As hortas urbanas estão virando um negócio de empresas e construtoras, diz Gustavo Nagib, doutor em Geografia Humana pela USP. A sua pesquisa mostra como a expressão ativista e as hortas comunitárias de São Paulo e Paris levaram a um novo urbanismo que está incorporando essa prática de agricultura.
A pesquisa mostra que Paris, Nova York e Berlim ganharam fama mundial com moradores colaborando em hortas urbanas como comunidade e, um tempo depois, start ups e imobiliárias começaram a adotar as mesmas práticas — mas com o intuito de capitalizar.
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“O capitalismo sempre vai se apropriar de discursos e práticas ativistas para fazer negócios, capitalizar. O que podemos fazer? Vamos falar que queremos ter uma horta no bairro mas são pessoas contratadas que vão cuidar dela, ou eu quero colocar a mão na terra, eu quero participar e me apropriar desse espaço?”, disse o geógrafo ao UOL.
Quando um negócio particular toma a iniciativa de fazer uma horta urbana, não são os moradores e funcionários que cuidam do projeto — uma empresa é contratada para tocar a horta. E a produção é colocada a venda.
“Temos novos mecanismos para fazer com que as cidades fiquem mais verdes. Porém precisamos tomar cuidado para que isso não vire só propaganda, só marketing”, explica Gustavo.
A história das hortas urbanas
O geógrafo é membro de um grupo de estudos sobre o tema no Instituto de Estudos Avançados da USP e diz que agricultura urbana e a ideia de hortas compartilhadas em comunidades não é novidade. As práticas se popularizaram na época das guerras mundiais em países como Inglaterra e Estados Unidos, para combater a escassez alimentar.
A partir dos anos 2000, porém, políticas públicas específicas para estimular e desenvolver projetos nos centros urbanos foram criadas. A prefeitura de Paris, por exemplo, permite que a comunidade crie uma horta urbana em certas áreas das praças da cidade.
Cenário do Brasil
Gustavo explica que faltam diretrizes sobre como as prefeituras vão lidar com as hortas urbanas e incorporá-las à esfera pública. Ele diz que algumas cidades como Belo Horizonte, Teresina e Campinas têm iniciativas mais avançadas, já de algum tempo, mas ainda assim precisam de um projeto melhor de desenvolvimento.
Gustavo também ressalta que existe sim uma expertise para o cultivo de hortas urbanas no Brasil, mas ela se concentra na área periurbana, como o cinturão verde de São Paulo, que abastece a metrópole. “O trabalho do agricultor que vive disso é muito tradicional em São Paulo. Desde sempre teve isso aqui – e nisso eu acho que São Paulo é exemplo.”