Para a nutricionista francesa Sophie Deram, dietas mais atrapalham que ajudam

Por Verônica Mambrini*

Pare de fazer dieta, coma com prazer e simplifique sua relação com a comida. Quem recomenda é Sophie Deram, autora do livro O Peso das Dietas (editora Sextante), que tenta desmistifi car a enorme confusão que paira hoje sobre nossos estômagos. Francesa, Sophie morou nos Estados Unidos, onde se formou como nutricionista.

Ao se mudar para o Brasil, pesquisou temas como obesidade, genética e transtornos alimentares – tornando- se uma defensora da ideia de que as dietas mais atrapalham que ajudam.

Como você percebeu que dietas não funcionavam?

SOPHIE DERAM: Na faculdade, percebi que a nutrição era dogmática e cheia de regras sem fundamento científi co. No departamento de Obesidade e Genética da USP, estudei como nosso corpo conversa com o que comemos. Um estilo de vida mais saudável aciona alguns genes, assim como alimentação ruim, estresse, fumar e a falta de sono acionam genes diferentes. Além disso, tratando crianças obesas, percebi que elas se esforçavam muito e não conseguiam parar de pensar em comida. Vi que tinha uma coisa maior que a força de vontade – o comportamento. Quase todos os transtornos alimentares que eu estava tratando, seja anorexia, bulimia ou compulsão alimentar, quase sempre tinham uma dieta por trás.

Qual o impacto de tantas restrições nas nossas vidas?

Cortar calorias, comer menos e passar fome causam sofrimento ao cérebro. Cortar grupos de alimentos também, a exemplo da dieta low carb. Mesmo em uma reeducação alimentar, trocar arroz branco por integral, evitar refrigerante e seguir outras informações correntes sobre o que é comer saudável o tempo todo podem causar um grande estresse e um comer emocional descontrolado. O “não pode” faz seu cérebro colocar esses alimentos proibidos como prioridade.

É como se você ensinasse o seu cérebro que apenas aquilo vai te deixar feliz?

Nosso próprio sistema de recompensa valoriza o alimento proibido. A fome desencadeia um sistema de sobrevivência para fazer você buscar alimento. É muito nítido: pessoas em dieta só falam sobre comida. Outra função do cérebro nessa situação é desacelerar o metabolismo. Imagine o desastre: você quer emagrecer e ao mesmo tempo só pensa em comida e gasta menos energia. Quando a dieta acaba, o corpo faz de tudo para engordar de volta.

Qual seria a alternativa para quem já não sabe mais como comer intuitivamente?

Entender que a dieta dar errado não é culpa dela. Oriento a pessoa a prestar atenção no comportamento, em como ela come. É de maneira emocional? Perde o controle? Fazer um diário alimentar ajuda a ganhar autonomia. Tem que respeitar como se fosse uma joia a habilidade de dizer “estou satisfeito”. Fazer dieta estraga isso: a pessoa para de reconhecer se é fome, se é tristeza.

E como lidar com a vontade de comer que não é fome?  

As pessoas estão tão desconectadas que não sabem mais o que é ter vontade; elas dizem que são viciadas… em chocolate, em açúcar. Eu não acredito em vício em alimentos. Ao se permitir comer chocolate sabendo que ele não é vilão e que não vai engordar, não é preciso fazer “despedida” da comida, engolir com rapidez por culpa.

Qual o papel da culpa em uma alimentação desequilibrada?

É uma das coisas que mais atrapalha. Muitas vezes, a pessoa chega ao consultório cheia de crenças erradas sobre nutrição. O necessário é saber quando se tem fome, quando se tem vontade e adquirir uma base sobre o que é comer equilibrado.

Então não é preciso se preocupar em detalhes com o que seria uma alimentação saudável?

Comer saudável também virou um tipo de dieta. Em vez de comer cenoura, arroz e carne, a pessoa come betacaroteno, carboidrato e proteína. Tem nome isso: nutricionismo. Cuidado para não entrar nessa.

Por que isso é ruim?

Pensar assim reduz seu corpo a um sistema fisiológico puro. Comer é psicológico também. Você desconsidera toda essa parte, que é comer em paz, comer saboreando, comer com prazer.

Fixar-se na ideia de comer saudável pode ter o mesmo efeito no cérebro de uma dieta restritiva? 

Exatamente, é uma restrição cognitiva. Seu racional ganha do intuitivo. Em vez de se respeitar, você racionaliza em excesso e esquece do mais importante: a moderação, a tranquilidade, o se permitir comer desfrutando. Não existe comer perfeito, existe comer bem.

Em resumo, há regras, mas elas são mais simples do que as pessoas imaginavam.

Tenho três dicas: não faça dieta restritiva, coma alimentos mais verdadeiros e menos industrializados e cozinhe. Podemos esquecer um pouco essa história de contar calorias e fi car obcecado com o que comer. Simplifi car a nutrição é sentir mais e pensar menos. Não coma menos, coma melhor.

*Reportagem publicada na edição nº 151 da Revista Go Outside, maio de 2018.







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