Por Gisele Gasparotto
Eis aqui um tema bem atual. Todos falam sobre mobilidade urbana, tentando encontrar soluções que ajudem a diminuir o trânsito das grandes cidades e desestimular o uso de carros. A partir daí surgem muitas ideias, como criar mais faixas de ônibus, construir novas linhas de metrô ou, ainda, tornar as grandes cidades mais "amigas da bicicleta", incentivando seu uso para deslocamento de pequenas distâncias (até 10 quilômetros).
É aí que entra a bicicleta, nossa querida magrela. Senti curiosidade em saber se os atletas de ciclismo e de triathlon fazem parte da “galera da mobilidade” e usam suas bikes também como meio de transporte. Quem me conhece mais intimamente sabe de minha história. Lá em 2005, já inconformada com o tempo que levava de carro para chegar até meu trabalho (cerca de 20 quilômetros de distância de casa) e com o incentivo de uma amiga que já usava a bike para locomover-se, resolvi comprar uma bicicleta e encarar a "Selva de Pedra". Desde então, concilio todas as minhas atividades andando de bike pela cidade. Mas meu caminho foi inverso. Primeiro adotei a bike como meio de transporte e, depois, tornei-me atleta do ciclismo.
Partindo daí, fiz uma pequena pesquisa com meus colegas ciclistas e triatletas sobre o comportamento deles em relação à utilização da bike como meio de transporte. O resultado não foi surpresa para mim. A grande maioria dos atletas consultados não usa a bike para locomoção. Não sentem segurança no trânsito, têm medo de serem roubados e alegam não ter estrutura (ciclovias) para que possam participar desse movimento. Por fim, disseram que, caso tivessem tudo isso, poderiam passar a usar a bike também para locomoção. Curioso observar que, mesmo para pequenas distâncias, como ir ao cabeleireiro, farmácia, padaria, a maioria ainda utiliza o carro.
É inegável que a cultura automobilística está impregnada em nós, brasileiros. Até mesmo nos atletas da bike. Apesar de muitos consultados terem confirmado que passariam a usar a bicicleta para locomoção caso existissem segurança e infraestrutura, será que na prática seria assim mesmo? A comodidade que o carro oferece, em minha opinião, é o grande agravante para a situação não mudar. E quando chover? E se estiver muito frio? Para isso acontecer, não basta termos estrutura e segurança, é essencial que tenhamos vontade e disposição de trocar o conforto pela qualidade de vida. Existem pessoas que esperam acontecer, outras fazem acontecer. De que lado você está?
É necessário, além de tudo o que falei acima sobre condições para se aderir à mobilidade urbana, criar o hábito. E, para isso, é preciso insistir. No começo, quando tomei essa decisão, muitas vezes me peguei dando desculpas para não me locomover de bike. Mas, aos poucos, fui me impregnando pela cultura da bicicleta e, hoje, todos os dias encontro motivos para continuar fazendo tudo com minha bicicleta. Não é uma luta solitária, mas ainda com poucos combatentes. Carrego sempre comigo uma frase de Gandhi: “Devemos ser a mudança que queremos ver no mundo”. E assim sigo com meu objetivo de, aos poucos, ir servindo de referência para uns e outros também sentirem vontade de começar sua mudança (de dentro para fora).
Gisele Gasparotto é ciclista profissional e atualmente integra a equipe de ciclismo Route Bike, de São Paulo