Todos que trabalham para enfrentar a mudança climática, de ativistas a cientistas, sabem que o sucesso depende em grande parte de sua capacidade de converter os céticos (ou mesmo negadores totais) em proponentes de ação. A maioria de nós tem alguém em nossas vidas – um membro da família, colega de trabalho ou amigo – cujas opiniões sobre o aquecimento global e as mudanças climáticas estão em conflito com a ciência mais recente, e você provavelmente teve algumas conversas inflamadas e polarizas com eles.

Philip Kitcher, professor de filosofia do MIT, e Evelyn Fox Keller, professora emérita de história e filosofia da ciência do MIT, co-escreveram um livro que imagina seis dessas mesmas conversas. The Seasons Alter: How to Save the Planet in Six Acts (WW Norton) são seis roteiros ambientados em diferentes locais e com duas pessoas diferentes em cada ato. Os autores descrevem as conversas no livro como “construtivas, cuidadosas e amigáveis”, mas em geral não são simples.

Mesmo que eles não pareçam verdadeiros, os diálogos do livro contêm dicas úteis sobre como argumentar com problemas específicos e trabalhar em torno de impasses. Aqui, retirados do The Seasons Alter e de outros especialistas, quatro princípios que podem te ajudar a conversar com alguém que nega os problemas ambientais causados pelo homem.


Não ignore as incertezas

O livro contém uma longa conversa entre um ativista de uma organização ambiental e uma pessoa com uma doença terminal que está decidindo onde doar seu dinheiro. Seu dilema é se deve apoiar iniciativas ambientais, com base nas previsões de que as mudanças climáticas irão prejudicar grandes populações, ou dar a grupos que abordam coisas como a desnutrição. “Às vezes acho que as verdadeiras catástrofes [da mudança climática] não são tão prováveis, e os efeitos prováveis ​​não são tão ruins”, diz ele.

Não há dúvida de que os gases do efeito estufa estão causando o aquecimento da Terra, elevando os níveis dos oceanos e a alterando os padrões climáticos. Mas esses eventos não estão acontecendo de acordo com um cronograma rigoroso, e os cientistas não podem nos dar um cronograma preciso com prazos para ação. A mudança climática provavelmente reforçará um aumento nas pandemias, por exemplo, mas não há um esquema para evitá-las. Alguns impactos são episódicos (ondas de calor, tempestades cada vez mais severas), enquanto outros são constantes (o nível do mar subindo), mas todos são perigosos. Ainda assim, aqueles que negam, costumam usar essas incertezas como pontos de discussão.

+ Mapa interativo revela como a mudança climática pode afetar sua cidade até 2050

A ativista faz o possível para apresentar evidências baseadas em fatos de que o movimento climático merece o apoio do homem, mas ela precisa permitir que, embora haja consenso sobre os mecanismos básicos da mudança climática, houve alguns estudos contraditórios. É assim que a ciência funciona. É por isso que as avaliações por pares são importantes e por que os pesquisadores continuam investigando, testando teses e acrescentando ao cânone. Os cientistas que estudam o câncer e suas causas também nem sempre concordam, mas isso não é um motivo para cancelar o financiamento para pesquisas sobre o câncer. Portanto, reconheça as lacunas no conhecimento – e lembre-se de que isso não anula seu propósito.


Tente fazer uma conexão

Gerentes e pessoas que clicam em artigos sobre produtividade adoram falar sobre inteligência emocional. Mas Renee Lertzman diz que precisamos mais disso no debate climático também. Lertzman, que chama a si mesma de “estrategista psicossocial com foco no clima e no meio ambiente”, orienta ONGs, universidades e corporações sobre como comunicar questões relacionadas ao aquecimento global. Seu trabalho é a interseção entre psicologia e mudança climática, e Lertzman diz que precisamos ser emocionalmente alfabetizados para entender o relacionamento que os outros têm com o meio ambiente. Um fazendeiro, por exemplo, pode estar “preocupado em se manter seu modo de vida viável – há uma carga emocional ali, e sua resposta ao aquecimento global é diferente de uma pessoa que vivem na cidade”, ela diz.

Então, conheça seu público, sugere Lertzman. A mudança climática significa coisas diferentes para pessoas diferentes, e todos nós trazemos nossos próprios preconceitos para a conversa. Você pode conhecer pessoas que acreditam no aquecimento global e lutem por ações políticas, mas também rejeitam as vacinas. Claramente, nem todas essas opiniões estão enraizadas na ciência. Você pode contrapor essas crenças com dados, mas é improvável crenças desapareçam se elas são baseadas em ansiedade e desconfiança.

+ Como ensinar seus filhos sobre as mudanças climáticas

Lertzman aconselha “a partir de um lugar de autêntica compaixão, para realmente nos sintonizarmos com o quão assustadoras são essas questões podem ser para as pessoas”.  “Qualquer pessoa que trabalhe com saúde mental ou pública dirá que sem compaixão, caímos em uma batalha, envolvendo-nos na resistência uns dos outros e em nossos próprios interesses em nos proteger de qualquer coisa que pareça ameaçadora”.

Essa abordagem também não é psicológica, diz Lertzman. A neurologia mostra que a compaixão acalma o sistema nervoso, enquanto o confronto o excita. “Se nosso sistema límbico – a parte de sobrevivência de nossas mentes – é ativado, o diálogo acaba. Se estou me sentindo desconfortável ou ansiosa, nem vou ouvir o que você tem a dizer.”


Ataque o problema, não as pessoas

O presidente Trump dos Estados Unidos e o presidente Jair Bolsonaro já compartilharam suas opiniões polêmicas sobre a mudança climática. As opiniões sobre questões ambientais também são baseadas em questões políticas. Além disso, nossas opiniões também são moldadas por nossos pais.

Essa é uma história comum em muitas das mais de 500 respostas que os usuários do Reddit postaram a esta pergunta: “Pessoas que não acreditavam no aquecimento global e que mudaram de ideia, o que o fez mudar?”.“Cresci ativamente negando a mudança climática porque meu pai disse que não era real ”, disse um norte-americano.

Outros disseram que foram criados por pais conservadores e que sempre viram a mudança climática como uma questão “liberal” que eles não poderiam ou não deveriam endossar. Um vídeo exibido durante um culto na igreja focado nas virtudes de cuidar da Terra mudou a ideia de um entrevistado.

Muitas pessoas que negavam a mudança climática disseram que ler sobre a ciência por trás disso e como ela já está nos afetando foi o catalisador em sua mudança de opinião. Em alguns casos, os usuários do Reddit apontaram como as mudanças ambientais em suas vidas pessoais os fizeram pensar diferente. “Eu cresci pescando no gelo no centro de Illinois, e já faz três anos que o lago lá não congela. Nós tivemos tornados em fevereiro. E eu estava caçando veados usando camiseta em dezembro, durante o inverno”, escreveu um deles, que se autodenominava um liberal redneck – um termo pejorativo para a classe média baixa branca conservadora e interiorana dos EUA.


Saiba como lidar com um impasse

Carla Wise, uma bióloga de conservação que virou ativista da mudança climática, diz que a coisa mais importante a fazer é continuar conversando sobre a mudança climática, porque quanto mais falamos sobre isso, menos ela se torna uma questão tabu que deixa todo mundo desconfortável. Isso não quer dizer que essas conversas serão sempre fáceis ou agradáveis.

Quando as coisas ficam muito tensas, Lertzman diz: “Eu uso uma técnica de artes marciais, onde você não se envolve diretamente com o oponente, você não discute. Eu poderia dizer: ‘Ouvi dizer que você acredita em XYZ, e não vou questionar isso, mas você pode me ajudar a entender? Vamos apenas dizer, hipoteticamente, que a mudança climática está acontecendo e terá esse efeito, o que isso significaria para você? Você poderia imaginar um cenário em que você está envolvido? ‘”

Lertzman diz que o objetivo desse tipo de conversa é ajudar um ao outro a entrar em contato com o que é verdadeiro e descobrir a resistência que a outra pessoa está expressando, o que ela normalmente acha ser um mecanismo de defesa.

Não espere dominar isso do dia para a noite, ela diz. “É uma habilidade, mas é sobre orientar a conversa para chegar ao que é verdadeiro. Estamos todos unidos por isso – ansiando pela verdade.”