Dor nas costas é a doença crônica mais comum no Brasil, de acordo com dados da Escola Nacional de Saúde Pública, ligada à Fiocruz. Embora seja tentador parar toda atividade e se recuperar na cama com uma bolsa de água quente, alguns médicos estão recomendando uma abordagem diferente para aliviar a dor nas costas: caminhar em trilhas.
Se suas costas estão latejando, é provável que você não queira fazer nada, muito menos sair para uma trilha. No entanto, segundo os médicos com quem conversei, fazer longas caminhadas durante o período de recuperação — e mesmo depois — pode acelerar o processo de cura e até reduzir o risco de novos episódios no futuro.
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Eu mesma sofri com dores nas costas por anos e cometi o erro de reduzir minhas caminhadas habituais após crises. Mas meu médico sugeriu que eu me movimentasse mais para ajudar a diminuir a dor, junto com outras mudanças de estilo de vida — e os resultados foram impressionantes. Já se passaram cinco anos desde meu último episódio sério de dor nas costas.
Cada caso é único, e os especialistas dizem que é importante ser estratégico ao usar caminhadas como forma de aliviar a dor. Veja o que eles recomendam.
Como caminhar pode ajudar a eliminar a dor nas costas
Há um bom volume de pesquisas que apoiam a caminhada como tratamento para dores nas costas. Um estudo de 2024 publicado na revista The Lancet acompanhou mais de 700 adultos ao longo de três anos que haviam tido recentemente dores lombares. Metade foi orientada a seguir um programa de caminhadas, com a meta de andar 30 minutos por dia, cinco vezes por semana. A outra metade não recebeu nenhuma intervenção específica, mas pôde buscar tratamento externo caso sentisse dor durante o estudo. (Os pesquisadores acreditaram que isso representaria uma comparação mais realista com o grupo da intervenção.)
Os resultados mostraram que o grupo que caminhava teve menos recorrências de dor e intervalos mais longos entre os episódios, comparado ao grupo que não fez alterações. A diferença foi significativa: quem caminhava levou cerca de 208 dias para ter uma nova crise, enquanto o grupo sem mudanças teve recaídas em média após 112 dias.
Uma análise de 2020, publicada no British Journal of Sports Medicine, apontou que exercícios regulares — incluindo caminhadas — são eficazes para prevenir dores recorrentes nas costas. Uma revisão sistemática de 2019, publicada na Scientific Reports, também concluiu que pessoas fisicamente ativas têm menor risco de desenvolver dores na região.
Dito isso, a maioria desses estudos se baseou em caminhadas em calçadas ou em esteiras, que são bem diferentes de trilhas. Caminhar de qualquer forma ajuda a ativar os músculos ao redor da coluna, o que pode reduzir a dor para muitas pessoas, afirma o médico David Kennedy, especialista em medicina intervencionista da dor. “Na minha opinião, caminhar em trilhas é ainda melhor”, diz ele.
Trilhar em terrenos irregulares ativa mais músculos das costas, incluindo pequenos estabilizadores, glúteos e o core, explica Kennedy. Ativar os músculos lombares também estimula o core, fortalecendo-o — e um core forte estabiliza a coluna. Já um core fraco aumenta o risco de desalinhamento da coluna, levando a mais dor, acrescenta.
Todd Miller, professor de ciências do exercício e nutrição, afirma que as trilhas também melhoram o equilíbrio e a propriocepção — a capacidade do corpo de perceber seus próprios movimentos. Isso ajuda a evitar padrões compensatórios, como mancar. Segundo Miller, esses padrões, se não corrigidos, podem gerar ainda mais dor ao desalinhar o corpo.
Subir e descer morros durante a caminhada também traz benefícios. “Subidas desafiam os músculos posturais — incluindo os mais profundos das costas e da pelve — promovendo uma postura mais ereta enquanto ativam os glúteos, isquiotibiais e o core para reduzir a sobrecarga na coluna”, explica Miller. “Por outro lado, as descidas exigem movimento excêntrico controlado, obrigando o corpo a absorver o impacto gradualmente, o que fortalece as pernas e minimiza a tensão na coluna.”
Mais um ponto a considerar, segundo Miller, é que caminhar em meio à natureza reduz o estresse. “Esse efeito calmante e relaxante pode diminuir a percepção da dor ao reduzir a tensão muscular geral”, conclui.
Qual é a melhor maneira de caminhar em trilhas para aliviar dores nas costas?
Se você está no meio de uma crise de dor nas costas, David Kennedy recomenda esperar até que a dor diminua um pouco antes de iniciar sua rotina de caminhadas. “Quando a crise tiver passado, manter-se ativo e fazer exercícios voltados para o core, incluindo caminhadas, ajuda a reduzir dores recorrentes”, explica.
No entanto, não é necessário estar completamente livre da dor para sair em uma trilha. “Sentir um pouco de dor durante a atividade é aceitável, desde que, ao parar, você volte ao seu estado basal e a dor não piore”, afirma Kennedy. “Não quero que a pessoa caminhe um quilômetro e depois fique de cama por três dias. Mas, se você conseguir fazer a trilha, sentir um leve desconforto e ainda assim não precisar se deitar pelo resto do dia, ótimo.”
Em relação ao calçado, é importante que tenha um solado com boa tração para garantir firmeza em terrenos irregulares, diz a podóloga Melissa Lockwood. Ela recomenda investir em sapatos com salto baixo, entre 1,5 cm e 2,5 cm — suas favoritas são botas de trilha impermeáveis. “Esse pequeno salto dá uma vantagem aos músculos da parte de trás da perna e ajuda a realinhar os ossos do quadril, o que, no fim das contas, beneficia a região lombar”, explica.
Já o cirurgião ortopédico Neel Anand recomenda alongar os glúteos e os isquiotibiais antes de iniciar a trilha. Depois disso, caminhe em um ritmo confortável para você. Durante a caminhada, preste atenção à sua postura: tente manter a cabeça alinhada com o pescoço e os ombros para trás (sem se curvar), diz Kennedy. “Postura faz diferença.”
Quanto tempo devo caminhar para aliviar a dor?
Segundo Todd Miller, tudo depende do seu nível de condicionamento físico e de como você se sente. “Comece com 30 a 45 minutos em terrenos leves e vá aumentando o tempo e a dificuldade gradualmente”, recomenda. “A chave é a consistência, e não tentar percorrer grandes distâncias logo de início.”
Se esse tempo parecer confortável para você, Miller diz que é possível aumentar gradualmente para 60 a 90 minutos — *desde que você mantenha uma boa postura e não tenha crises de dor.
Durante todo esse processo, ouvir o corpo é fundamental. Se você estiver caminhando e sentir dor, o melhor é reduzir o ritmo, afirma a Dra. Mara Vucich, cirurgiã da coluna. Isso pode significar desacelerar, buscar terrenos mais planos ou encurtar o trajeto, para depois aumentar aos poucos novamente.
Mas Miller não recomenda parar de caminhar imediatamente, a menos que você esteja com dores intensas. “O corpo normalmente leva algumas sessões para se adaptar às exigências do movimento e para que os benefícios comecem a aparecer”, afirma. Por isso, ele sugere fazer caminhadas de duas a três vezes por semana, durante três a quatro semanas, antes de decidir se a atividade funciona para você. “Se a dor piorar, o ideal é avaliar fatores como postura, tipo de calçado, peso da mochila e intensidade — em vez de abandonar a caminhada de vez”, completa.
A melhor maneira de subir e descer trilhas quando você está com dor nas costas
Sua forma de caminhar pode ter um grande impacto no seu nível de conforto, especialmente se você sente dores na parte superior ou inferior das costas, segundo o especialista Todd Miller. No entanto, sua postura pode variar ligeiramente ao caminhar em subidas e descidas, assim como dependendo de onde a dor se manifesta.
Miller afirma que há uma postura específica a considerar se você tem dor lombar. “Ao subir morros, é importante ativar os glúteos e o core, evitando arquear demais a lombar”, explica. “Usar passos curtos e constantes, em vez de passadas longas, pode reduzir a carga na coluna e melhorar a estabilidade.”
Na descida, Miller recomenda manter os joelhos levemente flexionados para absorver o impacto e evitar que a força do movimento seja transmitida diretamente à coluna. “O uso de bastões de caminhada também pode ajudar a aliviar a pressão sobre a lombar, oferecendo suporte extra”, afirma.
Se o problema estiver na parte superior das costas, Miller sugere manter os ombros relaxados e evitar curvar-se para a frente ao subir. Caso contrário, você pode aumentar a tensão na parte superior das costas, o que tende a causar mais dor.
“Na descida, focar em movimentos controlados e evitar curvar os ombros ou arredondar demais a postura pode ajudar a evitar desconforto e manter o alinhamento adequado da coluna”, diz ele. Uma boa dica é imaginar que você está puxando as escápulas para baixo e para trás, mantendo o core ativado para sustentar a coluna ereta.
Certifique-se de que sua mochila não está pesada demais
A mochila é importante para levar o essencial, mas Miller alerta que é fundamental usá-la da forma correta, especialmente em casos de dor nas costas. Ele recomenda manter o peso da mochila abaixo de 5 kg e distribuir o conteúdo de forma equilibrada.
“Uma mochila bem ajustada, com cintos de quadril e de tórax \[como esta aqui], pode ajudar a aliviar a pressão sobre a coluna, reduzindo a tensão e favorecendo uma postura melhor”, afirma.
Miller também sugere colocar os itens mais pesados próximos ao centro da mochila para melhorar a distribuição do peso. (Se você é iniciante nas trilhas, ele recomenda começar sem mochila, se possível, para permitir que o corpo se adapte ao movimento sem sobrecarga.)
Os médicos concordam que cultivar o hábito da caminhada em trilhas pode ser uma ótima maneira de reduzir o risco de novas crises de dor nas costas. “O mais importante para quem tem dor nas costas é se movimentar”, afirma Kennedy. “Se você puder sair e caminhar na natureza, melhor ainda.”
*Korin Miller é repórter da Outside USA.