Conhecido como “Iceman”, o brasileiro Djalma Gomes de Moura, 65 anos, embarcou rumo ao seu grande sonho no último mês de maio: concluir a Maratona do Everest.
O evento foi criado em 2003, em comemoração à primeira conquista do cume do Everest por Tenzing Norgay e Edmund Hillary, no dia 29 de maio de 1953.
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Desde então, a Tenzing-Hillary Everest Marathon reúne participantes de todo mundo para enfrentar baixíssimas temperaturas do Himalaia a 5.364 metros de altitude. São 42 km até a cidade de Namshe Bazaar.
Cerca de 150 atletas do mundo todo participaram da prova, dentre eles apenas três brasileiros. “Essa expedição, ao campo base do Everest, para fazer a maratona mais alta do Planeta, realmente me surpreendeu bastante”, conta Djalma.
“A viagem o durou ao todo 23 dias. Pousamos em Lukla – aeroporto considerado um dos mais perigosos do mundo. Era só montanha de um lado e do outro, mas conseguimos aterrissar bem”, relata o corredor.
“A partir daí, foi um trekking que eu realmente não fazia ideia da intensidade. Nós fizemos um caminho bem mais intenso e difícil, que foi o caminho da Extreme Marathon. Então, fomos ziguezagueando na encosta da montanha, subindo cada vez mais, realmente pontos bem perigosos, o risco de uma queda existia a todo instante”, relembra Djalma.
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A preparação
Atleta sênior, Djalma começou a treinar somente aos 50 anos, porém, nada o impediu de acumular grandes e desafiadoras experiências. Iceman foi o primeiro brasileiro e sul-americano com mais de 60 anos a concluir as provas mais extremas ao sul e ao norte do Planeta.
“Na Antártida me tornei o atleta mais rápido do mundo (61+) na prova Antarctic Ice Marathon. Também fui o primeiro brasileiro, com mais de 60, a concluir sete maratonas nos sete continentes em sete dias consecutivos”, conta com orgulho.
Para continuar superando os próprios limites, o atleta mantém uma rotina de treinos bastante regrada: Djalma acorda às 4h30 e procura correr de quatro a cinco dias na semana. Antes de provas como a Maratona do Everest, ele intensifica ainda mais os treinamentos.
“Tudo tem que ser bem calculado para que eu possa ter o maior rendimento possível. Corro 80 km para maratonas e, para essas provas específicas, em torno de 120 a 150 km por semana. As horas de treino variam. No ‘longão’ – que faço no final de semana, um treino de volume, chego a 32 km. Durante a semana, são treinos de 1h30, mais leves”, relata.
A prova
Na Maratona do Everest, Djalma Moura sabia que o nível de esforço seria alto, mas não tinha ideia realmente do quão grande seria.
“Eu acho que o que me manteve de pé durante o tempo todo foi a hidratação e muita comida. Procurava descansar também, na medida do possível. É preciso estar preparado para o frio, calor, vento, neve, chuva. Também é necessário levar alguns alimentos na mochila porque você pode estar distante de um alojamento ou algum lugar onde você possa comer alguma coisa”, explica.
“Apesar do nosso percurso ter exigido de mim um esforço realmente grande, estou muito satisfeito, eu acho que o meu desempenho foi bom. Estou muito feliz por ter conseguido. É uma vitória ter concluído essa prova – a sensação é maravilhosa, de realização de um sonho. Completei esse ciclo, o que me deixa mais forte para outras campanhas. E se eu, com 65 anos, consegui realizar esse sonho, qualquer um consegue. Basta acreditar, fazer um bom planejamento físico e financeiro e ser disciplinado. Estou há três anos tentando. A pandemia não permitiu no primeiro ano, nem o segundo, mas, felizmente agora foi possível e eu consegui realmente concluir e estou muito feliz por ter alcançado”, conta.
“A recepção também foi maravilhosa, o povo sherpa tem um carinho muito grande pelo turista, mas a estrutura dos alojamentos é bem precária. O banho é difícil, às vezes não tem, você tem que sair para um banheiro externo em baixíssimas temperaturas. E a passagem por todos esses lugares faz parte da aclimatação. É preciso realmente ir subindo e concluindo o trajeto, passo a passo, para que o que o corpo vá se adaptando, se não, você não consegue chegar lá e fazer a prova. A internet é bem precária e tudo é pago. Para carregar o aparelho celular, você tem que pagar”, relembra.
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Recordes extremos
Djalma sempre gostou de atividades ao ar livre, mas só conseguiu iniciar sua história como maratonista aos 50 anos. Ele começou a treinar sozinho, tomou gosto pela prática e resolveu procurar uma assessoria esportiva para aperfeiçoar e se preparar para as competições. Treinou um ano para a São Silvestre e, a partir daí, não parou mais.
“Não me lembro ao certo quando, mas vi um dia na televisão um repórter falando sobre uma corrida na Antártida e isso ficou martelando em minha cabeça por muito tempo. Comecei a me preparar para isso e resolvi correr a Antarctic Ice Marathon”, destaca Iceman.
A vontade era tanta que ele chegou a treinar em câmara frigorífica, a -25º C, para testar e acostumar o corpo às baixas temperaturas e fazer testes com os equipamentos, roupas especiais e suplementos alimentares que levaria durante as provas no gelo. “Eu tinha que saber como meu corpo iria se comportar, se os géis para alimentação iriam congelar na roupa, por exemplo. Foram treinamentos muito interessantes.”
Em 2017, Djalma saiu do Brasil e chegou de avião cargueiro à Antártida. “Apenas como referência, a Estação Comandante Ferraz fica a 1.000 km da costa continental da América do Sul e nós entramos 3.000 km. A sensação térmica era -30°C.”, narra.
Quatro meses depois da Maratona na Antártica, ele participou de mais um evento congelante: a Maratona no Polo Norte. “Fiz a prova em um bloco de gelo flutuando no mar. Embaixo dos meus pés tinha uma camada de gelo de 1,80m. Eram quilômetros de lâmina d’água. E essa placa quebrou depois. Mas conseguimos sair de lá de avião”, relembra.
Nove meses depois, ele deu a volta ao mundo fazendo sete maratonas consecutivas, em sete continentes, durante sete dias. Toda recuperação de uma corrida para outra foi feita dentro de um avião, que parecia um hospital. Foram 40 atletas do mundo todo. “Eu fui o único da América Latina. Além das corridas, eu tinha que passar pela fiscalização em cada aeroporto, abre e fecha mala. Toda essa parte que o viajante tem, eu também passei.”
“Acredito também que minha profissão (Djalma é engenheiro de Minas há 40 anos) colaborou, de alguma forma, para que eu buscasse esses cenários inusitados das minhas corridas. Eu já desci em mina subterrânea de carvão, onde o ambiente é extremamente inóspito. Ali, tem gases da própria camada do carvão, gases explosivos – na época o carvão era tirado dessa maneira. O ambiente tem muito pó em suspensão, uma pedra pode cair a qualquer instante, há muita umidade, então, eu aprendi a trabalhar nesses ambientes e a me proteger. Então eu pensei: isso vai ser útil para mim mais tarde. E terminou acontecendo nas provas extremas”, finaliza o brasileiro.
Para acompanhar a rotina do maratonista, siga o perfil @djalma.iceman no Instagram.