Até não muito tempo atrás, a relação da maioria das pessoas com a escalada era distante. Longe dos olhos do público, era preciso conhecer alguém que indicasse o “caminho das pedras” ou um ginásio indoor – algo raríssimo há algumas décadas. A escalada não estava nos meios de comunicação convencionais, não era lembrada como um boa atividade recreativa para crianças, e não aparecia com frequência entre as alternativas de lazer ou de profissionalização de pessoas interessadas em escolher um esporte para chamar de seu.
Mas o sucesso de figuras como Alex Honnold, estrela da escalada mundial que levou o documentário Free Solo ao Oscar, combinado ao imenso alcance dos seus feitos nas redes sociais, foi o primeiro impulso para um salto histórico, que teve seu ápice com a entrada da escalada esportiva nas Olimpíadas de Toquio 2020, ao lado de modalidades como o surf e o skate. A partir daí o cenário mudou e a prática da escalada ganhou um novo status, refletido no crescimento e popularização da modalidade ao redor do globo.
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Por aqui não foi diferente e, desde 2020, novos ginásios não param de pipocar pelo país, empresas começam a investir no esporte – também como ferramenta de inclusão social – e jovens atletas brilham em competições internacionais. Como reflexo disso, existem cada vez mais praticantes recreativos que adotaram a escalada como estilo de vida na modalidade indoor (academias, ginásios e clubes) ou outdoor (ao ar livre, rochas e montanhas).
Em Paris 2024, o Brasil vai para o seu segundo ciclo olímpico sem nenhum representante na modalidade, apesar de bons resultados recentes em mundiais juvenis, sul-americanos e pan-americanos, além de nomes da nova geração que contam com campeonatos nacionais fortalecidos e uma estrutura moderna oferecida pela CBEscalada (Confederação Brasileira de Escalada Esportiva, antiga ABEE) para se desenvolver no esporte.
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Nesta Olimpíada, mais de 20 nações conseguiram colocar atletas no torneio, enquanto o Brasil não alcançou os resultados necessários para a classificação. O país não obteve vagas via o Pan-Americano de Santiago em 2023 e também não conseguiu levar atletas para a disputa do Olympic Qualifier Series, os últimos eventos que marcam pontos para o ranking classificatório.
Por ser um esporte olímpico novo e ainda em fase de crescimento no Brasil, é natural que o país tenha dificuldades para levar atletas para os Jogos. No entanto, a modalidade vem alcançando resultados expressivos em competições internacionais recentes e alguns atletas começam a se destacar, como Rodrigo Hanada, Felipe Ho, Anja Kohler, Bianca Castro, Samuel Silva, Pedro Egg, Laura Timo e Mariana Hanggi, só para citar alguns.
Assim, a esperança de classificação segue para os próximos ciclos olímpicos.
O maior nome da escalada esportiva brasileira
Em 2013, Cesar Grosso decidiu fixar residência em Arco, na Itália, um dos principais centros da escalada no mundo. Grande ídolo da escalada esportiva no Brasil, ele anunciou a aposentadoria das competições em 2020, mas pouco antes disso seus treinos ganharam um novo significado: tentar conquistar uma vaga para o Brasil na estreia da escalada nos Jogos de Tóquio, o que ele considera um marco fundamental neste novo ciclo do esporte.
“A entrada da escalada nas Olimpíadas foi um grande passo. Claro que não foi apenas isso que ajudou a popularizar o esporte, mas foi o maior incentivo da última década”, diz Cesinha. “Muita gente achava que o esporte era só em rocha, que era preciso passar perrengue, sair com a mão sangrando. Mas viram que pode ser algo muito mais dinâmico e divertido, seja fisicamente – já que é um mega exercício – ou socialmente, porque é um esporte que você pratica entre amigos. Isso ajudou muito a difundir o esporte. Acho que sem as Olimpíadas seria bem mais difícil mostrar ao mundo como a escalada pode ser legal e interessante do ponto de vista físico, social e econômico”, comenta o escalador.
Oficialmente aposentado das competições, Cesinha agora passa o bastão e o sonho de ver o Brasil entre os grandes atletas olímpicos para nomes da nova geração, como Felipe Ho. O paulistano já é 16 vezes campeão brasileiro e também o mais jovem escalador do país a realizar ascensões de boulder graduados entre V10 e V14.
Quando começou a subir as primeiras paredes, Ho só encontrava duas opções de ginásios para treinar em todo estado de São Paulo. Agora são mais de três só na capital paulista e vários outros nas cidades ao redor, sem contar os amigos que já possuem paredes construídas em casa. “Antes eu estava acostumado a chegar para treinar e conhecer todo mundo ali; agora não conheço mais ninguém”, brinca. “Tem sempre rostos novos nas academias, pessoas me perguntando se sou da seleção, e isso é muito legal”, destaca o atleta.
Neste novo ciclo da escalada, agora como esporte olímpico, Felipe recebe apoio para viajar ao exterior e evoluir ao lado dos maiores escaladores do mundo. Ele também conta com patrocínio de empresas, e ainda tem à disposição a estrutura de ponta do Centro de Treinamento do COB, no Rio de Janeiro.
“No passado a gente basicamente não tinha nenhum campeonato nacional. Só depois da fundação da ABEE, em 2014, é que passamos a ter um motivo para treinar. Os atletas no Brasil, que antes estavam perdidos e não tinham estímulos para treinar – a não ser um desafio pessoal na rocha, no outdoor –, agora têm um campeonato cada vez mais profissionalizado”, diz Felipe. “Depois que a escalada entrou nesse ciclo olímpico melhorou ainda mais; a gente tem muitas vantagens por conta disso e há muito mais empresas apoiando”, completa.
Matéria adaptada da reportagem “O Caminhos das Pedras”, publicada na edição 174 da revista Go Outside.