Sopa de alho, rodelas de limão e bolinhos de arroz estão entre as opções “exóticas” oferecidas durante algumas provas ao redor do mundo – aqui a gente te ajuda a saber se vale a pena encará-las ou não
Por Fernanda Beck
Em 2013, durante a Transvulcania, ultramaratona de 73 quilômetros que acontece nas ilhas Canárias, o corredor cearense Chico Santos não entendeu muito bem quando deparou com uma bandeja de fatias de limão na área de alimentação da prova. Surpreendeu-se mais ainda ao ver muitos competidores devorando com gosto as ácidas rodelas da fruta. “Eu não comi, mas o pessoal parecia adorar”, conta ele. Espanto semelhante teve o ultracorredor curitibano Marcelos Alves, que em 2015 correu maratonas nos sete continentes. Na Everest Marathon, lá estava uma “perfumada” sopa de alho, em pleno posto de abastecimento dos atletas. “Não tive coragem de encarar.” Batatas cozidas frias, sem nem ao menos um salzinho, esperavam os competidores na prova La Ruta de Los Conquistadores, na Costa Rica, deixando o corredor suíço-equatoriano Karl Egloff com cara de interrogação. “E ainda por cima sem tempero nenhum… achei esquisito”, lembra ele.
- Receitas saudáveis projetadas para ultramaratonistas
- Mitos e verdades sobre correr no calor
- Como ter sucesso no Ultra-Trail du Mont-Blanc
Para muito além das barrinhas de cereais, frutas, sanduíches e isotônicos, os postos de controle de algumas competições ao redor do mundo são um prato cheio de criatividade e localismos gastronômicos – para desespero de alguns atletas estrangeiros pouco acostumados aos quitutes regionais de certos eventos. Antes de torcer o nariz para o que é novo, porém, veja nossa seleção de quitutes de provas e saiba no que vale a pena investir quando seu desempenho está em jogo, e de quais invencionices e tradições é melhor passar longe. As nutricionistas Lisa Dorfman, norte-americana especializada em nutrição para corredores, e Paula Crook, da clínica PB Consultoria e Nutrição, em São Paulo, ajudam a desmistificar as esquisitices e te dizem o que – e por quê – comer.
Onigiri (bolinhos de arroz cozido)
País: Japão
Prova: Lake Saroma 50/100k Ultramarathon
Por que são oferecidos: Os bolinhos de arroz são os precursores das barrinhas de energia. Compactos e cheio de carboidratos simples de rápida digestão, são especialmente úteis em eventos em grandes altitudes, em que o corpo prefere carboidratos a gordura, pois fornecem energia rapidamente.
Veredito: Coma. Sem glúten e riquíssimos em energia, contêm em média 180 calorias e 39 gramas de carboidrato por bolinho.
Sopa de alho
País: Nepal
Prova: Everest Marathon
Por que é oferecida: A sopa de alho é uma entrada muito comum nas refeições no Nepal.
Veredito: Coma. A sopa de alho é utilizada no país para ajudar o organismo a se adaptar às grandes altitudes, pois o alho diminui a hipertensão pulmonar causada pela falta de oxigênio. Esse alimento possui substâncias químicas responsáveis pelo relaxamento de artérias, ou seja, é vasodilatador – o que beneficia a oxigenação do sangue.
Mini salsichas defumadas
País: Alemanha
Prova: Hexenstieg Ultralauf
Por que são oferecidas: Salsichas defumadas são um prato típico do norte da Europa. Contêm bastante energia – e muita, muita gordura.
Veredito: Não coma. A nutricionista Lisa Dorfman lembra que alguns atletas podem ter complicações digestivas devido aos conservantes encontrados nas salsichas, enquanto outros podem apresentar problemas com o alto teor de gordura saturada ingerida durante o exercício – cinco mini salsichas contêm 14 gramas de gordura, com mais de um terço delas sendo saturada.
Rodelas de limão
País: Espanha (Ilhas Canárias)
Prova: Transvulcania
Por que são oferecidas: Fácil de encontrar na Espanha, o limão é altamente hidratante e refrescante.
Veredito: Talvez. Exercícios extenuantes tendem a acidificar o sangue dos atletas em consequência da produção excessiva de acido lático durante o esforço. O limão pode ser útil, pois auxilia o processo de estabilização do pH dos líquidos corporais. Mas a nutricionista Paula Crook não recomendaria o petisco a seus pacientes. “Em lugares quentes e com muito sol, como as ilhas Canárias, é perigoso consumir limão devido ao risco de queimaduras na pele”, diz. “Fora que nem todo mundo acha o gosto agradável.”
Pollo sudado (sopa de frango)
País: Colômbia
Prova: Chicamocha Run
Por que é oferecida: Uma sopa quente com pedaços de frango, cebolas e batatas, o pollo sudado é, supostamente, um prato completo para o atleta, pois combina hidratação com carboidratos e proteínas magras.
Veredito: Depende. Ultracorredores que não estranham alho, cebola e temperos provavelmente se beneficiarão dessa sopa. Mas, em uma prova mais rápida, pode ser um tanto pesada. Melhor tomar após a competição.
Batatas cozidas sem tempero
País: Costa Rica
Prova: La Ruta de Los Conquistadores (corrida de aventura)
Por que são oferecidas: As batatas são um dos ingredientes mais comuns da culinária daquele país e reconhecida fonte de carboidratos.
Veredito: Coma sem medo. A glicose (produto final da digestão dos carboidratos) é nossa principal fonte de energia durante o exercício. “Em uma prova, o consumo de carboidratos de rápida absorção, como a batata, fornece glicose e atrasa a fadiga muscular, permitindo a continuidade do exercício”, explica Paula. Além disso, evita-se a utilização de proteína como fonte de energia, mantendo-a em sua principal função, que é o crescimento, manutenção e reparo dos tecidos.
Queijo roquefort
País: França
Prova: Grand Trail des Templiers
Por que é oferecido: Queijos “azuis” são alimentos carregados de calorias (aproximadamente 350 calorias a cada 100 gramas), além de muito populares na França.
Veredito: Fique longe. Gorduras saturadas podem causar complicações digestivas, fazendo delas uma péssima escolha para atletas de endurance. Laticínios apresentam um equilíbrio entre proteína e carboidratos que é ótimo para a recuperação, mas consumi-los em excesso antes ou durante a atividade física pode causar náuseas e cólicas. Melhor não arriscar.
Vinho tinto
País: França
Prova: Le Marathon du Médoc
Por que é oferecido: Antioxidantes como o resveratrol trazem benefícios à saúde, como a redução de inflamações e a limitação do crescimento de células cancerígenas. O álcool, sozinho, pode melhorar a circulação e reduzir a dor.
Veredito: Não tome muito. Os efeitos benéficos do vinho vêm a longo prazo, e não têm impacto positivo para a prova. Durante a prática de exercícios, o álcool do vinho desidrata e pode piorar a performance. Mas, se você prometer não exagerar, uma tacinha pequena não te fará mal algum – ainda mais em plena França.