No sábado, 26 de junho, 184 pilotos começaram o Tour de France: oito para cada uma das 23 equipes participantes. Entre os 184 (que entretanto diminuíram um pouco devido a quedas e outros problemas) estava Lachlan Morton, um ciclista australiano de 29 anos contratado pela EF Education-Nippo, uma das 23 equipas em competição. Mas Morton está correndo o Tour de France de um jeito diferente: sozinho, em uma versão pessoal e alternativa, mas que é tão competitiva quando a prova profissional. De alguma forma, ele se aproxima do nascimento do ciclismo épico do início do século XX.
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O Tour de France terá 21 etapas a serem disputadas ao longo de três semanas, num total de 3.383 quilômetros este ano. O Tour de France alternativo que Morton está pedalando por conta própria segue exatamente a rota do Tour oficial, mas acrescenta várias centenas de quilômetros de conexão entre as várias etapas que os ciclistas farão viajando de ônibus ou avião. Morton fará absolutamente tudo de bicicleta. Batizado de “Alt Tour”, o percurso terá 5.500 quilômetros, com mais de 65.000 metros de altimetria acumulada, cerca de 12.000 a mais do que no Tour real.
Além disso, Morton estabeleceu como meta chegar à Champs Élysées em Paris – ponto de cheada do Tour de France há vários anos – antes dos ciclistas do Tour de France oficial.
Por enquanto, “Morton Tour” está mais de cem quilômetros à frente do Tour de France. Depois de deixar Brest, a cidade de partida da primeira etapa, cerca de uma hora depois dos ciclistas para não ficar preso na longa caravana que segue o grupo em cada etapa, Morton conseguiu se recuperar e ganhar terreno ao pedalar mais devagar, mas por mais tempo. Ele começa muito mais cedo do que o Tour real e quando os ciclistas do Tour estão tomando banho, fazendo massagem e jantando, ele ainda está pedalando – cerca de 10 horas por dia.
O desafio é monstruoso: ele vai precisar tirar a diferença de centenas de quilômetros. Entre a vigésima e a vigésima primeira e última etapa, por exemplo, o Tour de France terá uma transferência aérea de cerca de 700 quilômetros de Bordeaux a Paris. Os ciclistas do Tour farão em algumas horas; Morton fará pedalando, em alguns dias.
Não bastando tudo isso, ele fará a viagem em estilo randonée, como nas provas tipo Audax. A alimentação será comprada em padarias e mercearias pelo caminho – ele talvez de vez em quando se dê ao luxo de “um cerveja ou um copo de vinho “. Ele vai levar em bolsas de bikepacking barraca e fogareiro, além de kit de ferramentas para a bike. Ele pode optar por dormir em algum hotel caso o tempo esteja desfavorável esteja muito cansado. A bike com os equipamentos terá 20 kg de peso – mais que o dobro do peso das bicicletas de corrida de quem faz um Tour de France.
Morton é um ciclista profissional com uma personalidade atípica, dada a desafios outdoor que fogem das provas mainstream. Ele já venceu algumas etapas no Tour de Utah e terminou em 111º lugar um Giro d’Italia, mas alterna estas passagens com desafios em gravel e ultraciclismo. Ele já participou da mítica Dirty Kanza nos Estados Unidos e da Badlands, na Espanha. Nesta última, percorreu 700 quilômetros em 44 horas, sem dormir. Outro pedal épico foi com seu irmão, na Austrália, por mais de 2.000 mil quilômetros, de Port Macquarie, onde ele nasceu, para Uluru, no centro do país. Por alguns dias em 2020, Morton também foi o detentor do recorde mundial Everesting. Ele cumpriu os 8.848 em menos de sete horas e meia.
No desafio atual, Morton já disse em entrevistas que busca recriar, pelo menos em parte, o espírito das origens do ciclismo. Disse ainda que a ideia de fazer algo semelhante nasceu no Giro 2020. Sua própria equipe propôs implementar o plano do Tour. Patrocinadores à parte, Morton está se saindo bem nas atividades beneficentes ligadas ao projeto, que incluem a doação, por meio da organização sem fins lucrativos World Bicycle Relief, de centenas de bicicletas para quem precisar.
Nem Morton está seguro de dar conta da façanha, e ainda de fazê-lo mais rápido do que o Tour de France. De acordo com as estimativas de Morton, para ir de Brest a Paris seguindo a rota do Tour de France e pedalando em todas as viagens que o Tour fará com trnasporte motorizado vez de pedalar, será necessário estar de bicicleta por pelo menos 238 horas em 23 dias. Para quem quer seguir seu progresso em um mapa especial e ficar atualizado sobre sua margem em relação ao outro Tour, este link tem todas as informações. Você também pode acompanhar o perfil social dele e de sua equipe e esperar até agosto, quando deverá ser lançado um documentário no canal do YouTube do Rapha – patrocinador técnico de sua equipe e, portanto, também do Alt Tour.