Todas as manhãs, o neurocientista canadense Brian Christie dá uma turbinada no próprio cérebro. Nada a ver com tomar um café expresso triplo ou ficar horas vidrado em jogos de memória na internet. Para dar um gás na mente, ele corre para sua bike.
“Subo na minha bicicleta, vou para a academia e treino por 45 minutos. Depois pedalo até o trabalho”, diz Brian. “Quando sento na cadeira, meu cérebro fica no pico de atividade durante algumas horas.” Mais tarde, quando o foco dele começa a dar uma falhada, o cientista reinicia todo o processo com mais uma pedalada curta, para resolver coisas na rua.
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Pedalar, trabalhar, pedalar, repetir: eis uma rotina que melhora o funcionamento cerebral, comprovado cientificamente. Em um estudo publicado no Journal of Clinical and Diagnostic Research, voluntários marcaram mais pontos em testes de memória, raciocínio e planejamento depois de 30 minutos de exercício em uma bicicleta ergométrica do que antes de pedalar. Eles também completaram os testes mais rápido após esse tempo de exercício.
Cultive sua mente
Exercício é como fertilizante para o cérebro. Todas aquelas horas passadas girando na bike aumentam a vascularização não apenas da região dos quadríceps e glúteos, mas também da sua massa cinzenta. Mais vasos sanguíneos no cérebro e nos músculos significam mais oxigênio e nutrientes para ajudá-los a trabalhar, segundo Brian.
Quando você pedala, também obriga mais células nervosas a entrarem em ação. Quando esses neurônios se acendem, intensificam a produção de proteínas, como o fator neurotrófico derivado do cérebro (uma proteína conhecida pela sigla BDNF) e um composto chamado noggin, que levam à formação de novas células cerebrais. Resultado: você duplica ou triplica a produção dessas células, literalmente construindo seu cérebro, diz Brian. Você também libera neurotransmissores (os mensageiros entre as células cerebrais), para que todas as células, novas e velhas, possam se comunicar e funcionar melhor e mais rápido.
Esse tipo de crescimento é especialmente importante à medida que os aniversários vão passando porque, quando envelhecemos, nosso cérebro encolhe e essas conexões enfraquecem. O exercício restaura e protege o cérebro, diz o norte-americano Arthur Kramer, neurocientista na Universidade de Illinois. “Nossa pesquisa revelou que, depois de apenas três meses, pessoas que se exercitaram conseguiram ter o volume cerebral de alguém três anos mais jovem”, conta ele, referindo-se a um estudo que examinou o cérebro de 59 voluntários sedentários, entre 60 e 79 anos, que passaram a seguir um programa de exercícios.
Um cérebro maior e mais conectado simplesmente funciona melhor. “Adultos que fazem atividade física têm memória mais afiada, níveis mais altos de concentração, pensamento mais fluido e melhor habilidade para resolver problemas que os sedentários”, diz Arthur.
Pedal esperto
Se um pouco de exercício turbina sua capacidade mental, treinar mais tempo e com mais intensidade vai garantir a você um cérebro sempre eterno? Não é bem assim, explica Brian. “Quantidade nem sempre é qualidade, principalmente no curto prazo”, diz. O mesmo estudo que mostrou os benefícios para o cérebro de sessões curtas de exercícios também revelou que esforços mais intensos podem comprometer temporariamente a memória e o processamento de informações, algo que Brian testemunhou em primeira mão.
A filha adolescente de Brian também começa o dia se exercitando – mais especificamente praticando remo, geralmente em séries intervaladas puxadas.
Mas, em vez de fazer o cérebro dela tinir, o treino a deixa um pouco lenta quando chega à escola. “No curto prazo, você tem uma curva em U para o exercício e os benefícios à mente”, diz Brian. “Muito pouco exercício não permite que o cérebro tenha o que precisa para trabalhar bem. Se fizer demais, o corpo consome a glicose e outros recursos, ou seja, fica prejudicado até que se recupere.” A medida certa para a acuidade mental depois do exercício é fazer aproximadamente 30 a 60 minutos de atividade aeróbica a 75% da sua frequência cardíaca máxima, ou nível de esforço 7 em uma escala que vai de 1 (parado) a 10 (fazendo esforço máximo).
Giro positivo
Vários estudos científicos reforçam a ideia de que uma boa pedalada também oferece benefícios emocionais. Pode melhorar o humor, aliviar a ansiedade, aumentar a resistência ao stress e até mandar a tristeza embora. “O exercício funciona tanto quanto a psicoterapia e os antidepressivos no tratamento da depressão, talvez ainda melhor”, diz James Blumenthal, professor de medicina comportamental no departamento de psiquiatria Universidade de Duke (EUA). Um estudo recente que analisou 26 anos de pesquisas sobre o tema descobriu que mesmo apenas a prática de 20 a 30 minutos de exercício por dia já é capaz de prevenir a depressão no longo prazo.
No momento, os cientistas não entendem completamente os mecanismos exatos disso, mas sabem que atividades físicas como o ciclismo aumentam a produção de substâncias químicas responsáveis pelo bem estar, como a serotonina e a dopamina. “Chega a haver um aumento de 200% nos níveis de serotonina”, conta J. David Glass, PhD, pesquisador em química cerebral da Universidade Estadual de Kent (EUA).
Quando você pedala além da marca dos 20 e 30 minutos, outras substâncias que interferem no humor, como endorfinas e canabinoides (que, como o nome sugere, são da mesma família de substâncias que dão o barato em quem fuma maconha), entram em ação. Quando pesquisadores pediram a 24 homens para pedalar ou correr em intensidade moderada ou sentar por 50 minutos, notaram altos níveis de anandamida (um canabinoide natural) no sangue dos que se exercitaram, mas não no dos sedentários. Melhor ainda: pedalar regularmente ajuda a manter hormônios como adrenalina e cortisol sob controle, o que significa que você se sente menos estressado e se recupera mais facilmente de situações que provocam ansiedade.
Porém não esqueça: embora seja saudável, o exercício é também um tipo de estresse, principalmente quando você está iniciando ou retomando a atividade física. “Quando você começa a se cansar, o corpo libera cortisol para aumentar a frequência cardíaca, a pressão sanguínea e os níveis de açúcar no sangue”, diz Monika Fleshner, professora de fisiologia da Universidade do Colorado (EUA). À medida que se ganha condicionamento, é preciso um treino mais longo e intenso para conseguir a mesma resposta. “Para pessoas ativas, é preciso uma desafio maior para desencadear a resposta de cortisol, em comparação com pessoas sedentárias. Daí você consegue enfrentar um ambiente estressante e ficar bem, resistindo bastante antes de começar a liberar cortisol”, conclui Monika.
Qual é a prescrição de ciclismo para a felicidade? Os autores de uma recente revisão de estudos sobre exercício e depressão definiram as seguintes orientações para afastar a tristeza com atividade aeróbica: faça de três a seis treinos por semana. Cada um deve ter de 45 a 60 minutos e manter seus batimentos cardíacos entre 50 e 85% da frequência máxima. Claro, isso é apenas uma recomendação mínima para o público geral. Você pode ir além e assim fazer seu coração e mente felizes.
Como turbinar o cérebro
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ENCONTRE A HORA CERTA
Os benefícios imediatos do exercício vêm do estímulo. Você ativa os sistemas cerebrais que elevam a frequência cardíaca, o alerta sensorial e a rapidez de resposta. Por isso, programe seu exercício para quando você mais precisar de uma ajuda para despertar – à tarde, se for uma pessoa naturalmente matutina; logo pela manhã, se não for. Ou, melhor ainda, nos dois momentos, se puder se dar ao luxo.
ALIMENTE SUA CABEÇA
“O cérebro é um devorador de glicose: ele representa apenas 2% do peso corporal, mas é responsável por 20% do nosso consumo de glicose”, diz Brian. “Ingerir carboidratos é bom para os músculos e para o cérebro, principalmente se você for pedalar por bastante tempo.” Depois de treinar, lembre-se de repor os estoques de glicogênio (nos músculos e no cérebro) com um mix de carboidratos simples e complexos, como os encontrados em leite com achocolatado, que promove uma recuperação mental imediata e duradoura.
SINTONIZE
Sabe-se que ouvir música estimula o cérebro. Combinado com exercício, pode funcionar melhor ainda. Em um estudo com 33 homens e mulheres, aqueles que treinaram com música tiveram resultados melhores em testes de pensamento abstrato do que os que transpiraram em silêncio. É claro que você não precisa atravessar o trânsito ouvindo Jay Z, mas se estiver pedalando indoor ou numa trilha tranquila vá em frente e aumente o volume.
PEGUE PESADO – ÀS VEZES
Um estudo recente publicado no Translational Psychiatry mostrou que homens e mulheres mais velhos que praticavam exercícios de intensidade mais alta se saíram melhor do que seus colegas mais molengas em vários testes cognitivos, incluindo de memória e fluência verbal. Outra pesquisa mostrou que a produção da proteína cerebral BDNF aumenta quando a intensidade do exercício é maior.
MAS PLANEJE SEU ESFORÇO DO JEITO CERTO
Pedaladas intensas podem desenvolver um cérebro mais eficiente ao longo do tempo, mas a desidratação e o esgotamento de glicogênio deixam você um pouco lento no curto prazo. O que isso quer dizer? Se for precisar usar a cabeça logo depois de descer do selim (você tem uma reunião importante ou precisa trabalhar em um projeto complicado, por exemplo), tente não se acabar na bicicleta nas horas anteriores.