
Há uma enorme quantidade de evidências, vindas de centenas de estudos com milhares de participantes, mostrando que o exercício é uma ferramenta eficaz para combater a depressão e outros problemas de saúde mental, como a ansiedade.
Esses estudos indicam que o exercício é, no mínimo, tão eficaz quanto medicamentos ou terapia, e talvez até mais. Atualmente, ele é recomendado em diretrizes oficiais ao redor do mundo como um tratamento independente ou complementar. No entanto, existe uma ressalva importante a ser considerada: toda essa evidência sobre a conexão entre exercício e saúde mental é realmente sólida?
Veja também
+ Jeffing: conheço o método que adiciona caminhada à corrida
+ Esse vídeo nos ensina que surfar ondas pequenas também pode ser perigoso
+ Essa remadora acaba de concluir uma travessia histórica no Atlântico
Essa é a questão debatida em um artigo publicado recentemente na revista Medicine & Science in Sports & Exercise, baseado em um simpósio realizado durante a reunião anual do American College of Sports Medicine. Quatro pesquisadores, liderados por Patrick O’Connor, da Universidade da Geórgia, examinaram e avaliaram diferentes linhas de evidência. A conclusão deles é mista: sim, existe uma relação entre exercício e saúde mental, mas sua aplicabilidade no mundo real não é tão clara quanto parece.
As evidências observacionais sobre exercício e saúde mental
O’Connor e seus colegas analisaram três principais tipos de evidência. O primeiro são os estudos observacionais, que medem os níveis de atividade física e saúde mental em grandes grupos de pessoas para verificar se há conexão entre eles, acompanhando alguns desses grupos ao longo dos anos para observar a evolução dessas relações. O resultado principal é claro: pessoas mais ativas fisicamente têm menos chance de sofrer de depressão e ansiedade, tanto no presente quanto no futuro.
Os estudos observacionais também sugerem, embora de forma menos contundente, que existe uma relação dose-resposta entre exercício e saúde mental: quanto mais exercício, melhor. Apenas 20 minutos de atividade diária já produzem um efeito positivo, mas quantidades maiores geram um impacto ainda maior. No entanto, ainda não está claro se exercitar-se em excesso pode prejudicar a saúde mental. Alguns estudos, por exemplo, encontraram uma associação entre treinamento excessivo em atletas de resistência e sintomas de depressão.
O grande problema dos estudos observacionais é a questão da causalidade. As pessoas ativas têm menos probabilidade de desenvolver depressão, ou são as pessoas deprimidas que têm menos probabilidade de ser ativas? Para responder a essa questão, precisamos de um tipo diferente de estudo.
As evidências de ensaios clínicos randomizados
O segundo tipo de evidência vem dos ensaios clínicos randomizados, ou RCTs (sigla em inglês para Randomized Controlled Trials): um grupo de pessoas é orientado a se exercitar, outro grupo é instruído a não se exercitar, e os resultados são comparados. No geral, os resultados dos RCTs corroboram os estudos observacionais: prescrever exercício melhora ou previne a depressão e a ansiedade.
Por exemplo, uma meta-análise de 2024, publicada no British Journal of Medicine, analisou 218 ensaios clínicos randomizados com um total de mais de 14 mil participantes. Os resultados indicaram que atividades como caminhada ou corrida apresentam efeitos ligeiramente superiores à terapia cognitivo-comportamental e muito superiores aos medicamentos antidepressivos.
Ainda assim, as evidências não são infalíveis. Um problema é a dificuldade de evitar o efeito placebo. Os participantes que são designados para praticar exercício sabem que estão se exercitando e provavelmente também sabem que isso deveria fazer com que se sintam melhor. Por outro lado, aqueles que se inscrevem em um estudo sobre exercício e depressão, mas são designados para não se exercitar, podem esperar que não obterão nenhum benefício. Essas expectativas podem influenciar os resultados, especialmente quando se trata de um desfecho de difícil medição, como a saúde mental.
Outro desafio é a duração dos estudos. Ensaios clínicos são caros e demorados, por isso raramente duram mais de seis meses. No entanto, um terço dos episódios de depressão maior se resolve espontaneamente em seis meses, sem tratamento. Por isso, diretrizes internacionais recomendam que esses estudos durem pelo menos dois anos, para garantir que os resultados sejam reais e duradouros.
Por que o contexto importa ao estudar exercício e saúde mental
A terceira e última categoria de evidência analisada por O’Connor e seus colegas envolve os detalhes contextuais. O exercício em si é importante, eles afirmam, mas “com quem estamos, se nos divertimos, se somos incentivados ou criticados, e se saímos da experiência sentindo orgulho e aceitação ou vergonha e rejeição também importam”.
A maioria das pesquisas foca na “atividade física de lazer”, como esportes e academia. Mas há outros tipos de atividade física: no trabalho, no transporte (como ir ao trabalho a pé ou de bicicleta) e em casa (tarefas domésticas). Existe diferença entre levantar pesos na academia e carregar materiais pesados em uma obra? Entre caminhar no parque e andar pelos corredores de um armazém?
Uma das visões sobre os benefícios do exercício para o cérebro é que tudo se resume aos neurotransmissores: aumentar os batimentos cardíacos libera endorfinas, oxitocina e outras substâncias químicas que alteram o humor. Se esse fosse o caso, o trabalho manual deveria ser tão eficaz quanto os esportes, e malhar sozinho em um porão escuro deveria ser tão bom quanto correr com amigos em um dia ensolarado. Tanto a intuição quanto a pesquisa sugerem que esse não é o caso.
Em vez disso, alguns dos benefícios do exercício para a saúde mental são claramente contextuais. Praticar uma atividade que gera conexão social e proporciona uma sensação de realização provavelmente é benéfico, mesmo que sua frequência cardíaca não aumente muito. Por outro lado, um programa de exercício que faz você se sentir pior consigo mesmo—como as aulas de educação física antigas e rigorosas—pode não ajudar sua saúde mental, independentemente do impacto no seu VO2 máximo.
É aqui que estão as grandes lacunas na pesquisa, segundo O’Connor e seus colegas. Já está bastante claro que o exercício não está apenas correlacionado com a saúde mental; ele pode realmente mudá-la. No entanto, as melhores maneiras de implementá-lo no mundo real ainda precisam ser mais estudadas. Por enquanto, o melhor conselho é seguir sua intuição. Não se preocupe tanto com o tipo de exercício que está fazendo, com a intensidade ou com a duração. Para melhorar a saúde mental, essas variáveis parecem ter efeitos surpreendentemente fracos. Em vez disso, concentre-se nos aspectos principais: se você está gostando e se continuará praticando no dia seguinte.
Alex Hutchinson escreve sobre treinamento na Outside.