Recentemente, tomei a duvidosa decisão de não comer nada além de carne por 30 dias. Eu havia ouvido falar da “dieta carnívora” alguns meses antes, ao escutar um episódio do podcast de Joe Rogan. Seu convidado era Shawn Baker, atleta, cirurgião ortopedista e um dos defensores mais fervorosos do movimento “só carne”.
Durante dois anos, Shawn consumiu entre 1,5 a 2,5 kg de carne por dia. Sem frutas, vegetais, pão ou açúcar (ovos e peixes são permitidos). Shawn, o “Rei Carnívoro”, como ficou conhecido, compartilha rotineiramente as histórias de sucesso de colegas que adotaram essa moda no seu Instagram, com mais de 50.000 seguidores.
Os adeptos afirmam que a dieta carnívora pode melhorar o sono, eliminar dores articulares, normalizar a pressão arterial, limpar a pele, aumentar a energia, ajudar na perda de peso e ainda dar um gás na libido. Quem não iria querer um pouco disso tudo? Assim, em outubro passado, armado com mais de 18 kg de costela e contrafilé, eu dei início ao meu experimento. No café da manhã, mandei logo um bife e ovos.
Há pesquisas que alertam sobre os perigos potenciais desse estilo de vida, apontando que o consumo exagerado de carne, principalmente a vermelha, pode aumentar o risco de diabetes e doenças cardiovasculares conforme envelhecemos. Além disso, muitos nutrientes de que necessitamos, incluindo vitamina C, só são encontrados em alimentos de origem vegetal. Existe ainda o impacto ambiental de uma dieta exclusivamente carnívora: em 2013, as Nações Unidas estimaram que 14,5% das emissões de gases do efeito estufa vêm da criação de gado. Porém eu estava curioso quanto aos potenciais benefícios da dieta carnívora.
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No começo, a dieta foi satisfatória. Depois de uma semana, eu me senti menos lento pela manhã e com mais energia ao longo da tarde. Beber quatro ou mais xícaras de café para me manter acordado parecia um vício antigo. Eu comia sempre que ficava com fome, com um consumo médio de 685 gramas de carne por dia, e nunca me sentia inchado. Minha pressão arterial se manteve normal. Na academia, meu corpo esguio – de apenas 50,7 kg – logo chegou a quase 59 kg. Os músculos dos meus braços, tórax e costas ficaram mais definidos. E, embora eu tenha perdido vários quilos de gordura, não sofri por causa de fome. Às vezes, meu desejo de comer outros alimentos diminuía, e eu não tinha mais vontade de largar a dieta.
Por volta do oitavo dia, entretanto, os problemas começaram.
“Muitas pessoas se preocupam com prisão de ventre na dieta carnívora, porém, na realidade, o resultado mais comum é diarreia”, diz Shawn, confirmando minha experiência pessoal. Eliminar carboidratos significa que o organismo vai usar a gordura da carne para ter energia. Para digerir gordura, o pâncreas secreta uma enzima chamada lipase. Mas segundo a nutricionista Teresa Fung, do Simmons College, em Boston (EUA), a quantidade de gordura que eu estava consumindo havia ultrapassado minha capacidade de digeri-la. Por isso tive diarreias. As pessoas que adotam a dieta carnívora afirmam que o problema geralmente cessa após cerca de seis semanas.
Embora eu tenha consumido carne por apenas quatro semanas, a situação ficou tão séria que tive que comprar suplemento de lipase e tomar dois comprimidos antes de cada refeição. Fora uns comprimidos antidiarreicos para ajudar a tornar o dia a dia mais tolerável.
Um experimento de 30 dias não é longo o bastante para se descobrir todos os efeitos negativos de uma dieta à base de carne, mas foi suficiente para que eu decidisse retomar logo meus antigos hábitos alimentares. Teresa disse que estava preocupada com a minha saúde por estar comendo só carne e mencionou o maior risco de câncer colorretal. Porém, no curto prazo – apesar dos problemas intestinais –, eu passei aqueles 30 dias me sentindo bastante satisfeito. Simplificar o tempo de refeição também não me fez mal algum. Se você está pensando em tentar essa dieta em casa, eu não vou convencê-lo a desistir. Mas faça um favor a si mesmo: use papel higiênico de folhas duplas.
*Reportagem publicada originalmente na edição nº 158 da Revista Go Outside, de abril/maio de 2019