Influenciador de longevidade, médico e autor de best seller, Peter Attia quer mudar a maneira como cuidamos da saúde, com o treinamento físico no centro dessa abordagem. Esta é realmente a fonte da juventude?
Posso contar o momento exato em que comecei a pensar seriamente sobre longevidade. Aconteceu em 10 de março de 2023, às 22h20, em uma sala de parto de hospital iluminada por luzes no teto. Fiquei ao lado da cama, com a mão esmagada pelo aperto da minha esposa, enquanto um pequeno alienígena estridente, uma berinjela com olhos — nossa filha, Esme — escorregava para as mãos do obstetra de plantão. Aos 56 anos, fui pai pela primeira vez.
Até a chegada dela, o total dos meus pensamentos sobre o envelhecimento poderia ser resumido em uma frase que meu pai gosta de dizer: “Envelhecer é uma porcaria, mas é melhor do que a outra alternativa.” Agora, ao olhar para aquele rostinho roxo, eu queria cada minuto saudável dali para frente. Comecei a imaginar todas as coisas que eu seria capaz de mostrar a ela: montanhas, rios, livros (feitos de papel) e como preparar uma margarita perfeita. Quando chegamos em casa, eu não era mais o centro do meu universo. Era ela.
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Com esta nova cosmologia em mente, sentei-me com o livro de Peter Attia, Outlive: The Science and Art of Longevity, [Sobreviver: A Ciência e a Arte da Longevidade] escrito em parceria com Bill Gifford, editor contribuinte da Outside. O livro reverberou em muitas pessoas. Vendeu mais de um milhão e meio de cópias em menos de um ano e tem sido uma presença constante na lista de best-sellers do New York Times por quase todo esse tempo.
Comecei a ler com uma certa cautela. Escrevo sobre saúde e boa forma há mais de duas décadas, e a maioria das coisas que promovem a “longevidade” me dão arrepios. Por que morremos, e por que não, envolve uma ciência extremamente complicada, que é difícil, senão impossível, de pesquisar conclusivamente. Os caras – quase sempre são caras – que dizem que sabem tudo são suspeitos por definição.
Logo aprendi que Sobreviver não se trata da morte em si, mas do declínio. Attia acredita que se pode prevenir o declínio – ou, como ele diz, “endireitar a curva da longevidade” – por meio de uma combinação agressiva de exercícios, estilo de vida (nutrição, sono etc.) e elementos de cuidados de saúde personalizados, ou o que ele chama de Medicina 3.0. Envelhecer pode ser menos penoso? Ele diz que a resposta é um sonoro sim.
Attia, de 51 anos, é médico licenciado que administra um consultório de telemedicina de sua casa e QG de fitness em Austin, Texas (EUA). Dizem que ser paciente dele pode ter um custo anual de seis dígitos (ele não divulga esse número). Ele também é uma estrela em ascensão no circuito de influenciadores de autoaperfeiçoamento, aparecendo frequentemente em podcasts apresentados por Rich Roll, Andrew Huberman, Tim Ferriss, Joe Rogan e Rhonda Patrick, entre outros.
Além de suas participações especiais, Attia produz seu próprio podcast, The Drive, juntamente com um boletim informativo semanal e um fluxo robusto de conteúdo de mídia social. Ele tem um milhão de seguidores só no Instagram. Você pode até tê-lo visto como o médico no programa da Disney+ Sem limites com Chris Hemsworth, também conhecido como o Thor da Marvel. Quer mais? Você pode assinar a versão expandida, exclusiva para membros, da produção de Attia por US$ 149 ao ano. Ou invista em seu curso on-line sobre longevidade: Early — essencialmente uma versão aprimorada e interativa do livro — por US$ 2.500.
Passei meses imerso nas ideias dele, incluindo seu livro, podcast, boletim informativo e o programa Early. Alguns dos conselhos em Sobreviver – fazer exercícios vigorosos, não comer muito nem pouco – parecia existir desde que Jack LaLanne vestiu um macacão de lycra e começou a fazer flexões. Mas, no geral, eu não tinha visto nada tão abrangente e visionário quanto a abordagem de Attia.
Na sua visão, a Medicina 3.0 é uma mudança de paradigma em relação ao protocolo de pílulas e procedimentos (Medicina 2.0), que é o status quo atual da assistência médica. É focado na prevenção e organizado em cinco pilares: exercícios, nutrição, sono, saúde emocional e o que Attia chama de “moléculas exógenas” (fármacos, suplementos e assim por diante). Todos eles são importantes e têm o lugar apropriado no livro, mas o exercício reina supremo como “a ‘droga’ mais potente em nosso arsenal”, como ele escreve em Sobreviver. “Os dados são inequívocos: o exercício não só atrasa a morte real, mas também previne melhor o declínio cognitivo e físico do que qualquer outra intervenção.”
O exercício se divide em subcategorias: força, estabilidade, eficiência aeróbica e capacidade aeróbica máxima. O objetivo é obter o condicionamento físico ideal em cada um deles, já que eles demonstraram formar um escudo poderoso contra nossas maiores ameaças à saúde: doenças cardiovasculares, câncer, disfunção metabólica e distúrbios neurológicos degenerativos, o que Attia chama de “os quatro cavaleiros”.
A boa forma física parecia um bom remédio para mim, mas a ênfase nos exercícios também gerou muitas perguntas: Que tipo? Quanto? Qual o nível de dificuldade? Entrei em contato com o grupo de Attia, perguntando se eu poderia me tornar paciente por alguns dias e escrever sobre seus métodos. Eles disseram não – o senhor doutor está extremamente ocupado, mas depois de meses de idas e vindas, concordaram em me deixar ir lá por alguns dias em abril passado, para conhecê-lo e fazer algumas avaliações de condicionamento físico. Eu sentia que estava indo muito bem: pedalava de mountain bike e fazia musculação regularmente, entre outras coisas. Mas o que eu estava perdendo? O que devo fazer daqui para frente?
O momento era bom, porque Attia estava se preparando para abrir uma nova unidade em Austin chamada 10Squared, uma espécie de laboratório híbrido de testes e centro de treinamento que atenderá seus pacientes existentes e um novo grupo de membros selecionados. A equipe dele me enviou um acordo de confidencialidade antes da minha visita, com a ressalva de que esse seria um projeto de caixa-preta até que eu fosse informado do contrário. Isso me pareceu exagerado para o que parecia ser uma academia particular sofisticada, mas claro, por que não? Se isso era preciso para finalmente provar o tempero secreto por trás Sobreviver, me diz onde assino.
O interesse popular em viver mais não é novidade, mas aumentou nos últimos anos. As razões para isso não são exatamente claras. A pandemia nos lembrando da nossa mortalidade? Um número crescente de baby boomers está querendo antecipar a aposentadoria?
Nossa fixação pela longevidade está aumentando ao mesmo tempo em que nossa saúde parece piorar. Um estudo de 2018 realizado por pesquisadores da Universidade da Carolina do Norte causou impacto ao concluir que apenas 12% dos americanos são metabolicamente saudáveis. Além disso, de acordo com dados do Centro Nacional de Estatísticas de Saúde do CDC, a expectativa média de vida caiu entre 2019 e 2021, o maior declínio desde o início do século XX. É verdade que essa estatística foi afetada pela COVID-19, mas as doenças crônicas também desempenharam um papel significativo.
A renovada obsessão por uma vida mais saudável deu origem a alguns produtos e serviços voltados para a longevidade, muitos com um viés fitness. Sem dúvida o sucesso de Sobreviver ajudou a preparar o mercado. A Equinox, rede de academias de luxo, lançou recentemente um pacote de bem-estar e longevidade de US$ 40.000 por ano chamado Optimize, que inclui análise de sangue, um personal trainer e treinamento individualizado do sono.
Na cidade de Nova York, uma startup chamada Continuum vai ainda mais longe: por US$ 10.000 por mês, você obtém um plano de saúde de precisão criado por IA, uma análise biométrica completa, massagens, soro intravenoso rico em nutrientes e outros benefícios de luxo, tudo isso em uma academia particular de 2.300 metros quadrados em Greenwich Village.
Tive dificuldade em conciliar os novos luxos da longevidade – e os altos preços – com a vida de pessoas que vivem até os 90 ou 100 anos. Duvidei que a maioria deles já tivesse ouvido falar de VO2 máximo ou já tivesse pisado em uma sala de musculação. Talvez todos eles tenham sido apenas ganhadores da loteria genética?
Entrei em contato com Dan Buettner, o autor de Blue Zones [Zonas Azuis], o best-seller que virou série da Netflix e analisa de perto cinco lugares do mundo onde as pessoas vivem mais. Buettner é jornalista, não médico ou cientista, mas passou bastante tempo com centenários. Ele disse que gostou de Sobreviver e achava que a ciência era sólida, mas era cético porque seguir seus conselhos “pressupõe uma pessoa que esteja dois ou três desvios-padrão da norma no que diz respeito à disciplina, renda e presença de espírito”.
Attia chegou ao campo da longevidade por um caminho tortuoso. Ele cresceu em Toronto, filho de pais egípcios que imigraram para o Canadá. Em Sobreviver ele revela que, quando criança, foi abusado física e sexualmente – ele não diz por quem, apenas que não foi um membro da família. Quando adolescente, ele começou a lutar boxe, o que o ajudou a lidar com o trauma. “Eu tive que bater em sacos de pancada e em pessoas, e isso canalizou minha raiva”, escreve. Apesar desta e de outras saídas, problemas emocionais o acompanharam até a vida adulta.
Seu passado o ajudou a seguir o caminho da medicina. Como estudante de graduação na Queen’s University em Kingston, em Ontário, foi voluntário em um abrigo para crianças abusadas. Ele cursou medicina na Universidade de Stanford e depois fez uma prestigiosa residência cirúrgica na Johns Hopkins antes de abandonar o curso no quinto ano. Algo não estava funcionando para ele naquele mundo. Para Attia, a medicina tradicional parecia arraigada, resistente a novas abordagens e novas formas de pensar. Ele acreditava que deveria haver uma maneira melhor.
Attia acredita que você pode prevenir o declínio por meio de uma combinação agressiva de exercícios, estilo de vida e elementos de cuidados de saúde personalizados, ou o que ele chama de Medicina 3.0. Envelhecer pode ser menos penoso? Ele diz que a resposta é um sonoro sim.
Depois de abandonar completamente a medicina, aceitou um emprego na McKinsey and Company, gigante global de consultoria de gestão sediada na cidade de Nova York. Ele tinha uma forte inclinação para a matemática, o que deu certo na McKinsey, onde Attia desenvolveu um sistema de pensamento envolvendo estruturas, risco e probabilidade, que acabaria se tornando a base de sua abordagem à Medicina 3.0.
Attia também era atleta amador sério que levava sua própria forma física ao limite. No boxe, ele competiu em nível júnior de elite. Já adulto, fez a transição para esportes de resistência, praticando ciclismo e natação. Entre outros feitos impressionantes, em 2005 ele nadou da Ilha Catalina até Los Angeles — cerca de 32 quilômetros em 10 horas e 34 minutos. Mais recentemente, tem se concentrado em rucking, que envolve caminhadas extenuantes com uma mochila pesada — no caso dele, geralmente de 23 kg ou mais.
Ele também começou a se dedicar novamente à medicina, dessa vez em consultório particular. Por volta de 2014, escreveu seu manifesto sobre saúde, ideias que acabariam se transformando em Sobreviver. Ele percebeu que a chave para uma vida mais longa era manter as doenças crônicas sob controle. Nada faz isso melhor do que exercícios, argumenta Attia.
Esta não foi apenas uma proclamação exagerada de um homem obcecado com sua própria forma física. A literatura científica mostrou claramente o quão eficaz o exercício pode ser na prevenção e até no tratamento de doenças crônicas. Esse tipo de pensamento começou a se popularizar na era moderna, em parte graças a livros como Jogging (1966), de W.E. Harris, e Aerobics (1968), de Kenneth Cooper, que ajudaram a conectar os pontos entre aptidão física e saúde, e são às vezes creditados por terem ajudado a lançar o boom da corrida nos anos 1970.
Os dados eram tão convincentes que, em 2007, o American College of Sports Medicine se uniu à American Medical Association para lançar o Exercise Is Medicine, uma iniciativa registrada para facilitar a adoção de métricas de condicionamento físico entre os profissionais de saúde. Os médicos, segundo a proposta, não deveriam apenas verificar a pressão arterial. Eles deveriam monitorar quanto de atividade física você faz todos os dias.
“Não existe nenhuma doença crônica que o exercício não afete”, diz Robert Sallis, professor clínico de medicina de família em Fontana, Califórnia, e fundador do Exercise Is Medicine. “Faz muito mais sentido que esta seja uma prescrição de primeira linha.”
Embora a ideia seja ótima em teoria, as tentativas de confiar na atividade física como prevenção ou terapia não têm funcionado bem na prática, diz Sallis. Médicos ocupados raramente têm tempo para conversar com os pacientes sobre sua dieta e atividade física, e, quando o fazem, a conversa é geralmente breve e vaga. “É frustrante”, diz Sallis. “Tudo gira em torno de pílulas e procedimentos. Não estamos colocando anúncios na TV dizendo: ‘Fale com seu médico sobre exercício.’”
Minha conversa com Sallis me lembra que muito sobre a prática de exercício não se encaixa bem com a cultura contemporânea. Eliminamos a maior parte dos movimentos de nossas vidas; comemos demais, bebemos demais, nos estressamos demais e dormimos muito pouco. Para muitos, o exercício é árduo e desagradável, e precisa ser conciliado com outras demandas, como trabalhar (ou ter vários empregos), criar uma família e lidar com os vícios e distrações incessantes do capitalismo.
Se isso já não é difícil o suficiente, também não somos particularmente bem adaptados ao exercício, argumenta o biólogo evolutivo Daniel Lieberman, autor de Exercised: The Science of Physical Activity, Rest, and Health.[Exercitado: A Ciência da Atividade Física, Descanso e Saúde]. Sob uma ótica darwiniana, ser preguiçoso – isto é, conservar energia – é uma tática de sobrevivência. Segundo Lieberman, o exercício é uma invenção “estranha” à modernidade, criada para substituir eras de esforço físico constante.
Durante a maior parte da evolução humana, a atividade física – deve ser “necessária” e “divertida” para ser sustentável, escreve Lieberman. Sem essas qualidades, estamos nadando contra uma corrente cada vez mais rápida, se é que já não estamos sendo levados rio abaixo.
Chego em AUSTIN em um dia sem nuvens, com 21 graus Celsius, o tipo de dia que me dá motivação suficiente para seguir em frente. Multidões de pessoas estão caminhando, correndo, pedalando e remando ao redor do Lady Bird Lake, na periferia da cidade.
Estou agendado para me encontrar com Attia em um resort de golfe luxuoso, a alguns quilômetros a oeste da cidade. Um de seus assistentes chega antes para me ajudar a encontrar um local adequado para a entrevista; escolhemos um bar tranquilo perto do saguão, chamado Jim Bob’s. Attia chega atrasado, explicando que estava lidando com uma emergência de um paciente. Ele não parece muito animado de estar aqui. Quando pergunto se ainda temos as duas horas previstas, ele responde: “Vai demorar tanto assim?”
Ao vivo, Attia é musculoso e um pouco intimidador. As pessoas com quem conversei sobre ele antes de vir a Austin usaram palavras como “intenso” e “sério”, e agora entendo o porquê.
Não conversamos enquanto nos sentamos em uma mesa tranquila perto do bar, que tem uma parede cheia de bebidas sofisticadas atrás dele. “Nunca é ruim estar perto da tequila!”, brinco, tentando quebrar o gelo. Attia não ri. Quando começamos nossa conversa, ele tira o celular, coloca na mesa e diz que também vai gravar a entrevista.
Quando se trata de integrar medicina e aptidão física, parte do problema, como Attia vê, é que a maioria dos médicos não sabe como gerenciar isso – ou, se sabe, miram muito baixo. Existem muitas perguntas sem respostas sobre o exercício à medida que envelhecemos. Quanto, e que tipo, é o ideal em vez de apenas suficiente?
Quando menciono que as diretrizes federais de atividade física recomendam um valor relativamente modesto de 150 minutos por semana, Attia interrompe: “Eu nunca diria isso.”
“Eu sei que você não diria. Mas esse é o ponto de partida para muitos médicos.”
“Bem, essa é a primeira falha,” diz Attia. “Em vez de dizer às pessoas o que fazer, deveríamos dizer qual será o parâmetro de avaliação. Então, é mais importante dizer: Queremos que você tenha um VO2 máximo acima de tal faixa. Queremos que você tenha uma massa muscular acima de tal faixa. Queremos que seus indicadores de força estejam acima de tal faixa. E então a pergunta passa a ser: Quanto você está disposto a investir nisso?”
Attia não quer apenas que você se exercite. Ele quer que você treine. Menciono que conheço muitas pessoas ativas e em boa forma em seus cinquenta, sessenta anos ou mais, que passam bastante tempo correndo, caminhando ou pedalando, mas não fazem muito além disso.
“Acho que você sempre precisa diferenciar recreação, brincadeira e treinamento,” ele diz. “Acho que recreação e brincadeira são muito importantes. São o ‘porquê’. Mas para fazer essas coisas, você precisa treinar. Veja o maior jogador de tênis de todos os tempos, Novak Djokovic,” continua. “Para ser o melhor tenista do mundo, você precisa ser muito forte.
Precisa ser muito flexível. Você tem que ter muito equilíbrio. Precisa ter uma base de condicionamento aeróbico incrível, ter uma potência anaeróbica incrível. Só jogar tênis não é suficiente para fazer isso. E isso vale para tudo que uma pessoa queira fazer, seja esquiar ou jogar pickleball ou, no meu caso, dirigir um carro de corrida ou praticar arco e flecha.”
Attia não está sugerindo que todos se esforcem para ser o melhor jogador de tênis do mundo, mas ele quer que sejamos a melhor versão de nós mesmos à medida que envelhecemos. Em Sobreviver ele fala sobre o que chama de Decatlo Centenário. Esta é uma lista de coisas que você gostaria de poder fazer no seu 100º aniversário, ou na última década que atingir. A ideia por trás do decatlo é desenvolver um condicionamento físico amplo e completo, em vez de recorrer a coisas nas quais você já é bom ou simplesmente gosta.
“Não estamos falando em criar almas imortais que, aos oitenta anos, parecem ter 20 anos.”, diz Attia. “Isso é ficção científica. Mas você pode ter 80 anos e ainda ter o corpo de alguém de 60 anos. Como podemos fazer disso a norma e não a exceção?”
Embora você possa começar ou expandir seu programa em qualquer idade, é preferível cultivar um alto nível de condicionamento físico no início da vida, quando seu corpo está mais adaptável. Conforme envelhecemos, podemos ajustar o treinamento para mantê-lo, mas é preciso treinar. Você pode acompanhar seu progresso – ou talvez a ausência de deterioração seja uma maneira melhor de analisá-lo – usando um conjunto de métricas de condicionamento físico, da mesma forma que você monitora biomarcadores sanguíneos como uma indicação de sua saúde geral.
Pergunto o que ele acha das críticas que vejo dirigidas a ele, como a ideia de estar promovendo uma fantasia sobre uma vida mais longa e saudável, dada a complexidade real do assunto. “Não estou muito familiarizado com essas críticas”, diz ele. “Mas se você está se perguntando por que deveríamos fazer o que fazemos para evitar o declínio da expectativa de vida, acho que minha pergunta seria: qual é a alternativa? Simplesmente aceitar? Então, se alguém me perguntar: Por que você se exercita? Eu diria: Qual é a sua proposta em vez disso? Não se exercitar?”
Attia responde minhas perguntas obedientemente, até mesmo minuciosamente, mas a vibração não está boa. Ele balança o pé. Os dentes dele são muito brancos. Fico nervoso e perco a linha de raciocínio algumas vezes. Cheguei esperando algumas horas de experiência da Medicina 3.0, mas saí com a sensação de ter ido a uma consulta médica da Medicina 2.0 – impessoal e superficial.A experiência me faz refletir sobre o grau em que precisamos cuidar da nossa própria saúde. Como Attia escreve em Sobreviver, A Medicina 3.0 “exige muito mais de você, o paciente. Você deve estar bem informado, ter conhecimento médico razoável, ter clareza sobre seus objetivos e estar ciente da verdadeira natureza do risco. Você deve estar disposto a mudar hábitos arraigados, aceitar novos desafios… Você enfrenta os problemas, mesmo os desconfortáveis ou assustadores, em vez de ignorá-los até que seja tarde demais.”
Naquela noite, dei uma longa caminhada pelo centro de Austin. A lua cheia surgia entre as gruas e projetava um reflexo brilhante no Lago Lady Bird. Uma multidão se reunia ao longo do guarda-corpo da Ponte Congress Avenue para assistir a uma atração famosa: o enxame noturno de mais de um milhão de Morcegos-de-cauda-livre-mexicano, a maior colônia urbana da América do Norte, que vivem nas treliças. Eu me encaixei em um ponto de observação até que os morcegos emergiram em um grande pulso, voando ao redor da ponte e das árvores da costa em um murmúrio escuro. Pensando em trazer Esme aqui quando ela for mais velha para ver o show dos morcegos – essa e tantas outras maravilhas naturais que estão por vir.
Na manhã seguinte, dirijo até o 10Squared para meu teste de VO2 máximo e algumas avaliações de força. Também estou agendado para um exame DEXA, que revelará minha proporção entre músculo e gordura, mas isso será feito fora do consultório, em uma instalação chamada Fitness Institute of Texas, parte do departamento de cinesiologia da Universidade do Texas.
10Squared é uma instalação privada para uma clientela muito exclusiva, localizada em um pequeno complexo de escritórios no subúrbio de Austin. Não é exatamente uma Equinox, mas achei que era um modelo interessante para a maneira como os médicos podem integrar o condicionamento físico aos seus pacientes. Um lado do espaço modesto contém um suporte para agachamento, uma barra fixa, alguns pesos livres e kettlebells, além de diversos outros equipamentos de treinamento de resistência. O outro lado contém uma bicicleta ergométrica, uma esteira, uma máquina de remo e máquinas de diagnóstico. O local é estritamente comercial e é onde os clientes de Attia, muitos dos quais moram em outros lugares, podem chegar de avião, passar por alguns dias de testes, avaliações e treinamento e depois voltar para casa para fazer seus programas personalizados. Não surpreende que ninguém me diga quanto custa ou como se tornar um cliente, além de dizer que há um “processo de triagem”.
Sou recebido por Luke Bennett, o simpático CEO da 10Squared. O australiano ex-médico de equipes de Fórmula 1 está na casa dos cinquenta, mas parece mais jovem. Ele me coloca em uma bicicleta ergométrica e puxa uma máscara respiratória bem justa sobre minha cabeça para capturar e medir minha respiração enquanto pedalo. Já fiz isso antes, mas já faz um tempo – tipo 15 anos – e esqueci como é claustrofóbico.
O VO2 máximo mede a quantidade de oxigênio que seus músculos conseguem utilizar no pico do esforço. É a referência da aptidão cardiovascular porque é uma imagem da facilidade com que o oxigênio se move pelo seu sistema. Não é possível manipular os resultados. Também se tornou, recentemente, um indicador útil da longevidade. Se um pouco de aptidão física é bom, mais é melhor? Aparentemente sim. Vários estudos descobriram que pontuações mais altas de VO2 máximo estão correlacionadas a uma vida mais longa.
O teste dura cerca de 12 minutos, começando fácil e aumentando a dificuldade gradativamente até você desistir por exaustão. Você não deve falar – “a menos que haja uma emergência”, diz Bennett – mas pode indicar seu nível de esforço apontando para uma folha de referência. Quando chego ao nível mais alto (Muito, Muito Difícil), estou ofegante e suando como um cavalo de corrida.
Minha pontuação máxima é 41,6, o que me parece baixo, mas Bennett diz que é muito bom para um cara da minha idade. Estou silenciosamente emocionado ao ver meu boletim incluir a palavra “excelente”. Ainda assim, estou um pouco aquém da categoria Elite, que exige atingir 50 ou mais. Em Sobreviver, Attia afirma que quer que seus clientes busquem uma pontuação máxima de VO2 na zona Elite para seu gênero, mas duas décadas mais jovem. No meu caso, isso significaria uma pontuação em torno de 53, uma meta assustadora considerando o que seria necessário para chegar a 41.
Isso parecia altamente improvável, mas Bennett me garantiu que eu conseguiria chegar lá, ou quase. E o que, pergunto eu, isso pode exigir? Algo em torno de quatro a seis horas de trabalho na Zona 2, mais pelo menos uma sessão intervalada na Zona 5, por semana, ele diz.
A zona 2 é o limiar aeróbico quase mágico, onde é possível queimar mais gordura como combustível do que carboidratos. A Zona 2 é o tipo de esforço que você pode sustentar por muito tempo. A Zona 2 é bem fácil. Eu adoro a Zona 2.
O treinamento da Zona 5 é bem difícil, mas felizmente é breve. Um treino popular da Zona 5 envolve quatro minutos de esforço máximo seguidos de quatro minutos de recuperação, realizados um total de quatro vezes. Uma das maiores lições que aprendi com os testes foi perceber como essas zonas realmente funcionam. O que eu pensava ser a Zona 2 provavelmente era mais como a Zona 3 ou até mesmo 4. Descobri que meus treinos fáceis não foram fáceis o suficiente, e minhas sessões difíceis não foram difíceis o suficiente. Fiquei preso no meio, uma “terra de ninguém” metabólica.
Depois de me recuperar, passo para alguns testes de força. Esses são exercícios simples, incluindo ficar pendurado e carregar uma barra sextavada carregada. A força é outro componente vital da estratégia de longevidade, em grande parte porque a força e a massa muscular inevitavelmente se deterioram à medida que envelhecemos. Há muito tempo eu pensava que levantar pesos era essencial para o desempenho atlético, independentemente do esporte, mas não havia considerado o impacto no envelhecimento saudável. Preservar a massa muscular magra não só traz benefícios metabólicos, mas também nos ajuda a manter a mobilidade e a estabilidade. Quedas são a principal causa de morte após os 65 anos — o quinto maior problema.
Não é de surpreender que, dada as características da parte superior do corpo, eu não tenha um bom desempenho em força. A meta para o exercício de braço pendurado é de dois minutos. Isso não parece muito, mas é surpreendentemente difícil. Não chego nem a um minuto.
O objetivo do exercício com barra sextavada é igualmente desafiador: carregar o peso do seu corpo – no meu caso, 84 quilos – por 60 segundos. Mais uma vez fiquei aquém. Não se preocupe, Bennett me diz. Com um regime de levantamento dedicado, também posso atingir esses padrões.
Enquanto termino o exercício de força, Attia chega para uma sessão de fotos. “Ele está aqui!” um de seus assistentes grita. Estou curioso para saber o que ele acha dos meus resultados, mas ele não parece muito interessado e apenas concorda quando Bennett diz, descontraidamente, que eu me saí muito bem para um cara velho.
À tarde, dirijo até o Fitness Institute of Texas para fazer meu exame DEXA. A 10Squared envia clientes para lá porque a máquina, que custa mais de US$ 100.000, não faz parte do estoque de Attia. A DEXA se tornou uma forma popular de analisar a composição corporal, porque a tecnologia de imagem é considerada o padrão ouro para esse tipo de medição.
Rachel Watson, a otimista diretora do Fit Institute, é responsável pela minha análise de composição corporal. Depois que Sobreviver foi publicado, o instituto viu seus pedidos de exames quase dobrarem, ela me conta. O Fit Institute tem o prazer de ajudar (por modestos US$ 75). Ela trabalha com a UT para fornecer dados de pesquisa, portanto, coletá-los do público é uma fonte conveniente de informações. O instituto também oferece testes de VO2 máximo, treinos em grupo e treinamento nutricional.
Enquanto conversamos sobre tendências fitness, Watson escreve algo em um bloco. “Qual é a palavra da moda que todo mundo está falando?” pergunta. Fiquei sem resposta, então, depois de um momento, ela vira o bloco para me mostrar: longevidade.
“É nisso que todos estão fixados agora”, ela diz.
“Ah”, eu respondo, me sentindo idiota. “Claro.”
Deito-me na mesa e tento permanecer imóvel enquanto a barra de varredura se move lentamente sobre mim, da cabeça aos pés. Poucos minutos depois, Watson e eu nos sentamos à mesa dela para revisar meus resultados. Os dados são esclarecedores e melhores do que eu esperava. Com 84,4 quilos e uma composição geral de gordura corporal de 15,4%, estou entre Muito Magro e Atlético. Watson está particularmente feliz com minha pontuação de gordura visceral, que tabula o acúmulo de gordura ao redor da região central e dos órgãos. A média para homens da minha idade é 1,19 quilos. Minha marca foi de 0,55 quilos. Ela desenha um rostinho sorridente ao lado do número.
“Agora, as más notícias”, ela diz.
“Ah, não.”
“Seu corpo tem formato tipo pêra.”
Ela me mostra como os números se alinham com as partes do meu corpo. A maior parte da minha massa está localizada ao redor dos meus glúteos e das coxas: a constituição física de um ciclista. Eu poderia trabalhar um pouco na parte superior do corpo, braços e ombros se eu quiser atingir o tão desejado visual em V.
“Não se sinta tão mal”, ela diz alegremente. “A maioria dos homens da sua idade tem o corpo em forma de maçã. A massa corporal deles é concentrada em torno da região central.”
Minha decepção deve ter persistido, porque Watson me garantiu que estou indo muito bem. E eu sabia que o Fit Institute também oferece aulas de treinamento de força online?
Volto de Austin para casa me sentindo em forma, mas também percebendo que a boa forma é apenas uma peça de um quebra-cabeça complexo. Isso me deixou pensando: Estou saudável? A verdade é que não tenho certeza. Não faço um check-up adequado há alguns anos. Doenças crônicas são insidiosas porque muitas vezes começam – e podem se arrastar por anos – sem nenhum sinal óbvio.
Com motivação renovada, mando uma mensagem para meu médico, um cara muito legal, mas muito do tipo Medicina 2.0, para marcar uma consulta. Quero montar um “Grande Workup”, escrevo. Ele responde que vai me ligar, mas não tenho notícias dele.
Quando se trata de avaliar seus riscos de saúde a longo prazo, o histórico médico familiar é muito importante. O meu revela uma dura realidade. Minha mãe, enfermeira registrada, morreu em 2013 de câncer de mama, aos 75 anos. Meu pai, na casa dos oitenta, ainda está vivo, mas mora sozinho e tem dificuldade para andar, devido às consequências de uma substituição de joelho que deu errado e aos problemas cardíacos agravados. Minha irmã, que é um ano mais nova que eu e é minha única irmã, lutou contra problemas de peso por anos até que recentemente começou a fazer uso de Mounjaro, um dos alardeados GLP-1, como o Ozempic, feito para tratar diabetes tipo 2 e, cada vez mais, obesidade. No decorrer de um ano, ela perdeu mais de 45 quilos – a transformação física mais surpreendente que já vi. É claro que não venho de uma linhagem geneticamente imune. Os cavaleiros estão bem ali, atrás de mim, bufando no meu pescoço.
Dan Buettner, o autor de Blue Zones, disse que gostou Sobreviver e achava que a ciência era sólida, mas era cético porque “pressupõe uma pessoa que esteja dois ou três desvios-padrão da norma no que diz respeito à disciplina, renda e presença de espírito”.
Em Austin, Attia me disse que uma das maiores revelações de sua vida profissional foi perceber que centenários duram tanto porque perfis genéticos favoráveis tendem a manter doenças crônicas sob controle. Eles morrem das mesmas causas que todos os outros, mas isso acontece mais tarde. Attia não acreditou que isso acontecesse por viverem em zonas azuis ou terem uma dieta especial. “As pessoas adoram falar sobre o comportamento esotérico dos centenários”, disse ele.
O truque para imitar os longevos, então, é continuar investindo dinheiro em nossos planos de saúde fitness, por assim dizer. Jack LaLanne morreu em 2011, aos 96 anos, de pneumonia, mas supostamente ele continuou se exercitando até alguns dias antes de sua morte. Poderíamos todos ser como Jack?
“Há muitas pessoas na última década de suas vidas que estão maravilhosamente felizes com seus filhos e netos”, disse Attia. “Mas eu simplesmente não conheço muitas pessoas cujos corpos não estejam doendo e que não estejam pensando. E a verdade é que a maioria dessas pessoas não fez tudo o que podia para reduzir a probabilidade disso acontecer. Não estamos falando em criar almas imortais que, aos oitenta anos, parecem ter 20 anos. Isso é ficção científica. Mas você pode ter 80 anos e ainda ter o corpo de alguém de 60 anos. Como podemos fazer disso a norma e não a exceção?”
Ótima pergunta. Eu tinha algumas ideias, e nenhuma delas envolvia programas de treinamento de seis dígitos ou o VO2 máximo de elite de uma pessoa de 37 anos. Por mais que eu tenha gostado de ler Sobreviver, e por mais que eu acreditasse fortemente que o sistema de saúde estava pronto para uma revolução da Medicina 3.0, eu também sabia que às vezes romper o status quo poderia ser um tiro no pé.
Um caso em questão: Em 30 de maio, pouco antes desta história ir para a gráfica, Attia postou uma foto de grupo no Instagram que incluía seu “querido amigo” Kevin Spacey, o ator vencedor do Oscar acusado de má conduta sexual. Spacey foi absolvido em vários julgamentos, mas a publicação de apoio de Attia gerou revolta generalizada e questionamentos sobre o julgamento de Attia, incluindo mais de 3.000 comentários, a maioria negativos, no Instagram.
De modo geral, não quis confundir a mensagem com o mensageiro; há muito o que admirar no volumoso conteúdo de Attia. Como uma pessoa no Reddit resumiu: “Use influenciadores de bem-estar e longevidade como um canal para descobrir pesquisadores interessantes e para fins de entretenimento geral. Caso contrário, aplique uma dose saudável de análise crítica, como você deve fazer com qualquer coisa.”
No meu caso, percebi, felizmente, que já havia criado meu próprio estilo de vida de baixo orçamento da Medicina 3.0. Moro em Santa Fé, uma pequena cidade situada no flanco oeste das Montanhas Rochosas do sul, e cultivo um estilo de vida que prioriza a boa forma. Tenho fácil acesso a trilhas para caminhadas e ciclismo, o que tento fazer com frequência; é Zona 2 quase sempre que saio de casa. Para a Zona 5, só preciso encontrar uma colina íngreme. Minha esposa e eu adoramos cozinhar e adotamos uma dieta baseada em alimentos integrais, sem pensar muito em nutrição. Gostamos de tomar uma ou duas bebidas de vez em quando. Socializamos pessoalmente com frequência. Dormir bem é uma prioridade, não uma reflexão tardia.
Duas vezes por semana, dirijo uma hora para malhar em uma academia chamada Elevate PHW (Performance Health Wellness), junto com clientes que vão de atletas profissionais a idosos com andadores. Meus amigos não acreditam que eu vá para uma academia. Tento explicar que, além de um ótimo espaço e comunidade, o Elevate oferece motivação e programação de qualidade, que são essenciais. Eu particularmente não gosto de levantar pesos, e há muitos dias em que tenho que me esforçar. Mas sempre vou e sempre fico feliz; o Elevate torna algo de que eu nunca gostei, em necessário e divertido.
Sei que minha situação é única, mas a questão é que muitos caminhos podem levar ao mesmo lugar. O ideal é que a luta contra a entropia relacionada à idade faça parte da nossa rotina e não exija muita energia mental. O que faz funcionar é a consistência e a sustentabilidade.
“Não há solução a curto prazo”, Zonas Azuis como Dan Buettner me disse. “Se você quer viver mais, tem que pensar nas coisas que você vai fazer diariamente por décadas.”
Nossa espécie fez grandes progressos, mas chegamos a um lugar e a um tempo que prejudicam nossa saúde: sedentários, ansiosos e cada vez mais tóxicos. De forma mais insidiosa, a saúde – e, por extensão, a aptidão física e a longevidade – tende a se desintegrar nas desigualdades socioeconômicas, uma disparidade que aumenta a cada ano. Com recursos suficientes, os mais ricos podem comprar um corpo melhor. Mas e todos os outros?
Temos a tendência de subestimar o que é necessário para implementar mudanças significativas, que muitas vezes dependem tanto do nosso ambiente quanto do nosso comportamento. A Medicina 3.0 parece uma solução individual, mas na realidade é uma proposta sistêmica subversiva e radical que busca romper instituições e hierarquias há muito estabelecidas. Isso me faz pensar que tipo de mundo minha filha vai herdar. Espero estar aqui tempo suficiente para descobrir.
*Matéria originalmente publicada na Outside 183