Como as recompensas nutricionais funcionam?

Por Bianca Vilela*

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Foto: prostock_studio / Shutterstock.

As pesquisas científicas têm lançado luz sobre como os alimentos que consumimos podem influenciar o cérebro e comportamentos relacionados à alimentação.

Um estudo publicado na revista Cell, em 2023, revelou um aspecto intrigante desse fenômeno: refeições ricas em carboidratos e gorduras, mas com baixo teor de proteína, promovem picos expressivos de dopamina, ativando intensamente o sistema de recompensa cerebral.

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A dopamina é um neurotransmissor crucial no controle de prazer e recompensa no cérebro. Quando consumimos alimentos que provocam sua liberação, como aqueles ricos em açúcares e gorduras, sentimos uma sensação imediata de satisfação. Isso pode levar a um ciclo de busca constante por esses alimentos, um comportamento que se assemelha ao vício. A pesquisa demonstrou que esse pico de dopamina é muito mais intenso quando carboidratos e gorduras são consumidos juntos, em comparação com alimentos que contêm proteínas.

Esse mecanismo neuroquímico é semelhante ao que ocorre em dependências químicas, como as provocadas por drogas. Isso sugere que determinados alimentos, especialmente os ultraprocessados, podem ter efeitos profundos e prejudiciais sobre o cérebro. O estudo publicado na Cell destaca que, embora a resposta à dopamina também ocorra em outras situações de prazer, a combinação de carboidratos e gorduras parece criar um impacto desproporcional e altamente viciante.

Por outro lado, alimentos ricos em proteínas, como carnes, peixes e leguminosas, não provocam o mesmo tipo de pico na dopamina. Isso pode explicar por que alimentos proteicos tendem a ser mais saciantes e menos propensos a induzir o consumo compulsivo. A diferença na resposta do cérebro a esses diferentes tipos de alimentos reflete como os macronutrientes interagem de maneiras distintas com nossos circuitos de recompensa.

Isso é preocupante?

Os efeitos comportamentais dessa descoberta são alarmantes. Alimentos com altos teores de açúcar e gordura, muitas vezes presentes em produtos industrializados, podem incentivar o consumo excessivo e comportamentos compulsivos, já que nosso cérebro continua buscando aquela recompensa prazerosa proporcionada pela dopamina. Essa busca constante por prazer alimentar pode contribuir para o aumento de casos de obesidade, diabetes e outras condições de saúde relacionadas à alimentação desregulada.

Além disso, a disponibilidade e o marketing de alimentos ultraprocessados com essa combinação específica de macronutrientes ampliam o problema. Em sociedades modernas, esses alimentos são acessíveis, baratos e frequentemente promovidos como opções rápidas e convenientes. Isso cria um ambiente em que é cada vez mais difícil manter padrões alimentares saudáveis, especialmente quando o próprio cérebro está programado para desejar mais e mais desses alimentos.

O estudo também levanta questões sobre como o cérebro de pessoas que apresentam padrões alimentares compulsivos ou dependência alimentar pode estar alterado. Essas pessoas podem ter uma resposta dopaminérgica ainda mais acentuada ao consumo de alimentos ricos em carboidratos e gorduras, tornando ainda mais desafiador interromper o ciclo de alimentação descontrolada.

Essa pesquisa reforça a importância de uma dieta balanceada, rica em proteínas e moderada em carboidratos e gorduras, para evitar esse impacto neurofisiológico negativo. Focar em alimentos naturais, não processados, é uma estratégia eficaz para minimizar a estimulação excessiva do sistema de recompensa cerebral e prevenir o desenvolvimento de comportamentos alimentares problemáticos.

A combinação de carboidratos e gorduras pode ter um impacto significativo no cérebro, desencadeando respostas de recompensa que podem levar a padrões alimentares compulsivos. É fundamental compreender esses mecanismos para a promoção de hábitos alimentares saudáveis e o combate às epidemias de obesidade e doenças metabólicas que assolam as sociedades modernas.

*BIANCA VILELA é autora do livro Respire, palestrante, mestre em fisiologia do exercício pela Unifesp (Universidade Federal de São Paulo) e produtora de conteúdo.
Desenvolve programas de saúde em grandes empresas por todo o país há quase 20 anos. Na Go Outside fala sobre saúde no trabalho, produtividade e mudança de hábitos. Não deixe de visitar o Instagram: @biancavilelaoficial.