Linha de frente


AÇÃO: Ativistas da Sea Shepherd jogam garrafas com ácido butríco contra o navio baleeiro japonês Yushin Maru 1, na Nova Zelândia

Por Heloísa Ribeiro
Colaboração Sylvia D. Estrella

Recursos hídricos

DESAFIO PAULISTA

ONG: Instituto Socioambiental
Baseada em São Paulo (SP), ela existe desde 1994. Hoje tem filiais em São Gabriel da Cachoeira (AM), Brasília (DF) e Parque Indígena do Xingu (MT), contando com diferentes parcerias para cada um de seus programas. A campanha De Olho nos Mananciais tem apoio de nove instituições: Cauxi Comunicação, Annix, Bijari, Grendene, Movimento Nossa São Paulo, NBS Comunicação, Prefeitura de São Paulo e Agência 2 e ½.

PROJETO: De Olho nos Mananciais
Pelo menos 10% da população da cidade mais rica do país não tem acesso a água de qualidade. Mais de 80% do esgoto brasileiro vai para os rios, e pagamos cada vez mais para tratar essa mesma água. Ter água limpa depende do envolvimento de todos os atores quando o cenário é a megalópole, local de ocupação desenfreada e de recordes assustadores. E a campanha “De Olho nos Mananciais” conseguiu fazer muita gente parar para pensar nisso.

ATIVISTA: Marussia Whately
Graduada em Arquitetura e Urbanismo, Marussia logo percebeu que a questão urbana está totalmente ligada à proteção dos recursos naturais, já que água, áreas verdes, clima e qualidade do ar são a base da vida em qualquer ambiente. A infância vivida nas margens da Guarapiranga fez aumentar a preocupação de Marussia com o caos de nossas represas – Billings, Guarapiranga e Sistema Cantareira. No Instituto Socioambiental desde o início da década de 2000, Maru, como é conhecida, assumiu a condução do Programa Mananciais, que em 2007 germinou a campanha “De Olho nos Mananciais”, e passou a articular uma rede de entidades comprometidas com a recuperação das fontes de água da cidade. Em mais de 10 anos de luta pelos mananciais, o ISA acertou ao questionar “De onde vem a água que você bebe?”, para que cada cidadão relacionasse seu uso pessoal com a preservação das fontes naturais. Atrás dessa trincheira da causa ambiental, a coordenadora pôde acompanhar o aumento da consciência dos paulistas para um de seus bens mais preciosos.


DE CIMA: Vista aérea da represa Billings, em São Paulo
(Foto: Sambaphoto)

Go Outside: O que é a campanha e como ela funciona?
Maru: A campanha “De Olho nos Mananciais” é produto do Programa Mananciais, que nasceu originalmente para produzir diagnósticos sobre a situação da água paulista. O programa elaborou relatórios como “Billings: ameaças e perspectivas do maior reservatório da região metropolitana” ou “Guarapiranga: como e por que São Paulo está perdendo este manancial”. A partir dessas informações, passamos a buscar o envolvimento dos “atores” locais – moradores, ONGs, associações, órgãos públicos etc. Promovemos atos públicos de alerta sobre a escassez, organizamos mobilizações para recuperar as áreas verdes, fizemos esforços para barrar o crescimento das cidades sobre os mananciais e trabalhamos a conscientização de que a água é responsabilidade de todos. Hoje temos uma agenda ambiental compartilhada por vários setores, e nosso papel é não só colocar o tema da água em pauta, mas apresentar quem e o que fazer. O site da Campanha, www.mananciais.org.br, integra todas as informações e oferece mecanismos interativos, como o GoogleMaps, que permite ao internauta identificar de onde vem a água que bebe em sua casa.

Qual o impacto e os resultados que a campanha vem obtendo?
As mobilizações ampliaram a consciência sobre a situação calamitosa das fontes de água e, o mais importante, isso teve reflexo nas políticas públicas. Conseguimos produzir uma plataforma política para os mananciais e obter o compromisso dos representantes eleitos com as ações que precisam ser feitas para reverter a degradação na Grande São Paulo, como implantação de saneamento nas áreas urbanas e fim do crescimento das cidades nas represas. Todo ano promovemos o Abraço da Guarapiranga, em que damos as mãos em volta do manancial. Outro momento marcante foi a Expedição Fotográfica, com 1.190 participantes inscritos que, organizados em 74 grupos, saíram para fotografar os diversos pontos das bacias hidrográficas que abastecem São Paulo, numa ação de educação por meio da arte, coordenada por grandes fotógrafos do país. O resultado foi publicado no mananciais.org.br/expedição.

Quais os principais problemas dessa área?
Vivemos um enorme paradoxo: num mundo em que a escassez de água é cada vez mais intensa e acentuada pelas mudanças climáticas, os aglomerados humanos são cada vez maiores e estamos desvalorizando as áreas que produzem água em nome das construções urbanas. Nem sabemos onde ficam os rios de São Paulo, hoje cobertos pelo asfalto, ou seja, abrimos mão dos nossos rios para ter a cidade. Conhecemos onde estão os prédios, mas não associamos a avenida Paulista com um acidente geográfico, um elemento natural. Fora isso, sabemos que 1 bilhão de pessoas não tem acesso à água no mundo e que a distribuição no Brasil é desigual. Em São Paulo temos que buscar este recurso cada vez mais longe, em outras bacias.

Que outras iniciativas estão dando certo?
A questão da água é global, mas creio que os projetos bem-sucedidos são aqueles que trabalham o aspecto local, ampliando a consciência da população de que a responsabilidade é de todos que moram ali. O debate sobre os recursos hídricos precisa ser endereçado ao dia a dia das pessoas. Um exemplo de projeto de sucesso é o Conservador de Águas, do Comitê de Bacia dos Rios Piracicaba, Capivari e Jundiaí, em que os proprietários rurais recebem pagamento por serviços ambientais das matas ciliares de sua propriedade.

Quais são os vilões que mais comprometem os recursos hídricos?
A principal ameaça vem da expansão urbana sobre os mananciais, incentivada por obras como a do Rodoanel, em São Paulo (SP), e por leis que, por causa da forma como foram elaboradas, viraram a causa da ocupação. As represas estão sendo usadas no seu limite de exploração. Outros vilões são a poluição, o aumento do consumo e do desperdício de água, além dos impactos das mudanças climáticas, que causam fenômenos inesperados e intensos, como as secas.

Como o leitor pode atuar nessa área, na prática?
Há infinitas formas de ajudar no dia a dia: reutilizar a água da máquina de lavar para a descarga nos banheiros, por exemplo. O banheiro é o local que mais consome água numa casa, então é preciso ficar atento aos vazamentos e manter a descarga regulada. Também é preciso praticar a coleta seletiva, pois a reciclagem é uma maneira eficiente de economizar água: produtos reciclados consomem menos água do que os produzidos a partir da matéria-prima virgem. Se o cidadão detectar um vazamento na rua ou na calçada, deve ligar para o 195 e denunciar, a ligação é gratuita.

Mudanças climáticas

ALARME DO PLANETA DISPARA

ONG: GREENPEACE
Foi fundada em 1971 por canadenses, e desembarcou no Brasil em 1992, ano da Rio-92, mantendo a mesma filosofia de atuação mundial, de não aceitar recursos de governos, empresas ou partidos políticos, contando unicamente com a contribuição de milhões de colaboradores em todo o mundo. Hoje possui sede em São Paulo, Manaus e Brasília.

PROJETO: MUDE O CLIMA
Chuvas intensas, secas extremas e o primeiro ciclone tropical do Brasil, registrado em 2004 mostram as marcas que o ser humano vem conseguindo imprimir no clima do planeta. O efeito de nossas atividades já é comprovado pelos relatórios do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPPC), que une 2,5 mil cientistas de todo o mundo e prevê cenários dramáticos, como a possibilidade da Terra ficar até 6ºC mais quente até 2100. Na frente de combate às mudanças climáticas, o Greenpeace usa seu melhor potencial e consegue despertar no indivíduo o sentimento de participação nessa luta, informando e formando a sociedade em campanhas de peso.

ATIVISTA: SÉRGIO LEITÃO
A caminhada desse advogado cearense pelo movimento ambientalista no Brasil é antiga. Ele tem passagens pela direção do Instituto Socioambiental (ISA), pela coordenação da área de políticas públicas do Greenpeace e, mais recentemente, pela liderança do setor de campanhas da ONG. Hoje ele enfrenta brigas contra a energia nuclear com a mesma motivação com a qual acompanha as discussões no Congresso Nacional sobre o Plano Nacional de Mudanças do Clima. Sérgio acredita que as recentes descobertas do quanto a emissão de gases do efeito estufa aquecem a Terra irão favorecer as iniciativas em torno da preservação do meio ambiente.


AÇÃO: Voluntário da ONG observa uma pilha de troncos em Papua Nova Guiné, onde ficam as últimas florestas ancestrais da Ásia
(Foto: Corbis)

Go Outside: Como funciona a campanha e qual seu diferencial?
Sérgio: O diferencial da campanha de clima do Greenpeace é a visão integrada da solução do problema, olhando, por exemplo, para a questão florestal, pois no Brasil 75% das emissões provêm da queima de floresta, o que nos faz contribuir com 20% do total global de gases. É impossível não falar da nossa contribuição, precisamos assumir que o mundo não resolve sem nós e nós não resolvemos sem eles. Criamos diversas ações para traduzir as informações para a sociedade, como uma cartilha e o vídeo Mudanças do Clima, Mudanças de Vida, no qual apresentamos dados científicos e entrevistas feitas pelo Brasil com dezenas de vítimas dos fenômenos climáticos extremos, e mostramos que o aquecimento já é uma realidade. Os interessados podem agendar exibições públicas do documentário, basta entrar no site greenpeace.org.br. Para tornar o debate mais acessível à população, lançamos este ano a campanha Mude o Clima!, com participação de diferentes artistas e celebridades, e uma página na internet com dicas para as pessoas atuarem em casa, no trabalho, na escola. O site tem ferramentas interativas que permitem sentir os efeitos do aquecimento. O projeto vai gerar uma série de atividades nas ruas em datas especiais.

Qual o impacto e os resultados que a campanha vem obtendo?
O envolvimento da população tem crescido. Penso que conseguimos criar uma identidade com o público ao falarmos de problemas com que as pessoas se identificam, de questões que fazem parte do dia a dia. Não estamos criando uma demanda nova, mas sendo o veículo que possibilita às pessoas expressarem seus anseios. Pela primeira vez na história o ser humano criou uma situação na qual nossa própria espécie irá se extinguir. Já há problemas graves na Amazônia, na falta de água para agricultura, para abastecer os grandes centros. Essa informação tem de chegar ao cidadão. Não é uma discussão ambiental, mas de modelo de desenvolvimento.

Quais os principais problemas dessa área?
O último relatório do IPCC, de 2007, representou um rompimento ao mostrar cenários preocupantes, que pedem atitudes emergenciais. O momento atual é uma oportunidade de cada um fazer sua parte. O Brasil precisa dialogar com os países desenvolvidos, pois todos terão de fazer a lição de casa e promover uma combinação das várias iniciativas já em andamento. No plano interno, porém, a Política Nacional de Mudanças Climáticas existe somente no papel. Esta não pode ser uma política do Ministério do Meio Ambiente, precisa estar integrada a todos os ministérios e envolver os diferentes setores da sociedade. Trabalhamos para conscientizar e pressionar o país a assumir metas de redução de emissões. É uma questão ética e moral fazermos nossa parte.


OLHA AQUI: Ativistas do Greenpeace colocam uma faixa no Cristo Redentor (RJ) durante o Fórum Mundial para o Desenvolvimento Sustentável, em setembro de 2002
(Foto: Corbis)

Que outras iniciativas estão dando certo?
Temos sensibilizado a população para uma mudança de postura em relação às energias renováveis. O Greenpeace construiu uma agenda de planejamento estratégico para o setor elétrico, mostrando o quanto é mais econômico usar fontes renováveis. Hoje podemos gerar uma Itaipu de ventos no Nordeste se a opção fosse investir em energia eólica. Há ainda uma expedição do Greenpeace percorrendo várias cidades brasileiras para alertar a população da urgência do problema, a bordo do navio Arctic Sunrise.

Quais são os vilões que mais comprometem os recursos hídricos?
No Brasil, a Odete Roitman das mudanças climáticas é o desmatamento, a mudança no uso da terra por causa da agropecuária. No mundo, o vilão é a queima de combustível fóssil pelas indústrias e automóveis. Apesar de termos uma matriz considerada limpa, de energia hidrelétrica, estamos conseguindo sujar isso também. O Governo inventou a moda de construir termoelétricas, usinas movidas a óleo diesel e a carvão. Além de não resolver o problema do desmatamento, estamos aumentando o uso de combustível fóssil.

Como o leitor pode atuar nessa área, na prática?
Sugiro algumas dicas da campanha Mude o Clima, que estão em nosso site. Em casa, acumule várias peças de roupa para passar todas de uma vez, e instale a geladeira ou freezer em um local ventilado, longe do fogão. No trabalho, use os dois lados da folha de papel e procure imprimir documentos de uso interno em rascunhos. Procure usar também ônibus, trem e metrô.

Consumo consciente

QUESTIONAR O DESPERDÍCIO PARA MUDAR A ATITUDE

ONG: INSTITUTO AKATU
Surgiu em 2000, com sede em São Paulo (SP), e desde então teve o apoio de parceiros pioneiros como Fundação Avina e Fundação Kellog, Nestlé, Banco Real, HP e Itaú Social. Hoje já são mais de 30 empresas entre apoioadores, patrocinadores e parceiros estratégicos.

PROJETO: 1/3 DO QUE VOCÊ COMPRA VAI DIRETO PARA O LIXO
Mobilizar as pessoas para seu papel transformador como consumidoras para uma sociedade mais sustentável. Essa tem sido a missão do instituto Akatu desde que foi gerado, em 2000, dentro do instituto Ethos de Responsabilidade Social. Na mesma lógica do nome Akatu, que em tupi-guarani significa “semente boa”, a ONG vem conseguindo fazer a boa ideia do consumo consciente vingar entre os brasileiros, principalmente por meio de campanhas que questionam hábitos de compras. A última delas, 1/3 Do Que Você Compra Vai Direto Para o Lixo, usa a linguagem dos grandes supermercados para alertar para os desperdícios de alimentos e dar dicas para diminuir esse problema. A campanha partiu da constatação de que 1/3 dos alimentos comprados é desperdiçado – e, junto com eles, todas as embalagens, a água e a energia usadas na produção, e o CO2 emitido na fabricação e no transporte.

ATIVISTA: HELOISA TORRES DE MELLO
A gerente de operações do instituto Akatu é formada em publicidade e tem um MBA em marketing pela Universidade de São Paulo. A trajetória profissional começou em agências de propaganda e grandes empresas na área de marketing, mas o interesse na questão da sustentabilidade a fez implantar diferentes projetos de responsabilidade social nas várias empresas em que atuou. Há dois anos, porém, Heloísa direcionou esta bagagem para o terceiro setor, e partiu para a aventura de divulgar o consumo consciente para o grande público, informando, mas, principalmente, tentando sensibilizar as pessoas para seu papel como multiplicadoras dos ideais do Akatu.

Go Outside: O que é a campanha e como ela funciona?
Heloisa: A campanha, criada pela agência de publicidade Leo Burnett, tem o objetivo de alertar o consumidor sobre o nível de desperdício de alimentos que compramos. Mas mais do que chamar a atenção para este fato, mostramos que é possível mudar algo coletivo por meio de pequenos gestos diários individuais. As peças da campanha incluem um comercial de TV e cinema com duração de 30 segundos, um spot de rádio de 45 segundos, anúncios em revista e jornal, banners on-line e até um toque de celular. A linguagem é parecida com a dos anúncios de ofertas do varejo. Com a chamada “Olha que loucura!”, são exibidas imagens de frutas, hortaliças, carnes e laticínios estragados, ao lado do preço de cada produto.

Qual o impacto e os resultados que a campanha vem obtendo?
A ideia é levar a pessoa ao questionamento, e também enfatizar os pequenos gestos que fazem parte da solução. Por a campanha ter sido veiculada em mídia de alcance nacional – como Rede Globo, TV Cultura e SBT, canais de TV paga, jornais como Gazeta Mercantil, O Globo e Valor Econômico, mais de 80 sites, blogs e rádios via internet –, o número de acessos ao site do Akatu (akatu.org.br) mais que dobrou. As imagens dos alimentos estragados impactam o público e geram reações emocionais. As pessoas conseguem identificar situações semelhantes na rotina de suas casas. Isso foi comprovado por uma pesquisa de avaliação da campanha junto a um público interessado em responsabilidade social, composto por grupos de homens e mulheres entre 18 e 35 anos. Identificando-se com as cenas de desperdício, os consumidores admitem agir dessa maneira. Considerando que a sociedade é responsável por mudar esse cenário, eles se sentem impelidos a deixar de desperdiçar.

Por que é preciso trabalhar com o consumo consciente?
Todo consumo causa impacto (positivo ou negativo) na economia, nas relações sociais, na natureza e em você mesmo. Ao desenvolver a consciência sobre esse impacto na hora de escolher o que comprar, de quem comprar e definir a maneira de usar e como descartar o que não serve mais, o consumidor aumenta os impactos positivos e diminui os negativos. Desta forma faz uso de seu poder de consumo para contribuir com um mundo melhor. O consumidor consciente busca o equilíbrio entre a sua satisfação pessoal e o bem-estar do planeta, preferindo produtos que tragam consequências positivas para si mesmo, mas também para as relações sociais, para a economia e para a natureza. Ele também busca disseminar tais práticas, fazendo com que pequenos gestos realizados por um número muito grande de pessoas promovam grandes transformações.

Quais são os vilões dessa história?
Acho que são os padrões de consumo e produção, pois caso sejam mantidos no atual patamar, em menos de 50 anos serão necessários dois planetas Terra para atender às nossas necessidades de água, energia e alimento. Não é preciso dizer que esta situação pode dificultar a vida no planeta, inclusive da própria humanidade. A melhor maneira de mudar isso é a partir das escolhas de consumo, pois elas determinam também as características do mundo onde vivemos. Ao decidir sobre as seis dimensões do consumo – por que comprar, o que comprar, como comprar, de quem comprar, como usar e como descartar o que não serve mais – o consumidor está votando no mundo em que quer viver.

Como o leitor pode atuar nessa área, na prática?
O consumo consciente pode ser praticado no dia-a-dia, por meio de gestos simples que levem em conta os reflexos da compra, pelo uso ou descarte de produtos ou serviços, ou pela escolha das empresas da qual comprar, em função de seu compromisso com o desenvolvimento socioambiental. É uma contribuição voluntária, cotidiana e solidária para garantir a sustentabilidade da vida. Alguns exemplos: ler um rótulo atentamente antes da compra; usar integralmente os alimentos; optar por detergentes biodegradáveis (é possível encontrá-los em qualquer supermercado); usar os produtos até o final de sua vida útil, só comprando um novo quando for realmente necessário; dar preferência a produtos com selos de certificação, que indiquem uma qualidade diferenciada do produto, seja ambiental, social ou de qualidade.

E quais as dicas para não desperdiçar alimentos em casa?
Há várias maneiras simples de evitar o desperdício. Planeje suas compras e confira o que ainda tem em casa antes de sair, fazendo uma lista do que precisa ser comprado, evitando o supérfluo, que pode acabar parando na lata do lixo. Faça três, quatro compras por mês para comprar produtos perecíveis mais frescos e em menor quantidade e, portanto, diminuir a chance de estragarem e irem para o lixo. Preste atenção aos prazos de validade, de modo a ter tempo suficiente para usar os produtos comprados. Não faça compras com fome (o consumidor faminto compra desnecessariamente mais). Prefira frutas e legumes da época e produzidos nas redondezas, eles normalmente são mais frescos e baratos e requerem menos transporte, provocando menor aquecimento da Terra pelo gasto menor de energia. Leia as informações nutricionais nos rótulos de alimentos de forma a escolher produtos que permitam preparar refeições equilibradas nutricionalmente e também na quantidade certa, para evitar sobras. Mas se as sobras aparecerem, aproveite-as em novas receitas: das sobras do feijão faça sopa; do arroz, cenouras cozidas, carne assada ou o que restou da bacalhoada prepare deliciosos bolinhos; frutas azedas ou maduras demais viram compotas, geleias e recheios para bolo. Ao cozinhar, não despreze as cascas de legumes, os talos de verduras e nem as sementes.

Desenvolvimento sustentável

MERCADO PAGA POR PRODUTOS DA FLORESTA DE PÉ

ONG: WWF/BRASIL
Criada em 1996 no Brasil, com sede em Brasília (DF), conta com o apoio de mais de 120 organizações, entre governos, empresas, ONGs e instituições, tais como Ministério do Meio Ambiente, Banco Mundial, Banco HSBC, entre outros. Entretanto, os recursos são provenientes, em sua maioria, da rede WWF mundial.

PROJETO: PROGRAMA DE APOIO AO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL
Dos mais de 20 milhões de brasileiros que vivem na Amazônia, muitos dependem diretamente dos recursos da mata e dos rios para sobreviver, conhecendo segredos de manejo que vão em direção contrária ao desmatamento. Seringueiros da floresta, ribeirinhos da várzea, entre outros povos, dependem da madeira, da castanha e dos peixes, tanto quanto da comercialização, para que seu negócio seja sustentável. No apoio às comunidades e organizações locais, o WWF/Brasil encontrou um bom caminho para conservar a biodiversidade amazônica: incentivar o marketing de produtos de base florestal e pesqueira, e agregar valor à base da pirâmide produtiva, onde o extrativismo é realizado sem agressão ao meio ambiente.

ATIVISTA: MAURO ARMELIN
Em 2008, o coordenador de desenvolvimento sustentável do WWF, Mauro Armelin, recebeu o título de engenheiro florestal do ano pela Associação Paulista dos Engenheiros Florestais. Ele vem ajudando a construir práticas mais ecológicas desde que começou a atuar como coordenador do grupo Compradores de Produtos Florestais Certificados, da ONG Amigos da Terra, em 1998. Depois, Mauro participou do Projeto Negócios Sustentáveis, em 2002, no Ministério do Meio Ambiente, e deu consultorias para o Ibama, até entrar para a equipe do WWF/Brasil, onde seu empenho voltou-se para a introdução do extrativismo moderno na Amazônia. Nesse tipo de extração, a tecnologia e o manejo permitem aumentar o valor dos produtos ainda na floresta ou na várzea, e fazer todos os elos da cadeia produtiva ganharem com a sustentabilidade.

Go Outside: O que é o programa e como ele funciona? Mauro: Por meio da combinação entre o conhecimento científico e o saber tradicional, desenvolvemos parcerias locais na Amazônia para a construção de sociedades mais sustentáveis. O objetivo é apoiar o uso responsável dos recursos naturais e ajudar as comunidades extrativistas, povos ribeirinhos e outros a inserir seus produtos nos mercados nacional e internacional. Isso se dá pelo fortalecimento, capacitação e certificação desses grupos, e reflete em aumento de renda ao mesmo tempo em que dá tempo para a natureza se regenerar. Ganha a comunidade local, a sociedade como um todo e o meio ambiente.

Qual o impacto e os resultados que a campanha vem obtendo?
Nada melhor do que dar um exemplo prático, como o apoio à cadeia produtiva do óleo de copaíba, extraído na Amazônia, com inúmeras aplicações cosméticas e em medicamentos. A árvore permanece saudável após a retirada do óleo, que possui alto valor agregado e é um importante fator de inclusão social na região. Apoiamos as cooperativas locais, capacitando os associados para boas práticas econômicas, sociais e ambientais. Nossos técnicos auxiliam as comunidades na prospecção de mercados dispostos a pagar mais por produtos de origem sustentável. Na região do rio Purus e Madeira, cerca de 2 milhões de hectares são conservados em decorrência da extração correta do óleo da copaíba, e com apoio do WWF, mais de 300 famílias vêm sendo beneficiadas pelo manejo, obtendo melhora na renda. Também já iniciamos a atuação na cadeia da borracha, buscando agregar valor à produção próxima da floresta. A borracha é um produto-símbolo da Amazônia, representa a luta de Chico Mendes pela preservação. Optamos por trabalhar o couro vegetal, um produto do látex, e cerca de 200 famílias de seringueiros foram capacitados para fazer o produto no Acre. A capacitação das populações locais é o ponto de honra do programa, para que possam caminhar com as próprias pernas no futuro, sem necessidade de apoios externos.

Quais os principais problemas dessa área?
A Amazônia precisa de políticas de desenvolvimento que levem em conta as aptidões naturais de suas regiões, e esse desenvolvimento deve, necessariamente, contribuir com a conservação e a inclusão das famílias locais. Hoje ainda é muito mais fácil obter licenciamento e financiamento junto a bancos e agências de fomento para projetos de natureza predatória e contrários à legislação, em geral voltados para o agronegócio, do que para iniciativas que obedeçam padrões de sustentabilidade. Também é fundamental aumentar a presença do estado na região para assegurar a implementação das políticas.

Que outras iniciativas estão dando certo?
Outra experiência de êxito é a do manejo da castanha-do-Brasil (do Pará), principal fonte de renda das famílias no sudoeste da Amazônia e importante componente na dieta alimentar de toda a região. Cerca de 3 mil famílias participam do manejo nos blocos de conservação Acre-Purus (Acre) e Itenez-Mamoré, (em Rondônia). Apoiamos essa atividade desde 2001, treinando os produtores em melhores práticas de coleta, transporte, armazenagem, secagem e manuseio. E por meio da cooperativa local, os extrativistas vêm conseguindo participar de todas as fases da cadeia produtiva, o que é fundamental para o aumento da renda.

Quais são os vilões que mais comprometem o desenvolvimento sustentável na Amazônia?
A principal ameaça à floresta amazônica advém do desmatamento impulsionado principalmente pelo agronegócio. A pressão se dá diretamente, a exemplo da pecuária, ou indiretamente, quando a soja plantada no cerrado “empurra” o gado para a floresta, com efeitos nefastos. Tudo facilitado pela precariedade da questão fundiária na Amazônia, onde há terras tecnicamente sem dono, terras com mais de um dono e invasões “legalizadas” por documentos falsos e desmatamentos ilegais, inclusive dentro de Unidades de Conservação e de terras indígenas.

Como o leitor pode atuar nessa área, na prática?
Ele deve dar preferência, por exemplo, a produtos de madeira com selo FSC (de Forest Stewardship Council, ou Conselho de Manejo Florestal), garantia de que esta foi retirada corretamente. Ao comprarmos produtos sustentáveis, ajudamos a diminuir o incentivo ao desmatamento da floresta.

Energia

SOL CONTRA O AQUECIMENTO DO PLANETA

ONG: VITAE CIVILIS
A Vitae Civilis Instituto para o Meio Ambiente, Desenvolvimento e Paz foi fundada em 1989, em São Paulo (SP), e hoje tem sede em São Lourenço da Serra (SP). Entre suas parcerias, possui uma série de alianças locais, com ONGs e associações de bairro, como o Movimento em Defesa da Vida do Grande ABC ou a Sociedade Ecológica Amigos do Embu, e parcerias com instituições, como a Fundação Vitória Amazônica ou Greenpeace.

PROJETO: CIDADES SOLARES
Casas, apartamentos, lojas, fábricas. Uma gama de edifícios públicos já é obrigada a instalar aquecimento solar em São Paulo, segundo lei municipal aprovada em 2007. Mais 23 cidades do país também já incorporaram o uso da energia do sol em suas obras, estimuladas pelo pioneiro programa Cidades Solares, que desde 2006 capacita construtores, induz políticas públicas e mostra a vantagem dessa fonte renovável para o aquecimento de água. A iniciativa, da ONG Vitae Civilis, em parceria com o Departamento Nacional de Aquecimento Solar da Abrasa (associação que reúne fabricantes de aquecedores solares), concretiza o sonho de sociedades mais sustentáveis e, acima de tudo, surge como solução concreta para as mudanças climáticas, já que 80% das emissões globais de gases do efeito estufa provêm de fontes não renováveis, como o carvão e o petróleo. No caso do sol, a luz transformada em calor permite reduzir o consumo de energia elétrica com saldo positivo para o meio ambiente.

ATIVISTA: RUBENS BORN
Quando fundou a ONG Vitae Civilis Instituto para o Desenvolvimento, Meio Ambiente e Paz, em 1989, o engenheiro e mestre em saúde pública escolheu o nome que em latim quer dizer “para a sociedade civil”, enfatizando o valor do fortalecimento da cidadania e das organizações da sociedade. Além de ter trabalhado esses anos todos para conciliar o desenvolvimento econômico e social com a conservação ambiental, a experiência de Rubens também se desdobrou na liderança de redes nacionais e internacionais, sempre com o pé nas iniciativas da sociedade civil. Da coordenação da delegação de ONGs brasileiras na Rio-92 ao papel em fóruns como Agenda 21 e Fórum Brasileiro de Mudanças Climáticas, o coordenador da Vitae destaca-se por sua atuação no acompanhamento e no impulso a políticas que tornem nossa sociedade mais sustentável.

Go Outside: O que é a iniciativa e como ela funciona?
O projeto Cidades Solares é fruto do estudo “Um banho de sol para o Brasil”, de 2004, em que a Vitae Civilis detectou as barreiras para o aquecimento solar no Brasil, entre elas a falta de capacitação profissional e de códigos de obra pouco amigáveis a essa tecnologia nos municípios. Também identificamos a oportunidade de alavancar uma energia de fácil aplicação: o cidadão pode não só consumi-la, mas produzir seu próprio sistema. Enquanto os órgãos federais, encarregados da política energética no país, vêm optando por aumentar a oferta, nosso objetivo é envolver a sociedade para inverter essa equação e atuar do lado da demanda, ou seja, no uso eficiente e prevenção do aumento de consumo. Por isso, a Vitae Civilis e seus parceiros resolveram disseminar a importância do aquecimento solar para a população, sua economia e seus benefícios ambientais. Há três anos realizamos seminários pelo país para tratar de políticas públicas que incentivem o uso de aquecedores nas edificações das cidades, mostrando todos os ganhos da energia solar, seguidos de um curso de capacitação sobre a tecnologia e de como usá-la.

Qual o impacto e os resultados que a campanha vem obtendo?
O programa já está em seu terceiro ano e é um sucesso entre os municípios brasileiros, com o aquecimento solar sendo regulamentado em diversas cidades que já aprovaram leis tornando obrigatória a instalação de coletores solares em certos tipos de prédios. Costumo dizer que perdemos o controle do Cidades Solares, o que é bom, pois hoje muitos usuários visitam o site cidadessolares.org.br e se inspiram para implantar a tecnologia em suas cidades.

Quais os principais problemas dessa área?
Desde a década de 1990, a Vitae Civilis estuda o tema do clima e sua interface com a questão energética. A expansão da demanda por energia no Brasil, abastecida por grandes hidrelétricas, sempre impactam o meio ambiente, assim como a tendência de aumento das termelétricas, que usam combustível fóssil. Em 2003, decidimos então investir no estudo “Um banho de sol para o Brasil”, confirmando o que os aquecedores solares podem fazer pela sociedade e o ambiente. Ao substituir torneiras e chuveiros elétricos, pode haver uma economia de 35% no consumo de energia elétrica de uma residência.

Que outras iniciativas estão dando certo?
Há famílias conseguindo instalar sistemas de baixo custo com garrafas PET e Tetrapack. Gostaria também de destacar o projeto Energia Solar e Ecoturismo na Mata Atlântica, também da Vitae Civilis. Moradores e organizações da região de São Lourenço da Serra (SP), onde está a ONG, vêm aproveitando as garrafas de refrigerante e embalagens de leite para reter o calor solar que esquenta a água e passa pela tubulação. O projeto inclui campanha de coleta de embalagens que iriam para o lixo e o sistema é simples, não concorre com os equipamentos industrializados, além de reduzir o gasto com energia em famílias de baixa renda. A energia solar possibilita essa descentralização e os sistemas com reciclados servem para engajar a população nessa ideia. Após três ou quatro anos de vida útil, a pessoa decide se migra para o fabricado pelas empresas ou refaz os mesmos equipamentos. Monitores e lideranças da região também já estão sendo formados sobre as vantagens da energia solar e sua instalação.

Quais são os vilões que mais comprometem essa área?
O grande problema do uso de energia é o excesso de consumo, que leva ao aumento da produção e ao esgotamento de fontes não renováveis. E a emissão de gases do efeito estufa pelo uso de combustíveis fósseis é o principal vilão do aquecimento do planeta. Embora no Brasil a maior parte da energia elétrica seja produzida em barragens, a política governamental atual está permitindo a construção de usinas termoeletrícas.

Como o leitor pode atuar nessa área, na prática?
A economia de energia pode ocorrer em várias frentes, da instalação de sistemas simples de aquecimento solar, iluminação da casa sem desperdício e economia no uso de aparelhos elétricos, até na própria reflexão sobre o consumo anual, questionando gastos desnecessários. O leitor também pode consultar dicas para diminuir as emissões e o desperdício na página da campanha Mude o Consumo Para Não Mudar o Clima (climaeconsumo.org.br), iniciativa do Vitae Civilis em parceria com o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (IDEC).

Fauna

EDUCAÇÃO CONTRA O TRÁFICO ILEGAL

ONG: RENCTAS
A Rede Nacional de Combate ao Tráfico de Animais Silvestres foi criada em 1999, com sede em Brasília (DF). É mantida por instituições como o Grupo Itapemirim e a Fundação Avina, além de ter parceria institucional com mais de 33 organizações, como Universidade Metodista de São Paulo, Ibama e Ashoka.

PROJETO: REDE NACIONAL DE COMBATE AO TRÁFICO DE ANIMAIS SILVESTRES
Fica fácil entender a ameaça do tráfico de animais sobre as espécies em extinção quando ficamos sabendo que uma das partes dessa enorme cadeia, a dos consumidores que colecionam espécies raras, paga até 20 mil dólares por um único mico-leão-dourado no mercado internacional. Combater o crime, porém, depende não só de denúncias e cobranças, mas de ações educativas que conscientizem a sociedade como um todo para o valor de nossa fauna, inibindo a prática ilegal em todas suas etapas. A Renctas nasceu em 1999 para combater esse que é um dos problemas ambientais mais antigos do país, e se tornou uma das mais combatentes ONGs usando de sua melhor estratégia: a união dos diversos segmentos da sociedade, poder público, iniciativa privada e terceiro setor, em parcerias que aumentam a chance de preservação de nossos animais.

ATIVISTA: DENER GIOVANINI
Ele ficou conhecido na mídia por ser homenageado pela ONU como um dos mais importantes ambientalistas do planeta, e por aparecer na TV denunciando o tráfico ilegal. Fundador e coordenador da Renctas, Dener Giovanini luta há mais de 20 anos pelo meio ambiente no país, tendo participado da fundação do Partido Verde, em 1987, coordenado diversos projetos de conservação ambiental e recebido prêmios internacionais pelo seu trabalho de proteção da biodiversidade. Segundo ele, enquanto houver demanda por animais silvestres, o problema continuará. Conscientizar a sociedade brasileira se tornou, portanto, a missão número um da Renctas, que luta contra esse crime desenvolvendo ações em todo o território nacional.

Go Outside: Qual o diferencial da Renctas e como seus projetos funcionam?
Dener: Nossa principal estratégia foi identificar e conhecer a questão do tráfico, produzindo o primeiro relatório sobre o tema no país, já que até então não existia um diagnóstico da extensão do problema. Foram dois anos para conseguir uma visão profunda das principais rotas, espécies e ameaças ambientais. Hoje sabemos que até 38 milhões de animais podem estar sendo retirados ilegalmente dos ecossistemas brasileiros por ano, e que contribuímos com cerca de 10% do comércio ilegal de animais no mundo – terceira maior atividade ilícita do planeta, só superada pelo tráfico de armas e drogas. O diferencial da Renctas foi primeiro levantar dados para só então tomar iniciativas. Outro ponto é nossa maneira de trabalhar, buscando uma postura associativa, de apoio dos diversos segmentos envolvidos com o tema, em vez de só apontar o dedo para o que está errado. O objetivo é chamar cada um para sua parcela de participação, focar em ações que possam ser replicadas por parceiros e saber que sozinhos não resolveremos o problema num país continental como o nosso. Hoje, nossas campanhas educativas, filmes, exposições, publicações e dados são executadas no Brasil inteiro, por escolas, batalhões da polícia ambiental, prefeitura. Jogamos a semente e cada um cuida da sua planta. Damos oportunidade para voluntários participarem, exibirem filmes no bairro deles, por exemplo, e de outro lado fazemos workshops, mobilização parlamentar, campanhas de educação ambiental e exposições em aeroportos.

Qual o impacto e os resultados que a campanha vem obtendo?
Uma constatação pessoal minha é o aumento no número de e-mails que recebemos com informações sobre o tráfico. Hoje os traficantes se preocupam em esconder os animais silvestres nas feiras, o que antes ficava exposto abertamente. O comércio continua, mas houve uma mudança de comportamento da sociedade e dos próprios órgãos de fiscalização, graças também ao apoio da mídia. Outra constatação é quantitativa: fizemos uma pesquisa junto com o Ibope, em que 80% das pessoas disseram saber que comprar animais silvestres é crime e 76% afirmaram que jamais comprariam. Hoje podemos dizer que a grande maioria da sociedade condena essa prática.

Quais os principais problemas dessa área?
De todas as formas de degradação, o tráfico de animais é a mais cruel e um dos grandes responsáveis pela extinção de espécies. É devastador por vários motivos: não gera empregos nem impostos, e possui como base o aliciamento de comunidades menos favorecidas, que recebem um valor irrisório pelo animal capturado. Além disso, traz riscos à saúde dos envolvidos e, em termos ambientais, não afeta só a espécie traficada, mas traz consequências ecológicas para toda a cadeia de onde ela foi retirada. É um comércio que movimenta até US$ 20 bilhões anualmente no mundo.

Como costuma se dar o fluxo do tráfico animal? Em que ponta começa e em qual termina?
A cadeia social do tráfico animal é composta basicamente por três grupos: os fornecedores, pessoas das camadas mais pobres, que se utilizam da caça e descobriram nesse comércio uma renda complementar; os chamados intermediários, que transitam entre as zonas rurais e urbanas, como barqueiros, fazendeiros, motoristas de caminhão e ônibus, e os pequenos e médios traficantes que fazem a conexão com as grandes organizações criminosas; por fim, é claro, os consumidores, que se calcula sejam 60% do Brasil e 40% do mercado internacional. A maioria dos animais no Brasil vem das regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, e é escoada para Sul e Sudeste pelas rodovias federais. Depois são vendidos em feiras, principalmente em São Paulo e Rio de Janeiro, e exportados pelos portos e aeroportos para América do Norte, Europa e Ásia.

Quais são os vilões que mais ameaçam a fauna?
Acho importante citar os consumidores como grandes vilões. Eles vão desde de colecionadores e zoológicos particulares (pessoas que mantêm bichos de estimação e que movimentam os valores mais altos) a pet shops e indústrias química e farmacêutica (que usam as espécies para pesquisas científicas). Por fim, há a fabricação de produtos: o comércio de couros, peles, penas, presas de animais, que alimentam inclusive a indústria da moda e do artesanato, comprado em grande parte por turistas.

Como o leitor pode atuar nessa área, na prática?
É importante acessar o site renctas.org.br e conhecer mais sobre a questão. Hoje estamos lutando, por exemplo, para aumentar o tempo da pena para traficantes na lei de Crimes Ambientais. Há necessidade de uma nova consciência do cidadão para que os projetos de lei sejam acelerados no Congresso. E no dia-a-dia, as dicas são não comprar objetos e bijuterias com penas de animais, não comprar animais silvestres e denunciar o tráfico diretamente na Linha Verde do Ibama (0800 618080).

Florestas

GUARDIÃO DOS REFÚGIOS AMEAÇADOS

ONG: ALIANÇA PARA A CONSERVAÇÃO DA MATA ATLÂNTICA
Ela é uma parceria entre as ONGs SOS Mata Atlântica e Conservação Internacional (CI), e foi criada em 1999, com base em São Paulo (SP). Conta com apoio do Bradesco Cartões, Bradesco Capitalização, The Nature Conservancy, Fundo de Parceria para Ecossistemas Críticos (CEPF), Colgate-Palmolive, entre outros.

PROJETO: PROGRAMA DE INCENTIVO ÀS RPPNS
Eles preservam pedaços de mata que podem ter de 1 a mil hectares, criam corredores entre fragmentos isolados de vegetação e já são donos de mais de 500 Reservas Particulares do Patrimônio Natural (RPPNs) na Mata Atlântica. O esforço desses guerreiros ambientais surgiu de dentro de duas ONGs, a Fundação SOS Mata Atlântica e a Conservação Internacional (CI), que juntas criaram a Aliança para a Conservação da Mata Atlântica a fim de aumentar a escala da conservação dos últimos 7% que sobraram da floresta original. Pelo Programa de Incentivo às RPPNs, a Aliança repassa recursos diretamente para os proprietários de terra, capacitando e fortalecendo políticas ambientais. Com isso, a ONG ataca o ponto mais importante da luta pela preservação da mata atlântica: somente as áreas protegidas públicas não serão suficientes para manter a biodiversidade, já que mais de 70% das áreas naturais estão na mão de particulares. Somente a luta da sociedade civil garantirá a sobrevivência dessas matas.

ATIVISTA: MÔNICA FONSECA
A especialista em áreas protegidas da Conservação Internacional é bióloga e mestre em ecologia, e se aproximou da questão ambiental ainda na faculdade, de onde partiu imediatamente para uma organização de defesa do meio ambiente, a CI. Lá, ao perceber a importância de reconhecer os proprietários de terra que, sozinhos, sustentam essas reservas de natureza, a especialista em áreas protegidas se tornou uma espécie de madrinha do Programa de Incentivo às RPPNs da Mata Atlântica. Desde o começo da iniciativa, em 2003, a intenção do programa é orientar a criação de um verdadeiro mosaico de áreas protegidas na floresta atlântica, reforçar a relação direta com os proprietários de terra e apoiar projetos criativos nessas reservas – sejam eles de ecoturismo, educação ambiental e pesquisa, sejam de apoio financeiro para a própria criação de uma RPPN, que na lei acontece por um ato voluntário do proprietário, preocupado em deixar sua mata protegida para as futuras gerações.

Go Outside: O que é o programa e como ele funciona?
Mônica: Tudo foi concebido pensando diretamente no proprietário, especialmente no pequeno proprietário, visando o reconhecimento das pessoas físicas que recebem a verba a fundo perdido [sem necessidade de contrapartida financeira]. Já foram mais de R$ 4 milhões, captados do Bradesco Cartões, do Fundo de Parceria para Ecossistemas Críticos (CEPF) e da ONG TNC, beneficiando 133 projetos em cinco anos. Quem decide criar uma reserva em seu sítio ou fazenda precisa pensar em formas de sustentar a propriedade, além da proteção e fiscalização. Atendemos a esse público em suas questões, desde o momento em que decidem submeter a proposta até os trâmites jurídicos para criarem essas reservas dentro da lei. Desenhamos o acesso aos recursos da forma menos burocrática possível, para que possa ser feito diretamente pelo proprietário. Eles são nossos parceiros nessa empreitada de manutenção e recuperação, e seu engajamento e motivação mostram que existe um verdadeiro movimento de conservação em terras privadas no Brasil.

Qual o impacto e os resultados que a campanha vem obtendo?
O programa permitiu o aumento de cerca de 50% no número de RPPNs na mata atlântica. Sua filosofia se tornou uma referência no apoio ao setor privado, inspirando outros proprietários e fortalecendo as reservas já existentes, além de permitir uma maior organização entre eles para concorrerem a fundos mais complexos. Foram criadas mais de 200 novas reservas (um único projeto pode conter a criação de várias reservas) e 33 projetos de gestão dessas áreas, o que mostra ser possível conviver com a mata sem destruí-la, e achar caminhos para o desenvolvimento sustentável.

Quais os principais problemas dessa área?
Uma das questões que devem permear todas as ações de proteção e recuperação da mata atlântica é a valoração e o pagamento pelos serviços ambientais prestados por essas áreas de mata a toda a sociedade. A floresta remanescente é importante na produção de água, manutenção do clima e infinitos serviços. São os 7% que sobraram da mata atlântica que mantêm a vida nas cidades dos 17 estados brasileiros por onde ela se espalha, e quem protege precisa ser recompensado por isso. Então, os problemas são de falta de valorização desses serviços ambientais e mesmo de quantificar o quanto eles representam em termos econômicos para a sociedade, que hoje não paga pela água (só pelo tratamento e distribuição) ou pela limpeza do ar advindo das florestas.

Que outras iniciativas estão dando certo?
O crescimento das iniciativas de proteção em terras privadas está mostrando que as RPPNs são como núcleos para o envolvimento de novos públicos, como educadores, cientistas, universidades, poder público e empresas que podem investir ali. Esse potencial fez com que fossem lançados programas de apoio a RPPNs em outros biomas, como o Programa de Incentivo às RPPNs do Pantanal e a Aliança da Caatinga.

Quais são os vilões que mais comprometem o que resta da mata atlântica?
A falta de informação sobre o bioma e sua importância é o maior problema, bem como sua localização junto aos principais centros urbanos e industriais do país. Nesse cenário, surgem práticas econômicas que não consideram a superexploração dos recursos naturais, e faltam mecanismos eficientes de fiscalização e controle que assegurem o cumprimento da legislação ambiental em vigor.

Como o leitor pode atuar nessa área, na prática?
Eles podem mudar as práticas e a intensidade com que consomem, passando a ser compradores mais conscientes, que reciclam e reutilizam produtos, economizam água em todas as suas atividades diárias e, principalmente, buscam o conhecimento sobre a origem dos produtos que utiliza.

Áreas costeiras

PIRATAS BONS DE MARES

ONG: Sea Shepherd Brasil (ISSB)
Existe desde 1999, é sediada em Porto Alegre (RS) e entre seus principais patrocinadores e parceiros estão ou já estiveram Petrobras, Chevron, Texaco, Devon Energy, Agencia Global Comm de Propaganda e Publicidade, lojas Gang, Tropico Surf Shop, Ashoka Empreendedores Sociais, Fundação O Boticário de Proteção a Natureza, Ministério da Justiça, Ibama, Projeto Baleia Jubarte, Tamar, UFRGS e PUC/RS.

PROJETO: PRÁTICAS DE PESCA E CULTIVO AMBIENTALMENTE RESPONSÁVEIS
Ocupação intensa, pesca predatória e falta de saneamento são apenas alguns dos fatores que destroem ecossistemas marinhos da nossa área costeira e afetam baleias, golfinhos, corais e tartarugas marinhas. É nessa área que a Sea Shepherd atua. A ONG foi fundada em 1977, pelo ativista canadense Paul Watson, que foi um dos criadores do Greenpeace, mas depois partiu para a ideia de outra organização, mais ativista e combativa, que lutasse pela proteção dos mares do mundo. Todos na Sea Shepherd são voluntários, que ficaram conhecidos como “piratas dos mares” depois de afundarem 11 navios baleeiros ilegais e barrarem pesqueiros ilícitos. São mais de 30 anos de atuação efetiva: nos anos 1970, contra os baleeiros piratas japoneses; na década de 1980, contra a captura de golfinhos em redes de pesca de atum na América Central; nos anos 1990, como Guarda Costeira nas Ilhas Galápagos. Nos últimos cinco anos, a luta é contra navios baleeiros japoneses, que agem na Antártica, e russos, que navegam pelo Pacífico. No Brasil, a ONG existe desde 1999, com total autonomia da matriz norte-americana, e é responsável por belos projetos, como o Práticas de Pesca e Cultivo Ambientalmente Responsáveis, finalista do prêmio Empreendedor Social Ashoka & Mckinsey em 2005.

ATIVISTA: DANIEL VAIRO
Há 17 anos, o brasileiro Daniel Vairo, 34, começou como voluntário ativista da matriz internacional da Sea Shepherd em Santa Monica, Califórnia. “Mas já embarquei para a Noruega e Canadá, entre outros lugares, sempre para participar de ações contra a matança de focas, baleia e golfinhos”, completa ele, que em 1999, junto com o primo, o biólogo Alexandre Castro, conseguiu trazer a ONG ao Brasil. “A Sea Shepherd Brasil é a única filiada que tem total autonomia financeira e administrativa” diz.


SANGUE NOVO: Bote da Sea Sheoherd aborda navio baleeiro na Antártica

GO OUTSIDE: O que é a organização e como ela funciona?
Daniel: A Sea Shepherd Brasil é uma organização não-governamental ativista que tem o ideal de defender a costa brasileira. Administramos uma série de projetos e campanhas, entre elas a de proteção a baleias e golfinhos, e o salvamento de aves marinhas quando ocorrem desastres ecológicos na costa do país. Como o perfil da ONG é ser ágil e ter uma resposta rápida, as campanhas se estruturam de acordo com a necessidade do momento. Já projetos como o Práticas de Pesca e Cultivos Ambientalmente Responsáveis visam qualificar tecnicamente as comunidades tradicionais de pesca e maricultura, promovendo a inclusão social, gerando renda e ampliando a oferta de pescados e produtos com valor agregado. Em 2007, voltamos à bacia de Campos para capacitar ONGs e comunidades de pescadores de 15 municípios do litoral do Rio de Janeiro, preparando-os para as primeiras ações de proteção e recuperação dos ecossistemas costeiros, como por exemplo salvamento de animais frente a um eventual derrame de óleo.

(Reportagem publicada originalmente na Go Outside de maio de 2009)