Brincar de Treinar

Boa forma física deveria ser sinônimo de diversão. Então pare de treinar e comece a agir como um moleque novamente. Com a ajuda de especialistas, atletas e treinadores, montamos um programa “faça-o-que-você-gosta” para você conseguir uma vida saudável e energizada, sempre

(Ted Spiker; colaborou Cassio Waki) *

QUER FICAR EM FORMA? NÃO PENSE NISSO. Em 2004, o judoca Flávio Canto completou sua coleção de medalhas com o bronze olímpico de Atenas – a 12a medalha olímpica na história do judô brasileiro. Um ano antes, nos Jogos Panamericanos de Santo Domingo, Flávio já tinha conquistado o ouro; antes disso, venceu quatro campeonatos sul-americanos e sete Pan-americanos. Alguém com resultados tão bons só pode treinar o dia inteiro, em regime semi-xiita, certo? Errado.


Aos 29 anos, Flávio gosta de intercalar os golpes no dojô com sessões de surfe, natação, corrida na praia e meditação. Judoca desde os 14, é essa variação que faz com que ele se mantenha apaixonado pelo seu esporte e motivado para os treinos. "É estafante fazer sempre a mesma coisa", diz. "O surfe é meu lazer.Preciso do mar para ser feliz. Se eu não fosse tão ruim de onda, virava surfista profissional", brinca. Além da vida multi-esportes, Flávio preza o bom humor e um ambiente com energias positivas. "Preciso estar feliz para fazer as coisas bem. Se eu não me sinto bem, não treino bem”, afirma.


Em algum lugar entre a esteira e os pesinhos, as carteirinhas de academia abandonadas e as tediosas rotinas de exercícios, muitos de nós perdemos o que Flávio tanto presa: um jeito mais leve e alegre de ver a saúde e o treinamento. Lembra do recreio no colégio, de brincar com os amigos, rindo se ganhasse ou perdesse, nem vendo as horas passarem? Taí o segredo de muitos campeões.

“Muitos de nós treinamos porque nos sentimos obrigados e não porque queremos”, diz Doug Newburg, 44, consultor de desempenho da Universidade de Medicina de Virgínia, em Charlottesville. Natalie Durand-Bush, 34, professora assistente de psicologia da saúde e esportes da Universidade de Ottawa, em Ontário, Canadá, concorda. “Infelizmente, as pessoas se preocupam só com resultados. Isso leva ao desgaste e à perda da condição atlética”, diz. Natalie entrevistou dezenas de campeões olímpicos e descobriu que brincar é muito mais importante do que a maioria das pessoas se dá conta. “Mesmo quando os treinamentos se tornavam mais sérios e as competições se aproximavam, os atletas olímpicos equilibravam isso com atividades físicas que os divertissem”, conta a professora.


Com os jogadores de vôlei das seleções olímpicas brasileiras, também foi assim. “Nas Olimpíadas de Barcelona, os jogadores e jogadoras adoravam jogar futebol antes dos treinos, para relaxar antes do ‘trabalho’. As meninas ficaram em quarto lugar e, os homens, com a medalha de ouro”, conta Regina Brandão, doutora em psicologia do esporte, responsável pela preparação e acompanhamento psicológicos das seleções de vôlei em Barcelona e da seleção de futebol na Copa do Mundo de 2002, além de vários times de futebol profissional.


Divertir-se parece ser uma boa estratégia – e é este o espírito que invade as páginas a seguir. Descobrimos treinos intensos disfarçados de brincadeiras e novas maneiras de refrescar velhos esportes. Damos dicas para evitar rotinas maçantes e ainda garimpamos lançamentos em equipamentos – afinal, nada dá mais vontade de fazer um esporte do que um brinquedo novo. Jogue fora aquelas rotinas e treinos chatos. Quer ficar em forma? Então comece a se divertir.

1. FAÇA A ENERGIA FLUIR
Para manter-se comprometido e motivado, você precisa gostar do que faz e estabelecer objetivos realistas. Abaixo, um guia para colocar isso em prática.

CORRIDA
A DIVERSÃO: uma vez por semana, “mate” o treino de corrida e vá jogar futebol, frisbee ou basquete. Ou desafie um amigo para um treino de sprints de 100 metros. Os sprints aumentam a força de sua passada, o que ajuda na hora de subir montanhas.
ENCARE: A Volta À Ilha é uma corrida de revezamento que percorre 150km em torno da ilha de Florianópolis, em Santa Catarina. O percurso tem as mais variadas paisagens e terrenos e acontece sempre em abril. A diversão pode ser dividida em equipes de dois a oito atletas. A
Crazy Race, como já indica o nome, é uma espécie de corrida maluca. São cinco voltas de 4km com 40 obstáculos diferentes, de paredes para escalar a buracos de lama para saltar.

TÊNIS
A DIVERSÃO: Otaviano dos Santos, coordenador técnico do Clube Paineiras e mentor do ex-tenistas Jaime Oncins, recomenda o "quadradinho". "Além de divertido, é uma das técnicas que consagrou André Agassi", conta. Divida a meia-quadra em duas com uma linha perpendicular à rede. Você terá quatro quadrados. Fique bem no centro de um dos dois que são mais próximos à linha de fundo e estabeleça uma pontuação limite (cinco pontos, por exemplo). Num primeiro estágio, rebata só com "top spins". Mude para o quadradinho ao lado e só use "slices". Por último, volte para o primeiro quadradinho e rebata como quiser. "É um ótimo aquecimento e desenvolve técnica e criatividade", diz Otaviano.
ENCARE: os Torneios Abertos das federações de tênis são organizados para atletas amadores. Na federação paulista, atletas avulsos podem se cadastrar para receber o calendário semestral das competições. A cada jogo o tenista ganha uma pontuação para o ranking e, de acordo com os números, pode subir de categoria. (11) 3051-6688;
www.tenispaulista.com.br.

FUTEBOL
A DIVERSÃO: durante o treino ou como aquecimento antes de um jogo, transforme o futebol num jogo “um contra um”. Faça duas linhas de oito cones cada, distantes uma da outra cerca de dez metros. Alinhem-se e larguem cada um com uma bola, driblando os cones e voltando, como num slalom. Quem ganhar avança para a próxima rodada até a grande final.
ENCARE: Junte mais seis amigos e entre na terceira divisão do Campeonato Paulista de Futebol Society. Em 2004, 32 equipes enfrentaram-se nos três meses de competição. Os jogos acontecem nas quatro regiões da capital. Atletas sem time podem se cadastrar no site da Federação Paulista de Futebol Society (FPFS), que também organiza campeonatos particulares para empresas e eventos. (11) 3168-6028;
www.fpfs.com.br.


CAIAQUE OCEÂNICO
A DIVERSÃO: brinque com a velocidade e a potência das remadas: 50 remadas fortes, 50 fracas, dez rápidas, dez lentas. Se estiver remando com um parceiro, escolha um ponto qualquer na paisagem (uma pedra, uma praia) e reme forte até lá. Você pode fazer uma “melhor de cinco” – quem perder paga o jantar.
ENCARE: em Santos, na Garagem Náutica do Vasco da Gama, a Escola Canoa Brasil dá aulas de canoa havaiana e sedia etapas de campeonatos paulistas e brasileiros. Uma competição que pode ser encarada como passeio é a Volta à Ilha, com 80km ao redor da ilha de Santo Amaro. (13) 3261-2229;
www.canoahavaiana.com.br.

CICLISMO
A DIVERSÃO: Pedalando sozinho? Faça contra-relógios baseados em calorias queimadas, por exemplo. Uma vez por semana, use um monitor de freqüência cardíaca que estime as calorias incineradas e pedale forte por 30 minutos. A cada semana, foque em queimar mais calorias, em vez de ficar de olho no tempo ou na velocidade média, que variam muito de acordo com o tempo e o terreno.
ENCARE: o Iron Biker, Desafio das Montanhas, percorre a região histórica de Ouro Preto e Mariana, em Minas Gerais. O primeiro dia traz 74km de mountain bike, e o segundo, 58km. O percurso é bem acidentado, mas não é só para profissionais. Para que não quer fazer a prova sozinho, a organização disponibiliza 100 vagas para equipes com três integrantes, além da categoria Tandem, com bikes de dois lugares. Este ano, a prova está marcada para os dias 1 e 2 de outubro.
www.ironbiker.com.br.

* A matéria completa está publicada na primeira edição da revista Go Outside