Por que correr 5 km é tão bom (e digno) quanto completar uma maratona

Por Danielle Zickl, para a Outside USA RUN

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Rocky Mountain Games 2025, Pedra Grande, Atibaia (SP). Foto: Rodrigo Capote.

Não, você não precisa correr uma maratona para se considerar um corredor — nem para colher os benefícios fisiológicos e psicológicos que o treino e as competições proporcionam.

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Se você é corredor, conhece bem essa situação. Você conhece alguém novo. A pessoa pergunta o que você gosta de fazer no tempo livre. Inevitavelmente, você diz que corre — e vem a pergunta: “Você já correu uma maratona?”

“Não”, você responde, talvez com um pouco de vergonha. E, ao sair da conversa, fica com aquela sensação esquisita de ser “menos”.

Você sabe, racionalmente, que correr — inclusive competir — vai muito além de completar uma maratona. Sabe que correr rápido pode ser tão desafiador e válido quanto correr longe. E sabe também que isso não deveria importar, porque se você corre, então é um corredor. Mesmo assim, a pergunta continua ecoando na cabeça.

Muitos corredores, especialmente aqueles que preferem distâncias mais curtas, passam por essa espécie de crise de identidade. Alguns chegam a se inscrever em uma maratona só para provar — para si mesmos e para os outros — que são “corredores de verdade”. Mas você não precisa fazer isso.

E não precisa apenas acreditar na nossa palavra. Conversamos com duas fisiologistas do exercício que também atuam como treinadoras de corrida sobre por que quem corre distâncias médias não deve se sentir inferior aos maratonistas. Se você está em busca de validação, aqui vão três razões pelas quais correr distâncias mais curtas também é algo digno por si só.

Seus treinos podem ser mais intensos

Se você corre para manter a forma e gosta de competir em provas de 5 km e 10 km, temos boas notícias. Quando o assunto é melhorar a condição física, a fisiologista do exercício Heather Hart, cofundadora e treinadora-chefe de ultramaratona da Hart Strength & Endurance, nos EUA, diz que a distância percorrida importa menos do que o esforço e a intensidade.

“A intensidade é o principal fator por trás das adaptações fisiológicas ao treinamento, pois está diretamente ligada ao sistema de energia que o corpo mais utiliza durante a atividade — seja o fosfagênico, o oxidativo ou o glicolítico”, explica Hart.

Ela diz que, ao correr a cerca de 70% da sua frequência cardíaca máxima ou menos — o que é típico em distâncias longas como a maratona —, você está usando principalmente a via oxidativa, ou aeróbica, para gerar energia. Correr nesse ritmo ajuda a desenvolver resistência.

Mas, normalmente, você corre distâncias curtas com mais intensidade. Digamos que você está em uma prova de 5 km. Embora a frequência cardíaca máxima — e as zonas que derivam dela — variem de pessoa para pessoa, é provável que você esteja na Zona 4 (em um modelo de cinco zonas) durante toda a corrida, segundo Hart.

“Sabemos que uma pessoa consegue manter a intensidade da Zona 4, que gira em torno de 80% a 90% da frequência cardíaca máxima, por cerca de seis a 40 minutos”, afirma Hart. “Portanto, podemos supor que alguém que está dando o máximo em uma prova de 5 km está nessa zona.”

Correr na Zona 4 traz muitos benefícios fisiológicos. Por exemplo, segundo Hart, você aumenta o tamanho e a densidade das mitocôndrias — que produzem a energia necessária para o funcionamento celular.

Por que isso é importante? Porque ajuda a eliminar o lactato dos músculos, evitando dores e fadiga no futuro. Também aumenta o volume de plasma no sangue, o que melhora a regulação da temperatura corporal e a produção de energia.

Pamela Geisel, fisiologista do exercício e diretora de performance e bem-estar do Hospital for Special Surgery, também nos EUA, explica que correr em intensidades altas — chegando até a Zona 5 — também traz outros ganhos: melhora o VO2 máximo (a quantidade de oxigênio que o corpo consegue absorver e usar em esforço máximo), aumenta as fibras musculares de contração rápida e melhora a velocidade, cadência, técnica e economia de corrida.

Claro, você não vai (nem deve) treinar na Zona 4 ou 5 em toda corrida. Isso leva a lesões e overtraining. Mas, se seu objetivo é bater o recorde pessoal nos 5 km, um bom plano de treinamento certamente incluirá treinos de velocidade que te levam a essas zonas pelo menos uma vez por semana. Ou seja: só porque não há um treino de 32 km na sua planilha, não quer dizer que você está menos em forma que um maratonista. Seu condicionamento apenas assume outra forma.

Você provavelmente corre muitos quilômetros

Falando em distância, há um mito em relação ao volume de treino para provas de 5 km e 10 km. Se olharmos para alguns planos de maratona com baixa quilometragem, vemos corredores chegando a um pico de cerca de 55 km por semana. Muitos atletas que não estão treinando para maratonas chegam perto disso. Por exemplo:

  • Um plano avançado de 5 km pode levar você a correr 40 km (ou mais) na semana de pico.
  • Um plano intermediário de 10 km pode chegar a mais de 48 km na semana mais intensa.
  • Um plano intermediário de meia maratona pode chegar aos 64 km semanais.

Num exemplo extremo, podemos comparar um corredor de 1.600 metros a um maratonista. Quem busca recorde pessoal em uma milha vai correr trechos mais curtos, porém mais intensos, do que quem está treinando para concluir sua primeira maratona, explica Hart. “Esse atleta da milha pode ter um volume total menor se olharmos só os quilômetros, mas provavelmente terá um volume muito maior de intensidade quando analisamos os treinos com mais profundidade”, diz ela.

Vale lembrar que dois atletas intermediários, em plena preparação para uma maratona, podem ter semanas de treino completamente diferentes — e ainda assim obter resultados semelhantes no dia da prova, segundo Hart. Além disso, dependendo do histórico de treinos e da tolerância do corpo, um atleta focado em provas curtas pode ter um volume semanal até maior do que alguém treinando para uma maratona.

No fim das contas, “não existe um número mágico de quilômetros que você precisa correr em um treino, semana, mês ou ano para se qualificar como ‘corredor de verdade’”, afirma Hart. “Se você escolhe correr como forma de exercício ou prazer, e seus dois pés saem do chão ao mesmo tempo durante o movimento da corrida, mesmo que por alguns segundos, parabéns — você é um corredor!”

Sua queima metabólica é elevada

Vamos falar também de gasto metabólico — um jeito técnico de dizer quantas calorias você queima. Se você treina para distâncias curtas e com alta intensidade, provavelmente corre mais rápido e, portanto, queima mais calorias por minuto, explica Geisel.

Os treinos de curta distância, por natureza, têm segmentos mais curtos e intensos. Costumamos ouvir falar do maratonista faminto, que precisa comer o tempo todo — muito por causa da quilometragem elevada. (E, sejamos justos, maratonistas mais experientes também fazem treinos de velocidade, o que pode deixá-los duplamente famintos.) Mas quem treina para 5 km ou 10 km pode acabar ignorando a necessidade de se alimentar bem, ou não perceber o quanto o corpo está queimando por causa da intensidade.

Veja um exemplo:

  • Uma pessoa de 82 kg correndo uma milha (1,6 km) em 7 minutos e 54 segundos, com boa técnica, queima cerca de 17 calorias por minuto.
  • Ao correr em ritmo mais lento, como 6:12/km, a queima cai para cerca de 11 a 12 calorias por minuto, segundo Geisel.

Ou seja: uma corrida de 30 minutos no ritmo de 04:55/km pode queimar 507 calorias — o mesmo que uma corrida de 40 minutos em ritmo mais lento.

Além disso, ao treinar em alta intensidade, o corpo continua queimando calorias depois do treino — o chamado efeito afterburn, ou consumo excessivo de oxigênio pós-exercício. “Exercícios de alta intensidade levam a uma queima pós-treino mais acentuada”, afirma Geisel.

Conclusão: você corre? Então você é corredor.

Cada pessoa tem um nível diferente de condicionamento, habilidades, pontos fortes, limitações, experiência e objetivos.

“O que é difícil para um atleta pode ser fácil para outro — e vice-versa. O que motiva um atleta pode não atrair o outro”, diz Hart.

Pense assim: alguém que corre maratonas pode torcer o nariz para a ideia de correr uma milha ou um 5 km no limite, porque prefere esforços aeróbicos de longa duração e não se sente bem correndo no limiar anaeróbico (o maior esforço possível que se pode sustentar por um tempo sem acumular muito lactato).

“Essas pessoas simplesmente não gostam disso, mas isso não diminui em nada o valor de um esforço curto e intenso, se é isso que alguém gosta ou escolhe fazer”, diz Hart. “Ninguém em sã consciência diria a um atleta olímpico dos 100 metros que ele não é um ‘corredor de verdade’ por causa da distância que corre.”

Geisel concorda totalmente: “Nem a distância nem o ritmo definem quem é corredor — se você coloca um pé na frente do outro e se move para frente com um dos pés fora do chão, você está correndo. E, portanto, é um corredor”, afirma.

Se correr te traz alegria e uma sensação de realização, isso já é motivo para comemorar — não importa se você correu 1 km ou uma maratona.