Invasão gringa


TOUCHDOWN: Jogador dos Mamutes derruba adversário dos Falcões no Saquarema Bowl II

Por Osmar Camelo
Foto por Eric Nascimento

Nem a garoa fina do sábado, 19 de fevereiro, tira o ânimo de Hugo Bustilho, 24 anos, que treina com seu time, o Santo André Huskies, no Parque Prefeito Celso Daniel, na cidade do ABC paulista. O local, um descampado coberto de pedregulhos, não é o que se poderia definir como ideal para a prática do esporte. Ajuda da prefeitura? Hugo já correu atrás… E é ali que eles devem treinar, disseram-lhe. Ostentando a camisa número 35, que pertenceu a Anthony Thomas, running back do Chicago Bears, time pelo qual Bustilho é fanático, ele arremessa, corre e instrui os outros jogadores. Estudante de Educação Física, Bustilho formou, além dos Huskies, o Metodista Cougars, para defender as cores da universidade em que estuda.

Em 2005, os Cougars foram terceiro colocados no 1o Campeonato Universitário de Flag Football 5×5 (modalidade menos “agressiva” de futebol americano, onde o objetivo é, em vez de derrubar o oponente para pará-lo, arrancar-lhe a fita presa na cintura), disputado no Mackenzie Tamboré. Além da Metodista, participaram do campeonato Unisa. Mackenzie, FMU, PUC-SP e Imes. A Unisa levou o troféu.

A carreira de Bustilho no futebol americano parecia mais uma história de um jovem com um hobby e nada mais. Em 2001, ele assistiu ao filme Um Domingo Qualquer, de Oliver Stone, sobre os bastidores de um time de futebol americano. No dia seguinte, arranjou uma bola oval e foi para a rua treinar uns passes. Desde então, montou dois times, vem alimentando sua paixão e sendo alimentada por ela. Colabora com a organização de campeonatos, compra troféus, medalhas e incentiva os aspirantes a atletas. “O futebol americano está se popularizando bastante no Brasil, mas vai levar um bocado para a profissionalização do esporte no país”, lamenta Renato Bastos, jogador e diretor dos Falcões, time da Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro. “Não temos divulgação. A mídia cobre o futebol americano só na época do Super Bowl [a grande final do futebol americano, que no dia 5 de fevereiro completou sua 40a edição], nossos campeonatos não têm espaço”, afirma.

Dentre os campeonatos citados por Bastos, está o Saquarema Bowl, cuja terceira edição foi disputada nas belas praias da vila, com participação de oito equipes fluminenses, entre os dias 18 e 19 de fevereiro. Eliminados nas semifinais, os Falcões, que haviam sido campeões no ano passado, voltaram mais cedo para casa. Decepcionado, Bastos nem quis saber quem levaria o troféu. Contudo, aos 24 anos – 150 quilos e 1,90 metro de altura –, o tackle dos Falcões não perde a disposição e o bom humor para voltar aos treinos. “Para jogar nessa posição precisa ser grande, meu irmão. Vamos continuar a jogar, tem sempre gente nova se interessando pelos treinos e, hoje, nosso time já tem uns 40 ou 50 jogadores”, conclui.

Desilusão à parte, Bastos e os Falcões perderam um ótimo domingo em Saquarema, com sol de quase 40 graus e muita gente na praia. Na final, os Piratas de Copacabana foram batidos pelo RJ Red Lions. Com uma vitória incontestável por 10 a 0, a equipe do Leme sagrou-se campeã. Além disso, um jogo curioso antecedeu a final: o Saquarema Big Riders bateu por 24 a 0 a Mistura de Mamutes e Hárpias. Ambos os times são formados exclusivamente por mulheres.

Outro dos mais famosos campeonatos do Brasil é o Carioca Bowl, que atrai centenas de pessoas às praias cariocas todo fim de ano, e que em 2006 segue para sua sétima edição. As equipes que se preparem. Está difícil parar o Botafogo Reptiles, tetracampeão da competição.

A maioria dos garotos que hoje disputam os campeonatos de praia no Rio de Janeiro conheceu o esporte pela TV. E isso não é algo recente. “Assisti a um jogo pela primeira vez aos 10 anos, na antiga TV Tupi. Por incrível que pareça, eles transmitiam o jogo aos domingos à noite”, lembra Paulo Arcuri, 46, hoje presidente da Abrafa (Associação Brasileira de Futebol Americano e Flag). O garoto de então se apaixonou pelo Dallas Cowboys e decidiu ir além de sentar em frente à TV. Começou a jogar, estudou as regras e a tática e criou a associação, sem fins lucrativos, regulamentada por lei e com incumbências de federação.

A Abrafa trabalha pela popularização do esporte, promovendo eventos, workshops e campeonatos. Para esse ano, estão previstos um campeonato paulista de flag football, um campeonato escolar, um torneio Rio-São Paulo e um esperado campeonato nacional. Além das atividades da Abrafa, Arcuri é o treinador das equipes escolares e universitárias do Mackenzie Tamboré. Entre seus objetivos, está o de implantar uma liga universitária forte, que incentive os alunos a jogarem como nos moldes norte-americanos, onde a NCAA (National College Athletics Association) é a responsável, nos campeonatos universitários, pela revelação de novos talentos. Como parte da estratégia de popularização, Arcuri trabalha muito com o flag football, formando, inclusive, equipes femininas.

Para os interessados em arremessar ou receber uma bola oval, há vários caminhos a serem percorridos. No Rio de Janeiro, o caminho mais indicado é o das praias. Por quase toda orla existem equipes treinando e novos jogadores são sempre bem vindos. Em São Paulo, a Liga Flag SP, que no último campeonato reuniu seis equipes, é uma possibilidade, tanto para montar o próprio time quanto para se juntar a equipes já formadas. Segundo um dos diretores da liga, Fábio Moreno, o primeiro semestre deste ano será dedicado a “rachões” e “contras” para entrosar e motivar as equipes e testar novas regras e convenções. No segundo semestre a liga promoverá seu campeonato. Para Moreno, todos que estiverem dispostos a jogar serão bem vindos. “O que a liga exige é seriedade.Temos responsabilidades para montar um campeonato, por isso os times têm de se empenhar nos seus compromissos”. Costumam acontecer treinos de sábado ou domingo no parque do Ibirapuera. Para manter-se informado, acesse o site www.ligaflag.com.

(Reportagem publicada originalmente na Go Outside de março de 2006)