Outubro Rosa: Como o esporte ajudou essas mulheres a enfrentarem o câncer de mama

Por Redação

Deborah, Marisa e Jade foram diagnosticadas com câncer de mama, mas encontraram no esporte uma maneira de encarar a doença. Foto: Reprodução.

A prática de exercícios físicos é importante na prevenção de certa doenças, mas não só isso: uma vida ativa também pode ser chave depois do diagnóstico e durante o tratamento.

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Pelo menos é o que ensina a história de Jade Borges, Marisa Kumimatsu e Deborah Aquino, três mulheres que sempre tiveram o esporte na rotina e acabaram diagnosticadas com câncer de mama.

No relato abaixo, feito especialmente para o mês especial do Outubro Rosa na Go Outside, elas contam como o esporte ajudou a superar o duro tratamento, além de falarem sobre a importância da conscientização e exames de prevenção à doença.

Jade Borges
Arquiteta e Urbanista
38 anos

Foto: Arquivo Pessoal / @jadeborges.

“Durante meu processo encontrei essa frase que me fez ter força e enxergar um sentido para tudo aquilo: ‘Para renascer é preciso morrer.”

“Descobri com 33 anos, em novembro de 2016, ainda no estágio inicial. Diz o médico que poderia ser entre 1 e meio a 2 anos que eu estava com câncer de mama. Mas ainda assim era inicial. Por eu ter a mama pequena, além do lugar e formato, os médicos decidiram por retirar toda a mama esquerda, mas preservaram o mamilo e pele. Não me colocaram em tratamento, apenas acompanhamento constante.

O esporte sempre foi meu lugar de desafios e prazer ao mesmo tempo. Sempre foi meu reflexo de como sou verdadeiramente e de lá me enxergo e tiro meus aprendizados. E durante o câncer não foi diferente. De quando descobri, até operar, era o esporte que me trazia distração e tranquilidade. Durante as recuperações eu sempre pedia ao médico me liberar para voltar. Tanto que precisei fazer uma troca de prótese porque desloquei uma surfando. Quando finalmente voltei, mesmo contrariando o médico, eu me vi diferente, voltei com calma e atenção. Ou seja, o que sou no esporte sou eu de verdade, como sinto, como penso, como ajo, enfim.

Quando veio o diagnóstico pensei em como somos suscetíveis a tudo, coisa que eu não enxergava nos riscos que passava no esporte. Senti que eu era de uma forma materializada, uma ciência comprovada sobre a teoria da seleção natural de Darwin. Senti o peso da morte como havia sentido outras vezes me afogando no mar. Mas, mesmo assim, lá dentro, eu sabia que eu ia passar dessa. Em todas as ocasiões, sempre soube.

Pedi que minhas amigas fizessem os exames. Tive outra amiga com um câncer mais grave na mesma idade também. Digo que não podemos negligenciar nosso único bem, que é o nosso corpo, o que nos faz ser vivo e o que nos move.

Durante meu processo encontrei essa frase que me fez ter força e enxergar um sentido para tudo aquilo: ‘Para renascer é preciso morrer’. Que fosse por mais um dia ou anos de vida, cada renascimento é um presente, cada dia de acordar, de praticar o que ama, é um presente de vida. E o que amamos – e principalmente quando sonhamos com o que amamos – é o que nos dá força pra iniciar dias difíceis e seguir. Se o esporte te leva pra essa sensação de amor, então é lá que se deve estar.”

Marisa Kumimatsu
Psicóloga e triatleta amadora
54 anos

Foto: Arquivo Pessoal / @marisakumimatsu.

“Chorei intensamente por dois dias, até que um dia parei e pensei: eu tinha duas escolhas… enfrentar ou desistir.”

“Descobri o câncer em 13 de janeiro de 2018, através do auto-exame que faço durante o banho. Percebi um caroço e avisei meu marido, que é médico radiologista. Marcamos com ele pra fazer o ultrassom alguns dias depois e o resultado saiu em uma sexta-feira, dia 19.

Foi difícil porque meu marido que fez todo o exame e ele teve que me avisar. Era um carcinoma de aproximadamente 4 centímetros na mama esquerda, receptor hormonal positivo e HER-2 negativo. Fui submetida à segmentectomia da mama em 14 de fevereiro daquele ano.

De abril até agosto fiz o tratamento com quimioterapia adjuvante com esquema TC, seguido de radioterapia adjuvante de mama por 30 dias. Em outubro de 2018 iniciei o tratamento com hormonoterapia adjuvante com Tamoxifeno, com prazo de 10 anos.

Pratico esporte desde criança, meus pais sempre me incentivaram. Durante o tratamento eu continuei firme nos treinos de triatlo, e tive muito apoio da assessoria Spadotto. Nós ajustávamos o volume e a intensidade de acordo com a minha percepção de esforço, até para não cair muito a imunidade.

Eu fazia quimio em uma segunda-feira e no dia seguinte já estava na academia treinando.
Meu oncologista, Dr. Buzaid, sempre me incentivou na prática de esportes durante o tratamento e acredito que isso foi essencial para ter poucos efeitos colaterais durante a quimio. Foram praticamente dois anos de muita paciência e persistência para eu voltar.

Eu tinha realizado um sonho de participar do Ironman IM70.3 Rio em outubro de 2017 e já estava me preparando para a prova Triathlon Internacional de Santos, que seria em fevereiro de 2018. A descoberta foi um balde de água fria, meu mundo desabou. E foi um ano em que minha filha estava realizando seu sonho, um intercâmbio nos EUA, não falei pra ela. Meu medo era morrer sem vê-la pela última vez. Chorei intensamente por dois dias, até que um dia parei e pensei: eu tinha duas escolhas… enfrentar ou desistir. Então resolvi enfrentar de cabeça erguida e nunca deixei que ela me dominasse. O controle mental e a vontade de viver foi mais forte.

Deletei a palavra câncer dos meus pensamentos e para mim era outra doença qualquer, nunca mais pensei que eu estava com câncer. Pensava em outras coisas que me faziam feliz – e uma delas era o esporte.

O câncer é uma doença silenciosa que ataca os órgãos do corpo pouco a pouco, mas não consegue destruir o sonho de quem luta pela vida. Na minha rotina de exames, em maio de 2020, descobri outro nódulo na mama direita, mas desta vez é benigno… Foi um alivio, mas é preciso acompanhar anualmente. A prevenção ajuda no diagnóstico precoce da enfermidade, e o auto-exame foi o que me salvou.

Além disso, o esporte, o apoio dos amigos e familiares foi muito importante e até hoje são os meus melhores aliados.”

Deborah Aquino
Especialista em desenvolvimento humano
37 anos

Foto: Arquivo Pessoal / @debsaquino.

“Penso que não podemos dar uma pausa na vida toda vez que uma coisa ruim acontece. O que sempre digo é: não é uma situação normal, agradável, porém, você pode continuar sonhando, fazendo o seu esporte preferido”.

Percebi este nódulo em abril de 2013. Quando fiz a biópsia em um laboratório (apesar de meu médico ter recomendado um hospital) o resultado deu ausência de células malignas. Mesmo assim fiquei super encanada até que, em dezembro de 2013, resolvi fazer outra biópsia no mesmo nódulo, o que confirmou que era câncer de mama.  Operei em 27 de dezembro, fiz a mastectomia bilateral. Como já tinha metástase nos linfonodos, tive que fazer quimioterapia durante seis meses para depois tomar o Tamoxifeno até 2018. Agora faço só o controle.

O esporte entrou na minha vida já um pouco tarde, apesar de uma infância ativa, eu parei com tudo quando fui fazer faculdade em Bauru. Só voltei realmente a fazer esporte quando saí da faculdade, porque estava muito acima do meu peso. Já a corrida entrou na minha vida em 2004, quando separei do meu primeiro marido. Uma amiga me chamou para fazer uma prova de 10 km e me apaixonei. Então costumo dizer que a corrida sempre foi um elemento meio que salvador na minha vida. Foi através dela que também conheci o Fabio, que é meu atual marido. Depois, quando engravidei, eu corri até os 8 meses da gestação. Quando a Duda nasceu eu voltei a correr logo depois, então foi ótimo pra cabeça, pra eu voltar ao meu papel de mulher depois da maternidade.

Durante o meu tratamento de quimioterapia eu corri durante uns três meses e depois parei, mas aí fiquei fazendo bicicleta e natação. Então sempre digo que o esporte que me salva, nos momentos que estou ali mas depressiva, ou passando por um algum problema de saúde. E depois do câncer, sem dúvidas, ele tornou-se algo com um valor inegociável. Eu não deixo de fazer, não abro mão do esporte de jeito nenhum. Ele não garante que eu não vá ter nada, mas me ajuda na questão da prevenção. Meu médico sempre fala isso, que talvez eu tenha encarado o tratamento de uma maneira muito melhor por praticar esportes.

Outra coisa que sempre falo nas minhas palestras é que o câncer não é uma sentença de morte, mas quando a gente recebe a notícia é sempre a pior sensação do mundo. Acho que isso te traz uma percepção de vida muito diferente, algo como uma escassez de vida. Hoje quando acordo eu agradeço por mais um dia, e quero fazer valer cada momento com minha família e meus amigos. Acho que quando você passa por uma situação assim vem esse peso da sentença de morte, só que você pode ressignificá-lo. Então acho que foi isso que fui fazendo ao longo do meu tratamento. Ao invés de contabilizar problemas eu contabilizava bençãos. Depois disso veio uma virada de chave. Acho que a gente tem que fazer valer todos os dias que vivemos.

Na época, por causa do meu Instagram, conheci muitas mulheres que tiveram câncer de mama. E ouvi muitas histórias de algumas que estavam com nódulo há dois, três, quatro anos e não tinham coragem de ver o que que era. Então, o que disse e ainda digo para todas é o seguinte: coloca na agenda uma vez por ano para fazer os exames. Acho que meu caso só não foi pior porque realmente fui atrás e foi um diagnóstico precoce no sentido de ser um tumor pequeno, mas mesmo assim eu já tinha seis nódulos malignos. O diagnóstico precoce é muito importante pra não termos uma mortalidade por causa do câncer de mama. Tem tratamento, existe recurso para poder bloquear o tumor, mas o diagnostico precoce é realmente muito importante.

Para quem enfrenta o diagnóstico de câncer de mama, penso que não podemos dar uma pausa na vida toda vez que uma coisa ruim acontece. O que sempre digo é: não é uma situação normal, agradável, porém, você pode continuar sonhando, fazendo o seu esporte preferido. Eu lembro que meu médico falava isso, para eu tentar manter a rotina ao máximo para passar por essa fase de transição de uma forma mais leve.”