Em uma entrevista recente ao talk show espanhol “La Revuelta”, reproduzida pela Cumbres Magazine, o lendário trail runner catalão Kilian Jornet compartilhou algumas de suas experiências mais impactantes e reflexões sobre sua vida nas montanhas.
Com uma trajetória que o levou a ser considerado um dos melhores atletas de resistência da história, Jornet não falou apenas sobre seus recordes e feitos, mas também sobre como a montanha moldou sua vida desde a infância.
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Kilian não teve uma infância convencional. Criado em um refúgio de montanha nos Pirineus a 2.000 metros de altitude, sua conexão com a natureza foi algo natural, quase inato. “Eu não tive outra opção. A montanha fazia parte do meu dia a dia”, confessou durante a entrevista.
Suas lembranças de infância não incluem grandes viagens à cidade ou à praia, mas sim batalhas com pedras e brincadeiras com bastões nas árvores junto com sua irmã. “Uma vez fomos a Barcelona e a Paris, mas o que mais lembro é do asfalto, dos prédios enormes e das pessoas. Para mim, aquilo era estranho”, comentou com um sorriso.
Essa conexão precoce com a montanha o levou a desenvolver uma resistência e uma paixão que o transformaram em uma referência mundial. No entanto, Jornet não buscou apenas a competição. Para ele, a montanha é um estilo de vida, um lugar onde encontra paz e desafio em medidas iguais.
Recordes: do Mont Blanc ao Everest
Um dos temas centrais da entrevista foi sua transição das corridas competitivas para as tentativas de bater recordes em algumas das montanhas mais altas do mundo. “No fim das contas, é levar o que aprendi na competição para a alta montanha”, explicou Jornet.
Entre seus feitos mais impressionantes está sua ascensão e descida do Mont Blanc em menos de 5 horas, um tempo que, para muitos alpinistas, exige dias de preparação e esforço.
Mas, sem dúvida, uma das histórias mais impactantes que ele compartilhou foi sua experiência no Everest. Em 2017, Jornet realizou duas tentativas de subida e descida em tempo recorde. No primeiro desafio, sofreu diarreia e desidratação, o que comprometeu seu desempenho. “Subi em 26 horas e desci em 34 horas. Não foi um dia em que eu estivesse 100%”, relatou Kilian.
No entanto, decidiu tentar novamente uma semana depois. “Saí de um acampamento mais alto e levei 19 horas para subir e descer”, lembrou.
O mais surpreendente dessa segunda expedição foi o estado físico e mental em que ele se encontrava. “Eu tinha meio litro de água, que congelou, e, na descida, tive um blackout. Comecei a ver um garoto me seguindo, e eu sabia que era uma alucinação, mas não conseguia parar de vê-lo”, contou Jornet. Em um momento de extrema fadiga e confusão, ele chegou a questionar se estava sonhando ou se realmente estava na montanha. “Foi como uma roleta-russa. Se eu não estivesse sonhando, poderia morrer”, admitiu.
A montanha como estilo de vida
Apesar de suas conquistas incríveis, Jornet não busca apenas a glória ou os recordes. Para ele, a montanha é um lugar de conexão e superação pessoal. “Eu não quero droga, mas você passa 40 horas na montanha e é quase a mesma coisa”, brincou Kilian ao falar sobre as alucinações e o esgotamento extremo que experimenta em suas expedições.
Atualmente, Jornet vive com sua esposa, Emelie Forsberg, em Romsdal, na Noruega. Um lugar que ele descreve como um paraíso para os amantes da montanha. “Tenho o fiorde a 20 metros de casa, mas, em 8 anos, só desci até o mar algumas vezes”, confessou. Para ele, a verdadeira beleza está nos cumes, não nas praias, que ele admira do ponto mais alto possível.
Kilian também falou sobre sua vida familiar. Com duas filhas pequenas e um terceiro bebê a caminho, a montanha continua sendo um elemento central em sua vida. “Saímos para caminhar, subimos 800 metros e elas dormem bem”, comentou, rindo. Suas filhas já estão familiarizadas com a natureza, embora ainda não tenham alcançado as alturas que o pai conquistou.
Quanto aos seus próximos desafios, Jornet não para. Recentemente, completou uma travessia pelos Alpes, conectando todos os picos de 4.000 metros. “Era um projeto que eu queria fazer há muito tempo. Ficar nos cumes por dias, depois descer, pegar a bicicleta e seguir”, explicou.