Movimentos negros ganham espaço no ainda pouco diverso mundo outdoor, e aventureiros negros estão mostrando que as mudanças vieram para ficar

O impacto do movimento Black Lives Matter, que ganhou dimensão mundial após o assassinato do norte-americano George Floyd, repercutiu na comunidade outdoor – durante décadas dominada por uma profunda falta de representatividade e diversidade. Um dos termômetros disso é a leva de influenciadores digitais que tem se mostrado disposta a quebrar estereótipos sobre a participação do negro em viagens e esportes ao ar livre.

“Era hora dos questionamentos se transformarem em ação”, diz Denilson Silva, 42 anos, sociólogo e cocriador do Instagram Negritude Outdoor. Junto do amigo Leonardo Ferreira, ele fez uma pesquisa buscando aventureiros negros e referências negras no tema. E praticamente não encontrou nenhum conteúdo sobre o assunto no Brasil.

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Ambos são montanhistas e ciclistas, casos raros mesmo entre seus amigos de aventuras. “Começamos a investigar as razões de tamanha falta de representatividade. Será que os negros não gostam de esportes outdoor? Será que são esportes caros para uma parcela da população reconhecidamente menos privilegiada financeiramente?”, questiona Denilson. Ao criar esse perfil do Instagram, a dupla de amigos queria incentivar o debate em torno do tema. “Além disso, nosso objetivo também era ser uma plataforma para que outros projetos fantásticos pudessem ser divulgados.” Ele cita o exemplo de Aretha Duarte, guia de alta montanha da agência Grade 6, que está com um plano de escalar o Everest em 2021. Assim como Aretha, existem outros projetos com pouca visibilidade, porque os negros não têm espaço nas mídias e marcas outdoor.

A ideia de que representatividade importa vem ganhando força poderosa. “Sempre tive vontade de conhecer lugares diferentes, mas sempre que buscava qualquer informação sobre um destino, lá estava uma pessoa branca, aparentando ter o dinheiro que eu sinceramente sabia que eu não dispunha”, conta a comunicadora Priscila Pereira, que criou o Instagram de viagens @poraicomapri. Ali recebe diversos relatos de mulheres negras contando o quanto vê-la viajando é importante e inspirador.

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Para os negros que estão criando movimentos para mostrar presença nas atividades outdoor, é impossível discutir o assunto sem falar de racismo estrutural. “Nosso país ainda sente os efeitos de séculos de escravidão. Ainda hoje somos uma população vulnerável, com pouco acesso à cultura e ao esporte”, afirma o educador físico Luiz Dantas, dono do Instagram Momento Cicloturismo. Apaixonado por viagens de bike, ele criou o perfil para compartilhar com família e amigos as viagens que fazia, mas percebeu ali uma oportunidade de discutir questões mais profundas. Nas redes sociais, ele aproveita para debater assuntos como cicloturismo étnico e afro. “Já recebi muitas respostas de que o cicloturismo é democrático e, portanto, não há a necessidade de falar de racismo. Mas discordo: o debate é importante, sim. Pessoas não negras contribuem para a mudança dessa estrutura a partir da consciência de seus próprios privilégios.”

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O papel das marcas de produtos para o mundo ao ar livre também tem sido foco dos debates. Cofundador do Negritude Outdoor, o designer Leonardo Ferreira conheceu o esporte outdoor há seis anos, ao trabalhar para uma empresa do ramo. Tornou-se montanhista e ciclista e viu no bikepacking uma forma de ir para lugares remotos gastando pouca grana e com as próprias forças. Leonardo analisa a questão socioeconômica no meio desse processo. “As marcas precisam achar uma forma de baratear custos e fazer com que os negros se vejam praticando essa maravilha que é o esporte outdoor”, afirma. “Para a periferia, o que costuma chegar é apenas o skate e o BMX. Um jovem negro de periferia não se vê comprando uma mochila cargueira de R$ 1.000.”

Com vitrines assim se multiplicando, o protagonismo negro tende a conquistar um papel de destaque, em uma revolução pela diversidade. “O esporte outdoor foi onde eu encontrei a liberdade”, diz Leonardo. Nada mais justo do que fazer dessa liberdade um direito de todos.

7 aventureiros negros para te inspirar

Aventureiros negros para seguir e compartilhar:

@bitonatravel

O Bitonga Travel reúne histórias de mulheres negras que viajam. Além do Instagram, elas têm um blog recheado de dicas de viagens.

@negritudeoutdoor

O Negritude Outdoor traz relatos e perfis de negros e negras que amam montanha, bike, escalada e outras trips outdoor.

@travelmakerkai

A jornalista de viagens e blogueira Kai Travelmaker escreve sobre lugares da diáspora negra como Bahia e Colômbia.

@bichapretapelomundo

O professor de história da arte Tiago Duas relata suas viagens, sempre sob o mantra “Tire seu preconceito do caminho porque eu quero viajar”.

@destinoafro

A Destino Afro é uma agência de viagens especializada. Além de foca no público negros, possui roteiros para a África e outros destinos.

@momentocicloturismo

O Educador físico Luiz Dantas, que também produz um canal no YouTube e um blog, conta aqui sobre suas viagens de bicicleta.

@viagempreta

O casal Jacy July e Lucas Torres dá um banho de lifestyle carioca, com muito outdoor nesta conta lotada de imagens de paraísos à beira-mar.







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