Não há nada como a sensação de juntar os amigos para um rolê de bike. A camaradagem, a emoção de descobrir novas rotas e a alegria de compartilhar um objetivo em comum transformam qualquer esforço em uma jornada recompensadora.
Mas os benefícios em participar de um grupo vão além, desde melhorar as relações sociais, até aumentar a motivação e desenvolver uma maior resistência na bike. Também há o bônus adicional da segurança – quando você pedala com outras pessoas, pode ter certeza de que alguém sempre estará ao seu lado na hora do perrengue. E é justamente o medo de enfrentar algumas situações complicadas que faz muitas pessoas desistirem de incluir a magrela no cotidiano. Assim, os grupos de pedal – que não param de surgir organicamente pelos centros urbanos do País – também contribuem para tornar o ciclismo um esporte mais seguro, democrático e divertido.
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Pelo menos um sábado por mês, a designer de interiores Marina Sá, 39 anos, reúne sua tribo para um giro matinal pelas ruas de Florianópolis. A programação é sempre a mesma: acordar e sair para pedalar. A viagem pode ser um simples passeio até uma praia próxima ou um treino mais puxado. Desde 2017, o grupo Elas Pedalam é um incentivo para mais mulheres pedalarem na capital catarinense. “Nosso grupo surgiu inicialmente como um perfil no Instagram, com a ideia de ajudarmos umas às outras, já que muitas mulheres, assim como eu, tinham dificuldades em começar, seja por medo de pedalar sozinha, por não saber andar mesmo ou não conseguir acompanhar o ritmo de um grupo mais forte ou do marido/namorado”, conta Marina, idealizadora do projeto.
Se no começo a comunicação era apenas pelas redes sociais, a ideia ganhou força e o grupo passou a ser encontrar fisicamente, conquistando seu espaço nas apertadas ruas de Floripa. “Temos muitas histórias de mulheres que começaram com a gente e hoje já participam de provas, ou fizeram cicloviagens incríveis, testando novas modalidades da bicicleta. Sem contar as grandes amizades que foram formadas, o que acho mais fascinante neste universo da bike”, complementa Marina.
Para a designer, pedalar em uma turma, principalmente feminina, é uma forma de se incluir no esporte, se sentir acolhida e fazer parte de uma comunidade que se ajuda. “Nós mulheres infelizmente não nos sentimos seguras em pedalar sozinhas e um grupo certamente é uma boa opção para pedalar com mais segurança. Compartilhamos conhecimentos e vivências e acima de tudo cuidamos umas das outras”, pontua.
Rolê noturno
Se pedalar sozinho já é um obstáculo para muitas pessoas, à noite a tarefa pode ser ainda mais desafiadora. No entanto, o giro noturno tem inúmeras vantagens, como ruas mais livres de carro, menos poluição sonora, e pode ser uma excelente alternativa para quem usa a falta de tempo durante o dia como desculpa para não se exercitar.
Hoje há centenas de grupos noturnos que pedalam pelas ruas de São Paulo todas as noites, mas a ideia começou lá trás, em 1988, com o Night Bikers, grupo pioneiro criado pela jornalista e cicloativista Renata Falzoni. Na época, Renata não se inspirou em nenhum outro grupo, pois não havia nada similar nas ruas.
“A verdade é que o Night Bikers nasceu um pouco da minha boêmia”, relembra Falzoni, hoje com 69 anos. “Em 1976, quando eu ainda era estudante de arquitetura, troquei meu carro pela bicicleta e tinha aquela coisa de ficar ‘por aí à noite’, então passei a pedalar sozinha direto pela cidade. Já nos aos 80 comecei a viajar por estradas de terra, com bicicletas que eu mesmo adaptei e com isso formou-se uma turma, que passou a pedalar comigo à noite também na cidade. Quando me dei conta, desse hábito nasceu os Night Bikers no finalzinho de 1988”, explica a cicloativista, que acredita que estar em grupo é sempre melhor.
“O que de fato me levou a criar o Night Bikers foi essa necessidade de ter companhia para fazer aquilo que eu mais gostava – e ainda gosto de fazer – que é pedalar. Pedalar sozinha como eu fazia é legal, mas em grupo é muito melhor”, afirma.
Criadora do canal Bike é Legal, a cicloativista zela pela mobilidade ativa, que é o ato de se deslocar de forma não motorizada. Assim, ela reforça que grupos de pedal também podem ter um papel importante na promoção do ciclismo como um meio de transporte sustentável e saudável, incentivando mais pessoas a deixar o carro em casa e adotar a bicicleta como uma opção de mobilidade urbana.
“Eu sempre tive a consciência e a proposta de provocar uma mudança nos hábitos das pessoas, induzir as pessoas a trocarem o carro pela bicicleta, propondo uma atividade lúdica e não apenas como uma ‘missão’. E se for em grupo melhor ainda”, complementa.
Competição saudável
Pedalar com mais pessoas também ajuda a melhorar a performance em vários aspectos, garantem os especialistas, já que estar ao lado de ciclistas mais experientes é um atalho para desenvolver novas técnicas, habilidades, além de testar a resistência ao acompanhar o ritmo do pelotão. Além disso, pode ser uma ótima fonte de motivação, já que a competição saudável entre os pedaleiros turbina o desempenho.
“Acho que o fator grupo no ciclismo tem muito o efeito manada. Apesar de ser um esporte totalmente individual, a prática é sempre coletiva. Isso nos leva a uma necessidade de evolução. Quando a gente pedala em grupo estamos sempre reproduzindo aquilo que vai enfrentar em uma competição, travessia, ou alguma outra situação que tenha mais pessoas próximas”, avalia o competidor Guto Astolphi, o Verde Ciclista, que oferece dicas de mountain bike no seu canal no Instagram. “Ter um pedal marcado com um grupo também evita muito aquela preguiça matinal de acabar deixando de ir”, reforça o ciclista de 38 anos.
Treinadora de alta performance na LuluFive, o principal grupo voltado ao ciclismo de estrada feminino do País, a personal trainer Erika Soares, 39, também destaca que a motivação, superação e evolução são algumas vantagens dos treinos realizados em grupos.
“Um grupo sempre motiva você ter o compromisso com outras pessoas, além do compromisso com você mesmo. Essa responsabilidade com os outros traz mais disciplina. A gente também acaba sendo mais competitivo quando estamos com outras pessoas, com uma tendência maior a sair da zona de conforto”, diz Erika, que já acompanhou diversas histórias de superação ao longos dos últimos anos na LuluFive.
“A gente sempre tem histórias legais quando faz parte de um grupo ou de uma comunidade. Aqui tem muitas meninas que não tiveram aquela vivência na bike quando crianças e foram aprender a pedalar só adultas, o que torna tudo um pouco mais difícil. Então a superação de enfrentar na fase adulta um esporte que requer um pouco mais de equilíbrio, consciência corporal, já é um ato de superação”, diz. “Fora isso acho que tem a evolução física e mental. O medo de encarar uma subida, por exemplo. Você vê uma menina que tinha medo de uma subida de dois quilômetros e hoje já está encarando uma serra de 12 km. Tem muita história de evolução e superação que a gente acompanha de perto porque tem muita menina que passa pela iniciação e vai evoluindo até começar a participar de provas, pódios”, finaliza a personal trainer.
Um é pouco
Antes de meter o pé na estrada com a galera, siga essas dicas para pedalar com mais confiança
1. SIGA O LÍDER DA MATILHA
É importante seguir as orientações dos líderes do grupo. Eles vão ditar o ritmo, averiguar o caminho e saber os momentos de parar ou seguir em frente quando houver trânsito.
2. FOQUE NO RITMO
Pedalar em grupo pode ajudar a reduzir o esforço individual de cada ciclista, já que eles podem se beneficiar do vácuo gerado pelo ciclista à frente. Mas cada pessoa tem um limite diferente, então sinta qual é a velocidade padrão do grupo e tente mantê-la. Caso seu ritmo seja totalmente diferente, nada impede de conhecer outros grupos.
3. COMUNICAÇÃO É TUDO
Mantenha contato com os outros ciclistas antes, durante e depois do passeio. Converse sobre a rota, velocidade, paradas e tudo mais que precisar para que todo mundo esteja na mesma página. Essa regra inclui avisar que um carro está se aproximando, advertir sobre buracos e até fazer perguntas para saber como estão os ciclistas próximos.
4. DISTÂNCIA SEGURA
Mantenha uma distância segura do ciclista à sua frente. Assim, você evita colisões e acidentes. Tente manter um espaço de pelo menos um metro e meio.
5. PLANEJE A ROTA
Antes do ponto de largada, converse com seu grupo para definir o melhor trajeto. Deve-se levar em conta o tráfego, evitar trechos esburacados e considerar a distância do percurso, que precisa ser adequada aos envolvidos. Os pontos de paradas devem ser combinados e, assim, o grupo pode descansar, alimentar-se e se hidratar. Se for um dia muito quente, adicione mais paradas para o bem-estar de todos.
6. TOME ATITUDES SEGURAS
Ao andar de bike, é preciso usar os equipamentos de segurança corretos para seu próprio bem e nunca abrir mão deles. À noite, por exemplo, use faróis dianteiros e traseiros e equipe a sua magrela com detalhes chamativos para deixar claro que você está no trânsito e merece ser respeitado.
Grupos de pedal: onde encontrar o seu
Uma das melhores maneiras de encontrar o grupo de pedal mais adequado para você é nas redes sociais. A maior parte das lojas de bairro também conta com grupos que partem do próprio estabelecimento. Abaixo separamos alguns exemplos que atendem diferentes perfis.
– Escalera: alto rendimento
Instagram: @escaleracc
– Onde Vamos?: cicloviagens
Instagram: @pedalondevamos
– Giro Preto: para pessoas pretas
Instagram: @giropreto
– Elas Pedalam: para mulheres
Instagram: @elaspedalam
– Bikers & Proud: LGBTQIAPN+
Instagram: @bikers.proud
– Sampa Bikers: pedal noturno
Instagram: @sampa_bikers
– Rebas do Cerrado: MTB
Instagram: @rebasdocerrado
– Bisual bikers: iniciantes e intermediários
Instagram: @bisual_bikers
– Monta Mona: LGBTQIAPN+
Instagram: @montamona.sp
– Malungada: para pessoas pretas
Instagram: @malungadapedal
Matéria originalmente publicada na Go Outside 180.