Os veganos vão dominar os esportes

Sem carne, sem medo, sem limites: há quase 15 anos alimentando-se apenas de vegetais, a escaladora Steph Davis ainda está disposta a provar que o veganismo é um bem para o próprio corpo, para os animais e para o planeta

EM CASA: Steph em sua casa em Moab, com os amados "Mao", o gato, e "Cajun", a blue heeler (FOTO: Chris Noble)
EM CASA: Steph em Moab, com os amados “Mao”, o gato, e “Cajun”, a blue heeler (FOTO: Chris Noble)

Por Mario Mele

A NORTE-AMERICANA STEPH DAVIS vive na constante busca pela simplicidade, e por isso tenta sempre compreender a diferença entre o que é essencial e o que é excessivo em sua vida. Uma lição foi tirada da escalada, esporte que começou a praticar em 1991, na época em que cursava literatura na Universidade de Maryland (EUA), e nunca mais parou – hoje, ela é considerada uma das mais importantes escaladoras do mundo, com difíceis ascensões em free solo (sem corda de segurança). “A escalada é uma metáfora da vida, sob vários aspectos. Você tem que fazer o que considera certo e o que te mantém vivo. E curtir muito enquanto durar”, diz Steph, que é também fiel praticante de base jump e wingsuit.

Outro aprendizado veio do veganismo. Em 2002, em busca de um novo estilo de alimentação que colaborasse com sua performance, ela passou a seguir uma dieta baseada exclusivamente em vegetais. Na época, esse não era um hábito comum, e seus amigos tentaram fazê-la desistir da ideia. Segundo Steph, porém, não faltaram motivos para seguir em frente na decisão. “No começo, foi uma questão de saúde, mas logo notei um grande avanço no meu desempenho”, garante. “Depois percebi também que deixei de patrocinar uma indústria cruel.”

Hoje Steph vive em paz em uma pequena casa em Moab, no estado de Utah, a cinco quilômetros de alguns dos melhores picos de escalada e base jump do mundo. Tornou-se uma das atletas mais respeitadas no mundo outdoor porque, além de suas marcas nos esportes, é uma grande incentivadora do estilo de vida simples: desfruta de uma rotina que consiste, entre outras coisas, levar sua cadela blue heeler Cajun para passear nas montanhas e compartilhar receitas de vegetais refogados nas redes sociais. Aos 42 anos, ela ainda acredita que o veganismo pode salvar o mundo.

“Quando decidi me tornar vegana, todos os escaladores que eu conhecia me diziam que essa seria uma péssima opção. Depois de duas semanas, no entanto, me sentia muito melhor em relação a outras dietas que eu tentara antes. Posteriormente descobri como os animais são tratados para fornecer produtos de sua origem para o consumo humano, e decidi que nunca mais patrocinaria aquilo.”

“Acredito que se tornar vegano é somente uma questão de decisão: temos que ver o que realmente é importante para nós, e então mudar nossos hábitos. Garanto que não é assim tão difícil incluir leite de castanha e tofu no cardápio.”

“Depois que me tornei vegana, escalei em livre a via The Nose, no El Capitan, no Yosemite, em um dia. Também no El Capitan, escalei a Salathé Wall no mesmo estilo, e fiz a primeira ascensão de um dia da Torre Egger, na Patagônia argentina. Nada foi por acaso. Percebi claramente o meu progresso.”

“No começo, tentei ficar calada em relação ao veganismo. Inclusive uma marca que me patrocinava disse que eu não deveria falar em público sobre isso para não incomodar as pessoas. Anos depois, decidi que seria de minha total responsabilidade, e assumi um compromisso com os animais. Gradualmente fui me tornando mais corajosa para falar sobre o assunto.”

“Nos últimos anos, o veganismo ficou mais popular, e percebo inclusive que a mentalidade está mudando, apesar de existirem muitos escaladores top que são veganos, mas não querem ser porta-vozes da causa.”

“Recentemente, fiz um trabalho com a [marca norte-americana de sapatilhas para escalada] Evolv, em que ajudei na criação de uma nova linha vegana, lançada nesta temporada. Quero cada vez mais que as pessoas saibam que ser vegano é uma grande escolha.”

“Como escaladora, acredito muito na interação com a natureza. Por outro lado, vejo que o ‘jeito moderno’ de esperar que a Terra se adapte sempre ao homem é artificial e incoerente. Não devemos esquecer que somos uma criatura como outra qualquer que habita este planeta e, por isso, quanto mais estivermos em harmonia com o meio ambiente, mais teremos uma vida saudável.”

“A maioria dos ambientalistas concorda que se tornar vegano é uma das melhores coisas que as pessoas podem fazer para proteger o meio ambiente. Independentemente disso, acho que temos que ser mais humildes em relação ao planeta, e não pensar que tudo o que existe aqui é nosso, que temos o direito de usar e destruir apenas porque, infelizmente, somos capazes disso.”

“Ainda fico irritada com o fato de algumas pessoas se manterem completamente indiferentes com animais sendo abusados, feridos e escravizados. É difícil eu me manter calma e ‘diplomática’ nessas horas, mas sei que a raiva nunca funciona em conversas. Por isso, às vezes, eu tenho que simplesmente ficar quieta.”