Alguns países já estão vivendo o “novo normal” pós-pandemia, em que as bikes tem um papel fundamental, por recomendação da própria ONU. “O ciclismo e a caminhada devem ser promovidos como uma alternativa ao transporte público, sempre que possível, para reduzir o risco de disseminação do vírus e melhorar a saúde da população em geral. Devem ser priorizados os deslocamentos de pedestres e ciclistas em determinadas vias, garantindo a sinalização adequada para maior segurança”, diz um documento da ONU Habitat.
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Na Europa, metrópoles como Milão e Paris estão investindo. As novidades vêm na forma de reforços na estrutura cicloviária, vouchers e bônus para compra de bikes novas ou reparo de bicicletas usadas. Várias cidades estão testando estruturas temporárias para melhorar o fluxo de pedestres e ciclistas, como fitas removíveis e sinais móveis para demarcar os espaços destinados a ciclistas.
Em Berlim, na Alemanha, um teste feito no final de março transformou duas pistas em ciclofaixas no bairro de Kreuzberg. Com o sucesso da medida, mais faixas foram revertidas em outros pontos da capital. Proposta parecida está rolando em Budapeste, capital da Hungria, onde pistas temporárias para bicicletas podem se tornar medidas permanentes. O incentivo teve efeito: durante a pandemia, houve uma redução no uso do carro ou transporte público.
Mas esta tomada de direção não é só nos países europeus. Bogotá, na Colômbia, anunciou em março a habilitação de 76 novos quilômetros de faixas destinadas a bicicletas, localizadas em vias existentes, mas separadas dos carros por cones. Com isso, o modelo mais invejável da América do Sul ganhou ainda mais pontos. Em resumo: mais de 100 cidades do mundo aderiram à recomendação de priorizar bicicleta e criaram estruturas temporárias.
Além disso, a “primavera das bikes” fez com que lojas pelo mundo todo tivessem estoques esgotados. Um “boom” na procura por bicicletas elétricas indica que novos públicos pretendem aderir às bicicletas. Objeto de desejo, a bike elétrica urbana VanMoof triplicou a produção para 10.000 bicicletas por mês – o modelo mais popular é vendido por 1.998 euros.
Brasil na contramão da “primavera das bikes”
Com zero medidas governamentais neste sentido, o Brasil pode ainda assim ter um algum crescimento no uso de bicicletas. A infraestrutura cicloviária teve uma expansão significativa na última década em metrópoles como São Paulo, Rio de Janeiro e Belo Horizonte. Durante a quarentena, a opção de muitas prefeituras foi por reduzir em vez de ampliar o transporte público. Com a reabertura, é possível que parte dos usuários migrem o quanto possível seus percursos para evitar aglomeração dentro de ônibus, metrô e trens.
Neste sentido, em São Paulo, 38% pretendem se deslocar mais a pé e 20% vão usar mais bicicleta após quarentena, de acordo com segunda rodada da pesquisa ‘Viver em São Paulo: Especial Pandemia’, realizada pelo Ibope Inteligência em parceria com a Rede Nossa São Paulo. A pesquisa foi feita entre 21 de maio e 1º de junho e traz dados sobre a experiência da pandemia de coronavírus e do isolamento social entre internautas no município de São Paulo das classes A, B e C da capital paulista a partir de 16 anos.
Na prática, a decisão de trocar o transporte público pela bicicleta continua sendo uma decisão individual. Apesar de ser eficaz para manter o distanciamento físico a baixo custo, evitar superlotação no transporte público, reduzir a poluição do ar e deixar a população mais ativa e saudável, a bike está sendo solenemente ignorada. O país está saindo de uma quarentena que não foi feita como deveria ter sido. As pessoas terão de retomar a rotina se expondo a altos riscos de contaminação sem sequer ter opções mais seguras.
Novos ciclistas, por conta própria
Mesmo assim, os números do setor indicam que a bike pode ganhar novos usuários. A quarentena causou uma baixa na produção pelo fechamento da indústria e da cadeia produtiva. Já em maio, o setor registrou um aumento de 50% nas vendas, na comparação com o mesmo período do ano passado. O dado vem da Associação Brasileira do Setor de Bicicletas (Aliança Bike), a partir de dados de uma pesquisa com 35 associados.
Estes resultados sinalizam um crescimento nas vendas depois da reabertura, já que o uso da bicicleta é um modo de evitar aglomerações em meio à pandemia do novo coronavírus. Seria o Brasil aderindo à “primavera das bikes” pós-pandemia? Longe disso. Estes incrementos no uso da bike serão sempre tímidos enquanto faltarem políticas públicas que incentivem e permitam à sociedade usar a bicicleta com um mínimo de segurança. Capitais com alta densidade populacional como São Paulo, Rio de Janeiro e Belo Horizonte sequer mencionaram projetos neste sentido. Com números descontrolados de contágios e mortes, pensar no “novo normal” movido a bicicletas parece um luxo inacessível para o Brasil.