O governo paquistanês emitiu um relatório detalhado sobre a polêmica morte do carregador local Muhammad Hassan, ocorrida no dia 27 de julho no K2, a segunda maior montanha do mundo.

Hassan escalava com uma equipe de 15 pessoas responsável por fixar cordas nas partes mais íngremes e perigosas da montanha de 8.611 metros.

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Entre meia-noite e 2 horas da manhã, o carregador caiu de uma altura de cinco a sete metros em um delicado trecho de encosta, perto da região do Bottleneck. Seu mosquetão, que estava preso à corda, impediu uma queda ainda maior.

Com avalanches ocorrendo ao redor, além de uma iminente tempestade de neve, a equipe de Hassan continuou a fixar as cordas em direção ao cume. No entanto, dois sherpas ficaram para tentar puxar Hassan de volta à trilha, mas não obtiveram sucesso.

Eles logo se juntaram aos outros fixadores, deixando o paquistanês sozinho e pendurado de cabeça para baixo, de acordo com o relatório.

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Clique de Gabriel Tarso durante sua expedição ao K2 nesta temporada: considerada por muitos a montanha mais desafiadora do Planeta. Foto: Arquivo Pessoal.
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Tarso ao lado do filho de Muhammad Hassan: brasileiro ajudou a criar uma conta no GoFundMe para arrecadar recursos para a família do carregador após sua morte. Foto: Arquivo Pessoal.

Nas primeiras horas da manhã do dia 27 de julho, cerca de 200 alpinistas – de todas as partes do mundo – já estavam a caminho do cume a partir do Acampamento 3.

Entre os escaladores estava a equipe da montanhista norueguesa Kristin Harila, composta por Tenjen “Lama” Sherpa e pelo fotógrafo brasileiro Gabriel Tarso.

Em direção ao topo, eles se depararam com uma longa fila de alpinistas parados no Bottleneck, no trecho conhecido como Traverse (Travessia).

À frente deles estava Hassan pendurado na corda fixa. Ninguém sabia como ajudar, então a equipe de Tarso tomou a frente para avaliar a situação.

À medida que se aproximava do local do acidente, o montanhista brasileiro relatou ter ouvido “gemidos de dor”.

Fila de alpinistas no Bottleneck na manhã do dia 27 de julho. Foto: Fernando Anaudi.

Tarso e sua equipe então finalmente encontraram Hassan de cabeça para baixo, sem traje de plumas, capacete, luvas ou oxigênio. O relatório afirma que ele já estava nessa posição por mais de uma hora.

Ainda segundo o relatório, Hassan não tinha experiência em escalada ou em altitudes elevadas. Sua experiência anterior consistia em fazer trilhas ao redor do K2 e do Spantik, uma montanha vizinha de 7.027 metros de altura.

Tarso, junto com o companheiro de Hassan, Hassam Shighri, rapidamente montou um sistema improvisado com as ferramentas que tinha para tentar resgatar o carregador.

Depois de várias tentativas, eles finalmente conseguiram puxá-lo de volta para a trilha e assim conseguiram prestar os primeiros socorros.

Relatório de 70 páginas elaborado por uma comissão do governo do Paquistão após o acidente no Bottleneck. Foto: Reprodução.

O relatório afirma: “Os alpinistas notaram que o abdômen do Sr. Hassan continuou exposto em temperaturas extremamente baixas, e a concentração de fluidos corporais de cabeça para baixo limitou sua capacidade de sobrevivência.”

Tarso também observou que Hassan estava hipotérmico e parecia ter quebrado as duas pernas na queda, com seu arnês o impedindo de se mover.

De acordo com o relatório, sob a liderança de Tarso, os escaladores tentaram salvar a vida de Hassan em meio a uma feroz tempestade de neve. Tarso compartilhou seu oxigênio suplementar e forneceu luvas e água quente, mas Hassan ficou inconsciente. A tempestade também prejudicou as comunicações por rádio.

Tarso relatou que, enquanto estavam trabalhando no resgate, outros alpinistas passavam e perguntavam: “Você poderia sair do caminho para eu poder passar, por favor?”

Muhammad Hassan acabou morrendo nas primeiras horas da manhã, a 8.200 metros de altitude.

Tarso, ficando sem oxigênio, também poderia morrer se não encontrasse outra garrafa em breve. A fonte mais próxima era um Sherpa da equipe Seven Summits Treks, que estava em uma parte mais alta na montanha carregando uma garrafa extra.

Quando deixou Hassan, Tarso relatou: “Olhando nos olhos dele, agora com quase nenhum brilho, percebi ali que talvez não houvesse mais esperança”.

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Três vezes no topo do Everest, Tarso foi o cinegrafista escolhido para a expedição da equipe da norueguesa Kristin Harila, que tentaria quebrar um recorde no K2. Foto: Arquivo Pessoal.
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Relatório do governo paquistanês inclui uma lista com mudanças necessárias nas regulamentações para a escalada no K2.
Relatório

Após a polêmica morte de Hassan, o relatório elaborado por uma comissão do governo paquistanês incluiu uma longa lista de mudanças necessárias nas regulamentações e regras para a escalada no local.

Além disso, ele recomenda que a agência de montanhismo Lela’s Peak Expeditions, responsável pela operação da equipe de Hassan, seja punida com dois anos sem poder operar nas montanhas do Paquistão.

No entanto, o relatório aponta que a morte foi acidental e reconhece algumas pessoas que tentaram socorrer Hassan, citando em vários trechos os esforços do montanhista e fotógrafo brasileiro Gabriel Tarso.

Assim, eles aconselharam que o governador ou do ministro-chefe da região de Gilgit-Baltistão envie uma carta de agradecimento ao brasileiro.

Uma conta no GoFundMe foi aberta para doações em apoio à família de Hassan.







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