Por Jason Daley OS FILHOS DE HASSELHOFF, GEOFF E MARK, colocaram as carteiras de motorista novinhas no bolso, vestiram as camisetas estampadas com a capa do seu disco predileto, entraram no pequeno Volkswagen Golf 1.5 CL 1986 e seguiram em direção ao sul, saindo de Reading, um subúrbio a oeste de Londres.
Enquanto isso, no porto de Poole, no Canal da Mancha, os Conedodgers, uma equipe composta por Declan Hicks, funcionário de uma cervejaria, e pelo mecânico marinho Ed Parke, zoavam com 12 latas de Carlsberg, enfiando as latinhas vazias em um compartimento de madeira que instalaram em seu cupê Volvo 1992. Em Londres, Benja Hedley e Denis Meehan, os garotos da Badger Racing, prenderam o velho reboque que compraram no eBay em seu surrado Mitsubishi Montero Magnum 4×4 1984.
Depois, como em uma espécie de cerimônia, cortaram os cabelos em estilo moicano e se mandaram da cidade. E, do outro lado da capital inglesa, bombeiros fechavam um posto onde o tanque de um pequeno VW Polo 1991 vermelho—pilotado por Emma Barber, da Equipe SloMoShun, e lotado até o talo de equipamento de camping, garrafas de combustível vazias e brinquedos de plástico—estava derramando gasolina pelo concreto.
Como coelhos movidos a gasolina, eles e outras 33 equipes de todos os cantos do Reino Unido se mandaram correndo para as balsas que os levariam à França. Todos na esperança de que, do outro lado da travessia, seus detonados carros, muitos deles encontrados em ferros-velhos, consigam levá-los ao extremo sul da Espanha, depois às Montanhas do Atlas, no Marrocos, até as areias do Saara. Era o primeiro dia do bizarro Desafio Plymouth-Dakar e, apesar dos 7.250 quilômetros e três semanas de viagem pela frente, a legião de calhambeques bravamente seguia seu caminho.
MINHA EQUIPE, POR UM BREVE MOMENTO, liderou o grupo. Até que tivemos de fazer um pit-stop em uma revendedora perto de Toulouse, na França. Sid Horman, de 43 anos, seu filho Martin, de 13, e eu paramos para observar nosso SEAT Malaga 1.6 1991, um sedan a diesel sem graça fabricado na Espanha que batizamos de Ros Bif 1 (homenagem ao meigo apelido dado pelos franceses aos britânicos, “rosbifes”), vomitar uma substância verde amarronzada oleosa que saía de seu reservatório, enquanto um mecânico insensível ameaçava apreender o carro por violar uma porrada de normas de segurança.
Havíamos caído na estrada dois dias antes do início oficial do desafio, em 18 de fevereiro, e pressionado nosso intrépido Ros Bif ao seu limite, acelerando até 146 km/h nas estradas da Gália. Em um determinado momento, a caranga quebrou. Após algumas mentiras mal-traduzidas, conseguimos passar a perna no mecânico, torcendo para que o motor não derretesse como Chernobyl antes que conseguíssemos parar para reparos na Espanha.
Na verdade, não havia pressa. As equipes entram no DPD com um único objetivo: cruzar a linha de chegada. O evento é a resposta de alguns ingleses malucos ao rally Paris-Dakar (agora Lisboa-Dakar), o famoso evento de 10.450 quilômetros que atravessa o deserto norte-africano. Enquanto o Paris-Dakar oferece altos prêmios em dinheiro, o DPD (Desafio Plymouth-Dakar), também carinhosamente chamado no Reino Unido de Rally dos Calhambeques (Banger Rally, em inglês), termina com um leilão de caridade.
Eu me inscrevi como co-piloto de Sid—um termo vago, considerando que nem sei dirigir carros com câmbio manual—depois que ele respondeu a uma mensagem no fórum de discussão do site do DPD. Durante nossa única e breve conversa antes de eu pegar um avião para a Inglaterra, Sid, que confessou ter tomado algumas garrafas de vinho antes de me telefonar, descreveu a si mesmo como um banqueiro internacional semi-aposentado da Ilha de Jersey que agora vive em uma fazenda em Devon.
Tradução: ele é um ex-gerente de banco que teve um colapso nervoso e se mudou para o interior para acalmar os nervos. Agora, dois anos depois, ele estava tomando remédios para controlar seu distúrbio bipolar enquanto completava seu orçamento vendendo produtos de limpeza de porta em porta e cuidando dos cavalos dos vizinhos. Ele era um homem cronicamente nervoso. Quando as coisas dão erradas, como acontece sempre com ele, Sid gosta de dirigir. E não no fim da fila.
O DPD COMEÇOU EM 2003, quando Julian Nowill, então um milionário de 43 anos, decidiu testar os limites dos carros Lada, aqueles esquisitos veículos soviéticos da Guerra Fria, que ele vinha colecionando desde os anos 80. Através de um jornal local, convidou outras pessoas a se juntar a ele em uma rota que exploradores independentes atravessam com carrões 4×4 há décadas. Bajul, capital da Gâmbia, foi escolhida como linha de chegada, mas Nowill chamou o evento de Desafio Plymouth-Dakar para tirar um sarro da corrida “séria” do Paris-Dakar.
O plano funcionou: a história virou notícia na BBC e gerou uma avalanche de interessados. Naquele ano, 43 equipes em antigos Peugeots, Mercedes e Renaults seguiram Nowill para o sul, saindo de Plymouth, apesar de não terem a menor idéia de como seriam recebidos nas fronteiras africanas ou se seus carros sem tração nas quatro rodas conseguiriam encarar o Saara.
Para surpresa de muita gente, os caras conseguiram chegar em Banjul, com exceção de umas poucas equipes. A saga chamou tanta atenção que Nowill organizou um repeteco em 2004. Quando me juntei a Sid em 2005, o DPD já havia se tornado um fenômeno cult, com 800 candidatos disputando as 200 vagas do rally, que é dividido em quatro levas de mais ou menos 50 carros, que partem entre dezembro e fevereiro com a intenção de completar o percurso três semanas depois de saírem da Grã-Bretanha.
O evento é único no mundo dos rallys automotivos e atrai homens e mulheres de todas as idades _de endinheirados aficionados por carro e casais de senhores a gente estranhíssima e, naturalmente, fãs de mecânica. “Não é tão radical como no início. Hoje tem mais gente de meia-idade interessada na caridade”, diz Nowill. “Mas eu tento manter vivo o espírito da corrida, por isso seleciono entre os inscritos os mais lunáticos.” Até agora, por sorte, ninguém morreu, mas isso quase aconteceu uma pá de vezes e, a cada corrida, um ou dois carros costumam acabar abandonados no meio do deserto, onde são depenados pelos beduínos. Por outro lado, vários veículos notáveis conseguiram sobreviver às areias do Saara. Em 2004, o Creamy Treats, um caminhão de sorvete em perfeito estado de funcionamento e cheio de picolés, chegou em Banjul, onde depois foi convertido em uma ambulância para uma cidade isolada no interior da Gâmbia.
Nowill não participou em 2005, mas seus idéias amalucadas estiverem presentes na forma de um guia de estrada de 15 páginas que oferece às equipes um vago percurso em indicações curtas e enigmáticas que normalmente mais confundem que ajudam. As equipes, selecionadas por Nowill, pagam uma taxa de inscrição de £ 200 (US$ 355). Em troca, recebem um número oficial do DPD, o tal guia, livros de viagem da editora Lonely Planet sobre o Marrocos e o Senegal e um convite para a festa de lançamento. Para participar da prova, os inscritos têm de concordar com os três mandamentos do DPD: 1) os carros podem valer, no máximo, £ 100; 2) preparos e reparos não podem custar mais que £ 15; e 3) as regras estão aí para serem quebradas.
Sid era particularmente fã do terceiro mandamento. Ele colocou quase US$ 1.500 no Malaga no ano anterior ao rally, pagando melhorias como pneus novos e faróis poderosos. Ele também decorou o exterior do veículo com adesivos coloridos que, com certeza, chamariam a atenção das pessoas pelo caminho, como “Eu só breco para as gatas” e outras frases sem noção.
Em nossa festa de despedida com a família Horman, Sid falou para sua câmera, enquanto erguia uma taça de champanhe. “Não sei se vamos chegar à Gâmbia, nem mesmo se vamos conseguir sair da garagem, para ser sincero”, disse. “Mas um brinde a uma grande aventura!” Com essas palavras, ele jogou a garrafa no chão, mas ela não se partiu, e o carro começou a se mover de ré para fora da garagem, como um cachorrinho se afastando do dono com o rabo entre as pernas.
DE DEVON À FRANÇA e daí para a Espanha, Sid, sempre vestido com uma camisa vermelha da Ferrari, não parou de tagarelar. Ele calcula a quilometragem, ensaia o cronograma e celebra nossa sorte por termos conseguido 15 caixas de rações militares da Guerra do Golfo para encararmos o deserto. Conta histórias de acidentes quase fatais com mountain bikes, relembra seus dias como manager de uma equipe de motocicletas de corrida e do breve período em que ensinou “técnicas avançadas de pilotagem” para policiais britânicos.
Mas, quando chegamos ao primeiro ponto de encontro do DPD, o estacionamento do Hotel Camillas, na pequena cidade de veraneio do sul da Espanha chamada Sotogrande, os solilóquios de Sid haviam passado de motor e esportes radicais para assassinatos e vinganças. Em uma área de descanso ao lado da estrada perto da cidade de Benidorm, ladrões arrebentaram a janela traseira direita do Ros Bif e pegaram tudo que tinha dentro.
“Não acredito! Drogados!”, ele ficava repetindo. “Pai, podiam ser bandidos”, sugeriu Martin, o filho adolescente. Drogados ou bandidos, não importa, o fato é que eles pegaram a sacola do laptop com os vistos e os passaportes de Sid e Martin, os documentos do nosso carro (a maioria, aliás, falsos), um saco com o inalador de asma do garoto e parte dos remédios de Sid. “Se eu os encontrar”, fumegou Sid, “vão morrer com certeza”.
Enquanto revíamos nossas opções, o estacionamento se encheu de monstruosidades automotivas. Algumas tinham belas pinturas de camelos de desenho animado. Outros pareciam ter sido colonizados por tatus. O carro de Emma Barber ainda estava vazando gasolina, os garotos da Badger Racing tiveram que revirar um ferro-velho em Gibraltar para encontrar um câmbio novo para seu Montero e os Conedodgers haviam perdido um escapamento.
Nos dois dias seguintes, macacos e chaves inglesas foram passados de mão em mão como se fosse um baseado para os pilotos consertarem seus freios, amarrarem os escapamentos e pregarem placas protetoras para proteger os tanques de gasolina das pedras. As equipes mais sortudas descansaram uma noite antes de seguir em grupos de cinco ou seis até o terminal da balsa em Algeciras para fazer a travessia para o Marrocos. Os azarados, como nós, tiveram que ficar alguns dias ajeitando as coisas.
Mandamos o Ros Bif para consertar, enquanto Sid e Martin pegaram um ônibus noturno para Madri para pedir passaportes novos. Eu esperei no hotel pela encomenda da DHL com os novos (e legítimos) documentos do Ros Bif.
Finalmente, o Malaga voltou da oficina. Sid e Martin também chegaram, cansados, mas com passaportes novos e cheios de disposição. Quando conseguimos partir, nossa vantagem já tinha se evaporado completamente.
À NOITE, A ESTRADA MARROQUINA se parece com qualquer estrada lotada de caminhões, mas basta parar em algum vilarejo para encontrar ruas cheias de movimento—grupos de homens jovens passeando longe da luz do Sol para evitar o calor do dia. Uma hora depois de entrarmos no país, paramos em um vilarejo bem iluminado para encher o tanque, mas figuras sombrias e o labirinto de ruas fizeram um irritado Sid bater em retirada. Uma hora depois, ele arriscou um rápido pit-stop em um posto de gasolina iluminado por néon, onde arranjou café e pão. Dali, seguimos em linha reta para o sul, desviando dos caminhões na escuridão. Às 6h da manhã, uma das horas do dia em que os muçulmanos anunciam em voz alta suas orações, sol revelava a silhueta coberta de poeira de Casablanca. Sid entrou no bairro financeiro, estacionou o Ros Bif próximo ao banco com mais cara de ocidental que encontrou e adormeceu no assento do motorista.
Perdemos três dias enquanto Sid e Martin negociavam vistos substitutos com a embaixada da Mauritânia. Depois, queimamos borracha feito loucos no caminho para Marrakesh, no sul, convencidos de que estávamos perigosamente atrás da manada. Justo quando já perdíamos nossas esperanças de ver outros carros do rally, avistamos a Rural Chic—uma equipe composta por recém-formados da Universidade de Bristol, em um Fiat 128 1978 amarelo-canário—de papo pro ar ao lado de um posto de gasolina.
Em menos de uma hora, mais oito equipes se juntaram a nós para atravessar as montanhas do Atlas em comboio, que é mais seguro. Apareceram os três carros da equipe SloMoShun, assim como os Filhos de Hasselhoff e os Conedodgers. Nossa fila de latas-velhas cruzou uma estrada estreita e sem proteção que vai de Casablanca a picos de 3.600 metros de altitude antes de descer para as planícies do Saara. A cada curva, víamos um pedaço do deserto antes de voltarmos para os verdejantes vales montanhosos.
Mas Sid não estava interessado na paisagem. Éramos os lanternas, e ele queria ser o líder. Quando o comboio chegou a um longo aclive, seus olhos faíscaram. “Olha só isso”, disse, entrando na contramão e pisando fundo. O Ros Bif fez o melhor que pôde. Passou um carro. Dois carros. Após o que pareceu ser uns dez minutos, estávamos no meio da fila, mas então um caminhão dos grandes apareceu no topo do morro a nossa frente e começou a vir para cima de nossa pequena lata de sardinha espanhola.
Sid tinha duas opções: dar uma guinada para a direita e jogar o Citröen XL azul da equipe SloMoShun no abismo ou enfiar a fuça no caminhão. Por uma fração de segundo, ele não fez nada e então, no último momento, o caminhão desviou para cima das pedras ao lado da estrada, o Citröen virou para a direita e nós passamos espremidos pelo espaço entre eles.
As outras equipes encararam o Ros Bif como se desejassem furar nossos olhos, mas Sid continuou acelerando até tomar a liderança. “Eu sou treinado em pilotagem avançada!”, explodiu. “Se todos soubessem dirigir, não teria tido problema nenhum!”
A PARTE MAIS SECA DO DPD é um trecho off-road de 560 quilômetros no deserto que dura três dias e passa pelo Parc National du Banc d’Arduin, no sul da Mauritânia. Sem postos de gasolina, sem fonte de água potável e sem marcadores de rota, é necessário contratar um guia e carregar suprimentos. Carros caem em bancos de areia e radiadores e tanques se arrebentam. A temperatura média ao meio-dia é de 35 ºC.
Com tanto potencial para o perigo, dei um perdido em Sid e Martin em Dakhla, a cidade mais ao sul do Saara ocidental, depois que estourou outra parte do motor do Ros Bif .
Se ele nos deixasse na mão de novo no meio do deserto, seria quase impossível as outras equipes incorporaram as três pessoas e nossas coisas. “Então você está abandonando a gente”, disse Sid, com frieza. “Entendo. Quando o caldo engrossa, você desiste.” Ele estava querendo arranjar uma desculpa para começar a falar sem parar, mas eu me recusei a levantar essa bola para ele.
Parti na tarde seguinte no VW Polo dos SloMoShun, com Emma Barber, uma mulher de negócios alta e loira na casa dos 30.
Também fazia parte da equipe seu pai, John, um mecânico de 70 anos com o pulso engessado, e sua esposa, Fuzzy, uma animada mulher de 60 anos com cabelo prateado espetado, num Citröen. Joe, o meio-irmão de Emma, e o amigo dele, David, ambos com 30 e tantos anos, fechavam a caravana em seu Rover 800 de oito cilindros. A. SloMoShun havia ganhado um monte de apelidos, incluindo Equipe Pânico, por causa de seus erros históricos _como, por exemplo, ter esquecido Fuzzy em um banheiro ao lado da estrada por quase uma hora. Eu os chamava de Equipe Chique devido ao hábito de dormirem em hotéis de luxo e por terem trazido cerca de uma dúzia de garrafas de vinho.
Nosso guia, Hamid, levou-nos, em sua Toyota branca, ao que parecia ser um pedaço aleatório do Saara, fazendo sinais a toda hora para acelerar o carro e evitar que atolássemos. Cruzamos a planície a 80 quilômetros por hora até que, 20 minutos depois, o Polo de Emma ficou preso na areia. Todo mundo descarregou o carro para desatolá-lo, enfiando pedaços de tapete sob os pneus para dar tração.
Pelo menos uma dúzia de salvamentos depois, paramos para acampar. A Equipe Chique levou uma hora para armar uma de nossas quatro tendas para quatro pessoas. Nesse tempo, montei as outras três e fiz o jantar. “Ah, você é exatamente como achei que um americano seria!”, disse Fuzzy. “Tão independente!”
Mas o bom-humor não durou muito. Na manhã seguinte, Emma entalou em um monte particularmente fofo de areia e decidimos deixar o carro para trás. “Adeus, Polozinho”, disse ela tristemente para seu companheiro, enquanto nos enfiávamos na cabine da picape de Hamid. Ao longo da tarde, paramos um monte de vezes para desenterrar morosamente os outros carros. Certa hora houve uma onda de pânico, quando a bacia do John se deslocou quando ele examinava embaixo do Citröen. “Entra na sua caminhonete e puxa esses carros daí”, Fuzzy exigiu de Hamid. “Não estamos te pagando para que esse senhor de idade precise ficar cavando!”
Continuamos avançando a passo de tartaruga e, na tarde seguinte, chegamos a Nouamghar, uma pequena vila de pescadores onde as dunas terminam em uma praia perigosamente estreita, a única rota de volta à estrada, uns 80 quilômetros ao sul. Acordamos ao nascer do sol para que nossa arrancada final coincidisse com a janela de três horas que a maré baixa nos daria, acelerando a 100 por hora até que o Citröen atolou. Levamos meia hora para liberá-lo. Faltando 15 quilômetros, foi a vez de o Rover ficar preso; as ondas batiam em nossos pés enquanto cavávamos a areia furiosamente.
"Allez, allez, allez!”, gritava Hamid. Faltavam sete quilômetros e ondas cada vez maiores batiam nos pneus. Então uma massa de pessoas se materializou no meio da poeira, abrindo caminho para nós. Chegamos à estrada. Fuzzy, que estava dirigindo, saiu do Citröen e acendeu um cigarro. “Meu Deus, isso foi horrível”, desabafou.
Prosseguimos a viagem até a capital da Mauritânia, Nouakchott, onde a Equipe Chique encontrou um restaurante que servia Heineken e, graças aos céus, um prato aceitável de batatas inglesas salgadas.
NOS ARREDORES DE SAINT-LOUIS, no Senegal, a Equipe Chique se acomodou em um caro resort na praia. Eu peguei carona com um nativo até Zebrabar, um camping uns 30 quilômetros ao sul do antigo porto colonial, onde as outras equipes estavam recuperando as energias após o deserto. Depois de alguns dias de descanso, enfiei-me no banco de trás do trailer cinza da equipe ReVolvor, pilotado por John e Sam Drew, uma dupla de pai e filho de Malmesbury, no sudoeste da Inglaterra. Os últimos ventos do inverno sopravam como se tivessem saído de uma fornalha por três dias.
Enquanto cruzamos aos trancos e barrancos os últimos 650 quilômetros pelo Senegal até Banjul, a cor dourada pálida do Saara virou um vermelho de tijolo, enquanto o asfalto ia deteriorando cada vez mais conforme avançávamos para o sul. Sempre que parávamos—em Touba, Mbacké, Kaolack—, crianças cercavam o comboio de dez carros, pedindo aos gritos “Bon-bons!” (Balas!) e “Cadeaux!” (Presentes!) e subindo nos pára-choques e tetos e enfiando as mãozinhas nas janelas abertas, como se fossem zumbis atrás de cérebros.
E então, sem pompas e celebrações, chegamos às quietas ruas de Banjuldo no fim de tarde. A vanguarda da DPD havia terminado vários dias antes e tinha sido escoltada pela polícia até o estádio nacional de futebol, onde fizeram um desfile para políticos locais. Nós nos encontramos com eles no luxuoso bar a céu aberto do Safari Garden Hotel, onde ficamos contando nossos relatos épicos noite adentro, tomando enormes quantidades de JulBrew, a cerveja local. Os 34 carros que sobreviveram em nossa leva foram quase todos vendidos a motoristas de táxi locais, acumulando um milhão de dalalis gambianos, ou cerca de US$ 40 mil, quantia que foi distribuída para o Hospital Victoria, que sofre com a falta de remédios e equipamentos, e outros grupos de Banjul.
Sid e Martin conseguiram cruzar a linha de chegada, embora não da maneira grandiosa que planejaram. Algumas horas depois de saírem de Dakhla, pifou outra peça do Ros Bif, e o calhambeque morreu em um campo minado mal demarcado que separa o Saara ocidental da Mauritânia. O carro foi rebocado até a cidade de Nouadhibou e vendido por US$ 300. Sid e Martin foram forçados a implorar por uma carona na caminhonete de um guia pelo restante da viagem. E, para piorar ainda mais, as rações militares estavam estragadas, fazendo Martin passar uma noite vomitando junk food.
A esposa de Sid, Ann, e seu filho mais velho, Peter, vieram de avião para que a família passasse as férias nos resorts praieiros de Gâmbia, levando duas garrafas de champanhe até o Safari Garden. Sid pegou uma delas e tirou a rolha. Quase toda a espuma vazou na hora. “Oh, céus!”, resmungou ele, tirando a rolha da outra garrafa. Aconteceu a mesma coisa com a outra, deixando Sid com uma garrafa quase vazia nas mãos. Bela maneira de terminar sua atrapalhada aventura.
(Reportagem publicada originalmente na Go Outside de dezembro de 2006)
Ilustração Mark Todd