Aventura com propósito

EM AÇÃO: Os ultramaratonistas Sarah McCloskey e Craig Lloyd, que correram por bosques remotos durante todo o verão de 2015 como voluntários (Foto: Garret Smith)

Um time de atletas e pesquisadores incrivelmente habilitados para a vida ao ar livre uniu forças em nome de pesquisas para conservar mares, rios, bosques e montanhas, do melhor jeito possível: curtindo a natureza

Por Maria Clara Vergueiro

CONCILIAR NOSSAS PAIXÕES mais pessoais com atividades produtivas pode ser um sonho suficientemente grande e um tanto distante para a maioria de nós. Imagine, então, o potencial revolucionário de aplicar essa premissa em larga escala, impactando positivamente o meio ambiente e a vida de outras pessoas em diversas partes do mundo. Foi o que o norte-americano Gregg Treinish conseguiu ao criar uma organização sem fins lucrativos que recruta aventureiros voluntários, de várias regiões do globo e habilitados em modalidades outdoor, para contribuírem com projetos ambientais ajudando a coletar dados em áreas de acesso limitado.

A Adventurers and Scientists for Conservation (ASC) – aventureiros e cientistas pela conservação, na tradução para o português – está conseguido colaborar, desde 2011, na coleta de informações para pesquisas relevantes, que têm como foco a preservação de espécies ameaçadas de animais e plantas. A mão de obra fundamental para essas coletas é constituída de ultramaratonistas, esquiadores, surfistas, canoístas, escaladores, velejadores e montanhistas com um repertório de dar inveja.

EM CAMPO: As montanhas Ulinta, em Utah, foram o cenário da pesquisa realizada pelo ASC sobre carnívoros na região (Foto: Garret Smith)
EM CAMPO: As montanhas Ulinta, em Utah, foram o cenário da pesquisa realizada pelo ASC sobre carnívoros na região (Foto: Garret Smith)

Quando fundou a ASC, Gregg tinha um pé na ciência e outro na aventura. Já havia trabalhado como pesquisador da vida selvagem, catalogando animais da região do Parque Nacional do Yosemite, na Califórnia, como linces, ursos pardos e carcajus, chamados de wolverines por aquelas bandas. Como aventureiro, ele trazia na bagagem uma expedição que cobriu toda a Trilha dos Apalaches e outra que percorreu a extensão completa da Cordilheira dos Andes – uma viagem de dois anos, que lhe rendeu o título de Aventureiro do Ano pela National Geographic, em 2008.

“Gregg identificou o potencial de casar esses dois universos, utilizando as habilidades e a energia da galera do mundo ao ar livre para coletar dados que amparam os esforços conservacionistas”, conta Mike Kautz, diretor de projetos da ASC. “O laço que une todos nós – atletas voluntários, equipe e parceiros – é o desejo de contribuir para a preservação”, completa.

O perfil desses voluntários varia bastante de um projeto para outro, dependendo do tipo de coleta necessário e do ambiente em que essa coleta será realizada. Atualmente a ASC tem cerca de 70 pessoas “em campo”, recolhendo todos os dias essas informações que podem estar em cartões de memória com fotos de mamíferos em pontos estratégicos de um bosque, ou em amostras de água retiradas de um rio. Em cinco anos, mais de 500 pessoas participaram coletando dados. Surfistas, remadores e velejadores têm contribuído, por exemplo, para um dos mais bem-sucedidos projetos da ASC, batizado de Microplastics, que estuda a presença de micropartículas plásticas nos oceanos e rios de todo o mundo. Menores que 5 mm, elas estão presentes em fibras sintéticas, pastas de dente e sabonetes abrasivos, entre dezenas de outros produtos, e absorvem toxinas venenosas como o BPA e o DDT. Isso tem um efeito devastador para a vida marinha e toda a cadeia alimentar, incluindo os alimentos que vêm para a nossa mesa. Hoje a ASC é responsável por um dos maiores conjuntos de dados do mundo nessa área, graças ao Microplastics.

Depois que os voluntários são selecionados e treinados de acordo com os protocolos científicos dos projetos, um gerente responsável supervisiona o trabalho de cada um. Smartphones e plataformas digitais servem para registar e preservar os dados, acompanhados por todos em tempo real. O monitoramento de carnívoros raros das montanhas Uinta, em Utah, é feito por meio de câmeras instaladas em áreas remotas que podem estar a 50 km de algum ponto em que se chega de carro, uma distância que para ultramaratonistas como os norte-americanos Sarah McCloskey e Craig Lloyd, voluntários do projeto, faz parte de um treino longo para alguma das provas de seus calendários. Com a experiência de quem já correu mais de 60 ultramaratonas (14 delas de 100 milhas, o equivalente a 160 km), para Sarah não foi preciso nem mesmo “treinar” para colher os registros dos animais de lá. “Participei de dois finais de semana de treinamento teórico, bem divertido. Aprendi muito sobre os hábitos dos carnívoros e também a trabalhar com as câmeras e os GPSs que nos levam até as estações montadas para atrai-los. É indescritível estar naquelas montanhas fazendo o que eu amo e ainda ajudando uma organização de proteção ao meio ambiente”, conta Sarah.

COM EMOÇÃO: A dupla de corredores atravessa cerca de 50 km por vez, para coletar informações e manusear equipamentos de pesquisa instalados nos bosques (Foto: Garret Smith)
COM EMOÇÃO: A dupla de corredores atravessa cerca de 50 km por vez, para coletar informações e manusear equipamentos de pesquisa instalados nos bosques (Foto: Garret Smith)

A pesquisa nas montanhas Uinta foi registrada pelas lentes do fotógrafo e documentarista Danny Schmidt e resultou no curta-metragem Running Wild. Danny, que já havia documentado outro projeto da ASC anteriormente, acompanhou Sarah e Craig pelas trilhas de Utah (onde ele próprio passou a infância) durante todo o verão de 2015. Os caminhos foram escolhidos com base na localização exata das estações que abrigam as câmeras fotográficas, mas também em pontos onde a equipe de filmagem poderia se estabelecer com alguma mínima segurança e acesso. As paisagens de uma das regiões mais lindas da maior cadeira de montanhas dos Estados Unidos também contaram bastante.

“Eu entrei nesse projeto com esperança de poder inspirar outras pessoas a fazer mais das suas experiências quando se aventuram no mundo lá fora. Fiquei maravilhado com o que vivemos naqueles dias e, principalmente, com a oportunidade de aprofundar minha compreensão dos animais que habitam a região”, resume Danny.







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