Por que o Brasil ainda não tem representantes olímpicos na escalada esportiva?

Por Alexandre Versiani

escalada esportiva
Felipe Ho é um dos principais nomes da escalada esportiva brasileira. Foto: Dimitris Tosidis / IFSC.

Até não muito tempo atrás, a relação da maioria das pessoas com a escalada era distante. Longe dos olhos do público, era preciso conhecer alguém que indicasse o “caminho das pedras” ou um ginásio indoor – algo raríssimo há algumas décadas. A escalada não estava nos meios de comunicação convencionais, não era lembrada como um boa atividade recreativa para crianças, e não aparecia com frequência entre as alternativas de lazer ou de profissionalização de pessoas interessadas em escolher um esporte para chamar de seu.

Mas o sucesso de figuras como Alex Honnold, estrela da escalada mundial que levou o documentário Free Solo ao Oscar, combinado ao imenso alcance dos seus feitos nas redes sociais, foi o primeiro impulso para um salto histórico, que teve seu ápice com a entrada da escalada esportiva nas Olimpíadas de Toquio 2020, ao lado de modalidades como o surf e o skate. A partir daí o cenário mudou e a prática da escalada ganhou um novo status, refletido no crescimento e popularização da modalidade ao redor do globo.

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Por aqui não foi diferente e, desde 2020, novos ginásios não param de pipocar pelo país, empresas começam a investir no esporte – também como ferramenta de inclusão social – e jovens atletas brilham em competições internacionais. Como reflexo disso, existem cada vez mais praticantes recreativos que adotaram a escalada como estilo de vida na modalidade indoor (academias, ginásios e clubes) ou outdoor (ao ar livre, rochas e montanhas).

Em Paris 2024, o Brasil vai para o seu segundo ciclo olímpico sem nenhum representante na modalidade, apesar de bons resultados recentes em mundiais juvenis, sul-americanos e pan-americanos, além de nomes da nova geração que contam com campeonatos nacionais fortalecidos e uma estrutura moderna oferecida pela CBEscalada (Confederação Brasileira de Escalada Esportiva, antiga ABEE) para se desenvolver no esporte.

Nesta Olimpíada, mais de 20 nações conseguiram colocar atletas no torneio, enquanto o Brasil não alcançou os resultados necessários para a classificação. O país não obteve vagas via o Pan-Americano de Santiago em 2023 e também não conseguiu levar atletas para a disputa do Olympic Qualifier Series, os últimos eventos que marcam pontos para o ranking classificatório.

Por ser um esporte olímpico novo e ainda em fase de crescimento no Brasil, é natural que o país tenha dificuldades para levar atletas para os Jogos. No entanto, a modalidade vem alcançando resultados expressivos em competições internacionais recentes e alguns atletas começam a se destacar, como Rodrigo Hanada, Felipe Ho, Anja Kohler, Bianca Castro, Samuel Silva, Pedro Egg, Laura Timo e Mariana Hanggi, só para citar alguns.

Assim, a esperança de classificação segue para os próximos ciclos olímpicos.

O maior nome da escalada esportiva brasileira

Hoje aposentado das competições, Cesar Grosso é a grande referência da escalada esportiva brasileira. Foto: Rosita Belinky

Em 2013, Cesar Grosso decidiu fixar residência em Arco, na Itália, um dos principais centros da escalada no mundo. Grande ídolo da escalada esportiva no Brasil, ele anunciou a aposentadoria das competições em 2020, mas pouco antes disso seus treinos ganharam um novo significado: tentar conquistar uma vaga para o Brasil na estreia da escalada nos Jogos de Tóquio, o que ele considera um marco fundamental neste novo ciclo do esporte.

“A entrada da escalada nas Olimpíadas foi um grande passo. Claro que não foi apenas isso que ajudou a popularizar o esporte, mas foi o maior incentivo da última década”, diz Cesinha. “Muita gente achava que o esporte era só em rocha, que era preciso passar perrengue, sair com a mão sangrando. Mas viram que pode ser algo muito mais dinâmico e divertido, seja fisicamente – já que é um mega exercício – ou socialmente, porque é um esporte que você pratica entre amigos. Isso ajudou muito a difundir o esporte. Acho que sem as Olimpíadas seria bem mais difícil mostrar ao mundo como a escalada pode ser legal e interessante do ponto de vista físico, social e econômico”, comenta o escalador.

Oficialmente aposentado das competições, Cesinha agora passa o bastão e o sonho de ver o Brasil entre os grandes atletas olímpicos para nomes da nova geração, como Felipe Ho. O paulistano já é 16 vezes campeão brasileiro e também o mais jovem escalador do país a realizar ascensões de boulder graduados entre V10 e V14.

Quando começou a subir as primeiras paredes, Ho só encontrava duas opções de ginásios para treinar em todo estado de São Paulo. Agora são mais de três só na capital paulista e vários outros nas cidades ao redor, sem contar os amigos que já possuem paredes construídas em casa. “Antes eu estava acostumado a chegar para treinar e conhecer todo mundo ali; agora não conheço mais ninguém”, brinca. “Tem sempre rostos novos nas academias, pessoas me perguntando se sou da seleção, e isso é muito legal”, destaca o atleta.

Neste novo ciclo da escalada, agora como esporte olímpico, Felipe recebe apoio para viajar ao exterior e evoluir ao lado dos maiores escaladores do mundo. Ele também conta com patrocínio de empresas, e ainda tem à disposição a estrutura de ponta do Centro de Treinamento do COB, no Rio de Janeiro.

“No passado a gente basicamente não tinha nenhum campeonato nacional. Só depois da fundação da ABEE, em 2014, é que passamos a ter um motivo para treinar. Os atletas no Brasil, que antes estavam perdidos e não tinham estímulos para treinar – a não ser um desafio pessoal na rocha, no outdoor –, agora têm um campeonato cada vez mais profissionalizado”, diz Felipe. “Depois que a escalada entrou nesse ciclo olímpico melhorou ainda mais; a gente tem muitas vantagens por conta disso e há muito mais empresas apoiando”, completa.

Matéria adaptada da reportagem “O Caminhos das Pedras”, publicada na edição 174 da revista Go Outside.