Pandemia impulsiona pessoas a buscar oportunidades na agricultura e no turismo rural

Pandemia impulsiona pessoas a buscar oportunidades na agricultura e no turismo rural
SONHOS Raimunda Silva largou família e trabalho no interior de São Paulo para buscar um ideal alimentar: produtos orgânicos (Crédito: Emiliano Capozoli)

A funcionária pública Raimunda da Costa Silva, trabalhava como merendeira em um colégio estadual de Jundiaí, interior de São Paulo. Ganhava o suficiente para pagar as contas, o condomínio de seu apartamento, e ainda sobrava um pouco para fazer suas vontades. Até que veio a pandemia e a morte de seu pai. Raimunda resolveu se aposentar e, aos 56 anos, perseguir um grande sonho: produzir alimentos de qualidade para crianças que estudam em escolas públicas. Deixou os três filhos em Jundiaí e se mudou para Estiva, no sul de Minas Gerais, onde o pai tinha uma pequena roça de dois hectares. Raimunda viu naquele pedaço de terra um recomeço de vida. Fez cursos de agricultura orgânica e começou a plantar alface, couve, beterraba, quiabo, batata doce, tomate, e seus carros-chefes: pêssegos e pitaias. “As pessoas me perguntam por que larguei um emprego bom para morar na roça? Porque estou vivendo meu sonho. Tenho pouco, mas é suficiente para sobreviver”, afirma. Ela conseguiu realizar a aspiração ao participar do Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), plano do governo federal que escolhe pequenos agricultores familiares para fornecer e distribuir comida para a merenda das crianças em creches e escolas públicas. É de lá que a agricultora consegue sua renda mensal de pouco mais de R$ 3 mil.

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Um dos principais motivos para esse “exôdo urbano” é o cansaço. As pessoas não aguentam mais o estresse do dia a dia, a correria com horários marcados e a pressão de seus trabalhos. A pandemia intensificou o sentimento de que é preciso diminuir o ritmo diário de cada um. Essa migração para áreas rurais é descrita em estudos como neorruralidade. O casal Giselle Lima e Juliano Stockler é um exemplo dessa tendência. Os dois já moravam em São Sebastião das Águas Claras, em Nova Lima, na região metropolitana de Belo Horizonte, e trabalhavam em grandes escritórios de advocacia na capital, mas tinham o sonho de desacelear e não precisar se locomover para a cidade grande todos os dias. Perceberam que, durante a pandemia, aumentou o número de pessoas preocupadas em melhorar a alimentação, e resolveram investir em cogumelo shitake na sua propriedade. E o resultado ficou aquém do esperado. “Pensamos que venderíamos para grandes redes de supermercados, mas é muito difícil. Queríamos apenas mudar de vida e como faríamos isso seria uma consequência”, afirma Giselle. Embora os dois estejam ganhando menos do que quando trabalhavam como advogados, não há arrependimento quanto à mudança. “Sempre quisemos ter essa liberdade e tranquilidade. Não ganhamos muito dinheiro, mas temos qualidade de vida”, diz.

Tanto a produção de cogumelos do casal, quanto a roça de dona Raimunda recebem ajuda da Emater, empresa pública que presta serviço para pequenos agricultores familiares. A autarquia presta assistência, observa pontos positivos e mostra o que pode ser melhorado dentro de cada empreendimento. André Laranjo, agrônomo e técnico da Emater, diz que tem atendido vários novos produtores que migraram de cidades grandes para a área rural. “Eles querem criar os filhos como nossos avôs e bisavôs viveram: com o pé na terra e subindo em jabuticabeira”, explica. Mas nem só de agricultura vivem os novos empreendedores. Há projetos em turismo rural, ecoturismo, gastronomia, saúde e serviços ambientais. O fotógrafo Emiliano Capozoli, 38, e a estilista Fernanda Formigari, 35, levados pelo crescimento do aluguel nas grandes cidades, construíram três casas que funcionam como refúgios no meio da floresta com o objetivo de alugar para “os estressados dos centros urbanos”. O casal morava em São Paulo e sempre pensou em se aposentar em um local isolado no meio do mato. Nenhum dos dois se retirou ainda, mas a pandemia adiantou os planos. Eles compraram um terreno de 37 mil metros quadrados a 180 quilômetros da capital. Além das casas que servirão como hospedagem, eles ainda vão vender alimentos orgânicos de sua horta. “As pessoas estão buscando uma melhor qualidade de vida depois da loucura da pandemia. Elas agora só querem viver”, afirma Emiliano. Afinal, por que ficar preso em sua casa, sozinho, trabalhando em frente a uma tela se pode fazer o mesmo com o pé na grama, olhando para as montanhas e com uma boa internet?