Fogo contra fogo

Por Bruno Romano, da revista Go Outside.
Fotos: Mayke Toscano

A BATALHA DE 13 DIAS PARA APAGAR o fogo que se alastrou pelo Parque Nacional da Chapada dos Guimarães, no Mato Grosso, finalmente chegou ao fim. O Instituto Chico Mendes de Preservação da Biodiversidade (ICMBio), responsável pela administração do Parque, confirmou à Go Outside – através de sua chefia – nesta segunda-feira que não há mais focos de incêndio dentro desta área de preservação. O estrago, no entanto, foi enorme: 5,8 mil hectares (dos 33 mil hectares) foram atingidos pelas chamas. No auge do combate, todas as trilhas e os atrativos chegaram a ser fechados. Neste fim de semana, os principais pontos turísticos foram reabertos para visitação, mas a travessia da Casa do Morro e a trilha do Morro de São Jerônimo seguem interditadas por tempo indeterminado.

Segundo o ICMBio, uma perícia vai ser iniciada nesta semana visando identificar as razões que desencadearam o incêndio. Para a entidade, não há possibilidade de ser algo natural. O primeiro dos focos surgiu no dia 1 de setembro, na morraria do Coxipó do Ouro, uma área vizinha ao Parque Nacional. As chamas ganharam força e invadiram a área de preservação, chegando a formar uma faixa contínua de cinco quilômetros. O calor durante o dia, os fortes ventos, a baixa umidade do ar e o próprio relevo montanhoso dificultaram bastante os combates iniciais. Para piorar, novos pontos de fogo apareceram durante as últimas duas semanas – todos os indícios apontam para ações criminosas. Para virar este jogo, uma equipe integrada lutou por vinte horas diárias, se revezando em turnos, com jornadas que começavam às 4h da manhã e se estendiam pelo dia e noite seguintes (entenda o dia-a-dia do combate abaixo).


NÃO FOI CAUSA NATURAL: Acima e nas imagens a seguir, brigadistas lutam contra o fogo criminoso que devastou a Chapada dos Guimarães neste mês de setembro (Fotos: Mayke Toscano)

A luta chegou a juntar 100 pessoas, com liderança do ICMBio e do Corpo de Bombeiros Militar de Mato Grosso (CBM/MT), além de brigadistas do IBAMA e da CIOPAER, a Companhia Independente de Operações Aéreas do Governo de Mato Grosso. Nos últimos dias, moradores, entidades locais e guias do Parque se uniram às autoridades para uma ação voluntária. Para Christian Berlinck, coordenador nacional de Emergências Ambientais do ICMBio, o trabalho integrado dos brigadistas e as chuvas noturnas do dia 9 de setembro foram fundamentais para vencer o fogo. De acordo com Cintia Brazão, chefe do Parna da Chapada dos Guimarães, os prejuízos englobam a vegetação – que não consegue se recuperar nesta época sem chuvas – até os diversos animais – que morreram no incêndio ou tiveram seus hábitos seriamente afetados. Com o incêndio controlado, Cintia e Christian se encaminharam nesta segunda-feira para compromissos em Brasília.

Para Carolina Potter, chefe substituta do Parque Nacional da Chapada dos Guimarães, há várias possibilidades para explicar os incêndios, já que o Parna fica bem próximo a capital, Cuiabá, e conta com uma rodovia cortando a área verde. “Temos uma série de questões, como motos passando por trilhas, perda de controle de lixos incendiados em residências, e até ações criminosas intencionais. Enquanto estamos combatendo um foco, alguém taca fogo em outra área. Isso já aconteceu muitas vezes”, diz Carolina.

Com a chegada das chuvas esperadas pelos próximos meses, a situação tende a se normalizar. Mas para tentar evitar novos incêndios até o fim do período de seca deste ano, o ICMBio pretende manter um trabalho que une cursos para brigadistas e conscientizarão em escolas e comunidades locais, além de rondas e vistorias periódicas nas áreas do Parque. Infelizmente, os incêndios não são novidade no pedaço. Em casos recentes, nos anos de 2010 e 2012, a devastação foi ainda maior, de acordo com dados do ICMBio – desta vez, um quinto do Parque foi queimado. O prejuízo ambiental que isso representa, no entanto, é incalculável.


Chapa quente

Acompanhamos o dia-a-dia do combate ao incêndio na Chapada dos Guimarães.

01/set: Um incêndio é iniciado na morraria do Coxipó do Ouro, área vizinha ao Parque Nacional da Chapada dos Guimarães. O foco surgiu próximo à rodovia estadual MT-251, entre Cuiabá e o município de Chapada dos Guimarães. Segundo o ICMBio, não há possibilidade de o fogo ter razões naturais.

02/set: Na madrugada da terça-feira, brigadistas e entidades ligadas ao Parque começam o combate às chamas. ICMBio, Corpo de Bombeiros Militar de Mato Grosso (CBM/MT), IBAMA e CIOPAER (Companhia Independente de Operações Aéreas do Governo de Mato Grosso) se juntam para atuar em longas jornadas, tentando controlar o fogo.

03/set: As chamas alcançam a área de preservação, atingindo a região da cachoeira do Véu de Noiva, o atrativo mais visitado do Parque. O combate segue em turnos, um trabalho de 20 horas por dia.

04/set: Surgem novos focos de incêndio na área. São formadas três frentes de combate. Relevo, grandes distâncias, fortes ventos, calor e baixa umidade do ar deixam a batalha ainda mais difícil. O fogo chega a se espalhar por cinco quilômetros contínuos.

05/set: Número de combatentes ao fogo chega a oitenta pessoas. A equipe consegue diminuir as chamas, evitando que se espalhassem por mais áreas críticas de preservação no Parque.

06/set: Surge novo foco de incêndio próximo ao Rio da Paciência (margens da rodovia MT 251). Equipes seguem em combate e contam com a instalação de bombas para captar água diretamente dos rios da região.

07/set: A administração do Parque define que a partir de terça-feira (8 de setembro) todos os atrativos serão fechados ao público, devido o combate ao incêndio.

08/set: Ventos fortes fazem fogo se espalhar pelo Circuito de Cachoeiras. Outro foco, no noroeste do Parque, ganha força e avança na área de preservação. A Secretaria de Assistência social de Chapada dos Guimarães e alguns proprietários de terra em Cidade das Pedras começam a colaborar no combate, que passa a mobilizar 100 pessoas.

09/set: Primeiro boletim de “fogo controlado”, ainda que não extinto totalmente. As chuvas durante a noite colaboraram. Duas frentes, no entanto, seguem na ativa: uma na região de Mutuca e Cidade das Pedras, e outra no Circuito das Cachoeiras e São Jerônimo. Moradores, instituições locais, voluntários e guias aderem ao combate.

10 e 11/set: Equipe de combate estima que a área queimada dentro do Parque seja de cerca de 5.800 hectares, o que representa aproximadamente 18% do total desta Unidade de Conservação. A administração do Parque anuncia a reabertura dos atrativos para o fim de semana.

12 e 13/set: A visitação é reaberta em várias áreas do Parque: Véu de Noiva (local mais visitado), cachoeira dos Namorados, Cachoeirinha, Vale do Rio Claro e Cidade de Pedras. Parte da equipe de brigadistas deixa a região. Os últimos focos de incêndio são controlados durante o fim de semana.

14/set: O ICMBio confirma o fim do incêndio. A entidade vai dar início à perícia na região durante a semana. A Trilha do Morro São Jerônimo e a Travessia da Casa do Morro ainda continuam fechadas para turistas, mas com previsão de reabertura para os próximos dias.