A última onda de Mark Foo


FOCO: Cãmera montada na frente da prancha de Mark Foo capta o surfista dentro de um tubo em Pupukea, no litoral norte de Oahu, no Havaí
(Foto: Steve Wilkings)

Por Jon Krakauer

A 35 QUILÔMETROS DE DISTÂNCIA DE SÃO FRANCISCO PELA HIGHWAY 1, uma porção de terra escarpada chamada Pillar Point se estende sobre o frio Pacífico. A sexta-feira de 23 de dezembro de 1994 amanheceu um belo dia nesse trecho da costa. Ondas enormes arrebentavam contra o rochedo, lançando vagalhões de névoa que se espalhavam sobre as praias. Além do fim do Point, cerca de 15 surfistas boiavam sob o silencioso sol de inverno, varrendo o horizonte em busca de ondas.

Não era incomum encontrar surfistas além dos limites do Point — um local que eles chamam de Maverick’s —, vestidos com pesadas roupas de neoprene com capuz, sentados em grandes pranchas. Mas o helicóptero pairando acima deles, os três barcos com fotógrafos logo além da linha das ondas e a faixa contínua de espectadores percorrendo os morros sugeria que essa não era uma sessão de surf qualquer.

Por mais de uma semana, as maiores e mais perfeitas ondas da última década trovejavam sobre o recife no final de Pillar Point. A notícia se espalhou rápido entre os surfistas do mundo: Maverick’s, lar de uma das maiores ondas do planeta, estava à toda. Ao saber disso, um trio de renomados surfistas havaianos de grandes ondas — Brock Little, Ken Bradshaw e Mark Foo — veio correndo para a Califórnia para se juntar à turma local.

Os nomes dos três havaianos são conhecidos pela maioria dos cinco milhões de surfistas do planeta. Quem era o melhor dos três no começo daquele dia é discutível, mas não há dúvidas sobre quem saiu da água com mais renome. Mark Sheldon Foo não sofria de excesso de modéstia ou dúvidas sobre si mesmo. Em seu currículo, descrevia a si mesmo sem a menor vergonha como “a lenda viva consumada do surf”. Seus detratores o descreviam como “metido” ou coisa pior, mas isso não perturbava Foo. Em sua agenda havia o telefone dos maiores fotógrafos de surf, cuja amizade cultivou e com quem mantinha íntimo contato. Sua foto aparecia na mídia com incrível freqüência, além de ser apresentador de um programa sobre surf na TV a cabo.

Foo não escondia sua sede por fama ou sua estratégia para consegui-la: pegar as maiores ondas do mundo com audácia sem igual, e fazer isso na frente das câmeras. De fato, naquela manhã de sexta-feira, as câmeras estavam presentes para documentar o histórico encontro entre Foo e seus colegas em Maverick’s.

APESAR DE ESTAR TÃO PRÓXIMO DE SÃO FRANCISCO E SANTA CRUZ, até 1990 somente um punhado de gente havia ouvido falar em Maverick’s. E somente um homem — um morador local chamado Jeff Clark — havia tido a coragem de surfar ali. Clark, de 38 anos, é um homem forte e taciturno com olhos azuis-gelo e cabelo descuidado, endurecido pelo sal. Desde os nove anos viveu a menos de oito quilômetros de Maverick’s, que fica escondido atrás de morros costeiros altos e não é visível da estrada a não ser que se saiba onde procurar. O point foi notado pela primeira vez em 1962 por um surfista de São Francisco chamado Alex Matienzo, que pegou um swell pequeno e surfou algumas ondas respeitáveis que quebravam no recife interno. Ele batizou o lugar em homenagem a seu pastor alemão, Maverick, que o tinha seguido até as ondas.

Clark começou a pensar em surfar em Maverick’s quando era adolescente. Todo inverno ficava observando aqueles tubos enormes passando pelo final de Pillar Point e se perguntava por que ninguém os surfava. No fim de 1974, ele saiu remando em sua prancha para dar uma olhada e, embora ninguém em sã consciência fosse tentar surfar em ondas de mais de sete metros com pranchas de menos de três metros, ele subiu em cinco ondas grandes em uma prancha de 2,30 metros (era a maior que tinha na época), tornando-se assim a primeira pessoa a surfar em Maverick’s na época do ano considerada mais casca.

Como não conseguiu convencer ninguém a ir com ele, Clark continuou a surfar ali sozinho pelos quinze anos seguintes. Ele morria de vontade de apresentar Maverick’s a outras pessoas, mas não se incomodava com a solidão. “Depois de tanto tempo sozinho na água”, diz ele, “eu me tornei capaz de sentir como as ondas iam quebrar”. Dia a dia, ano a ano, ele observou e fez um catálogo mental de cada nuance de vento, maré e swell.

A coisa mais assustadora em Maverick’s, entretanto, são as rochas. O recife externo de Maverick’s fica sete metros abaixo da superfície do oceano, uma plataforma de rocha submersa que surge abruptamente das águas mais profundas. Quando os swells chegam à costa, a primeira coisa que acertam depois de 3.200 quilômetros de mar aberto é Maverick’s. Projetada contra a frente do recife como um esquiador em uma rampa de salto, onda após onda é lançada quase aos céus. Os picos externos se quebram de tal maneira que qualquer surfista que errar a hora de dropar, descendo muito cedo, provavelmente seria lançado no Boneyard (o “Jardim de Ossos”) — um amontoado de pedregulhos serrilhados do tamanho de caminhonetes, contra os quais seria brutalmente esmagado pelas ondas. Clark, que já teve seus problemas com o Boneyard, diz solenemente, “antes de cair na água, você precisa pensar com cuidado na pior hipótese possível e depois se perguntar se está pronto para lidar com isso. Maverick’s pune os erros com mais severidade do que outros points. Já vi coisas ruins acontecerem lá”.

Além disso, Maverick’s tem uma vibe que faz a aura assustadora de Waimea, considerada o Everest do surf, parecer benigna. Em 1992, um artigo de Ben Marcus na revista Surfer descreveu Maverick’s como “sombrio, isolado, inerentemente malévolo. O recife é cercado por águas profundas e fica exposto a tudo de ruim que há sobre e sob o Pacífico: swells vindos das Ilhas Aleutas, ventos noroeste, tempestades do sudeste, correntes frias, elefantes marinhos e coisas que comem elefantes marinhos… Maverick’s irradia perigo”. Pregado na parede de uma loja de pesca no cais de Pillar Point há um recorte de jornal desbotado falando de um pescador local que pescou três tubarões brancos nas proximidades do lugar em um único dia.

No começo daquela manhã de sexta-feira, como uma piada do destino, as ondas não correspondiam às expectativas dos surfistas visitantes e da imprensa reunida. As ondas épicas da semana anterior tinham perdido boa parte de suas forças. A multidão na água e nas pedras criava uma atípica atmosfera de segurança. “Estava um tanto anti-climático”, confirma Bradshaw. “Umas poucas séries grandes surgiram, mas nada realmente impressionante. O pessoal estava só se divertindo”.

Pouco antes do meio-dia, entretanto, Maverick’s mostrou sua cara. Alguém nos penhascos gritou: “Série!”. Uma procissão de faixas escuras se movia na direção do Point a 22 nós. A quase um quilômetro da praia, Bradshaw viu os swells que se aproximavam e se colocou em posição. Ele deixou a primeira onda da série passar por ele e então começou a remar o mais rápido que pôde para pegar a seguinte. Quando a onda passou sobre o recife raso, ela se ergueu até a altura de uma tela de cinema de drive-in, pareceu parar por um momento, como se estivesse juntando forças, e começou a desabar para frente. Esforçando-se para ficar na onda, Bradshaw viu Foo — seu amigo e rival de longa data — vários metros à frente e um pouco à direita, tentando pegar a mesma onda.

Segunda as regras tácitas do surf, a onda pertencia a Bradshaw, pois ele estava mais “no fundo” — ou seja, estava posicionado mais próximo do pico. “Mas talvez eu estivesse fundo demais”, pensa Bradshaw, “e dava para ver que Mark já tinha decidido pegar a onda, por isso decidi sair fora e deixei ele ficar com ela”. Sem esperar, ele pôs as pernas no lado da prancha e a freou. A onda alcançou sua altura máxima e passou por baixo dele.

Empoleirado por um segundo na enorme crista, ele viu de relance Foo batendo os braços com força pela face, pronto para ficar em pé, numa posição perfeita para pegar a onda. Dezenas de câmeras, todas focadas em Foo, começaram a rodar. Seria a última vez que Bradshaw o veria com vida.

CERTO OU ERRADO, A MAIOR PARTE DA SOCIEDADE ENCARA O SURF COMO UM PASSATEMPO de verão para adolescentes. Mas o surf de ondas grandes tem pouco em comum com uma diversão praieira. Os perigos e desafios inerentes à atividade lhe conferem uma seriedade de propósito, até uma certa nobreza.

Menos de 100 pessoas no mundo inteiro têm a agilidade e os reflexos para se lançar nas mandíbulas de ondas com mais de 12 metros e emergir inteiro. Conforme a onda aumenta de tamanho, sua massa aumenta exponencialmente, assim como a energia liberada quando ela quebra. A diferença entre subir em uma onda da altura de um homem — o limite máximo da maioria dos surfistas — e cavalgar um monstro de 12 metros é a mesma entre dirigir a 60 km/h e a 320 km/h.

Algo entre sete e 10 metros é o tamanho em que o surf de ondas grandes, nas palavras de Bradshaw, “começa a virar realidade”. Não que ele ou qualquer outro surfista de ondas grandes com um mínimo de auto-respeito se deixaria pegar chamando uma onda de 10 metros de “onda de 10 metros”. Surfistas de ondas grandes empregam um método misterioso de cálculo reducionista, o qual todos seguem rigidamente, que diz que a altura de uma onda é medida em mais ou menos metade da dimensão real da face. Uma onda que se ergue 10 metros até sua crista é considerada uma de 5 metros. Seis, se o surfista for californiano e portanto, diferente dos havaianos, dado a exageros.

O surf de ondas grandes se originou no North Shore (litoral norte) de Oahu, em 1957, quando Greg Noll surfou pela primeira vez os fabulosos leviatãs de Waimea. Uns poucos o seguiram e, desde então, uma fraternidade de entusiastas das grandes ondas passou a se reunir no Havaí todo novembro, quando chega um poderoso swell movido pelo vento proveniente do Golfo do Alasca. Nos 25 anos seguintes, o clube continuou sendo uma irmandade fechada, não corrompida pela atenção esporádica que recebia do mundo em geral. Sua cultura caracterizava-se por uma intensa competitividade e machismo, mas seus membros preocupavam-se basicamente em impressionar uns aos outros.

Isso mudou por volta de 1983. As ondas foram excepcionalmente grandes e freqüentes naquele inverno no North Shore, e as fotografias espetaculares clicadas naquela temporada foram bastante difundidas. Após se preocuparem por muito tempo com acrobacias apertadas em ondas pequenas, as revistas de surf da Califórnia deslocaram seu foco para o desafio mais puro, mais elementar, das ondas gigantes.

Quando a atenção editorial focou-se em Waimea, as grandes empresas despertaram para o potencial de marketing do surf de ondas grandes, com a imagem heróica de homens confrontando titãs. Tornou-se possível que um surfista de talento com um mínimo de conhecimento sobre a mídia ganhasse a vida, ainda que modestamente, surfando em Waimea.

Coincidência ou destino, 1983 também foi o ano em que Mark Foo chegou no pedaço. Graças a uma combinação de descarada auto-promoção e completa falta de medo, ele rapidamente fez seu nome no Havaí. Antes disso, a maioria das pessoas surfava as grandes ondas com uma atitude séria, sem tempo para brincadeiras, que reduzia suas chances de detonarem. Foo, em extremo contraste, introduziu um estilo mais chamativo, atacando as ondas gigantes com o mesmo abandono que demonstrava no surf comum. “Mark ia atrás das ondas grandes com um pouco mais de garra que a maioria dos caras”, diz Dennis Pang, um dos amigos mais antigos e próximos de Foo, e um respeitado surfista e shaper do North Shore. “Ele com certeza corria os maiores riscos”.

A irmandade das grandes ondas via uma grande diferença entre coragem e simples estupidez. Essa última eles chamam de “comportamento kook”, um dos piores xingamentos no vocabulário do surf. Alguns dos rivais de Foo o rotularam de kook no começo, mas suas incríveis performances na água impediram que o adjetivo colasse. Em pouco tempo, o estilo maluco de Foo havia inspirado uma leva completamente nova de surfistas de grandes ondas.

Foo justificava os riscos dizendo, “se você quer pegar a maior das ondas, tem que estar disposto a pagar o maior dos preços”. Ele recitava essa frase tantas vezes e para tantas pessoas que acabou virando clichê. Mas Foo dizia veementemente para seus amigos que tinha a forte sensação de que morreria jovem. A maior parte de seus conhecidos, acostumados com sua predileção por pronunciamentos melodramáticos, não o levavam a sério e riam de seus comentários.

DEPOIS DE PASSAR A NOITE EM UM VÔO VINDO DE HONOLULU, KEN BRADSHAW chegou num carro alugado no estacionamento de Pillar Point, e ele e Mark Foo saíram para se esticarem no sol da manhã. Era uma dupla de aparência improvável. Com uma constituição de urso e feições 100% americanas, Bradshaw se assomava sobre o quase 1,80 metro de Foo, que tinha o rosto imperturbável de um monge Confucionista. O fato de terem chegado a Maverick’s como grandes amigos era talvez ainda mais improvável, considerando sua longa e freqüentemente amarga rivalidade.

Aos 36, Foo era mais jovem por cinco anos. Ele ainda tinha o físico de um boxeador peso-pena, mas estava começando a formar uma papada sob o queixo e linhas ao redor dos olhos. Vinte e seis anos na praia estavam começando a cobrar seu preço.

Nascido em Singapura, com ascendência chinesa, Foo passou a maior parte da infância na área de Washington, capital dos Estados Unidos, onde seu pai trabalhava na Agência de Informações norte-americana. Só foi aprender a surfar, ou mesmo a nadar, depois que sua família se mudou para o Havaí, quando ele tinha dez anos. Depois que foi apresentado ao esporte, Mark decidiu fazer do surf sua existência.

Em 1970, o pai de Foo foi transferido de volta a Washington e a família se reassentou nos subúrbios de Maryland, uma mudança com a qual o teimoso moleque de doze anos não pôde se conformar. As três crianças Foo cresceram com conforto em uma família cujos valores eram uma mistura de norte-americano típico com chinês tradicional, segundo SharLyn Foo-Wagner, a irmã mais velha de Mark. “Nosso pai era o americano básico, distante, trabalhador. Nossa mãe tinha temperamento forte, sempre foi uma feminista.” Independente de quem puxaram, os irmãos Foo “eram superintensos desde pequenos”.

Dois anos depois de chegarem a Washington, os pais de Mark relutantemente permitiram que ele fosse à Flórida para deixar sua marca como surfista. “Meninos chineses educados não sonham em ser surfistas”, diz SharLyn. “Minha mãe teria preferido que ele fosse advogado ou médico, como nosso irmão Wayne”.

Aos 17, Mark estava no North Shore de Oahu, o centro escaldante do universo do surf, onde se enfiou no circuito de competições. Inicialmente, seus resultados eram promissores, mas, em 1982, após não ter passado do 66º lugar no ranking mundial, ele foi forçado a aceitar que nunca seria um astro do surf. No que se mostrou um golpe de mestre, Foo abandonou o circuito profissional e se concentrou em colocar sua imagem nas revistas. Para isso, ele revelou ter um talento raro, figurando na capa das duas maiores revistas de surf meia dúzia de vezes — mais que muitos dos campeões mundiais que deram banho nele nos campeonatos.

Sua presença nas revistas, vídeos e televisão garantiu-lhe contratos promocionais com várias empresas ligadas ao surf, pagando modestas somas para Foo bancar o outdoor vivo de seus produtos. Foo nunca ficou rico, mas tinha os recursos para surfar onde e quando quisesse, e isso era o bastante para atrair a inimizade eterna de seus colegas.

Em 1983, Foo surfou em Waimea pela primeira vez. Sem se impressionar com a reputação da baía, ele atacava as ondas enormes com uma valentia que forçou a velha guarda a ficar admirada, mesmo a contragosto. Em janeiro de 1985, pegou uma onda em Waimea que, dizem, tinha mais de 17 metros de altura — maior do que qualquer coisa já surfada até aquele momento. Ele errou ao dropar do topo, caiu e recebeu o impacto total da onda. A prancha de Foo foi quebrada ao meio e ele foi jogado pra lá e pra cá como um pedaço de trapo em uma máquina de lavar, mas alcançou a superfície incólume e foi logo tirado da zona de impacto por um helicóptero de resgate.

Mesmo não tendo nem chegado perto de pegar aquela onda, Foo não perdeu tempo para mandar relatos da tentativa para revistas ao redor do mundo, e quando esses artigos foram publicados, cimentaram sua reputação como um semi-Deus das grandes ondas. Em uma entrevista, Foo declarou: “Em termos de performance, acho que ninguém surfa Waimea melhor que eu”. Ken Bradshaw, na época rei de Waimea, não concordava. Ele já surfava em Waimea nove anos antes de Foo pôr os pés lá, e a presunção do jovem surfista e sua falta de respeito irritavam Bradshaw. Foo morava bem perto de Bradshaw e os dois surfistas se encontravam com freqüência. Enquanto a ascensão meteórica de Foo continuava, esses encontros se tornavam cada vez mais tensos.

O ponto mais baixo na relação entre os dois ocorreu em 1987, na manhã de uma importante competição de surf em Sunset Beach. Durante o período de aquecimento, antes de começar a competição, segundo Pang, “Mark ficava dropando em cima do Bradshaw, roubando suas ondas, até que finalmente Kenny perdeu a cabeça. Ele foi atrás do Mark no canal e começou a bater e a dar caldos nele. Ken não machucou Mark pra valer, mas o humilhou na frente dos melhores surfistas do mundo. Quando Mark voltou, ele me chamou na hora e me contou como aquilo o tinha incomodado. Mas ele superou bem rápido. Alguns dias depois, era como se nunca tivesse acontecido. O Mark não deixava esse tipo de coisa incomodá-lo”.

Ao mesmo tempo em que podia ser obcecado e só pensar em si, Foo também podia ser muito simpático quando era de seu interesse. Havia algo de atraente em seu fervor, em seu entusiasmo infantil. Pelo menos cinco pessoas o consideravam seu melhor amigo. “Ou você gostava muito do Mark”, diz SharLyn, “ou o detestava muito. Ninguém ficava indiferente”.

Apesar de seu comportamento na água, Foo nunca foi de bancar o machão, como costumam fazer os surfistas da irmandade das grandes ondas. Ele tinha disposição de sobra para discutir seus sentimentos mais íntimos. Não tinha medo de bancar o piegas. Mulheres se apaixonavam por ele o tempo todo.

Uma semana antes de ir a Maverick’s, Foo ficou noivo de Lisa Nakano, de 28 anos. “Ele estava mesmo apaixonado por Lisa”, diz Allen Sarlo, um dos melhores amigos de Foo. “E a mãe dele gostava dela, o que era muito importante para Mark”. Sarlo fica quieto alguns segundos e depois diz, “o que deixa a coisa toda ainda pior é que o irmão mais velho dele, o Wayne, morreu há dois anos, logo depois de se formar em medicina, e o pai dele morreu uns três anos atrás. E há pouco tempo Mark escreveu uma carta para sua mãe dizendo que a ama tanto que não consegue imaginar a vida sem ela, que ele queria morrer antes dela”.


MONSTRA: No dia 23 de dezembro de 1994, Mavrick’s levou Mark Foo. Mesmo assim, surfistas continuam dropando ali

(Foto: Corbis)

JÁ PASSAVA DAS NOVE DA MANHÃ QUANDO FOO E BRADSHAW COLOCARAM SUAS ROUPAS DE NEOPRENE E CAÍRAM NA ÁGUA, remando até o line-up de Maverick’s. Dada toda a animosidade entre os dois surfistas ao longo dos anos, algumas pessoas se espantaram ao ver os dois juntos na água, mas Dennis Pang insiste que a amizade entre eles era genuína. “Não era só na superfície. Cerca de oito meses antes de Mark morrer, ele e Ken haviam se tornado amigos de verdade”.

Pessoas próximas dizem que a reaproximação se deveu principalmente ao amadurecimento de Bradshaw. Depois de duas décadas provando suas habilidades, ele já havia assegurado seu lugar no panteão de Waimea. Confortável em seu novo papel de ancião respeitado, Bradshaw já não sentia mais necessidade de encarar todo moleque que caía na água. Ele se viu achando graça das peculiaridades da personalidade de Foo que teriam causado surtos de raiva alguns anos antes.

Em 23 de dezembro, Foo visitou pela primeira vez Maverick’s, mas Bradshaw já tinha estado lá várias vezes. “Eu sempre chegava um pouco fora da hora e perdia as ondas realmente grandes”. Na verdade, Bradshaw tinha estado na Califórnia apenas seis dias antes. Ele passou parte do sábado, 17 de dezembro, surfando em condições medíocres em Maverick’s, e voltou para o Havaí logo após ouvir que havia previsão de um swell gigante no North Shore. “Não esperar mais um dia na Califórnia foi um grande erro”, admite Bradshaw, “um dos maiores erros que já cometi”.

Na mesma hora que o avião de Bradshaw estava se dirigindo a Honolulu, uma massa de baixa pressão desceu do Golfo do Alasca e atingiu a costa californiana, dando início à semana com as maiores e mais perfeitas ondas já vistas em décadas, talvez em toda a história. “Na segunda, 19, Maverick’s tinha superado qualquer limite”, diz Mark Renneker, um médico de São Francisco que, aos 43 anos, ocupa uma posição de destaque na comunidade surfista da cidade. “Na quarta, elas estavam ainda maiores”.

Renneker, Jeff Clark, um novato em ascensão chamado Evan Slater, um surfista famoso de Santa Cruz chamado Peter Mel – todos presentes naquela semana sabiam que estavam testemunhando algo memorável. Série após série, alguém pegava a maior onda de sua vida. Um moleque de 16 anos de Santa Cruz pegou uma onda estimada em pelo menos 17 metros de altura, feito que o colocaria na capa da Surfer. “Jay Moriarty”, dizia a manchete, “dropa para a história em Maverick’s”.

Quando Bradshaw e Foo chegaram ao line-up, receberam a notícia que as ondas haviam diminuído de tamanho durante a noite. O swell estava esporádico. Poucas ondas estavam passando dos sete metros — o que os havaianos diriam ser uns quatro ou cinco metros. Mas uma série grande aparecia de vez em quando, e os 15 surfistas presentes disputavam as ondas com unhas e dentes. A chegada repentina de Foo e Bradshaw deixou a disputa ainda mais acirrada. “Parecia um circo”, lembra Renneeker. “Uma boa demonstração para as câmeras poderia fazer a carreira de um surfista. Havia uma pressão incrível”. “A multidão estava quase indo ao delírio”, concorda Clark. “Os caras estavam forçando um pouco demais”.

Nos velhos tempos, antes de Foo ensinar a todos o valor de uma foto dramática, prevalecia uma atitude mais conservadora na galera das grandes ondas. Vacas eram consideradas comportamento kook, para não dizer perigoso. Mas a proliferação de contratos de patrocínios com base em bônus por foto mudou isso. Como sair tarde e do fundo — descendo pela parte mais inclinada da onda — resulta nas fotos mais espetaculares, surfistas ambiciosos são motivados a retardar o drop o máximo que puderem, e que se danem as conseqüências. “Os fotógrafos não estão nem aí se a gente acaba de pé na prancha e consegue pegar a onda mesmo. Tudo que os eles querem é tirar aquelas fotos animais”, explica Bradshaw.

“Não dava para acreditar no que eu estava vendo”, insiste Renneker. “Ali estavam os melhores surfistas de ondas grandes do mundo, todos se comportando como idiotas. Em parte, era porque alguns deles, que estavam surfando Maverick’s pela primeira vez, estavam subestimando a onda. Mas era principalmente coragem Kodak: fazer coisas que nem seriam tentadas se as câmeras não estivessem presentes. E Mark estava no meio disso tudo, completamente fora de posição, cometendo os mesmos erros”. Pode ser, admite Bradshaw. “Mas o mais estranho é que Mark não estava muito fundo na onda que o matou”, diz. “Ele estava exatamente onde devia estar”.

Um pouco antes do meio-dia, Foo enxergou uma série das boas no horizonte. A onda que escolheu tinha aproximadamente 10 metros da base até a crista. Surfistas menos experientes tinham surfado em ondas maiores na última semana sem incidentes. O próprio Foo havia se dado bem várias vezes em ondas maiores e mais perigosas em Waimea. Ele deixou a primeira onda da série passar, depois se virou e começou a dar braçadas fortes para pegar a segunda. No começo tudo foi bem. Enquanto a onda tornava-se cada vez mais côncava, Foo assumiu posição agachada, sua marca registrada, com os braços esticados para fora e para baixo, tentando manter o equilíbrio. Conseguiu manter o controle quando a prancha entrou em queda-livre debaixo do paredão de água. Ele parecia estar se equilibrando bem quando restabeleceu contato com a onda, no meio da face.

As ondas em Maverick’s, entretanto, são nervosas, imprevisíveis. “A configuração do fundo, os vetores de energia — tudo lá é incrivelmente complexo”, explica Renneker. “Por isso, as ondas ficam subindo e descendo e mudando, tudo em microssegundos. Não dá para saber o que vai acontecer em seguida”. Enquanto Foo ia descendo a face, lembra Allen Sarlo, “a onda se torceu e o fundo simplesmente se descolou”. A prancha virou para a esquerda e Foo foi lançado violentamente para frente. Colidiu com a água com uma força tremenda, batendo de barriga, o que torceu seus braços para trás e hiper-estendeu sua coluna. Ele quicou na superfície como uma pedrinha e nunca chegou a penetrar o bastante na onda para ter chance de escapar pelo outro lado. Incrustado no paredão do enorme tubo verde, foi puxado face acima e jogado de volta para baixo. Em câmera-lenta, o vídeo mostra a silhueta fantasmagórica de Foo suspensa no topo da onda, enquanto ela se dobra para frente, se fecha, e colide com a base em uma explosão de água que parte sua prancha em três pedaços.

Foo morreu como viveu: diante do olho criador de lendas das câmeras. Mais de 100 pessoas viram-no ser enterrado debaixo da onda. Vários segundos depois, entretanto, Brock Little e Mike Parsons, um renomado surfista de grandes ondas de Orange County que também estava surfando em Maverick’s pela primeira vez, pegaram juntos a onda seguinte, e quando o imenso muro de água se ergueu e começou a se dobrar sobre si mesmo, todos os olhos se voltaram para eles. Ninguém notou que Foo não voltou à superfície.

Parsons e Little droparam lado a lado. O nariz da prancha de Parson se abaixou demais e ele caiu duro. Dois segundos depois, Little foi moído do mesmo jeito. Caindo de costas, Parsons foi esmagado pela guilhotina líquida e arrastado para o fundo. “Foi talvez a pior vaca que levei na vida”, diz Parsons. “Levei um tempão para voltar pra superfície. E naquela hora nem sabia que o pior ainda estava por vir”. Enquanto lutava para voltar à superfície, desesperado por ar, ele foi atingido com força pelo que achou ser a cabeça e o braço de alguém. Na hora Parsons achou que fosse Little. Mas na verdade era Foo.

Little, a essa altura, estava lutando pela própria vida a cerca de seis metros dali. Presos no Boneyard, esmagados pelas ondas que se seguiam, tanto Parsons como Little foram arrastados para as rochas. O leash que ligava a prancha de Little ao seu tornozelo direito — uma linha de 5 metros de polietileno forte o bastante para rebocar um caminhão — se enrolou em uma pedra submersa, quase o afogando, e depois se partiu. Finalmente, Little foi arrastado até a segurança da lagoa interna.

O leash de Parsons também se prendeu em algo, mas ele não teve tanta sorte. “Estava amarrado debaixo d’água”, lembra, “sendo jogado contra uma rocha pelas ondas, sem ter como respirar. Sem fôlego sobrando, eu tinha certeza que ia me afogar. Já tinha aceitado isso e estava esperando morrer quando as correntes da onda desprenderam o leash de repente. Voltei para a superfície, mas levei umas boas porradas antes da corrente finalmente me levar até a lagoa”.

Bradshaw, além da linha de surf, com a visão obstruída pelos paredões de água, não tinha como saber que havia gente com problemas. Oitenta segundos depois de deixar a onda para Foo, sem saber o que estava acontecendo na zona de impacto, Bradshaw pegou a última onda da série, a maior de todas. Ele fez um drop perfeito, saiu rasgando pelo fundo, subindo e descendo pela face. Conseguiu cruzar quase 300 metros antes de a espuma o alcançar e o derrubar da prancha.

Remando de volta para o line-up, passando pelos barcos da imprensa, ainda sentindo os efeitos da adrenalina, Bradshaw parou para conversar com um fotógrafo chamado Bob Barbour. “Barbour me contou que Mark tinha levado uma bela sova”, diz Bradshaw, “e parecia que sua prancha tinha quebrado. Não achei que fosse coisa séria — pranchas quebram o tempo todo. Quando Mark não apareceu, eu achei que ele tinha ido buscar outra”.

Por volta de uma da tarde, o céu foi coberto por nuvens e uma brisa maral estragou as ondas. Os surfistas começaram a sair da água, o helicóptero foi embora e os barcos da imprensa se mandaram. Um dos barcos se dirigiu para o cais com Parsons, Evan Slater e dois fotógrafos a bordo. Logo antes da entrada do cais, alguém notou a parte de trás de uma prancha amarela e roxa boiando. “Parece a prancha do Mark”, comentou Slater casualmente quando passaram por ela. Então Slater notou o que parecia uma pessoa meio submersa, vestida com uma roupa de neoprene preta, flutuando de rosto para baixo ao lado de uma prancha quebrada. Sem querer acreditar no que viam, alguém insistiu que era só uma bola de alga marinha. “Não”, respondeu Parsons, sentindo-se tonto, “aquilo não é alga marinha”. Slater pulou na água e puxou Foo até o lado do barco, e os outros puxaram seu corpo inerte para bordo.

Até aquela hora, ninguém nem tinha suspeitado que Foo tinha sumido. Ele ficou na água mais de uma hora. O capitão contatou a patrulha do cais e dois paramédicos chegaram em minutos, mas todas as tentativas de reavivar Foo fracassaram. Não muito depois disso, Bradshaw, um dos últimos surfistas na água, pegou uma última onda e se dirigiu para a praia. No estacionamento, Jeff Clark o abordou. Gaguejando, quase incapaz de falar, Clark contou o que tinha acontecido com Foo, e Bradshaw saiu correndo até o porto. “Falei pro xerife que queria ver o Mark”, diz, sua voz falhando. “Eu tinha que vê-lo com meus próprios olhos para saber se era verdade”. Puxando a coberta que cobria o corpo, Bradshaw olhou para a face do amigo e depois virou o rosto.

A autópsia determinou que a causa da morte foi afogamento por água salgada. Porque Foo se afogou, entretanto, continua incerto. “Foi uma vaca bem feia”, opina Bradshaw, “ser arrastado pela onda daquele jeito, mas a mesma coisa já tinha acontecido com todo mundo umas cem vezes”. Foo foi encontrado com uma pequena laceração sobre o olho direito e uma abrasão passando por sua testa. Mas Renneker examinou o corpo e insiste que “os ferimentos na cabeça eram muito superficiais. É possível que ele tenha colidido com sua prancha e desmaiado, mas o patologista não encontrou nada sob o crânio que sugerisse isso. Minha especulação é que ele ficou preso no fundo”.

O solo do oceano nas proximidades de Maverick’s é cheio de cavernas, fendas e afiadas projeções rochosas erguendo-se como troncos petrificados. O corpo de Foo — ou sua prancha ou seu leash — poderia muito bem ter ficado preso a alguma formação rochosa, do mesmo jeito que Little e Parsons. A maioria dos surfistas presentes naquele dia em Maverick’s encara a morte de Foo como um acidente improvável. E pode muito ter sido isso mesmo. Mas ainda restam dúvidas.

Muito se disse do fato que a morte era um assunto em que Foo pensava e falava com freqüência. “Mark vivia falando que, quando chegasse sua hora, ele queria morrer surfando a onda perfeita”, diz seu amigo Allen Sarlo. Os amigos de Foo não sabiam o que fazer com essa preocupação mórbida e tinham dificuldade em encaixar isso com o resto de sua personalidade. Ele não demonstrava tendências suicidas e dirigia seu carro como um velhinho. Foo considerava qualquer comportamento perigoso completamente fora de questão — em uma cultura conhecida por festas agitadas, ele quase nunca bebia e não usava drogas. Exceto por surfar ondas grandes, ele detestava participar de qualquer tipo de atividade arriscada, e os riscos que assumia na água eram muito bem calculados.

Ele falava com entusiasmo para Lisa Nakano, sua noiva, sobre terem filhos quando se casassem. Nakano acrescenta, entretanto, que em inúmeras ocasiões Foo mencionou ter um “forte pressentimento que não viveria muito”. “Isso não o incomodava ou mudava o jeito que vivia sua vida, mas ele estava convencido que morreria surfando. E aceitava isso numa boa. Na época, eu não levava isso a sério. Não acho que alguém levasse”, diz ela. Como Foo tinha o hábito de fazer declarações tresloucadas, confirma sua irmã SharLyn, “a maior parte das pessoas achava que essa conversa sobre morrer era papo furado. Estatisticamente, o surf de ondas grandes não é tão perigoso assim”.

Rick Grigg fraturou o pescoço em Waimea em 1982. Uma onda das grandes partiu o fêmur de Titus Kinimaka no mesmo lugar em 1989. O próprio Foo tinha cicatrizes por todo o corpo de colisões com os corais do North Shore. Quebrou um tornozelo surfando em Pipeline dois anos antes e, na primavera anterior, uma quilha cortou seu joelho esquerdo, partindo tendões. Mas, apesar de todos os “quases” e experiências próximas da morte, Foo foi o primeiro surfista a morrer nas ondas grandes desde 1943. Diante disso, as evidências sugerem que o big surf é muito menos perigoso do que escalar ou mesmo esquiar saltando de helicópteros. Foi então só uma grande falta de sorte que duas ondas consecutivas consideradas de tamanho nada excepcional — ondas descritas como tendo de cinco a seis metros pelos sobreviventes — terem matado um dos surfistas mais bem-sucedidos do mundo e quase matado dois outros?

A morte de Foo está repleta de ironias sombrias, entre as quais a menor não é o fato que por anos ele foi acusado de exagerar os riscos das grandes ondas. Mas até que ponto Foo foi responsável por seu fim? Estaria ele se exibindo demais para as câmeras naquela manhã de sexta-feira? Teria sido descuidado e cometido um erro crítico? Na verdade, ele parecia estar fazendo tudo certinho na onda que o matou. Foo, famoso por seu exibicionismo, estava surfando de um jeito anormalmente prudente quando perdeu a vida.

EM 30 DE DEZEMBRO, UMA HOMENAGEM FÚNEBRE COM MAIS DE 700 PESSOAS foi realizada no North Shore de Oahu. Mais de 150 pessoas entraram no mar com suas pranchas até o meio de Waimea, deram as mãos para formar um círculo e jogaram colares de flores na água. Algumas palavras foram ditas, todo mundo disse o nome de Foo em voz alta três vezes, e então Dennis Pang tirou uma urna de cinzas de sua mochila e devolveu Foo às ondas.

Após a cerimônia, em uma tentativa de ver o lado positivo de sua perda, várias pessoas comentaram que, ao fazer uma saída tão dramática em Maverick’s, Foo conseguiu realizar sua maior ambição. Na morte, ele foi além da simples fama e adentrou no reino das lendas imortais. “Meu brô Mark”, especula Pang, “está sentado em algum lugar, sorrindo e penteando o cabelo, dizendo: ‘Quero só ver alguém superar essa!’”.

Nas primeiras horas de uma manhã californiana enevoada, Jeff Clark caminha pela praia até o fim de Pillar Point e fica pensando na extensão cinza-metálica do Pacífico. Um grande swell vindo do oeste está se aproximando do recife externo, lançando nuvens de espuma parecidas com rabos de cavalo por sobre as ondas em tubo. Clark fecha sua roupa de neoprene, espera por um intervalo entre séries e começar a dar braçadas. Faz quatro dias que Foo morreu. Ninguém surfou Maverick’s desde então.

Clark mergulha por baixo de uma onda pequena, pega a elevação que se segue, e continua avançando mar adentro. Quinze minutos depois, ele chega ao line-up. Parando sua prancha além das ondas, por um longo tempo apenas encara o mar aberto, sintonizando seus sentidos ao ritmo do oceano.

Na direção oeste, o Pacífico se ergue em uma seqüência de elevações escuras e a série que se aproxima arranca Clark de seu transe. Ele deixa o primeiro swell passar, e o segundo também, e depois vira sua prancha e começa a remar. O mar se ergue sob ele até formar um enorme morro esverdeado, levando-o aos céus enquanto Clark rema furiosamente pela face. Quando a onda se aproximava de seu apogeu, ele fica de pé num pulo e se joga na direção do abismo. Sobre sua cabeça, a crista se dobra e cai para frente em um imenso arco translúcido.

Não há fotógrafos presentes, nem multidões, barcos ou helicópteros —somente Clark, sozinho, deslizando por um colossal paredão de água salgada. Após 20 anos, o ato ainda lhe dá o mesmo prazer que sempre deu, aquele sopro de êxtase e transcendência. Com sua mente limpa e leve pela primeira vez em dias, ele acelera pela base da onda, se agachando ao máximo para demarcar sua trilha, e traça um elegante arco enquanto a onda se retorce e tenta engoli-lo — um tornado rugindo, expelindo espuma, caindo rápido por trás dele, além do alcance dos olhos.

(Reportagem publicada originalmente na Go Outside de julho de 2006)







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