Por Marilin Novak
DEPOIS DE QUATRO DIAS MAREANDO NO NAVIO, abri os olhos, ansiosa. Finalmente a embarcação estava ancorada em frente à estação Comandante Ferraz, a parte de terra (sem direito de posse) que cabe ao Brasil no continente gelado chamado Antártica. Na prática, estar fundeado defronte à estação significava o fim de quatro angustiantes dias de claustro no Ary Rongel, um navio com bandeira verde-e-amarela construído na Noruega, e que desde 1994 dá apoio às pesquisas científicas tupiniquins, depois que o saudoso Barão de Teffé foi aposentado. Ancorar perto da estação também significava captar o sinal de internet e telefone – bem-vindo à globalização! – por meio da antena que uma empresa brasileira de telecomunicação instalara no extremo sul do planeta. E o melhor de tudo: pisar em terra firme (ou melhor, em neve fofa) reorganizaria o labirinto do corpo e aliviaria a sensação de confinamento que os navios causam. Pra entender como é estar em alto-mar a bordo, faça o teste: fique de pé numa dessas cadeiras giratórias de escritório. Depois, peça para um amigo girá-la, bem devagar, de um lado para o outro. Agora, imagine comer, fazer xixi, tomar banho, dormir e o que mais você precisa fazer diariamente enquanto é balançado. É de surtar.
Nestes últimos quatro dias eu acompanhara o trabalho de sondagem do navio, que é a medição da profundidade do oceano por meio de sonar (pelo tempo que uma onda sonora bate no fundo e volta, sabe-se a profundidade do local). Para isto, o navio segue rotas paralelas, traçadas num pedaço de carta náutica ainda não mapeado. Depois, esses dados são incorporados definitivamente à carta oficial da região, numa cooperação entre Brasil, Chile e Argentina. O retorno prático e positivo desse trabalho eu descobriria dali a alguns minutos.
Ainda deitada em um dos dois beliches do camarote de 3 por 4 metros, que abrigava eu e mais três brasileiras (outra jornalista, uma pesquisadora e a “doc” ou médica da embarcação), estranhei o vai-e-vem do navio, supostamente já ancorado desde a madrugada. Comentei isso com a jornalista da cama de baixo e então recebemos a bomba pelo fonoclama, o sistema de som do navio que transmite os informes do dia: estávamos novamente em alto-mar, rumando em direção a um navio que estava naufragando.
Antes de saber qual era o tamanho da encrenca – que depois descobri ser um cruzeiro com 154 passageiros, entre tripulação, turistas e guias –, corri para a escotilha (janela), ainda na desesperada tentativa de enxergar o conjunto de 60 containeres que compunham a estação Ferraz. Mas eles já tinham sumido de vista. Restava vestir a jardineira impermeável, o casaco corta-vento, as botas isolantes de frio e subir ao passadiço do Ary, o centro-nervoso do navio onde fica o comandante e seus auxiliares e onde eu passaria quase o dia inteiro acompanhando o resgate.
Eram 9h30 da manhã e ainda não havia muita informação sobre o naufrágio em si, que seria o primeiro de um cruzeiro de turistas em águas antárticas. Pela tela do radar do Ary, sabíamos que o M/S Explorer era uma embarcação de 73 metros de comprimento e 14 metros de largura (o Ary tem 75 e 13). Informações complementares na tela também indicavam que ele estava a caminho do Ushuaia, na Argentina, onde deveria chegar dia 29 de novembro de 2007, depois de 19 dias de viagem pela Antártica. Faltavam 6 dias para eles atracarem em seu destino final.
O EXPLORER DEU SINAL DE QUE IRIA A PIQUE às 2 da madrugada, quando seu casco se rompeu no choque com algo submerso, que não sabíamos se era uma geleira ou uma rocha. Daí a importância da sondagem, para conhecer o relevo do fundo do mar. E pior: poderíamos ser nós a notícia do dia, pois o local do naufrágio estava exatamente no fim da última linha de sondagem que o Ary deveria ter navegado e que só não o fez porque era hora de retornar à Ferraz para outras atividades.
Apesar de termos atendido ao pedido de resgate juntamente com dois outros navios, chegaríamos por último ao local do acidente. Os M/S National Geografic Endevour e o Nordnorge estavam a cerca de 20 milhas (37 quilômetros) de distância do naufrágio e nós a 45 milhas (83 quilômetros).
Ferraz havia sido contatada pela estação chilena e nos retransmitira o pedido de ajuda às 4h50 da manhã. Antes das 11 da manhã já dava para avistar pelo binóculo o navio adernado e os barcos de resgate. Dois helicópteros decolaram do nosso navio e os pilotos brasileiros traziam informações e fotos à sala de comando, entre um vôo e outro. Nestas imagens, via-se o Explorer inclinado cerca de 60º para boreste (à direita) e ao redor dele, muitos botes a motor e baleeiras (botes a remo para até 40 pessoas que os navios transportam para resgate) recheados de náufragos, na sua maior parte vovôs e vovós, que então levariam aos netos histórias adrenantes das últimas férias.
Se o trabalho de resgate foi aparentemente tranqüilo, foi por pura sorte dos naufragados. Era um dia de sol numa região onde a regra é o tempo ruim. O Explorer adernado agonizada, mas se mantinha estável na mesma inclinação, dando tempo de todos fugirem. O pior para os passageiros foi permanecer em baleeiras cerca de cinco horas até o primeiro navio chegar, debaixo de um frio de zero grau acentuado pela sensação térmica do vento. Felizmente, ninguém havia caído na água.
É incerto quanto tempo uma pessoa sobrevive se mergulhar nas águas gélidas da Antártica. Uma parte mais radical da tripulação do navio afirmava que meros dez segundos. Se a vítima estiver com um macacão tipo mustang – impermeável e flutuante, obrigatório para entrar num bote ou helicóptero –, o tempo subiria para 90 segundos. Os mergulhadores de plantão do Ary dizem estar preparados para resgatar alguém à deriva em até três minutos. Mas esses tempos são suposições, pois ninguém dessa tripulação presenciara uma história dessas para contar depois. Há rumores de pesquisadores brasileiros que já deram um tibum, por farra, sem mustang e saíram vivos depois de alguns minutos. Pode até ser verdade, pois um britânico agüentou 18,5 minutos nas águas gélidos do Ártico, só de calção, em 2007.
O fato é que quando o Ary alcançou o Explorer todos os passageiros já estavam são e salvos no Endevour e no Nordnodge e rumavam em direção à estação chilena Eduardo Frei, onde fica a única pista para aviões da região. De lá, eles seguiram até Punta Arenas, no Chile, em aeronaves militares chilenas e argentinas.
Passamos ao lado do Explorer, ainda estagnado na mesma inclinação – um visual incomum até para os marinheiros de muitas viagens que integram a tripulação do navio brasileiro. O Monróvia (capital da Libéria, na África) estampado no casco indicava a nacionalidade da embarcação, construída na Finlândia, em 1969. Os pacotes turísticos à moda Titanic haviam sido vendidos pela GAP Adventure, uma agência canadense, para 91 turistas de 20 nacionalidades – entre norte-americanos, japoneses, australianos e europeus – que haviam entrado, sem querer, na maior fria de suas vidas.
A presença do Explorer na região é um reflexo da invasão turística da Antártica, uma região freqüentada até então essencialmente por pesquisadores científicos. Para se ter uma idéia do tamanho da demanda turística atual, cerca de xx pessoas visitaram a Antártica a passeio na década de 19XX. Em 200X, este número subiu para XX – uma avalanche de pessoas que pode soterrar o continente mais inóspito do planeta.
A Antártica tem 14 milhões de quilômetros quadrados (1,6 vezes o tamanho do Brasil) no verão, que vai de outubro a março. Já no inverno, além de ser completamente coberto pela neve, o território dobra de extensão quando o mar a sua volta congela e forma as chamadas banquisas. Teoricamente a Antártica é terra de ninguém (nenhum país tem posse do local) e mesmo assim consegue ser um dos únicos lugares do planeta que não é alvo de disputas territoriais – ainda. Isto por causa do Tratado Antártico, que entrou em vigor em 1961 e foi ratificado por mais 50 anos em 1991, e que estabeleceu que o continente só pode ser explorado pacificamente para fins científicos. Ou seja, o tratado proíbe o retalhamento territorial do continente, as atividades militares (exceto as de apoio às pesquisas) e a exploração mineral e animal como a que quase exterminou focas e baleias na primeira metade do século 20. Mas esse acordo, na verdade, retarda uma disputa territorial que inevitavelmente explodirá em algum momento, afinal cerca de 90% da água potável do planeta está na Antártica e provavelmente muitas reservas de petróleo e minerais nobres. Hoje, 42 países fazem parte do tratado, sendo que 30 mantém ali estações de pesquisa . E o Brasil é um destes.
O BRASIL CHEGOU À ANTÁRTICA NO VERÃO de 1982/83, quando uma expedição foi à procura de um lugar para a construção de Ferraz, inaugurada em 1984. Em 86 o primeiro grupo de pesquisadores brasileiros passou um inverno inteiro isolado no continente e, desde então, a estação abriga ininterruptamente nossos cientistas, que desenvolvem projetos relacionados à atmosfera (que resultam em controle dos níveis de poluição ambiental, da camada de ozônio e do efeito estufa, por exemplo), à vida (estudos de peixes e aves) e à terra (estudo dos recursos minerais e glaciologia). Nos nove dias que fiquei na Antártica a bordo do Ary Rongel e como visitante em Ferraz, acompanhei parte de dois projetos: o Mônica, que estuda os elefantes-marinhos e outros pinípedes (os projetos sempre levam o nome do coordenador) e um braço do projeto Jefferson, que estuda as geleiras.
Mas por que os brasileiros devem gastar dinheiro observando os elefantes-marinhos e as geleiras da Antártica? A geógrafa Rosemary Vieira, coordenadora do Jefferson, dá um bom motivo: “O que ocorre na Antártica tem muito mais repercussão no Brasil do que nos Estados Unidos, que investem mais do que nós em pesquisas. Por exemplo, o que acontece aqui muda o processo de formação de frentes frias e as circulações de águas oceânicas na costa brasileira, interferindo, principalmente, nas áreas produtivas do centro-sul”, explica a pesquisadora.
Dividi com Rose um camarote do navio até ela partir para a geleira Wanda. Lá, a geógrafa ficaria acampada por três semanas com mais dois pesquisadores estreantes na Antártica. O trio faz parte do projeto do glaciologista Jefferson Simões, o principal especialista brasileiro em geleiras. Um dos objetivos do grupo era executar um trabalho chamado sensoriamento remoto de geleiras, no qual são fixadas nos glaciares estacas providas de GPS, para depois acompanhar, via satélite, os movimentos dessas montanhas de gelo. Dando suporte de segurança ao três estava o veterano alpinista neozelandês radicado no Brasil Peter Barry, que participou da primeira expedição brasileira em 1982 à caça de um lugar para Ferraz.
Já o Projeto Mônica também utiliza o sensoriamento remoto para rastrear mamíferos aquáticos (elefantes marinhos e focas) moradores da ilha Elefante, que ficou famosa depois que Endurance virou um clássico nas prateleiras de livros outdoor. A obra narra a aventura do navegador inglês Ernest Schakleton, que em 1914 partiu à Antártica a bordo do navio Endurance com a intenção de atravessar a pé o continente. Porém, antes disso, a nau ficou presa no gelo, afundando em seguida. A tripulação se salvou, mas passou seis meses acampada numa geleira até chegar à Elefante. De lá, o próprio Schakleton mais quatro pessoas protagonizaram uma epopéia a bordo de um barquinho em busca de resgate para o resto do grupo, o que aconteceu somente um ano depois do naufrágio.
Fui de helicóptero até a ilha para assistir à troca de pesquisadores acampados. O Brasil mantém em Elefante o refúgio Emílio Goeldi, que desde outubro de 2007 até março deste ano abrigará, em sistema de rodízio, 14 pesquisadores do projeto coordenado pela doutora em oceanografia Mônica Mathias Muelbert. Um dos trabalhos do grupo é acoplar pequenos sensores nos elefantes-marinhos, para monitorar a movimentação desses simpáticos animais nas águas geladas da região. Anotando por quais correntes eles nadam descobre-se, por exemplo, como as massas de água se movimentam na região. Esses dados são compartilhados com outros grupos de pesquisas, de outros países, criando uma rede de informações complementares sobre os movimentos das massas de água em toda a região Antártica.
Conhecer a dinâmica ambiental antártica ajuda não só a entender as mudanças climáticas globais, como também a completa seca que Ferraz vem sofrendo desde o começou do verão, em outubro. Pela primeira vez na história, os dois lagos que abastecem a estação congelaram por completo, deixando as torneiras sem uma gota d’água. Essa completa solidificação é uma conseqüência da baixa temperatura do ar, que teve médias recordes. O ano de 2007 foi o segundo mais frio da história da estação, levando em conta registros a partir de 1984: média de -3,5ºC ante -3,8ºC registrado em 1986 (antes dos dados metereológicos coletados em Ferraz, outras estações registraram a média anual mais fria em 1959: -4,9ºC). E se o ar está frio, o solo vai atrás. O primeiro a virar gelo foi o lago Sul, o menor dos dois, que ficou sólido em junho. O Norte, por ter mais água, congelou completamente em setembro.
Sem água na caixa d’água, o grupo de pesquisadores, militares e visitantes – o que inclui jornalistas – incorporou à rotina a árdua tarefa de produzir água a partir de neve derretida. Ué, mas o que mais tem na Antártica não é neve? Sim, há neve literalmente aos montes. O problema é que para se obter um copo d’água é necessário derreter um balde inteiro de neve. E encher as caixas de plástico de 130 litros usadas na estação com neve é uma labuta e tanto, como explica o alpinista paulista a serviço neste verão na estação, Nelson Barreta: “É preciso juntar no mínimo três pessoas, vestir um monte de roupas, avisar ao chefe onde estamos indo [por questão de segurança], arrastar as caixas para fora da estação, procurar um lugar com neve limpa, cavar fundo, colocar a neve pra dentro da caixa, arrastar mais de cem quilos pra dentro da estação, acondicionar as caixas no lugar apropriado e esperar de dois a três dias até que ela derreta. Todos os dias”. Depois desse estafante trabalho de coleta, as caixas ficam numa sala climatizada com altas temperaturas (na porta há um cartão-postal escrito “Rio 40º”). Para cada três caixas com neve, são produzidas uma de água.
Outra forma de derreter a neve é jogando-a no telhado de metal da estação e coletando a água por uma calha que cai direto nas caixas. Nos dias de mais sol, são produzidas quatro caixas de água que servem para tudo, desde lavar a louça até tomar banho de canequinha ou usar nos vasos sanitários. A água para beber vem de garrafas minerais estocadas e as roupas são lavadas, de tempos em tempos, na lavanderia do Ary Rongel.
Segundo Alberto Setzer – coordenador do grupo ligado ao Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) de estudos da metereologia antártica –, apesar da temperatura média anual da região de Ferraz estar sofrendo este resfriamento há sete anos, este é um processo contrário à tendência das últimas décadas, quando o padrão foi de aumento das temperaturas. Mas, segundo o engenheiro ambiental, ainda é cedo para saber quais serão as conseqüências desse frio extremo para a Antártica e para o Brasil nos próximos anos. O que eles já sabem é que as mudanças da temperatura na Antártica “não são resultados de aquecimento ou resfriamento regional, mas sim de uma mudança da origem das massas de ar”, explica Alberto. Ou seja, as temperaturas mudam por que os ventos do planeta mudam, assim como as correntes de água por onde nadam os elefantes-marinhos, assim como todas as dinâmicas climáticas do planeta. Portanto, acreditar que os pesquisadores brasileiros na Antártica estão lá apenas gastando dinheiro é pedir para naufragar junto com o Explorer.
Este, aliás, acabou indo por água abaixo na mesma tarde do acidente, de acordo com informações argentinas via rádio. Depois do fato consumado, achei que era o caso de ler com atenção um cartão que recebera no meu primeiro dia no navio. Nele havia a indicação de como proceder em caso de acidente e em qual baleeira eu deveria entrar no caso de abandono de barco. O meu bote de resgate era o bombordo (o anexado à esquerda do navio).
Enquanto isso, na estação, a vida continuava seca. A água não dava sinal de vida até o dia da minha volta ao Brasil, com os dois lagos completamente congelados, criando um paradoxo no continente que guarda a maior reserva de água doce do planeta. Uma semana depois do naufrágio, eu já pisava em solo tropical, sentindo-me um cubo de gelo que acabara de cair do copo. Mesmo debaixo de uma temperatura de 30 graus positivos da capital paulista, tinha ficado com a sensação de que a Antártica era logo ali, uma vizinha a seis mil quilômetros de distância, que merece nosso cuidado, respeito e atenção como se fosse nosso próprio país.
Num tô entendendo
Porque urso polar não come pingüim?
Por que eles não se encontram. Só há ursos no pólo norte (Ártico) e pingüins no pólo sul (Antártica). Daí o nome Antártica: a palavra “ártico”, derivada do grego, significa “urso”. E “anti-ártico” significa “onde não há ursos”. Em português, a palavra Antártida também está correta, mas a versão com “c” é mais utilizada entre pesquisadores e militares.
É realmente frio na Antártica?
Sim, é a região mais fria do planeta, com média de 15 a 20ºC inferiores ao Ártico. Na Antártica existem basicamente duas estações: o verão (de outubro a março) e o inverno, nos outros meses. Por causa da inclinação da Terra em relação à radiação do Sol, no verão antártico os dias são extremamente longos (no período em que eu estive lá anoitecia perto da meia-noite e às quatro da manhã já dava para usar óculos escuros). No inverno há poucas horas de luz, chegando a alguns dias de noite total no alto inverno. A temperatura negativa recorde já registrada foi -89,2ºC, em 1983, na estação russa Vostok.
Como e por que o Brasil está na Antártica?
Essencialmente para desenvolver pesquisa científica. O Brasil faz parte de um grupo de países que assinou o Tratado Antártico, uma convenção que reúne 28 países com direito a voto sobre os assuntos antárticos, mais 14 nações sem direito. Para ter voz ativa é necessário executar pesquisas científicas regularmente no continente gelado, e a Estação Antártica Comandante Ferraz (EACF) é a base brasileira para tal fim. Ela fica numa península da ilha Rei George, no extremo noroeste do continente. Ferraz está a 3.200 quilômetros do pólo sul e cerca de 4 mil quilômetros de Pelotas (RS), porta de saída no Brasil dos aviões e navios rumo à Antártica. O Brasil entrou para o tratado como membro votante em 1983. Em 1986 o primeiro grupo de pesquisadores brasileiros passou um inverno inteiro na estação.
Como é a estação?
Hoje, os 60 containeres da estação têm capacidade para abrigar 50 pessoas (na inauguração eram apenas oito containeres), que convivem numa área construída de 2.250 metros quadrados com alojamentos, laboratórios, oficinas, sala de estar, enfermaria, cozinha, biblioteca, sala de comunicação, academia de ginástica, paióis e heliponto.
Quem “mora” na Comandante Ferraz?
Além dos pesquisadores, um grupo de dez militares da marinha (Grupo-Base) responsável pela administração da estação e dos refúgios que o Brasil mantém em alguns pontos da região. Um outro grupo contratado faz a manutenção da infra-estrutura e, durante o verão, um alpinista do Clube Alpino Paulista dá suporte de segurança às atividades externas. No inverno a estação abriga cerca de 20 pessoas e no verão chega a ter lotação máxima. Também é a marinha que dá suporte logístico e operacional às atividades na região, como a ida e a vinda de pesquisadores, jornalistas e cargas. Já a Força Aérea Brasileira (FAB) faz o transporte de carga e pessoal em aviões Hércules do Brasil até a pista mais próxima de Ferraz, na estação chilena, a 40 quilômetros. Ainda há o navio oceanográfico Ary Rongel, que completa o trabalho de apoio às pesquisas. Eu viajei de Hércules do Rio de Janeiro até a estação antártica chilena. De lá, segui no Ary Rongel até Ferraz. Os dois helicópteros do navio também fazem transporte e outras pessoas vão à Antártica a bordo do Ary desde o Rio, que permanece em águas antárticas de outubro a abril do ano seguinte.
Em quais lugares da Antártica o Brasil faz pesquisas?
Além da George, este ano o Brasil tem pesquisas científicas nas ilhas Joinville, Elefante, Decepcion, Pingüim, Livingstone e Nelson. Em Elefante e Nelson há refúgios para abrigo dos pesquisadores. Todas essas ilhas estão no noroeste e norte do continente. Ao todo, no biênio 2007/2008 o Brasil manterá 18 projetos de pesquisa científica, um projeto de tecnologia (edificações na Antártica) e cinco atividades complementares efetuadas pelo Ary Rongel, como a de sondagem do mar descrito na reportagem e a coleta de amostras diversas em trechos de mar para as pesquisas em andamento.
Quais são os outros interesses na Antártica, além do científico?
Os países que estão na Antártica têm um interesses estratégicos (como o domínio da navegação no mar do Drake, um dos dois únicos pontos de ligação entre os oceanos Pacífico e Atlântico) e econômicos (extração de petróleo, minerais nobres e água, por exemplo). Por exemplo, por meio das análises metereológicas da Antártica, os pesquisadores conseguem prever mudanças climáticas em outros pontos do planeta e assim, evitar prejuízos na lavoura.
(Reportagem publicada originalmente na Go Outside de janeiro de 2008)
INVERNÃO: O segundo inverno mais frio dos últimos 20 anos na Antártica congelou toda a água da região, inclusive a usada pelos pesquisadores na estação brasileira Ferraz
FONTE BOA: A Antártica é dona de 90% da água da água potável do planeta
GORDUCHA: Os elefantes-marinhos são uma simpática espécie de foca da família dos pinípedes, que podem chegar a 4 mil quilos
INFRA: Bote da marinha brasileira transportando pesquisadores e visitantes do navio Ary Rongel (ao fundo) para a estação Comandante Ferraz
APAGARAM A LUZ: A Comandante Ferraz no inverno de 2007, período no qual o quase breu total dura o dia inteiro