Grace Spence Green é uma dessas pessoas que coleciona histórias reais de superação: ex-atleta e técnica de escalada para crianças, e estudante de medicina foi esmagada em um acidente por um homem que pulou sobre ela e a deixou paralisada, sem nunca mais poder voltar a andar.
A experiência traumática mudou sua vida instantaneamente, mas também ressignificou sua existência. “Pessoas com deficiência são chamadas de inspiradoras apenas por irem às compras. Acho que isso acontece porque as pessoas saudáveis pensam que as nossas vidas são horríveis, e quando fazemos algo comum isso torna-se extraordinário.”, contou em entrevista ao The Guardian.
Com o passar dos anos e encarando uma realidade totalmente nova, Grace Spence Green encontrou um novo propósito, incluindo um processo radical de aceitação e a paixão por mudar as perspectivas das pessoas com deficiência, trazendo um novo propósito.
Ela contou que, de certa forma, salvou a vida de outra pessoa por ter sido a vítima naquela situação, e que outros aspectos positivos vieram da experiência: maior empatia pelas pessoas, bons amigos e uma nova perspectiva. Ainda assim, ela afirma que aquela tarde em outubro de 2018 foi o dia mais traumático de sua vida.
Grace Spence Green, que praticava escalada desde pequena, caminhava pelo shopping center Westfield, em Londres, no exato momento em que um homem, que estava três andares acima, decidiu pular, causando o acidente a deixando paralisada. Ele caiu diretamente em cima dela, quebrando suas costas, ferindo sua medula espinhal e fraturando seu pescoço.
Nas primeiras semanas, o trabalho da equipe médica era mantê-la estável. Em seguida, ela foi transferida para um hospital especializado em lesões na coluna e na medula, onde passou por uma cirurgia de oito horas. A primeira vez que um médico mostrou a Grace Spence Green seus exames de ressonância magnética, foi quando ela finalmente se deparou com a realidade.
“Embora fosse estudante de medicina meu ferimento era sem sangue, não havia hematomas, cortes, arranhões, nada. Pensei: ‘Pareço igual’. Mas havia uma cicatriz gigante nas minhas costas, e eu estava em negação.”, contou.
Nos dois anos e meio que se seguiram ela passou a encarar seus próprios conceitos sobre a vida das pessoas com deficiência e reaprender a viver. Hoje, Grace apresenta o podcast This Is Spinal Crap, voltado às pessoas que vivem com lesões na coluna. O objetivo, segundo ela, é provar o simples fato de existir, ser feliz e ter uma vida normal já configura ativismo por si só.
“Não que tenha sido fácil. Eu não poderia me imaginar tendo uma vida boa em uma cadeira de rodas, porque eu simplesmente não acho que existem exemplos suficientes disso em qualquer lugar. A única coisa que me fez continuar foi o fato de eu saber que estava voltando para a medicina. Agarrei-me a isso porque fazia parte da minha identidade desde antes da minha lesão.”, revelou.
“Eu tinha 22 anos, e era ignorante sobre como essas pessoas viviam. Cresci muito privilegiada, uma jovem branca de classe média. Eu entendi que havia barreiras lá fora para outras pessoas, mas depois de vivê-las você pode realmente entender como é.”. Grace acredita que sua história também expôs o racismo velado (o homem que pulou é negro) e fortes sentimentos sobre o uso de drogas (o juiz que o condenou atribuiu seu comportamento ao consumo de maconha).
Demorou cerca de um ano, diz ela, para chegar a um ponto próximo da paz com o que havia acontecido. “Eu chamaria de aceitação radical, porque eu realmente tive que abraçar ser deficiente”, diz ela. “Assim que isso aconteceu, toda a minha perspectiva mudou, porque assim que me senti orgulhoso de quem eu era, simplesmente não aceitei mais os comentários de piedade ou crítica das pessoas, nem senti que precisava responder e elas sobre quem eu era e o que estava fazendo. Mas demorou muito para chegar lá.”, disse.
Ela começou a seguir pessoas com deficiência e ativistas online e leu muito sobre estudos sobre deficiência. “Percebi que tudo o que me disseram era a narrativa da sociedade de como uma pessoa com deficiência deveria ser e eu não precisava ser assim. Em vez disso, eu poderia realmente ser uma pessoa normal e aceitar minha lesão e realmente amar ser deficiente e o que isso traz.”
A vida não se tornou pequena para Grace, como ela temia inicialmente. “A lesão mudou tudo sobre mim. As pessoas não entendem, mas eu não voltaria atrás porque tudo isso me tornou quem eu sou hoje, mais forte. Tudo isso me deu, no fim, uma perspectiva mais ampla de vida”, afirma.
Com o apoio da família, passou a se concentrar em fisioterapia intensiva e com o passar das semanas, aprendeu a ficar de pé sem ajuda, mover partes das pernas e recuperar a força nos braços e na parte superior do corpo. O treinador de escalada de Grace, que ela conhece desde os 11 anos de idade, esteve presente em todo o processo e a dupla se prepara para escalar em Yosemite, mesmo depois di acidente que a deixou paralisada.
“Os médicos dizem que qualquer recuperação que você fizer nos primeiros dois anos após uma lesão na coluna é a melhor que você conseguirá, mas as pessoas superam as expectativas o tempo todo. Eu espero mais.”, concluiu.