É só acordar numa manhã ensolarada na reserva biológica de Huilo-Huilo, em plena selva da Patagônia chilena, para se sentir no melhor destino de aventura do mundo. Não que os dias claros sejam raros por lá, ou que a chuva dê à viagem um clima de lamentação. Mas é só o tempo dar uma ajudazinha que as opções ampliam-se, variando de uma simples “caminhada botânica” – cruzando rios e cachoeiras para desvendar a vida vegetal da floresta úmida e temperada – até um estafante trekking na neve rumo à cratera de dois vulcões.

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Huilo-Huilo está cercado pelos vulcões nevados Choshuenco e Mocho, que se destacam sobre as árvores e fazem a paisagem brilhar numa manhã de céu azul. Neltume, um pequeno povoado do estado de Los Ríos, é a porta de entrada pelo norte dessa região ao sul de Santiago do Chile. Lá as temperaturas variam entre 0ºC e 13ºC no inverno, mas podem facilmente passar dos 30ºC no verão. Entre Neltume e Puerto Fuy, um vilarejo na margem do lago Pirehueico, na divisa com a Argentina, são mais de 100 mil hectares de um bosque nativo que já sofreu com a extração de madeira nas décadas de 1970 e 1980, mas hoje é protegido graças a essa reserva biológica privada. O Huilo-Huilo oferece de área de camping a hospedagens climatizadas em cabanas ou hotéis luxuosos camuflados na mata, e também opera todas as atividades guiadas.

A seguir, uma amostra de como uma semana nesse lugar preservado, lindo e ainda pouco visitado pode ser muito bem aproveitada.

LINDEZA: Salto Huilo-Huilo

Dia 1: Trekking

Nada como chegar e se ambientar com o lugar. De cara, o melhor a se fazer é percorrer as trilhas da reserva Huilo-Huilo e receber pessoalmente as “boas-vindas” da selva patagônica. Há opções para todos os níveis: o trekking Truful (US$ 23) dura cerca de três horas e margeia o rio homônimo, que nasce do degelo do vulcão Mocho. A parada obrigatória é para observar a potente cachoeira Huilo-Huilo, de cerca de 15 metros de altura. Ainda é possível visitar uma caverna formada por rochas basálticas.

Já a trilha dos Espíritos é demarcada e chega a lugares que serviram de refúgio para os índios mapuche – os habitantes originais da Patagônia – durante os 300 anos de resistência contra os espanhóis. Uma visita guiada te colocará de frente às árvores endêmicas patagônicas, como coigüe, mañio e tepa, além da oportunidade de decifrar as espécies de liquens e cogumelos que se penduram nos troncos e colorem o bosque.

Dia 2: Mountain bike

 

Pampa Pilmaiquén

Leve sua bicicleta para a Patagônia. Se isso não for possível, alugue uma no centro de excursões da reserva. Os singletracks das trilhas de trekking geralmente são intransponíveis para as magrelas (principalmente quando chove), mas há mais de 50 quilômetros de estradas estreitas que ligam os povoados de Neltume e Puerto Fuy por uma rota conhecida como Caminho dos Pioneiros.

Você escolhe ficar entre duas ou sete horas em cima da bike, dependo do percurso escolhido. Com muita subida e descida, o mais longo corta o Pampa Pilmaiquén, onde guanacos são criados para serem reintegrados à natureza selvagem. Já a intermitente lagoa dos Patos é um clarão na mata que ajuda a manter viva a população de lebres, javalis e outros mamíferos ao seu redor. O retorno a Neltume acontece depois de uma longa sessão de downhill com passagens técnicas. O aluguel da bike, mais o guia saem por US$ 38.

Dia 3: Relax

NO TOPO: Arvorismo até a tirolesa Voo da Águia

Reserve o dia para conhecer a floresta patagônica por outro ângulo. Huilo-Huilo tem dois complexos de arvorismo que destorcem o nariz dos que acham que não há emoção em uma tirolesa. Um deles, batizado de Voo da Águia, tem cem metros de extensão e 35 de altura, e passa entre a copa das árvores do bosque úmido. Para chegar à descida principal, é preciso antes atravessar passarelas suspensas que são um desafio leve aos já acostumados com altura. O próximo passo é mirar a descida do Voo do Condor, uma tirolesa que, em alguns pontos, está a 95 metros do chão. É só não fechar os olhos para se sentir abraçado pelas montanhas nevadas da reserva.

“Turismo também é informação, e não apenas tirar fotinhos”, brinca o motorista chileno Jorge Alba, que solta uma mão do volante para disparar sua câmera imaginária enquanto seguíamos rumo à Fundação Huilo-Huilo, outro passeio bem interessante para um dia mais tranquilo. Além de projetos visando a preservação ambiental, a instituição também é responsável por empreendimentos sociais no povoado de Neltume. Num atelier rústico de 20 metros quadrados, o talhador de madeira Dragomir González ensina seu ofício a um grupo de crianças e adolescentes de uma escola local. Natural de Valdivia, capital de Los Ríos, ele mora há sete anos em Neltume e há quatro meses realiza esse significativo trabalho voluntário organizado pela fundação.

Dia 4: Rolê a cavalo

O cavalo é um meio de locomoção tradicional na região patagônica, e na reserva de Huilo-Huilo há áreas propícias para serem exploradas dessa forma. No lombo de uma montaria da pura raça chilena, nem a neve que embranquece o bosque no inverno é um problema. “Chino” é um desses cavalos criados na reserva, extremamente bem tratado e ensinado a cortar os caminhos estreitos da floresta temperada com o cuidado de não esbarrar nas árvores. Ele responde aos comandos da rédea com mais precisão do que um controle remoto. O roteiro mais extenso (US$ 100) tem em torno de cinco horas e chega a um mirante com vista para o rio Fuy e o imenso lago Pirehueico.

Dia 5: Caminhada na neve

Seres tropicais podem estranhar o frio patagônico, que chega a zerar a temperatura mesmo na meia-estação. A recompensa, no entanto, é poder curtir a neve o ano inteiro. Entre junho e agosto, uma subida até a cratera dos vulcões geminados Mocho e Choshuenco (2.400 metros de altitude) é a melhor escolha (US$ 85). Geralmente a subida é feita com raquetes de neve (os snowshoes) e dura cerca de três horas. De lá de cima, a visão é para os Andes e os vulcões Villarrica e Lanin, já na divisa com a Argentina.

Para esquiadores e snowboarders, a cereja do bolo é a descida, que começa com uma sessão fora de pista de nível avançado e termina nos corredores nevados do bosque patagônico. Durante a primavera e o verão (até o começo de fevereiro), é montado um snowpark com rampas, corrimões e caixotes no glacial do Choshuenco. Isso significa praticar esporte de neve vestindo bermuda e, depois, descer a montanha para nadar em algum rio glacial da reserva.

Dia 6: Canoagem

Espalhado por uma área de 35 quilômetros quadrados, o Pirehueico é um dos sete lagos chilenos que compõem a bacia do rio Valdivia. Ele fica dentro da reserva biológica de Huilo-Huilo, pronto para ser descoberto de caiaque. Partindo do povoado de Puerto Fuy, uma remada de quatro horas (US$ 18) possibilita explorar as pequenas ilhas, praias e termas ao longo do lago para ter outra perspectiva do bosque e das montanhas nevadas daquela região da Patagônia. Outra opção a remo é boiar pelas águas verdes e tranquilas do rio Cua Cua, no lado oeste da reserva, até desembocar no lago Neltume.

Dia 7: A recuperação

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O complexo de hospedagem da reserva Huilo-Huilo já é uma atração por si só. Passarelas de madeira suspensas, construídas numa área delimitada do bosque, ligam dois hotéis e um complexo de cabanas de luxo, sempre primando pela arquitetura. O maior hotel é o Nothofagus (diárias a partir de R$ 883 o casal). O hotel tem corredores em espiral que unificam os cinco andares e, no topo, forma um terraço em 360º mais alto do que o bosque. Na parte baixa, um spa de 970 metros quadrados com sauna e piscinas climatizadas (que avançam até a área externa) é o que você precisa para relaxar e voltar para casa com boas lembranças do Chile. Para quem quer gastar pouco, a saída é ficar no camping da reserva, que tem banheiro com chuveiro quente e pontos de luz (R$ 86).

Todos os preços informados incluem equipamento e guia, e são oferecidos pela própria reserva Huilo-Huilo (huilohuilo.com)

 

 

 

(Reportagem publicada originalmente na Go Outside de julho de 2013 e atualizada em fevereiro de 2020)