Conheça o refúgio de montanha onde trilheiros confessam seus pecados

Por Mary Beth Skylis

trilheiros
O Priest Shelter, na Appalachian Trail. Foto: PlumbBobM / Trailforks / Backpacker.

No topo de uma montanha na Virgínia, ao longo da Trilha dos Apalaches, nos EUA, um livro de registros guarda alguns dos segredos mais profundos e obscuros dos trilheiros.

Quando cheguei ao Priest Shelter durante minha caminhada pela Appalachian Trail (Trilha dos Apalaches) em 2015, não compreendi de imediato a importância cultural do lugar. Alcancei a área de acampamento e mal notei a estrutura discreta antes de montar minha barraca na floresta. Depois de concluir minhas tarefas no acampamento, segui o som das risadas até o abrigo, onde meus amigos estavam lendo o livro de registros.

“Escutem isso”, disse um deles. “Essa pessoa colocou uma pedra do tamanho de uma bola de beisebol na mochila de outra pessoa. Ela só percebeu um dia depois!” Rimos juntos sob o sol poente. Em seguida, começaram a compartilhar suas próprias histórias, confessando paixões surgidas na trilha e outros pensamentos impuros.

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Os caminhantes da Trilha dos Apalaches adoram tradições. Assim que nos aventuramos na floresta, adotamos novos nomes. Uma parada no Pine Grove Furnace State Park exige que participemos do “desafio do meio galão”, devorando uma grande quantidade de sorvete em menos de uma hora. Em New Hampshire, muitos de nós mostramos as nádegas para a locomotiva Cog enquanto ela sobe o Monte Washington. E quando chegamos ao Priest Shelter, na Virgínia, é hora de confessar nossos pecados.

Por que o abrigo se chama “Priest Shelter”?

Há algumas histórias diferentes sobre a origem do nome do Priest Shelter. Um dos mitos sugere que o abrigo foi batizado em homenagem à influente família DuPriest, que viveu na região e possuía muitas terras na área. Outra teoria aponta para um pastor local que viveu como eremita.

O que se sabe com certeza é que os construtores da trilha estabeleceram o abrigo após uma grande reconfiguração da Trilha dos Apalaches depois da Segunda Guerra Mundial. O abrigo fica no topo do pico mais alto da chamada “cadeia religiosa” no condado de Amherst, que também inclui o Cardinal e o Friar.

Por que confessamos nossos pecados ao Priest?

Ninguém sabe exatamente como ou quando começou a tradição de confessar segredos no abrigo. Alguns registros datam dos anos 1980, quando trilheiros já faziam confissões. Uma teoria popular sobre a cultura do Priest Shelter sugere que a árdua subida de 7 km e 945 metros até o topo da montanha se assemelha a uma penitência para os caminhantes, levando muitos a sentir que devem confessar os pecados pelos quais acabaram de sofrer.

O que os trilheiros confessam no Priest?

Às vezes, as confissões são sombrias, tristes ou pesadas (incluindo, supostamente, pelo menos uma que admite um assassinato). No entanto, na maioria das vezes, as confissões no Priest Shelter seguem um tom cômico, relatando histórias sobre snacks roubados e desejos incontroláveis por rodízios de comida.

Alguns trilheiros preferem manter seus segredos apenas no livro de registros do Priest, enquanto outros não se importam em compartilhá-los com o mundo. Em um vlog no YouTube, gravado sob a clássica chuva da Trilha dos Apalaches, o aventureiro Bear Trek Adventures confessou:

“Tive pensamentos impuros muitas, muitas vezes nesta jornada. Nos abrigos, penso com frequência em cortar o isolante térmico de quem ronca só para conseguir uma noite de sono tranquila.”

Ele continuou:

“Eu disse à minha esposa que, se ela me deixasse largar meu emprego para fazer a Trilha dos Apalaches, eu rasparia a barba quando terminasse. Desculpe, querida, mas isso não vai acontecer. A barba vai continuar viva muito depois do fim da trilha.”

Assim como Bear Trek Adventures, um episódio do Green Tunnel Podcast apresenta várias confissões extraídas do livro de registros. Amber Pelham declara:

“Perdoe-me, padre, pois eu pequei. Disse aos trilheiros de um dia que estou morrendo de fome só para ganhar comida de graça.”

Rachel Birch acrescenta:

“Perdoe-me, pai da trilha, ou não, pois não tenho vergonha. Às vezes canto músicas de Natal em voz alta, apesar do sofrimento que isso causa aos outros trilheiros.”

Já Alexandra Miller confessa:

“Perdoe-me, padre, pois eu pequei. Passei a maior parte da minha vida sem um mullet. Que horror.”

Outras confissões comuns incluem o yellow blazing (pegar carona para evitar trechos da trilha) e até o pink blazing (quando caminhantes seguem a trilha em busca de um romance).

Onde fica o Priest Shelter

A Priest Mountain é um pico popular na Virgínia para trilheiros de todos os tipos. Embora esteja localizada em uma área de natureza preservada, a região recebe um grande fluxo de visitantes, provavelmente devido à sua altitude elevada. Na verdade, a Priest Mountain é a última montanha de 4.000 pés (cerca de 1.220 metros) ao longo da Trilha dos Apalaches até que os caminhantes que seguem para o norte alcancem o Monte Moosilauke, em New Hampshire.

O Priest Shelter está situado ao sul do Rio Tye, na Virgínia, dentro da Priest Wilderness, uma área de aproximadamente 2.426 hectares estabelecida no ano 2000. No outono e no verão, o solo coberto por samambaias, rododendros e azaleias cria uma paisagem digna de conto de fadas. Já no topo da montanha, os caminhantes são presenteados com uma vista panorâmica do vale abaixo.

Localizado no marco do quilômetro 829,7 da Trilha dos Apalaches, aqueles que visitam a região por um dia ou um fim de semana geralmente estacionam no início da trilha na Crabtree Falls Highway. Outra opção é acessar o abrigo a partir da Rota 56, no Tye Trailhead, seguindo para o sul ao longo da Trilha dos Apalaches.

Hoje, o Priest Shelter é um símbolo da cultura da Trilha dos Apalaches, que é repleta de humor e tradição. Uma parada nesse destino não apenas oferece aos caminhantes um alívio do terreno desafiador, mas também um vislumbre da vida das pessoas com quem compartilham a trilha – quer estejam preparados para isso ou não.

*Mary Beth Skylis escreve para a Backpacker.