Cerca de 20% das pessoas nos Estados Unidos têm dor crônica, que interfere no dia a dia. Mais de 20% dos americanos também sofrem com dores psicológicas na forma de depressão, ansiedade e outras doenças mentais. Mas será que sabemos como tratar dor crônica?
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Na verdade, não. Não estamos entendendo e tratando corretamente a dor crônica quando focamos em buscar uma causa única e uma abordagem terapêutica simplista. “A abordagem convencional pode ser no mínimo incorreta e mesmo prejudicial”, diz Kelly Starrett, fisioterapeuta e fundador da Ready State, uma academia e centro de recursos online dedicado a aliviar a dor crônica, prevenção de lesões e melhora de performance.
Dor crônica: origem múltipla
Para Kelly, o primeiro erro é pressupor que a dor crônica acontece nos ossos e músculos. E no caso de doenças mentais, apenas na mente. De acordo com ele, o que a ciência médica tem mostrado é que não é bem assim. Dor crônica persistente é um fenômeno bio-psico-social. Em outras palavras, se manifesta de uma combinação de fatores entre corpo, mente e nosso meio. E, diferente da dor aguda de um tornozelo torcido ou dia pontual de tristeza, a única forma de tratá-la é uma abordagem mais holística.
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Considere estes exemplos: doenças mentais respondem bem a atividade física. Do mesmo jeito, dor física persistente pode ser aliviada com treinamento psicológico como mindfulness. Para tratar dor crônica de forma eficiente, Kelly explica que devemos focar no sistema como um todo.
O segundo erro é achar que dor crônica é sempre uma coisa ruim e ter medo dela. Para o treinador Steve Magness, isso é ignorar uma informação valiosa. “A dor é uma vantagem evolutiva fundamental”, diz. “É como sabemos onde há algo errado no corpo. Mas a dor pode indicar também como colocar tudo no lugar.” Faz sentido: melhorar em qualquer coisa, seja física, emocional ou social, implica em sair da zona de conforto. Ou mesmo em um processo de dores de crescimento.
Como tratar dor crônica: nível de sensibilidade
De acordo com Samer Narouze, professor de cirurgia e anestesia na Northeast Ohio Medical School e executivo no Centro de Controle da Dor do Western Reserve Hospital, a dor crônica persistente que não tem causas evidentes, como uma doença específica tratável, geralmente se prolonga por dois motivos. Ou ficamos hipersensíveis aos estímulos que causam dor, ou insensíveis a eles, o que traz consequências profundas.
No caso da hipersensibilidade, uma dor mínima pode fazer nosso sistema “surtar” e sentir cada vez mais dor, em um círculo vicioso de hipersensibilidade. É um processo comum em dor crônica física e transtornos de ansiedade. Já quanto à insensibilidade, nos acabamos habituados a suportar tanta dor sem fazer nada para evitar suas causas que é possível chegar ao ponto de não procurar ajuda nem quando é necessário.
O resultado nos dois casos, de acordo com Narouze, é a piora da dor. “Uma das coisas que avaliamos é á quanto tempo a pessoa está sofrendo sem procurar ajuda. Quanto mais tempo faz, maior a probabilidade da dor se tornar crônica”, diz. Achar que não tem jeito e que o sofrimento é normal está associado a depressão, que também está associada com dor física e social
Quando nos tornamos hipersensíveis à dor, é normal nos obrigarmos a tolerá-la como uma forma de não colapsar. Uma pessoa passando por este tipo de terapia de exposição aprende que o medo de sentir dor e a vontade de evitá-la podem ser mais estressantes do que a própria dor. Terapia de exposição é parte de um modelo de tratamento mais amplo chamado terapia comportamental cognitiva, que de acordo com Narouze, “tem o nível mais alto de evidência de ser eficaz com dor crônica persistente, mais do que remédios”.
Então, como tratar a dor crônica?
Quando aceitamos muita dor, a solução geralmente envolve aprender que é ok pedir ajuda e que podemos melhorar aquela situação. É também um pilar da terapia comportamental cognitiva, como aceitação e comprometimento.
Nos dois casos – hipersensibilidade e insensibilidade – os problemas surgem quando não temos uma resposta apropriada, seja por não tolerar a dor ou por tolerar demais. Nos dois casos, ela tende a se agravar.
Então, como tratar dor crônica de um jeito diferente? Parar de focar apenas na dor, e sim no que ela está nos dizendo, e como nós respondemos a ela, pode ser o mais adequado. E uma resposta holística que nos considere como indivíduo e como membro de uma comunidade será muito mais efetiva.