muito de jardinagem.
Mas a corrida é uma experiência que vocês dois podem compartilhar com o mesmo entusiasmo.
Isso porque “correr está no DNA do cão”, afirma Jenny Lee, treinadora e experiente competidora de canicross, esporte que envolve competir em trilha com seu amigo de quatro patas, que estará ligado a você por um cinto.
“Faz sentido em termos evolutivos: eles precisavam correr para caçar. Então uma recompensa psicológica ajudava a motivá-los”, explica.
Na verdade, de acordo com uma pesquisa da Universidade do Arizona (EUA), os cachorros experimentam o “barato” da corrida assim como nós.
Não é à toa que correr tem sido a salvação de Morris, sem dúvida nenhuma. Mistura de fox terrier com jack russell, ele veio para nós através de um centro de resgate, quando a paciência de seus antigos donos se esgotou com suas fugas frequentes.
Ele tinha energia para gastar. Portanto, ficar restrito a caminhadas na coleira não dava para nada. Ele começou a correr imediatamente. Estava feliz em acompanhar nosso ritmo e em trocar os odores fascinantes do gramado pela emoção de correr com o “pelotão”.
E ele adora puxar. Se ele visse seu reflexo em uma vitrine, acho que ficaria chocado ao ver um pequeno terrier olhando de volta em vez de um husky robusto.
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Canicross: a corrida para cachorros
O canicross era, obviamente, a próxima etapa. Os eventos variam de “corridas para diversão” não competitivas, em um extremo, até campeonatos nacionais, regionais e mundiais, no outro.
Os corredores usam um cinto no quadril ou na região lombar, na categoria de atletas de elite, e são puxados por seus cães para alcançar tempos que eles nunca haviam conseguido sem o auxílio do poder canino.
Mas, se meu primeiro evento serve de exemplo, você poderá descobrir que pode levar duas vezes mais tempo para percorrer uma certa distância graças ao andarilho que resolveu vagar por aí para fuçar no mato.
É aí que entra um pouco de treino. “O canicross vai além da corrida apenas”, afirma Jenny. “É preciso desenvolver a concentração e as habilidades do cachorro e aprender a trabalhar como uma equipe”.
Por isso, as aulas de canicross possibilitam que o cão e seu dono desenvolvam essas habilidades e ganhem condicionamento físico.
Nas aulas de Jenny, os cães têm que lidar com o “caminho das tentações”, cheio de distrações como brinquedos, bolas e carrinhos de passeio, para aprender a focar.
“Como as competições de canicross costumam ser em parques ou florestas, é possível que haja muitas distrações, desde ciclistas e patos até rosquinhas mordidas”, explica ela.
Além disso, você treina ultrapassar outros cães – e ser ultrapassado por eles. Muda o ritmo e usa comandos de direcionamento. Você nem imagina o quanto estou orgulhoso porque, hoje, Morris sabe diferenciar esquerda e direta.
Benefícios de correr com cachorro
Jenny começou a correr com seu labrador ainda pequeno, Tilly, há dez anos, e passou a praticar canicross um ano mais tarde. “A corrida me possibilitou fazer uma pausa do trabalho e da vida doméstica agitados e nos fez fazer exercício”, afirma ela.
Desde então, com seus dois kelpies, Gilby e Zula, ela está entre os 20 primeiros no campeonato de canicross europeu, ganhou várias competições locais. Além disso, é detentora do recorde de parkrun local.
“Meu melhor tempo pessoal em canicross de 5 km é cerca de três minutos mais rápido do que quando corro sozinha”, afirma ela.
Embora não seja possível melhorar drasticamente seu desempenho em todas as competições com um amigo canino, os benefícios da corrida com cão refletem no treino regular.
“Você vai correr mais rapidamente do que já fez em toda sua vida. O que significa que precisará focar em sua postura”, afirma Jenny. “E você vai fortalecer o core, para manter uma boa postura enquanto é puxado para frente.”
Depois de alguns erros e quase acidentes, eu também posso afirmar que um curso rápido com cachorros para aprender a parar, saltar ou mudar de direção repentinamente é ótimo para agilidade, velocidade de reação e agilidade de movimentação dos pés em terrenos mistos.
“A corrida é ótima para a saúde musculoesquelética e cardiovascular dos cachorros. Além de estimular seu cérebro e, geralmente, melhorar seu comportamento”, afirma Jenny. Isso significa menos contas a pagar no veterinário e uma vida mais longa e com saúde para seu cão.
Como começar
Vale lembrar que a maioria dos cachorros está pronta para correr logo de cara. Mas independentemente de quão em forma ele esteja, precisará de tempo para conseguir aguentar períodos prolongados de corrida. Exatamente da mesma forma como uma pessoa precisaria.
A comumente citada regra dos 10% é boa para cães assim como é boa para pessoas em termos de aumento da distância semanal. Não tem problema em correr no asfalto por períodos curtos.
Mas Jenny recomenda optar por trilhas sempre que possível, pois o asfalto pode ser duro para as articulações conforme as patas se chocam contra ele. “Aumente o treino de forma gradativa e respeite os dias de descanso adequados”, recomenda ela.
“Nem sempre os cães conseguem mostrar que não aguentam mais, pois eles querem nos acompanhar. Por isso, preste atenção neles durante e após as corridas, para ver como eles estão reagindo.”
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Dicas para correr com seu cão com Willian Oliveira, embaixador do Rocky Mountain Games
William Oliveira forma dupla com Xico, um Braco Alemão, desde 2016, e usa sua experiência com o canicross para dar dicas para quem pretende iniciar a atividade com o cãozinho. Confira:
1 – Começar com pequenas distâncias. Quando o cão e seu tutor começarem a ganhar condicionamento físico, é hora de aumentar a distância aos poucos.
2 – Ter cuidado com o tempo entre a refeição e o treino. Esse tempo deve ser de, no mínimo, 5 horas (eu dou 12h). Isso é muito importante, porque os cães podem sofrer uma torção gástrica caso tenham um volume de alimento sólido ou líquido dentro do estômago na hora da atividade.
3 – A dica do alimento vale também para a quantidade de água que pode ser oferecida ao cão durante o treino. Meus treinos de canicross, por exemplo, são bem curtos. Então, meus cães só bebem água após o exercício.
4 – Deixar a frequência respiratória do cão diminuir antes oferecer água para depois do treino.
5 – Nos dias mais quentes, deve-se levar o cão para nadar. É importante criar uma variação nas atividades: canicross, natação, brincadeira com bolinha (e essa pode ser na areia ou na água).
6 – Ter muita atenção com a temperatura na hora do treino. Com termômetros marcando acima dos 25°C, eu não treino canicross. Entre 23°C e 24°C, corro no máximo 2km. Os cães têm grandes dificuldades em fazer a troca de calor com o ambiente porque eles não suam igual aos humanos e isso acaba por facilitar a hipertermia.