Go Outside concorre a melhor capa do ano

Temos o prazer de informar que a revista Go Outside é finalista do concurso Melhor Capa do Ano 2011, realizado pela Associação Nacional de Editores de Revistas (ANER). Nossa capa (à dir.) está entre as 16 aprovadas por uma comissão julgadora composta por 10 pessoas indicadas pela diretoria da ANER. A votação vai até o dia 4 de setembro.

A capa vencedora será escolhida por votação na internet. Participe! Basta acessar o site oficial do concurso clicando aqui. A capa da Go Outside que concorre ao prêmio traz como tema a reportagem "Esporte Adaptado". Nela, é contada a história fascinante de atletas extraordinários com limitações físicas mas que nem por isso deixaram de amar e se sair bem em seus esportes.

As revistas participantes são publicações nacionais associadas à ANER e distribuídas pelo país entre 1 de julho de 2010 e 30 de setembro de 2011. Segundo a associação, o objetivo do concurso é reconhecer a melhor capa do ano levando em consideração valores visuais, conteúdo, integridade jornalística e inovação, para reforçar a importância do veículo "revista" no Brasil.

A entrega do prêmio será dia 12 de setembro, durante o V Fórum ANER de Revistas, em São Paulo.

A seguir publicamos um trecho da reportagem "Esporte Adaptado":

CONTRA ATAQUE

Persistência, determinação, coragem e força são os nobres atributos de qualquer atleta para derrubar barreiras no esporte. Alguns deles desenvolvem doses extras desses recursos e vão além da própria natureza

Por Maria Clara Vergueiro

Duas semanas depois de iniciada a viagem, enquanto eu cortava degraus em uma muralha de pedra íngreme, tive a sensação de que minha mochila colossal estava comprimindo minha espinha e esmagando meus órgãos internos. A tira que passava sobre meu peito me sufocava enquanto eu respirava com dificuldade o ar de oxigênio escasso e, a cada passo exaustivo, tinha a impressão de escorregar 60 centímetros a cada 30 que avançava. No caminho de volta, depois de ter deixado uma carga de equipamento em um acampamento mais elevado, escorreguei várias vezes nos profundos buracos congelados que haviam sido deixados pelas botas ao longo da trilha, meus tornozelo e joelhos retorcendo-se em ângulos bizarros. Cambaleei de volta para o nosso acampamento, instalado a 5.350 metros de altura, e atirei-me na neve, do lado de fora da tenda, totalmente esgotado. Tonto e nauseado, vomitei na neve, com lágrimas brotando dos meus olhos. Honestamente, não tinha certeza se teria a energia necessária para acordar na manhã seguinte e fazer tudo aquilo outra vez.”

Você pode até ter passado por situações parecidas com esta, descrita por Erik Weihenmayer no livro As Vantagens da Adversidade (Ed. Martins Fontes, 2008). O que talvez você nunca tenha experimentado é aventurar-se neste grau, só que de olhos vendados, com uma das pernas amarradas ou usando apenas uma das mãos. Erik teve os olhos “vendados” aos 13 anos, quando uma doença degenerativa na retina o deixou completamente cego. Não muito tempo depois, ele experimentou a escalada e dali em diante decidiu dedicar a vida a subir as montanhas mais altas do mundo. Em setembro de 2002, ele se tornou o primeiro (e até agora, único) homem cego a escalar os sete cumes mais altos da Terra.
Enquanto Erik pensa nas próximas empreitadas, a ultramaratonista norte-americana Amy Palmiero encarava mais uma prova, desta vez atravessando a Califórnia, nos Estados Unidos. A Western States 100 Mile Ultra Marathon é conhecida como uma das provas mais duras do mundo. Amy correu cerca de 161 quilômetros em trilhas que vão de Squaw Valley a Auburn – mais ou menos 24 horas sem parar. A prótese de corrida que ela usou na perna esquerda é apenas um detalhe. Em 2004, na sua primeira investida numa maratona, dez anos depois do acidente que a obrigou a rever sua maneira de fazer esporte, Amy levou o segundo lugar.
Exemplos como esses, e como os que você vai conhecer a seguir, nos levam a repensar padrões, lógicas e, principalmente, limites. Se o esporte é por excelência o lugar da superação, ele encontra sua forma mais pura nos atletas que mostramos nesta reportagem, de quem são exigidas doses ainda maiores de determinação, coragem e fé na própria capacidade para praticar a modalidade que amam. Sem medo de perder nem tempo para sofrer, eles descobriram uma forma diferente de transpor deficiências e desafiar-se fisicamente, usando a natureza como aliada para descobrir novos caminhos e possibilidades.

AMY PALMIERO, 37 ANOS, ULTRAMARATONISTA

Deficiência: amputada abaixo do joelho

Eficiência: resistência

“Por causa da minha experiência sei que não temos segunda chance para viver as coisas.”

PERDAS E DANOS

“Eu sempre fui atleta, desde os tempos de escola. Num acidente de moto, tive a perna esmagada. Depois de três meses e vinte e cinco cirurgias, amputaram a minha perna esquerda abaixo do joelho.”

SUPERAÇÃO

“Todos encaram algum tipo de desafio na vida. No caso dos amputados que conheci, o esporte funciona para trazer um senso de moving on, de continuar seguindo em frente todos os dias, apesar das dificuldades. E isso serve para qualquer pessoa, no esporte e na vida. Quando entrei em contato com crianças amputadas, vi o quanto o esporte tinha me dado confiança. Recentemente, uma menina que estava escalando uma montanha comigo [a norte-americana Amy trabalha como técnica na ONG Step Ahead, em Nova York, onde ela mora] queria desistir da escalada. Ela estava cansada, não gostava muito daquilo e me disse que não daria mais nenhum passo. Forcei um pouco a barra dizendo que ela poderia parar se desse mais cinco passos. Ela ficou muito brava, demorou cerca de meia hora, mas deu os cinco passos. Quando chegamos lá embaixo, ela percebeu o valor daqueles cinco passos. Aprendeu que dá para ir sempre um pouco mais longe, ganhou confiança, ficou mais forte. Essa confiança ninguém tira dela. Em abril deste ano ganhei o prêmio de atleta do ano da USATF [USA Track and Field, principal órgão oficial dos esportes de aventura nos Estados Unidos]. Fiquei muito honrada por ser a atleta escolhida para representar a ultramaratona. Sinto que todos os que me ajudaram ganharam comigo. Nada do que faço eu faço sozinha.”

ARMAS SECRETAS

“A experiência me ajuda muito no esporte. Sei que tive uma segunda chance, por isso dou o máximo de mim, porque a gente nunca sabe se vai ter outra chance. A corrida é a parte do triathlon em que me sinto mais à vontade. Sempre fui boa corredora e tenho uma facilidade natural para a corrida e características físicas a meu favor. Meu pai era levantador de peso e sempre me estimulou a praticar esportes. Uso uma prótese para correr, outra para pedalar e uma terceira para o dia a dia. Quando estou numa prova, tenho apenas equipamentos diferentes. Dá pra ser competitivo da mesma maneira que os atletas comuns.”

À FLOR DA PELE

“Quando estou nadando, correndo e pedalando numa prova, não me sinto exatamente no céu, porque estou competindo, como todo mundo. Mas fico muito orgulhosa de mim mesma por nunca desistir e espero estar, naquele momento, ajudando outras pessoas. A melhor coisa de treinar é saber que vou sair de lá ainda mais forte.”

ELIZIÁRIO DOS SANTOS “MOTORZINHO”, 48, TRIATLETA

Deficiência: lesado medular

Eficiência: carisma

“Não interessava quando eu ia chegar, mas sim que eu ia chegar.”

PERDAS E DANOS

“Meu apelido, Motorzinho, veio dos meus tempos de corrida de rua. Comecei a correr incentivado por alguns amigos que me convidavam para fazer cooper, como a gente chamava a corrida na época. Na primeira vez que corri, disparei na frente de todo mundo. Aí virei Motorzinho. Comecei a treinar em pista de atletismo, cheguei a fazer nove maratonas e uma ultramaratona em São Paulo, de 100 quilômetros. Eu já estava há quase 10 anos no pedestrianismo, tinha 35 anos, quando a loja onde eu trabalhava foi invadida e o assaltante disparou cinco tiros em mim. Perdi quase todo o sangue do corpo, fiquei oito meses internado e demorei dois anos para voltar para o esporte. As pessoas – amigos, parentes, comunidade – se mobilizaram, me tiraram do hospital onde eu estava internado e me transferiram para um particular, pagando todas as despesas. Com o dinheiro que arrecadaram em campanhas, foi possível até contratar quatro enfermeiros que se revezavam de seis em seis horas, me movimentando a cada meia hora, fazendo massagens, dando banho. Foi fundamental para a minha recuperação. Dor eu sinto até hoje e todo dia, porque tenho uma bala alojada entre a 4ª e a 5ª vértebras, mas já me acostumei.”

SUPERAÇÃO

“Recomecei a competir com a cadeira convencional mesmo e logo decidi que ia subir a Ilha Porchat [um dos pontos mais altos de São Vicente, litoral paulista, onde ele mora]. A primeira vez que botei na cabeça que ia ficar no esporte adaptado, fui pra lá. Não interessava quando eu ia chegar, mas eu ia chegar. Há 15 anos não havia essa acessibilidade de hoje, eu disputava espaço com os carros na rua, com os pedestres. Qualquer batidinha eu caía, não tinha equilíbrio de tronco. Adquiri esse equilíbrio no esporte, principalmente na água. Aprendi a nadar e comecei a fazer biathlon em 1998. A natação é o mais difícil para mim. Depois disso eu passei para o triathlon e, em 2003, fiz meu primeiro IronMan, em Florianópolis. Não consegui completar os dois primeiros que participei, só os últimos cinco. Todo o público me apoia muito, acompanha a minha trajetória. Sei que já inspirei muita gente que nem pensava em se superar. As pessoas vêm falar comigo, me dão os parabéns e nos anos seguintes me contam como passaram a fazer alguma atividade física por causa do meu exemplo. Meu sonho é ir para o IronMan do Havaí.”

ARMAS SECRETAS

“Meus equipamentos são bem ultrapassados, na verdade. Uso uma cadeira convencional para meus deslocamentos diários, outra para pedalar e uma de atletismo para as provas de corrida. A convencional é um pouco menor que a de corrida, até por conta da minha estatura [Motorzinho mede 1,64 metro e pesa 46 quilos]. A cadeira de ciclismo é outra coisa, tem corrente, pé de vela. A que uso nas provas de corrida é mais longa e tem uma aerodinâmica específica, com aro de impulsão. Estou trocando essa, que uso desde 2000, por uma americana com freio. A minha atual é de fundo de quintal, foi feita por um cara em Goiânia que fazia cadeiras comuns e copiou um modelo americano para mim, com algumas peças importadas. A nova vai custar US$ 3.000, mas vai fazer bastante diferença na minha performance. O atleta de corrida e o cadeirante podem ter um bom desempenho com um equipamento de qualidade e treino. Acordo três vezes por semana às 3h20 para conseguir sair de casa às 5h30 e volto pra casa só depois do almoço. Quando a gente se propõe a fazer algo grandioso, não vê mais nada. Tem que ter cabeça, coração e auto-estima; sem isso não dá.”

À FLOR DA PELE

“Na última edição do Iron Man Brasil, minha oitava participação, consegui quebrar meu próprio recorde na água. Quando saí do mar e vi no meu relógio o tempo de 1h23, fiquei muito feliz. Qualquer tempo abaixo dos anteriores é uma felicidade enorme.”