Para aumentar o acesso do público aos parques nacionais brasileiros, estão sendo inauguradas trilhas de longo percurso em algumas das regiões mais bonitas do país – uma ótima notícia para quem curte turismo de aventura
EM UM PAÍS CONHECIDO mundialmente pela beleza de suas grandes florestas e chapadas, pouquíssimos quilômetros são destinados aos turistas aventureiros que gostam de mergulhar na natureza por meio de trilhas e caminhos localizados em parques nacionais. O total de percursos sinalizados e manejados no Brasil não chega a 200 quilômetros. Em Portugal, por exemplo, são mais de 20 mil quilômetros e, num único parque nacional sul-africano, como o Table Mountain, são mais de 600 quilômetros de trilhas. Nos Estados Unidos, então, nem se fale: só a renomada Appalachian Trail, que corta vários estados norte-americanos e é supervisionada pelo governo do país, possui cerca de 3.500 quilômetros sinalizados. Pensando nesses números, o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), órgão que gere, implanta, protege, fiscaliza e monitora grandes áreas naturais do Brasil, aprovou recentemente a implantação de novos caminhos em parques nacionais. Toda trilha oficial pela qual você passa hoje tem o dedo deles, que estudam, discutem, manejam e procuram
fazer com que as visitas tenham o mínimo de impacto na natureza local. “A gente quer incentivar o contato das pessoas com o verde, com o máximo de liberdade e respeito”, diz o analista ambiental Geraldo Pereira, responsável pelo uso público do Parque Nacional do Pau Brasil, em Porto Seguro, na Bahia. O parque está em vias de ser aberto ao público e terá a maior trilha de mountain bike no Brasil. Entre suas iniciativas, Geraldo pretende implantar energia solar para abastecer uma futura área de camping na região. “Teremos o mínimo de energia necessária, com baixo impacto, apenas para acender algumas luzes básicas”, diz ele. Existem dois modelos de trilhas de longo percurso adotados pelo ICMBio na criação das novas trilhas para turismo de aventura que serão inaugurados pela entidade: em um, a distância total é quebrada em vários trechos, permitindo que o visitante deixe a trilha a qualquer hora e possa reiniciá-la exatamente do ponto em que havia abandonado; em outro, o pernoite é feito em abrigos ou campings ao longo do trajeto. Em ambos os casos, as trilhas são demarcadas e permitem aos turistas que a utilizem por conta própria – porém, ter alguém que conheça o trajeto pode facilitar as coisas. “Um guia pode orientar, mas muitas vezes quem está visitando quer ter uma experiência mais pessoal e privada”, diz Geraldo. Os novos trechos já estão com o padrão de sinalização internacional, que é a sinalização rústica, barata, de fácil manutenção e reposição. “A ideia é que todas as trilhas hoje sejam autoguiadas”, explica Pedro Menezes, que recentemente deixou o cargo de diretor do ICMBio. Ele acredita que a presença de visitantes contribui para a situação econômica dos novos locais a serem explorados. “A indústria hoteleira e gastronômica dos arredores cresce, uma vez que o grupo que está no parque pode se hospedar e se alimentar fora dele”, diz. Dessa forma, a comunidade da região beneficia-se desse turismo de preservação. Confira a seguir os novos roteiros do ICMBio para você explorar de perto nossos parques nacionais. São trilhas que precisarão muito de sua ajuda na preservação e até na indicação de melhorias futuras.
PEDAL NA BAHIA
Ciclismo no Pau Brasil (BA)
Em junho, os ciclistas vão ganhar 28,5 quilômetros de terra para pedalar – é a maior trilha manejada para bicicletas do Brasil. O Parque Nacional do Pau Brasil, situado em Porto Seguro, foi inaugurado em 2000 para preservar espécies como o Pau-Brasil, e só agora, após toda a concretização das trilhas, está com sinalização e condições para o turismo de aventura, com rotas de longo percurso. A vantagem dessa trilha é que sua viagem será em um dos parques mais intocados do país, a poucos quilômetros de algumas das praias mais famosas do sul da Bahia, como Trancoso e Caraíva. Como o trajeto ainda é novo, é recomendado ter o acompanhamento de um guia, mas isso não é obrigatório. O pernoite dentro do parque deve entrar em funcionamento em alguns meses, com um camping com capacidade para 20 a 30 pessoas, localizado a um quilômetro de distância de uma cachoeira com queda de quatro metros. Antes que os campings sejam inaugurados, hospedar-se em Porto Seguro ou Arraial d’Ajuda é a pedida. Em Porto Seguro, uma opção é o hotel Transoceânico (transoceanico.com.br, tel. 73 2105 4000, diárias para casal a partir de R$ 150). Na hora de comer, não deixe de passar no Paulinho Pescador (paulopescador.com.br), em Arraial d’Ajuda. O Parque Nacional do Pau Brasil não cobra nenhum tipo de taxa. Para mais informações sobre os horários de funcionamento, fale com a central que cuida do Pau Brasil (tel. 73 3281 0805).
NO CORAÇÃO DO RIO
Transcarioca (RJ)
O objetivo da chamada Transcarioca, que conta com a ajuda de voluntários no manejo, é demarcar o trajeto de 130 quilômetros que vai da Restinga da Marambaia, no extremo oeste do município do Rio, ao Pão de Açúcar, no extremo leste, conectando dez Unidades de Conservação encravadas dentro da cidade do Rio de Janeiro. Um de seus trechos, com aproximadamente 75 quilômetros, foi recém-inaugurado no Parque da Tijuca, na capital fluminense. Ele teve como inspiração ações semelhantes realizadas em florestas urbanas de cidades como Sydney, na Austrália, Cidade do Cabo, na África do Sul, e Hong Kong, na China. Não é permitido pernoitar nesse parque, por isso a trilha tem saídas para o asfalto a cada 5 quilômetros, num total de 50 pontos de acesso ao trajeto. Há entradas e saídas em diferentes bairros do Rio, como Barra da Tijuca, Santa Tereza e Jardim Botânico. É possível fazer um trecho da trilha, passar a noite na cidade e retomar no dia seguinte, do ponto onde parou. Uma vez que esse trecho da trilha fica no coração da cidade do Rio de Janeiro, as possibilidades de hospedagem e alimentação são diversas – e com preços um pouco salgados. Ficar na Barra da Tijuca é mais estratégico e menos caro. No Entremares Hotel (entremareshotel.com.br, tel. 21 2494 3887), a diária para o casal sai a partir de R$ 330. No Jardim Botânico, a hospedagem é um pouco mais cara: o hotel Mercure (mercure.com.br, tel. 21 2113 2400) cobra a partir de R$ 380 de diária para o casal.
MONTANHAS FLUMINENSES
Trilha Caminhos da Serra do Mar (RJ)
A trilha que começa na Vila Inhotimirim, no distrito de Magé, a 50 quilômetros do Rio de Janeiro, tem 65 quilômetros de extensão e une seis trechos que levam até Teresópolis, cruzando o Parque Nacional da Serra dos Órgãos. O projeto visa, além da preservação do local, o desenvolvimento de emprego e renda por meio de acomodação nas comunidades do entorno. São seis dias de caminhada, com o percurso repleto de campos de altitude, mata de encosta, paredões rochosos, picos, poços e cachoeiras. Nos primeiros três dias, o pernoite é feito em comunidades urbanas ou rurais, com hospedagem, alimentação e consumo em pequenas lojas, farmácias e mercearias. Nos três trechos finais, que passam pelo ponto mais alto da caminhada, na Pedra do Sino, a opção é ficar nos abrigos de montanha (R$ 40 por noite, com reserva antecipada) ou campings (R$6 por noite). É possível chegar até a Vila Inhotimirim de trem, partindo da Central do Brasil (R$ 3,10 cada bilhete), no Rio, e chegando à histórica estação da primeira ferrovia do país, no Caminho do Ouro – primeiro trecho da trilha. Para quem vai de carro do Rio de Janeiro, o caminho é pela BR 116, passando por Piabetá. Você pode reservar entrada, pernoites e decidir quais trechos vai encarar falando com o Parnaso, órgão que cuida do parque (parnaso.gov.br, tel. 24 2236 0258). Na chegada a Teresópolis, o hotel Alpina (hotelalpina.com.br, tel. 21 2741 4999) oferece diárias para o casal a partir de R$ 320, tem um café da manhã reforçado e é bom para descansar.
GRANDES CHAPADÕES
Travessia das Sete Quedas (GO)
Em uma região com algumas das trilhas mais alucinantes do país, um novo trecho foi inaugurado: são 35 quilômetros na travessia São Jorge-Cavalcante, que terá duração de seis dias. Os chapadões, corredeiras, rios e cânions da região da chapada dos Veadeiros, somados às dezenas de cachoeiras, fizeram as cidades de Alto Paraíso e São Jorge ficarem famosas. E agora quem entra nessa rota é o município de Cavalcante que, devido a uma espécie de minério, tem as águas das cachoeiras bem cristalinas, o que torna o passeio ainda mais paradisíaco. Na trilha, os pernoites são feitos em áreas de camping rústico, por isso leve sua barraca e tenha muitas pilhas, pois não há pontos com energia elétrica. Esteja preparado para cruzar rios, encontrar trechos bem pedregosos, subidas de morros e, claro, cachoeiras, como a das Sete Quedas. O ponto de partida é a entrada do parque nacional, em São Jorge – para chegar lá, é possível ir de carro ou ônibus a partir de Brasília (cerca de duas horas de viagem). Em São Jorge, existem campings como o Espaço Flora (peduespacoflorasaojorge@hotmail.com, tel. 62 3455 1041) e pousadas muito confortáveis, como a Água Esperança (pousadaaguaesperanca.com.br, tel. 61 9971 6314, diárias para casal a partir de R$ 840). É imperdível experimentar a matula no Rancho do Waldomiro, que fica ao pé do Morro da Baleia, antes ou depois do trekking. O prato é típico dos tropeiros locais, feito com farinha, feijão e três tipos de carne diferentes. O licor produzido no próprio Rancho também é delicioso e ajuda na digestão.
(Reportagem publicada originalmente na Go Outside de maio de 2013)
Por Fernando Gueiros
NOVAS TRILHAS: Em sentido horário, a partir desta, visual da Serra dos Órgãos,
ponto final da trilha Caminhos da Serra do Mar; fauna e flora do Parque Nacional Pau-Brasil
e vista da trilha Transcarioca
PRONTINHA: Trecho da Transcarioca em pleno trabalho
da abertura e sinalização
(Foto: Edu Zappia)
(Foto: Edu Zappia)