Em 2010, uma viagem de camping ao Saara abriu meus olhos para a magia do céu noturno. Na época, eu estava no terceiro ano da faculdade, passando o verão em um intercâmbio no Marrocos, e até então nunca tinha visto a Via Láctea, muito menos uma chuva de meteoros, devido à poluição luminosa da minha cidade natal, Dayton, Ohio (EUA). Mas naquela noite, enrolada em um saco de dormir sob o planetário natural do deserto africano, vi ambos. A experiência me conectou às maravilhas incompreensíveis do universo.
Nos anos seguintes, construí carreira como escritora de viagens, explorando minha fascinação pelo mundo à luz da lua. Recentemente, minhas aventuras noturnas incluíram observar tartarugas marinhas desovando com guias indígenas no Panamá, acampar na camada de gelo da Groenlândia durante uma nevasca, perseguir a aurora boreal na Islândia e procurar rochas fluorescentes nas margens do Lago Superior — entre muitas outras jornadas sem sono.
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Essas viagens, e outras mais, preenchem as páginas do meu próximo livro, 100 Nights of a Lifetime: The World’s Ultimate Adventures After Dark (100 Noites para a Vida Toda: As Aventuras Mais Incríveis do Mundo Após o Anoitecer, em tradução livre), que será publicado em breve nos EUA pela National Geographic. Espero que os três trechos adaptados a seguir — algumas das minhas experiências favoritas — inspirem você a trocar algumas horas de sono pelas maravilhas da noite.
A aventura: acampamento no gelo da Groenlândia
Passe uma noite gelada acima do Círculo Polar Ártico, seguindo os passos dos exploradores polares na camada de gelo da Groenlândia. É uma rara e imersiva forma de admirar a segunda maior massa de gelo do mundo, um gigante ventoso que cobre quase 80% do território da Groenlândia com montanhas geladas, lagos azul-turquesa e um campo minado de fendas e moulins (poços profundos no gelo).
Devido às condições extremas, a maioria das expedições noturnas ao gelo é reservada para equipes profissionais de exploração ou pesquisa científica. Mas o Camp Ice Cap torna essa experiência possível para visitantes menos experientes, mas igualmente destemidos. A viagem de dois dias e uma noite oferece um gostinho da vida de expedição — mas não se engane com a duração curta. Dormir nos 1,7 milhões de quilômetros quadrados de gelo — uma área aproximadamente do tamanho do Alasca — não é um passeio no parque.
Durante a viagem, você e sua equipe levam tendas, sacos de dormir e combustível para uma caminhada de aproximadamente uma hora no vasto deserto branco. Ao chegar ao local escolhido para passar a noite, é hora de montar o acampamento do zero: fixar estacas no gelo, organizar equipamentos, montar barracas e derreter neve para obter água potável. É um trabalho árduo, mas recompensador, com momentos inesquecíveis em meio a essa paisagem única.
O itinerário inclui caminhadas entre montes de gelo e lagos azul-claros, caça à aurora boreal (na primavera ou no outono) e contemplação do sol da meia-noite durante o verão. As conversas profundas no refeitório improvisado, com jantares desidratados, também marcam a experiência, muitas vezes girando em torno de um tema inevitável: as mudanças climáticas.
O derretimento da camada de gelo da Groenlândia é um dos maiores símbolos da crise climática global. Estima-se que até 2100 ela perca até 110 trilhões de toneladas de gelo, elevando os níveis do mar em até 30 centímetros. Para proteger esse recurso natural, o operador do Camp Ice Cap, Albatros Arctic Circle, segue uma política rigorosa de “Não Deixe Rastros”. Isso significa que tudo o que você levar deve ser trazido de volta.
Cada estação do ano oferece um sabor único de aventura. No verão, aproveite as caminhadas com intermináveis horas de luz e, nos dias mais quentes, até mergulhos curtos nos lagos formados pelo degelo. Na primavera ou no outono, a aurora boreal pode ser a recompensa — mas prepare-se para condições meteorológicas imprevisíveis, com possibilidade de tempestades de neve e céu estrelado na mesma noite.
A aventura começa em Kangerlussuaq, no centro-oeste da Groenlândia, onde está localizada uma das principais portas de entrada internacionais da ilha. Esta pequena cidade possui a única estrada que conecta ao gelo, uma rota de 25 quilômetros repleta de buracos e, ocasionalmente, de renas e bois-almiscarados.
Enquanto estiver na Groenlândia
Se a noite no Camp Ice Cap despertar seu apetite por aventuras na Groenlândia, Kangerlussuaq oferece mais opções. A cidade está conectada à famosa Trilha do Círculo Polar Ártico, um trekking de 160 quilômetros até Sisimiut, na costa oeste, com tundra intocada, renas e bois-almiscarados.
Outras maravilhas
Um rápido voo de 45 minutos ao norte de Kangerlussuaq leva você a Ilulissat, lar do Patrimônio Mundial da Unesco, o Ilulissat Icefjord. Esse mosaico de 55 quilômetros de icebergs, com alturas equivalentes a edifícios de 10 a 20 andares, se origina no Sermeq Kujalleq (também conhecido como Glaciar Jakobshavn), que desce da camada de gelo da Groenlândia. É um dos glaciares que se movem mais rapidamente no mundo, e os cientistas acreditam que foi ele que produziu o trágico iceberg que colidiu com o Titanic em 1912.
A aventura: a bordo do Star Train no Deserto da Grande Bacia, Nevada
No início dos anos 1900, a Nevada Northern Railway colocou a remota cidade de Ely no mapa da mineração de cobre. Mais de um século depois, as locomotivas históricas da ferrovia ainda transportam passageiros para o Vale Steptoe, em Nevada, pontilhado por pinheiros piñon e zimbros — embora, atualmente, os visitantes busquem um tesouro diferente: céus noturnos claros e deslumbrantes. Eles encontram essa rara maravilha a bordo da edição especial do Star Train, que atravessa o coração do Deserto da Grande Bacia (Great Basin).
Cerca de 80% dos americanos não conseguem ver a Via Láctea devido à poluição luminosa. Isso não acontece no remoto Great Basin, que cobre grande parte de Nevada. Esse mosaico de 492 mil quilômetros quadrados de pradarias de sálvia, montanhas ondulantes e vales amplos oferece alguns dos céus noturnos mais escuros dos Estados Unidos. A Nevada Northern Railway, hoje um marco histórico nacional em Ely, localizada a cerca de quatro horas ao norte de Las Vegas de carro, aproveita ao máximo o espetáculo celestial com o Star Train, que parte ao entardecer em sextas-feiras selecionadas, entre maio e setembro.
À medida que o deserto transita da hora dourada, banhada de tons de mel, para a escuridão intensa da noite, guardas florestais do vizinho Parque Nacional Great Basin e a equipe da ferrovia compartilham curiosidades sobre as atrações do céu noturno que aguardam. Ao chegar ao destino final — um local privado de observação no Great Basin equipado com telescópios de alta potência —, os guardas narram as maravilhas do universo, desde os anéis iridescentes de Saturno até o tesouro favorito de qualquer observador de estrelas: a cintilante Via Láctea.
A aventura: caçando as luzes do sul da Austrália
Você já ouviu falar das luzes do norte, mas sabia que também pode perseguir essas fluorescências celestiais no Hemisfério Sul? Avistar essas esquivas faixas verdes e violetas, conhecidas como luzes do sul ou aurora austral, exige um pouco de sorte. Assim como as luzes do norte no Ártico, os avistamentos das luzes do sul são mais frequentes na Antártica. No entanto, a temporada de viagens para a Antártica — o verão — coincide com o sol da meia-noite, quando o céu permanece claro o tempo todo. O que um caçador de auroras pode fazer?
Rume para a Tasmânia, uma área geográfica melhor posicionada para avistar auroras do que quase qualquer outro lugar no Hemisfério Sul, exceto o Continente Branco. O potencial da Tasmânia para auroras está ligado à sua posição geográfica e ao mecanismo pelo qual as auroras acontecem.
Durante tempestades solares, o sol lança partículas carregadas no espaço. Quando prótons e elétrons atingem a Terra, eles se concentram perto dos polos geomagnéticos norte e sul, reagindo com a atmosfera para criar faixas de luz verdes, púrpuras, vermelhas ou azuis. Normalmente, as luzes aparecem em regiões extremas do norte ou do sul do planeta, como Islândia ou Antártica, mas quando uma tempestade solar é suficientemente forte, é possível observá-las mais próximas do equador. A Tasmânia, situada perto do polo geomagnético sul, é um dos pontos mais confiáveis do hemisfério para isso.
“Não temos nenhuma massa de terra no Oceano Antártico que corresponda à Noruega ou Islândia”, diz Margaret Sonnemann, autora do livro *The Aurora Chaser’s Handbook*, baseada na Tasmânia. No Ártico ou na Antártica, onde as partículas carregadas colidem com a atmosfera diretamente acima, você pode observar a reação — as auroras — de forma vertical. Na Tasmânia, geralmente o espetáculo é apreciado de uma certa distância, cerca de 45 a 60 graus no horizonte.
Esse ponto de vista oferece uma perspectiva única. Quando as luzes estão diretamente acima, as cores verdes são as mais notáveis, explica Sonnemann. “De lado, você consegue ver as camadas de cores.”
Dada a pureza dos céus noturnos da Tasmânia, é possível observar esses redemoinhos coloridos em diversas partes da ilha. Procure um panorama com obstruções mínimas para o horizonte sul; as margens do norte de um grande lago olhando para o sul ou a costa sul da ilha voltada para o mar são ideias.
Alguns locais comprovados para avistar auroras na Tasmânia incluem Goat Bluff Lookout, na Península South Arm, Carlton Beach, Tinderbox Bay e o cume do Monte Wellington. Para uma hospedagem favorável às luzes do sul, experimente o Pedder Wilderness Lodge, que conta com mínima poluição luminosa e vistas desobstruídas para o sul, cruzando o Lago Pedder. Durante os meses mais quentes, vá até Taroona Beach, ao sul de Hobart, para vivenciar um emocionante espetáculo noturno duplo: auroras serpenteando pelo céu enquanto bioluminescência azul elétrica pulsa sobre as águas.
Uma vantagem de caçar auroras na Tasmânia: é possível observar as luzes durante o ano todo. A Tasmânia experimenta a escuridão noturna em todas as estações. Embora o inverno, mais escuro, ofereça mais horas de potenciais exibições de auroras, é possível presenciar um espetáculo estelar em uma noite quente de verão.
Fatos rápidos sobre auroras
A cor de uma aurora depende de onde as partículas carregadas do sol colidem com a atmosfera terrestre. Auroras vermelhas ocorrem na ionosfera, cerca de 240 km de altitude. Faixas verdes aparecem em uma parte moderadamente densa da atmosfera, aproximadamente entre 95 e 240 km acima do solo. Os raros tons púrpuras surgem quando a reação acontece em nossa densa atmosfera inferior, a cerca de 95 km da superfície terrestre.