Criar filhos é um ato arriscado por natureza. Mas, em vez de nos deixarmos levar por histórias sobre tudo o que pode dar errado, talvez a melhor coisa que possamos fazer seja incentivar nossos filhos a gerenciar riscos e desenvolver independência.
Quando ouvi a notícia de que uma mãe foi presa na Geórgia (EUA) por conduta imprudente depois que alguém viu seu filho de 10 anos caminhando sozinho a menos de 1,5 km de casa, a primeira coisa que fiz foi abrir o Google Maps. Olhei a distância entre minha casa e uma escola próxima que minha filha de 6 anos às vezes frequenta a pé com uma amiga da mesma idade. Elas adoram brincar no parquinho da escola sem adultos por perto, e eu aproveito a liberdade de ter a casa só para mim por meia hora.
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Ainda assim, fico aliviada toda vez que ouço a voz da minha filha se aproximando da entrada de casa depois de uma dessas mini-aventuras – que, de acordo com minha pesquisa no Google Maps, não ultrapassa 800 metros ida e volta. Meu alívio não vem tanto da preocupação de que algo realmente possa acontecer com ela, mas da possibilidade de um vizinho ou transeunte me julgar negligente por deixá-la ir sozinha até o parquinho.
Mesmo antes da história da mãe da Geórgia viralizar, eu já havia ouvido relatos semelhantes: uma mãe do Texas algemada e presa durante a noite por fazer seu filho de 8 anos caminhar 800 metros até em casa; irmãos em Maryland detidos por quase seis horas pela polícia por brincarem sozinhos em um parquinho.
Cada vez que uma dessas histórias ganha as manchetes, o público norte-americano perde a cabeça. Pessoas de todos os lados do espectro político ficam igualmente indignadas, concordando (pela primeira vez) que a cultura de superproteção parental foi longe demais. Os mesmos comentários ecoam pela internet: “Quando eu era criança, meus pais não ligavam onde estávamos, desde que voltássemos quando os postes acendessem!” Ou: “Quando eu tinha essa idade, ia para casa sozinha e cuidava dos meus irmãos mais novos!”.
Os pais que conheço na vida real são igualmente a favor de dar liberdade aos filhos e horrorizados com a ideia de que possamos ser punidos por isso. Uma amiga imprimiu e plastificou uma “Licença para Brincar” para sua filha de 8 anos levar consigo. Se algum cidadão preocupado tentar intervir, a criança pode apresentar o cartão, que inclui o número dos pais e informa que ela não está perdida nem sendo negligenciada.
Minha cunhada, por sua vez, me contou que dois de seus filhos, de 15 e 8 anos, estavam recentemente voltando da biblioteca quando uma senhora parou o carro ao lado deles, implorando para que entrassem para que ela os levasse para casa. A mulher estava tão angustiada com o que percebia como comportamento arriscado das crianças que achou melhor pedir que entrassem no carro de uma desconhecida do que deixá-los caminhar sozinhos por uma rua suburbana familiar em plena luz do dia.
Embora lapsos de julgamento assim sejam bem-intencionados, as chances de uma criança ser sequestrada ou atropelada são extremamente baixas nos Estados Unidos – e certamente menores do que eram nos anos 80 e 90, quando eu era criança. No entanto, em parte porque os relatos da mídia tendem a amplificar a violência e a tragédia, esses incidentes parecem mais comuns do que realmente são, levando algumas pessoas a superestimarem o risco de crianças agirem de forma independente.
Anedoticamente, muitas das pessoas preocupadas com crianças modernas andando ou brincando sozinhas parecem ser de gerações mais velhas que a minha, que cresceram com ampla liberdade, mas talvez tenham assistido a muito CSI desde então. Meus colegas – em sua maioria Millennials – têm lido muitos artigos exaltando os benefícios de desenvolvimento de deixar os filhos gerenciarem riscos e construírem independência, e muitos de nós tentamos encorajar essas práticas.
Um estudo de 2023 meio que confirma isso, revelando que apenas 28% dos pais Millennials estão “muito preocupados” com o sequestro de seus filhos nos EUA. O mesmo estudo constatou que pais negros e hispânicos se preocupam muito mais do que pais brancos ou asiáticos com a possibilidade de seus filhos serem baleados, o que reflete tendências demográficas da violência armada e destaca que criar filhos livres é um privilégio de quem vive em lugares relativamente seguros.
Pessoalmente, me preocupo mais com as repercussões sociais ou legais de deixar minha filha explorar a vizinhança sozinha do que com a possibilidade de alguém sequestrá-la. Mas e se minhas preocupações forem tão exageradas quanto as da mulher no carro que tentou impedir meu sobrinho e minha sobrinha de voltarem para casa? Lenore Skenazy, que cunhou o termo “criação livre” e cofundou a ONG de independência infantil Let Grow, enfatiza que é extremamente raro os pais enfrentarem ações legais por deixarem os filhos brincarem ou caminharem sozinhos – tão raro que, quando acontece, vira notícia nacional.
Em outras palavras, assim como o risco de uma criança ser sequestrada é minúsculo nos EUA, também é a chance de alguém chamar a polícia porque deixei minha filha de 6 anos explorar ao ar livre com uma amiga – especialmente agora que mais estados estão aprovando leis sobre criação livre.
Criar filhos é um ato de risco. O mundo nunca foi nem será totalmente seguro. Mas, em vez de nos deixarmos levar por histórias sobre tudo o que pode dar errado, talvez o melhor que possamos fazer por nossos filhos e por nós mesmos seja focar em tudo o que ainda está bem – como minha filha, pulando pela entrada de casa com sua melhor amiga, as bochechas coradas de frio e empolgação, voltando para casa exatamente quando os postes se acendem e eu tiro um jantar quentinho do forno.
*Outside USA